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Processo n.º 64/2016
(Recurso Cível)

Relator: João Gil de Oliveira
Data : 29/Setembro/2016


ASSUNTOS:
- Simulação; prova dos requisitos do negócio simulado
    
    
SUMÁRIO :
1. O que importa, na invocação de um negócio simulado é que se alegue a face visível do que se passou entre os simuladores, que esse negócio seja descrito com clareza e seja de molde a configurar um negócio celebrado com a intenção de enganar terceiros, no caso, invocando-se ainda o prejuízo dos interesses do autor.
2. Para que haja negócio simulado é necessário comprovar os diferentes requisitos da simulação, tal como previstos no art. 232º do CC: acordo entre declarante e declaratário, intuito de enganar terceiros e divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante.
3. Como está bem de ver, é difícil encontrar uma prova directa para alguns destes requisitos, pois em relação ao primeiro, os participantes no acordo simulatório estão interessados no seu secretismo e em relação aos dois requisitos seguintes integram eles matéria de facto do foro íntimo, volitivo e anímico que, no mais das vezes, só por uma elevação do julgador, a partir da conjugação de todos os elementos circunstanciais e pelas regras do senso comum e da normalidade da vida, será possível atingir.
              
              O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira























Processo n.º 64/2016
(Recurso Cível)
Data : 29/Setembro/2016

Recorrentes : - A (preso)
        - B有限公司

Recorrida : - C


    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO

1. A e B有限公司, ora recorrentes, vêm recorrer do acórdão proferido pelo Tribunal Colectivo sobre a matéria de facto, no que se refere às respostas dadas aos artigos 1.°, 2.°, 4.°, 5.°, 8.°, 10.°, 11.°, 13.° a 17.° e 21.° a 24.° e sobre a douta sentença que deu provimento ao pedido de declaração de nulidade de compra e venda das fracções autónomas AR/C e BR/C celebrado entre 1.º Réu e 2.ª Ré, por simulação, assim como ao cancelamento de todos os registos realizados juntos da Conservatória Predial de Macau (tendo ainda a A. formulado o pedido, subsidiariamente, caso assim se não entendesse, que fosse julgada procedente a impugnação pauliana da autora por serem provados os factos articulados na petição inicial, e declarado que o acto de compra e venda realizado pelo 1º réu e 2ª ré relativamente às fracções A/RC e B/RC sitas na Avenida do Almirante Lacerda, n.º XX de Macau (inscritas na Conservatória do Registo Predial
sob o n.º XXXXX) não produz efeitos em relação à autora; que a autora tem direito a executar as fracções A/RC e B/RC da 2ª ré, e exigir a restituição patrimonial conforme o limite dos seus interesses, pelo que pode ser executada a restituição dos referidos bens da obrigada).
    
    As alegações que se apresentam dividem-se em dois momentos: um em que os recorrentes expõem os motivos pelos quais impugnam a decisão proferida pelo Tribunal Colectivo, indicando, para esse efeito os meios de prova constantes do processo e, que, no seu entender, impunham uma decisão diferente da que foi proferida; num segundo momento os Recorrentes procederão à impugnação da decisão de improcedência dos pedidos formulados pelos Recorrentes.

Para tanto concluem as suas alegações de recurso do seguinte modo:
    1) O presente recurso tem por objecto o acórdão proferido pelo Tribunal Colectivo sobre a matéria de facto, no que se refere às respostas dadas aos artigos 1.°, 2.°, 4.°, 5.°, 8.°, 10.°, 11.°, 13.° a 17.° e 21.° a 24.° da base instrutória e sobre a douta sentença que deu provimento ao pedido de declaração de nulidade de compra e venda das fracções autónomas AR/C e BR/C celebrado entre 1.° Réu e 2.ª Ré, assim como ao cancelamento de todos os registos realizados juntos da Conservatória Predial de Macau.
