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Processo nº 561/2016 Data: 22.09.2016
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “tráfico de estupefacientes”.
Pena.
Atenuação especial.



SUMÁRIO

1. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.

2. A atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo.
Para efeito de atenuação especial da pena prevista no art.º 18.º da Lei n.º 17/2009, só tem relevância o auxílio concreto na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura de outros responsáveis do tráfico de drogas, especialmente no caso de grupos, organizações ou associações, ou seja, tais provas devem ser tão relevantes capazes de identificar ou permitir a captura de responsáveis de tráfico de drogas com certa estrutura de organização, com possibilidade do seu desmantelamento.

O relator,

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José Maria Dias Azedo

Processo nº 561/2016
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por Acórdão do T.J.B. de 20.05.2016, decidiu-se condenar A, (3°) arguido com os sinais dos autos, como autor da prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão; (cfr., fls. 433 a 439 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado, vem o arguido recorrer para dizer (apenas) que excessiva é a pena que devia ser reduzida para uma outra não superior a 4 anos e 6 meses de prisão; (cfr., fls. 463 a 467).

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Respondendo, diz o Ministério Público que o recurso não merece provimento; (cfr., fls. 475 a 480).

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Admitido o recurso e remetidos os autos a este T.S.I., em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação (fls.463 a 467 dos autos), o recorrente pediu a redução da pena aplicada no Acórdão recorrido para a não superior a 4 anos e 6 meses de prisão, arrogando a atenuação especial contemplada nos n.°1 e n.°2/c) do art.66° do CPM bem como no art.18° da Lei n.°17/2009, e a título subsidiário, assacando a violação do disposto nos arts.40° e 65° do CPM.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações da ilustre Colega na Resposta (fls.475 a 480 dos autos), no sentido do não provimento do recurso em exame.
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No ordenamento jurídico de Macau, a atenuação especial da pena é de aplicação excepcional, e não é qualquer das circunstâncias previstas no n.°2 do art.66° do Código Penal ou semelhantes logo capaz de accionar o regime de atenuação especial da pena, antes tem de apreciar todo o quadro da actuação do agente para ponderar a atenuação especial e encontrar a medida concreta da pena.
Com efeito, «Para poder beneficiar da atenuação especial da pena prevista no art.66° do Código Penal, é necessário que se verifica uma situação de diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena, em resultado da existência de circunstâncias com essa virtualidade.» (Acórdão do TUI no Processo n.°20/2004)
De outro lado, não deve perder vista que para efeitos de atenuação especial da pena, o arrependimento só é relevante se se traduzir em actos concretos demonstrativos de tal sentimento (Ac. do TUI no Processo n.°34/2010), a mera colaboração com autoridade policial bem como a confissão não tem condão do arrependimento consignado na c) do n.°2 do art.66° do CPM.
E importa ter sempre presente que «para que seja possível accionar o mecanismo de atenuação especial ou dispensa da pena previsto no art.18° da Lei n.°17/2009, é necessário que as provas fornecidas sejam tão relevantes capazes de identificar ou permitir a captura de responsáveis de tráfico de drogas de certa estrutura de organização, com possibilidade do seu desmantelamento.» (Acórdão do TUI no Processo n.°34/2010)
No vertido caso, sucede que fundamentando o pedido de redução da pena, a recorrente alegou «上訴人坦白承認販毒的事實,而且在犯罪後表示真誠的後悔。上訴人為初犯,在實施犯罪時未有使用任何暴力手段、被司警偵查員截停時亦無任何逃走或強烈的反抗舉動,甚至亦同意偵查員搜身,其亦表現合作。» e «其後於整個調查中,上訴人亦有一直配合偵查員,其所知悉之案情如實交代,亦同意提供其與第一嫌犯之手機短訊,因此對上訴人的刑罰應獲得特別減輕。».
Ressalvado o elevado respeito pela opinião diferente, e em esteira das prudentes orientações jurisprudenciais, entendemos que nenhuma das circunstâncias arrogadas pelo recorrente dispõe do condão de atenuação especial da pena consagrada no n.°1 do art.8° da Lei n.°17/2009.
Na verdade, o douto Tribunal a quo não esqueceu da circunstância de atenuação especial, mencionando propositadamente, no acórdão em causa, que «嫌犯B基本上承認了所有向其歸責的犯罪事實。在庭上態度合作且詳細描述了整件案件的經過,內容大致與控訴書相同。» e «且又由於第一嫌犯曾主動向司法警察局提出協助識別及逮捕本案的其第二嫌犯,故合議庭認為可根據8月10日第17/2009號法律第18條之規定特別減輕該嫌犯的刑罰。»
Tendo à colação a moldura penal prescrita no n.°1 do art.8° da Lei n.°17/2009 e a pena imposta ao 1° arguido B de 5 anos e 3 meses de prisão efectiva, afigura-se-nos que não infringe as disposições nos arts.40° e 65° do CPM a pena de 6 anos e 6 meses de prisão efectiva aplicada ao recorrente”; (cfr., fls. 512 a 513).