    2) De forma a provar os artigos 21.° a 24.° da base instrutória os Recorrentes lançaram mão dos seguintes meios que, a seu ver, impunham um julgamento diferente daquele que foi proferido pelo Tribunal Colectivo, i.e., prova testemunhal produzida pela testemunha D e pelas testemunhas E e F. No que concerne à prova documental, os Recorrentes basearam-se nos documentos que mais à frente se enunciarão.
    3) A prova testemunhal sustenta ainda que num sentido inverso, a resposta dada aos quesitos 1.°, 2.°, 13.° a 17.° da base instrutória, i.e., para demonstrar que os quesitos julgados como provados deveriam ao invés ter sido julgados como não provados.
    4) Por fim, a prova documental serve também para demonstrar que os quesitos 4.°, 5.°, 8.° e 11° deveriam ter tido um julgamento diverso e, consequentemente, ter sido julgados como não provados.
    5) Conforme resulta das transcrições do depoimento da testemunha, irmão do 1.° Réu, ora 1.° Recorrente, foi referido e explicado que as duas fracções autónomas foram vendidas pelo la Réu à B有限公司 pelo valor de 8 milhões. Sendo que, foi pago o valor de um milhão e meio ao 1.° Réu, ora 1.° Recorrente e as duas hipotecas foram transferidas para o comprador (2.ª Ré), sendo que o comprador aceitou as hipotecas incidentes sobre as duas fracções autónomas.
    6) Mais foi dito que, a família do 1.° Réu só teve conhecimento da venda as fracções autónomas a posteriori e "ficaram muito aborrecidos quando descobriram a venda das fracções autónomas. Dado que ainda estavam a utilizar as fracções autónomas, não tínhamos outra maneira de resolver e decidimos comprar as fracções autónomas novamente".
    7) Daí que a família adquiriu as fracções não através de escritura pública de compra e vendas, mas através da aquisição das acções dos sócios da sociedade B有限公司, de modo a evitar impostos.
    Assim sendo, em Janeiro de 2011 foram pagos 11 milhões, sendo que 3 eram da hipoteca. O pagamento foi dividido em 3 tranches. A primeira foi de 4 milhões, a segunda de 1 milhão e meio e a terceira de dois milhões e meio.
    8) A testemunha D teve conhecimento do sucedido através da sua Mãe, e foi tratado como um assunto importante e sério pela família. A testemunha não soube precisar o nome de um dos sócios da sociedade B有限公司, mas afirmou que conheceram os sócios através da aquisição das acções que foi realizada.
    9) Acresce que, do depoimento da supra referida testemunha resultou também ainda que, como contra-prova que, desconheciam os alegados actos de burla do 1.° Réu, só houve contacto com os sócios da 2.ª Ré quando descobriram a venda das fracções autónomas, pelo que os quesitos 1.°, 10.° e 13.° deveriam ter sido julgados como não provados.
    10) Em face disto, G e H não poderiam ter auxiliado na transmissão das fracções autónomas para a 2.ª Ré. Mais ainda, que por desconhecerem os alegados actos praticados pelo 1.° Réu, I e J não sabiam que a denúncia havia sido feita, logo, a procuração que foi passada era válida. Resultando assim que, os quesitos 14.° e 15.° da base instrutória deveriam ter sido também julgados como não provados.
    11) Em suma, a testemunha corroborou os factos vertidos nos artigos 18.° a 24.° da base instrutória, pelo que o seu depoimento deveria ter sido valor ado para prova dos factos supra referidos, que devem ser julgados como provados.
    12) De outra banda, os quesitos 1.°, 10.°, 13.°, 14.°, 15.° deveriam ter sido julgados como não provados.
    13) Relativamente à primeira testemunha da Autora, E, do depoimento desta testemunha resulta que pouco ou nada sabe quanto à compra e venda das fracções autónomas AR/C e BR/C, em que moldes se realizou esta compra e venda, e muito menos em relação à cessão de quotas realizada.
    14) Falou reiteradamente que foi enganada, burlada, tendo sempre por base o processo crime no qual o 1.° Réu foi condenado mas, quanto ao essencial, apenas parte de suposições obviamente infundadas para afirmar que o 1.° Réu fugiu às suas responsabilidades e ficcionou uma compra e venda das fracções autónomas ora em causa.
    15) Refere também que falou com o 1.° Réu, com os seus familiares, mas nada disso pode provar que o 1.° Réu, ora 1.° Recorrente sabia que tinha sido feita uma queixa, bem como os seus familiares. Por outro lado, também não se consegue fazer prova que, por esta razão, foi outorgada uma procuração para fugir às dívidas.
    16) Igualmente ficou por provar que os ex-sócios da 2.ª Ré conheciam a mãe e irmão do 1.° Recorrente, I e J e que esta cessão de quotas foi orquestrada de modo a fugir a dívidas e escamotear o que de facto foi um contrato de compra e venda de duas fracções e um contrato de cessão de quotas!
    17) Em sede de contradita ficou patente o interesse que a testemunha tem no provimento da presente acção, pois, sendo declarada nula a compra e venda das fracções autónomas e procedendo-se ao cancelamento dos registos na Conservatória do Registo Predial, a testemunha poderá intentar uma acção de execução contra o 1.° Réu e, assim, executar os imóveis.
    18) Ora, salvo o devido respeito, o depoimento da testemunha está inquinado, e, serve para demonstrar que os quesitos 1.°, 2.°, 13.° a 17.° da base instrutória deveriam ter sido julgados como não provados.
    19) Conforme decorre do depoimento da segunda testemunha F todos os factos que relatou no tribunal advieram do que a sua filha, Autora nos presentes autos, lhe disse ou de documentos que viu posteriormente à acção ter sido intentada. Pois bem, parece-nos que tal depoimento é insuficiente, incongruente e desprovido na maior parte das vezes de qualquer sentido.
    20) Mais uma vez a testemunha falou sobre a condenação do 1.° Réu em sede do processo crime mas nada soube dizer relativamente ao contrato de compra e venda, contrato de cessão de quotas, se alegadamente a família do 1.° Réu agiu em conluio o com os sócios da 2.ª Ré, quem eram os sócios da 2.ª Ré e se auxiliaram de qualquer modo o 1.ª Réu e a família deste na compra e venda, bem como na cessão de quotas!
    21) Ou seja, o que se retira deste depoimento é virtualmente nada! Mas mais, esta testemunha também tem todo o interesse em que acção tenha provimento, como foi destacado na contradita, e só vem confirmar que os quesitos 1.º, 2.º, 13.º a 16.º não deveriam ter sido julgados provados!
    22) Termos em que, deverá ser revogado o acórdão proferido sobre a matéria de facto por violação dos artigos 386.º e ss do Código Civil e, consequentemente, com base nos meios de prova mencionados os artigos 21.º a 24.º da base instrutória passem a ser dados como provados e os artigos 1.º, 2.º, 13.º a 16.º devem ser julgados como não provados.
    23) Da prova documental constante dos autos, é possível deduzir e concluir pela prova dos artigos 21.º a 24.º da base instrutória e pela não prova dos artigos 4.º, 5.º 8.º e 11.º da base instrutória.
    24) Dos documentos n.º 2 a na 4 juntos com o requerimento de 05 de Novembro de 2013 resulta que foi celebrado um contrato promessa de cessão de quotas em 31 de Janeiro de 2011, através do qual se transmitiram as quotas da 2ª Ré para a Sra. I e o Sr. J, pelo valor de HKD$8,000,000.00, sendo que a título de sinal era devido o valor de HKD$4,000,000.00. Assim, como através dos contratos suplementares de 6 de Maio e 27 de Maio de 2011 ficou estipulado como seria pago o valor remanescente e em que data seria finalizado o processo da cessão de quotas.