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Cumpre apreciar.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 435 a 436-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou como autor da prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão.

Pede, apenas, a redução – atenuação especial – da pena que lhe foi aplicada, não impugnando a decisão da matéria de facto e sua qualificação jurídico-criminal que, por não merecer qualquer censura, se tem aqui como definitivamente fixada.

Quanto à “pena”, vejamos, pouco havendo a dizer.

O crime de “tráfico” pelo arguido ora recorrente cometido é punido com a pena de 3 a 15 anos de prisão; (cfr., art. 8° da Lei n.° 17/2009).

Como sabido é, a “determinação da medida concreta da pena”, é tarefa que implica a ponderação de vários aspectos.

Desde logo, há que ter presente que nos termos do art. 40° do C.P.M.:

“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.

Por sua vez, e atento o teor art. 65° do mesmo código, onde se fixam os “critérios para a determinação da pena”, tem este T.S.I. entendido que “na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 10.03.2016, Proc. n.° 134/2016, de 07.07.2016, Proc. n.° 436/2016 e de 21.07.2016, Proc. n.° 483/2016).

No caso, agiu o arguido com dolo directo e intenso, sendo muito elevado o grau de ilicitude da sua conduta, pois que não sendo residente de Macau, para aqui se deslocou, transportando estupefaciente, tendo sido detectado, vigiado e posteriormente detido em flagrante delito, com mais de 40 gramas de Cocaína.

Face aos graves malefícios e prejuízos que o crime de “tráfico de estupefacientes” causa para a saúde pública, e, atento o aumento dos índices deste tipo de criminalidade, evidentes se mostram as fortes razões de prevenção criminal.

Em abono do arguido, provou-se que “confessou os factos”.

Porém, importa atentar que foi detido em “flagrante delito”, pouco valor atenuativo se podendo assim atribuir à aludida confissão.

E então, aqui chegados, quid iuris?

Pois bem, é sabido que com os recursos não se visa eliminar a margem de livre apreciação reconhecida ao Tribunal de 1ª Instância em matéria de determinação da pena, e que esta deve ser confirmada se verificado estiver que no seu doseamento foram observados os critérios legais legalmente atendíveis; (cfr., v.g., os Acs. do Vdo T.U.I. de 03.12.2014, Proc. n.° 119/2014 e de 04.03.2015, Proc. n.° 9/2015, e, os recentes Acs. deste T.S.I. de 07.07.2016, Proc. n.° 436/2016 e de 21.07.2016, Proc. n.° 483/2016).

Temos também considerado que “a atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 03.03.2016, Proc. n.° 78/2016, de 12.05.2016, Proc. n.° 305/2016 e de 21.07.2016, Proc. n.° 483/2016).

Nesta conformidade, evidente sendo que motivos não existem para qualquer “atenuação especial da pena” ao abrigo do art. 66° do C.P.M. ou art. 18° da Lei n.° 17/2009 – já que igualmente inverificados estão os necessários pressupostos legais para tal, cfr., v.g., o Ac. do Vdo T.U.I. de 30.07.2015, Proc. n.° 39/2015 onde se decidiu que: “Para efeito de atenuação especial da pena prevista no art.º 18.º da Lei n.º 17/2009, só tem relevância o auxílio concreto na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura de outros responsáveis do tráfico de drogas, especialmente no caso de grupos, organizações ou associações, ou seja, tais provas devem ser tão relevantes capazes de identificar ou permitir a captura de responsáveis de tráfico de drogas com certa estrutura de organização, com possibilidade do seu desmantelamento” – atenta a moldura penal prevista para o crime em questão, (3 a 15 anos de prisão) a conduta provada, da qual se destaca a forte intensidade do dolo (directo) e as fortes necessidade de prevenção criminal, (especialmente, geral), e as decisões sobre esta matéria tomadas por este T.S.I. e Vdo T.U.I., afigura-se-nos que motivos não há para se reduzir a pena fixada, com o que improcede o recurso.

Decisão

4. Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso.

Pagará o arguido a taxa de justiça que se fixa em 5 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique.

Macau, aos 22 de Setembro de 2016
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 561/2016 Pág. 12

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