    25) A comprovar o supra referido temos os documentos n.º 5 a 8 e n.º 9 e 10 juntos com o requerimento de 05 de Novembro de 2013.
    Pois bem, destes documentos constam os pagamentos de HKD$4,000,000.00, HKD$300,000.00, HKD$1,200,000.00 e HKD$2,500,00.00 realizados em 1 de Fevereiro de 2011, 6 de Maio de 2011 e 26 de Junho de 2011 a H. A estes documentos acrescem os documentos 9 e 10 que atestam a suficiência económica de I para proceder aos pagamentos supra mais bem referidos.
    26) Ora, parece claro que estes documentos não foram devidamente tidos em conta pelo Tribunal Colectivo, pois da soma destes cheques resulta o valor atribuído à cessão de quotas. Fazendo assim, cabal prova dos artigos 21.° a 24.° da base instrutória que foram dados como não provados, mas que devem agora serem julgados como provados.
    27) Doutra sorte, os documentos n.º 2 e n.º 3 juntos com a contestação comprovam que foi emitido um cheque a favor do procurador do 1ª Réu e que a a 2ª Ré dispunha de meios financeiros.
    28) Doutra sorte, os documentos n.º 2 e n.º 3 juntos com a contestação comprovam que foi emitido um cheque a favor do procurador do 1ª Réu e que a a 2ª Ré dispunha de meios financeiros. Sendo o documento n.º 2 uma pública-forma do cheque emitido pelo Banco Industrial e Comercial da China datado de 22 de Outubro de 2010 a favor de L no valor de HKD$1,557,850.00 que contém o carimbo da 2ª Ré e o valor de HKD$1,557,850.00, correspondente ao valor da compra e venda das fracções autónomas por parte da 2ª Ré ao 1.° Réu representado pelo seu procurador.
    29) Por outro lado, o documento n.º 3 é um extracto bancário da 2.ª Ré que indica que dispunha de meios financeiro.
    30) Face a estes documentos, comprova-se que os quesitos 4.° e 5.° da base instrutória não deveriam ter sido dados como provados. Pois, se por um lado, o 1.° Réu recebeu da 2ª Ré o preço das fracções autónomas, para isto suceder, a 2ª Ré teria, necessariamente que ter dinheiro para pagar o preço referido em O) dos factos assentes, até porque o extracto bancário indica suficiência económica.
    31) Os documentos n.º 4 e n.º 5 juntos com a contestação e o doe. n.º 1 junto com o requerimento de 13 de Janeiro de 2014 são declarações emitidas pelo Banco Industrial e Comercial da China em que é confirmado que a 06 de Dezembro de 2010 a 2ª Ré pagou a hipoteca que incidia sobre a fracção autónoma BR/C a favor do Banco Industrial e Comercial da China, realizando um pagamento no valor de HKD$3,142,252.31. O documento n.º l faz também referência ao pagamento realizado pela 2.ª Ré e ao cancelamento da hipoteca.
    32) Ora, mais uma vez estes documentos provam que os quesitos 4.º e 5.º da base instrutória não deveriam ter sido julgados provados e que estão em contradição com o artigo 20.º da base instrutória. Isto porque, se pode provar que "em 17 de Novembro de 2010, o Banco Industrial e Comercial da China, debitou da conta da 2.ª ré a quantia de HKD$3,142,252.31 e a aplicou no pagamento do remanescente da dívida hipotecária a que se refere a inscrição referida em H) dos factos assentes", quando anteriormente provou que a 2ª Ré não tinha fundos suficientes para a aquisição das fracções autónomas referidas em G) e I) do factos assentes e que a 2ª Ré não pagou o preço referido em O) dos factos assentes ao 1.º Réu. Ou bem que a 2ª Ré tinha suficiência económica ou não tinha!
    33) Pelo que, os quesitos 4.º e 5.º da base instrutória deveriam ter sido julgados como não provados.
    34) A isto acresce que, dos documentos n.º 11 e n.º 12 juntos com o requerimento de 05 de Novembro de 2013, avaliações realizadas às fracções autónomas retira-se que valor das fracções autónomas é HKD$4,230,000.00 e HKD$2,790,000.00, sendo que valor pago a título de compra e venda das fracções autónomas foi de HKD$1,557,850, acrescido das duas hipotecas, HKD$2,784,375.00 e HKD$3,850,000.00, equivalentes para efeitos fiscais a MOP$3,965,500.00.
    35) Ora, o valor descrito no relatório de avaliação vai de encontro ao valor pago pelo imóvel à data de realização da escritura pública de compra e venda, aos quais acresciam as hipotecas, comprovando, assim, que se tratou de uma verdadeira compra e venda.
    36) A isto acrescem os documentos n.º 1 e n.º 2 juntos com o requerimento de 22 de Abril de 2015 que configuram um carta de intenção para realização de um concerto e um contrato entre uma produtora e K Limited respeitante a locação de um espaço para o mesmo concerto. Pois bem, tais documentos provam que, à data de celebração deste acordo o 1.° Réu teria que pagar a quantia de HKD$1,380,000.00 à P Ltd, e tal reflecte que que a venda das fracções não se tratou duma manobra de dissipação de património, mas da necessidade do 1.° Réu de realizar dinheiro, pelo que o quesito 8.° da base intrutória deve dar-se como não provado.
    37) Finalmente, reitera-se que o quesito 11.° da base instrutória deveria ter sido considerado não provado pois, como consta do documento n.° 5 junto com a p.i. e da matéria constantes dos factos assentes P), em 25 de Julho de 2011 foi cancelada a hipoteca fixada à fracção autónoma BR/C, com a inscrição n.º 72904C.
    38) Acresce que, este artigo também e encontra em contradição com o artigo 20.° da base instrutória. A razão é simples, não se pode dar como provado que foi aplicada a quantia referida no artigo 20.° da base instrutória para pagamento da inscrição hipotecária referida a alínea H) dos factos assentes e, por outro lado dar como provado que a 2ª Ré não tinha dinheiro para pagar o empréstimo referido na alínea H) dos factos assentes. Tanto tinha que o fez!
    39) Pelo que, salvo melhor entendimento, o quesito 11.° da base instrutória deveria ser julgado como não provado por se encontrar em contradição com o artigo 20.º da base instrutória.
    40) Termos em ue deverá ser revo ado o acórdão roferido or violar o dis osto nos arti os 355.° e ss do Códi o Civil e em conse uência com base nos meios de rova mencionados deverão os arti os 21.° a 24.° da base instrutória assem a ser dados como rovados e os arti os 4.° 5.° 8.° e 11.° deverão ser ·ul ados como não provados.
    41) Tendo o presente recurso interposto pelos Réus! ora Recorrentes, provimento, como legalmente se espera! a consequência jurídica passará pelo Tribunal Colectivo ser confrontado com uma nova factualidade que demonstra por um lado que o contrato de compra e venda das fracções autónomas AR/ C e BR/ C foi um verdadeiro contrato.
    42) Por outro lado, passará também por verificar que na sequência do contrato de compra e venda foi realizado um contrato de cessão de quotas, também ele não simulado, porque verdadeiro. Duas transacções lógicas, pois, como sabemos, em Macau é comum e frequente que se proceda à compra de imóveis comprando as sociedades.
    43) Como resulta da matéria de facto assente, em 22 de Outubro de 2010, L em representação do 1.° Réu vendeu as duas fracções, AR/C e BR/C à 2ª Ré, nos valores de MOP$803,520.00 MOP$803,400.00, respectivamente.
    44) Sobre estas duas fracções recaíam duas hipotecas, a primeira a favor do "Banco Tai Fung" conforme inscrição n.º XXXXXC e a segunda a favor do Banco Industrial e Comercial da China n.º XXXXXC, no valor de MOP$2.784.375,00 (dois milhões setecentas e oitenta e quatro mil trezentas e setenta e cinco patacas) e HKD$3.850.000,00 (três milhões oitocentos e cinquenta mil dólares de Hong Kong), equivalente para efeitos fiscais a MOP$3.965.500,00 (três milhões novecentas e sessenta e cinco mil e quinhentas patacas).
    45) O 1.° Réu outorgou uma procuração, mas não podemos inferir que que lançou mão de qualquer expediente de modo a vender o mais rapidamente as fracções autónomas AR/C e BR/C, ora em crise, porque poderia ser acusado de um crime como se aventou durante a audiência de discussãoe julgamento.
    46) Tanto assim é que, só em 22 de Fevereiro de 2011, o 1.° Réu tomou conhecimento dos factos que deram origem à sua detenção, aquando da realização do interrogatório na Polícia Judiciária.
    47) Ora, o valor resultante do valor da compra e venda das fracções autónomas e das respectivas hipotecas, é um valor que não é inferior ao valor de mercado.
    48) Ou seja, a 2.ª Ré pagou o preço das fracções autónomas, um preço condizente com o valor de mercado praticado, senão superior, bem como cancelou umas das hipotecas, a hipoteca incidente sobre a fracçao “BR/C” a favor do Banco Industrial e Comercial da China, tal como melhor supra descrito.
    49) A sentença funda-se na divergência entre declaração negocial e a vontade real do declarante. Ora, estatui o artigo 232.° do Código Civil que “se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado. Tendo como consequência a nulidade, tudo nos termos do n.º 2 do artigo 232.° do Código Civil.
    50) Ora, na medida em que o 1.° Réu quis celebrar um contrato de compra e venda das fracções autónomas em crise nos presentes autos, negócio esse celebrado com o procurador, munido de um documento que lhe dava poderes suficientes para tal, inclusive para se receber os preços resultantes da venda supra referida.
    51) Não se pode, assim dar provimento à arguição da simulação de tal negócio, uma vez que cumpriu os requisitos fixados na lei, nomeadamente o pagamento de um preço. E, o cancelamento de uma das hipotecas consta da matéria de facto assente P), restando uma das hipotecas. Ora, como esá bom de ver, não podemos concluir tout court pela simulação do contrato de compra e venda das fracções autónomas AR/C e BR/C.
    52) Por outro lado, no que concerne ao contrato de cessão de quotas, este é uma transacção que ocorre posteriormente ao contrato de compra e venda das fracções autónomas e também não pode ser tido como prova para cimentar a simulação do contrato de compra e venda.
    53) O preço devido pela cessão de quotas foi pago, existia suficiência económica para proceder a tal cessão de quotas, pelo que, com o devido respeito, o Tribunal Colectivo não julgou esta matéria na melhor óptica.
    Face ao exposto, requerem se revogue:
    a) a douta decisão proferida pelo Tribunal Colectivo quanto aos quesitos 21.° a 24.º da base instrutória os quais deverão passar a considerar-se como integrahnente provados e quantos aos quesitos 1.°, 2.°, 4.°, 5.°, 8.°, 10.°, 11.°, 13.° a 17.° que deverão passar-se a considerar-se como integralmente não provados.
    b) a douta sentença recorrida, a qual deverá ser substituída da por outra decisão que em face dos novos factos provados resultantes do provimento dado ao recurso sobre a matéria de facto:
    - declarar a improcedência do pedido de simulação do contrato de compra e venda das fracções autónomas AR/C e BR/C, melhor identificadas nos autos, celebrados entre o 1.° Réu e a 2.ª Ré, ora Recorrentes e, consequentemente, ser a 2.ª Recorrente declarada a proprietária das fracções autónomas AR/C e BR/C e manter-se o registo na Conservatória do Registo Predial com o n.º XXXXX efectivo, assim como o registo da compra e venda titulada com o n.º 207481G.
    
   2. C, autora nos autos acima referidos, tendo recebido as alegações de recurso dos dois réus nos mesmos autos, ou seja, A e a B, Lda. (B有限公司), vieram apresentar as suas contra-alegações, rebatendo, ponto por ponto, os argumentos apresentados pelos recorrentes, pronunciando-se pelo acerto da decisão da matéria de facto e subsequente enquadramento jurídico efectuado na douta sentença recorrida.
  
   3. Foram colhidos os vistos legais.
  
    II – FACTOS
    Vêm provados os factos seguintes:
  Factos assentes:
- O 1º réu conheceu a autora em Julho de 2009 através de E (alínea A) dos factos assentes).
- Depois, o 1º réu aliciou a autora a juntamente investir em concerto, através de investir em concertos junto de E e ter retribuições (alínea B) dos factos assentes).
- Entre 5 de Maio de 2010 e 28 de Agosto de 2010, o 1º réu burlou a autora e F em dinheiro por meio de engano sobre a realização de concerto (alínea C) dos factos assentes).
- Em Outubro de 2010, a autora e F descobriram que o 1º réu não tinha capacidade de realizar o concerto que as partes assinaram para cooperar nem era sócio da M, Lda. (M有限公司), e o 1º réu tinha evitado a autora e F, pelo que a autora participou à PJ em 17 de Outubro de 2010 (alínea D) dos factos assentes).
- Por sentença já transitada em julgado de 13 de Junho de 2012, o 1º réu foi condenado, no processo do TJB n.º CR1-11-0234-PCC, pela prática do crime de burla, a devolver à autora 26.096.950,00 patacas (alínea E) dos factos assentes).
- Desde o trânsito em julgado da decisão até a instauração da presente acção, o 1º réu ainda não pagou à autora a quantia no valor de 26.096.950,00 patacas (alínea F) dos factos assentes).
- Em 24 de Novembro de 2006, o 1º réu obteve de I , através do registo n.º XXXXXX, a fracção BR/C sita em Macau, na Avenida do Almirante Lacerda, n.º XX (descrita na Conservatória do Registo Predial
sob o n.º XXXXX) (alínea G) dos factos assentes).
- O referido imóvel foi dado de hipoteca ao Banco Industrial e
Comercial da China, S.A., sucursal de Macau, pelo valor de HKD$3.850.000,00, registo n.º XXXXXC (alínea H) dos factos assentes).
- Em 25 de Junho de 2009, o 1º réu obteve de I , através do registo n.º XXXXXX1, a fracção AR/C sita em Macau, na Avenida do Almirante Lacerda, n.º XX (descrita na Conservatória do Registo Predial
sob o n.º XXXXX) (alínea I) dos factos assentes).
- O referido imóvel foi dado de hipoteca ao Banco Tai Fung, S.A.R.L., pelo valor de HKD$2.784.375,00, registo n.º XXXXXC (alínea J) dos factos assentes).
- O 1º réu celebrou em Hong Kong a procuração em 19 de Outubro de 2010 perante o notário internacional de Hong Kong, N, conferindo poderes a L para efectuar a “venda” das fracções AR/C e BR/C. O teor concreto consta do documento de fls. 129 a 131, que se dá aqui por integralmente reproduzido (alínea K) dos factos assentes).
- A 2ª ré é uma sociedade limitada com capital de 25.000,00 patacas, criada em 20 de Julho de 2009 e destinada ao exercício das actividades imóveis. No momento da sua criação os sócios da 2ª ré eram O e H, que detinham, respectivamente, uma quota de 12.500,00 patacas (alínea L) dos factos assentes).
- Em 29 de Junho de 2011, G e H transmitiram, respectivamente a I e J, as quotas da 2ª ré que aqueles detinham (alínea M) dos factos assentes).
- A partir de 29 de Junho de 2011 até agora, I e J passaram a ser os únicos sócios e membros da administração da 2ª ré (alínea N) dos factos assentes).
- No dia 22 de Outubro de 2010, o procurador L, representando o 1º réu, vendeu à 2ª ré as duas fracções AR/C e BR/C no escritório do notário privado Q pelo preço de 803.520,00 patacas e 803.400,00 patacas, respectivamente (alínea O) dos factos assentes).
- A hipoteca sob o n.º XXXXXC referente à fracção autónoma BR/C foi cancelada em 25 de Julho de 2011 (alínea P) dos factos assentes).
- No momento da celebração da escritura de compra e venda referida na alínea O) acima referida, os então sócios da 2ª ré, G e H, detinham respectivamente uma quota de 12.500,00 patacas. (alínea Q) dos factos assentes).
- Antes da alienação das fracções autónomas referidas nas alíneas G) e I) ao 1º réu, estas foram penhoradas, por causa das dívidas de I, nos seguintes processos de execução (alínea R) dos factos assentes):
1. A fracção AR/C foi penhorada em 11 de Janeiro de 20092 pelo 5.º Juízo do TJB, com o valor de execução de MOP$15.583,90;
2. As fracções AR/C e BR/C foram penhoradas em 24 de Fevereiro de 2000 pelo 1º Juízo do TJB, com o valor de execução de HKD$2.640.000,00;
3. As fracções AR/C e BR/C foram penhoradas em 9 de Fevereiro de 2004 pelo 6º Juízo do TJB, com o valor de execução de MOP$923.195,40;
4. A fracção AR/C foi penhorada em 28 de Junho de 2001 pelo 2.º Juízo do TJB, com o valor de execução de MOP$4.880,00;
**
Base Instrutória:
- Depois de tomar conhecimento de que os seus actos de burla foram descobertos e de que a autora fez queixa denunciada à Polícia Judiciária em 17 de Outubro de 2010, o 1o réu soube que incorria em responsabilidade criminal e civil. (quesito 1.º da Base Instrutória)
- Para fugir às eventuais dívidas decorrentes dos actos de burla referidos na resposta ao quesito 1.º, o 1o réu celebrou a procuração referida na alínea K) dos factos assentes, em 19 de Outubro de 2010, a fim de permitir a L efectuar a venda das fracções autónomas referidas em G) e I) dos factos assentes o mais rápido possível. (quesito 2.º da Base Instrutória)
- Em 29 de Junho de 2011, G transmitiu a quota social que detinha na 2a ré, quota esta no valor nominal de MOP$12.500,00 a I, pelo preço de MOP$12.500,00 e H transmitiu a quota social que detinha na 2a ré, quota esta no valor nominal de MOP$12.500,00, a J, pelo preço de MOP$12.500,00. (quesito 3.º da Base Instrutória)
- A 2a ré é uma sociedade limitada com capital de MOP$25.000,00, e não tinha fundo suficiente para a aquisição das fracções autónomas referidas em G) e I) dos factos assentes. (quesito 4.º da Base Instrutória)
- A 2a ré não pagou o preço referido em O) dos factos assentes ao 1o réu. (quesito 5.º da Base Instrutória)
- Quando foi assinada a escritura pública de compra e venda citado em O) dos factos assentes, o 1o réu não cancelou as inscrições hipotecárias das fracções autónomas referidas em G) e I) dos factos assentes então vigentes. (quesito 6.º da Base Instrutória)
- A 2a ré declarou adquirir os imóveis sem que o 1o réu tivesse pago os empréstimos bancários a que se referem as hipotecas referidas em H) e J) dos factos assentes nem cancelado as respectivas inscrições hipotecárias. (quesito 7.º da Base Instrutória)
- O 1o réu não tinha vontade de vender as fracções autónomas referidas em G) e I) dos factos assentes à 2a ré, nem esta tinha vontade de as adquirir. (quesito 8.º da Base Instrutória)
- Os actuais sócios da 2a ré, I e J, são a mãe e o irmão do 1o réu respectivamente. (quesito 9.º da Base Instrutória)
- A I e J sabiam dos actos de burla praticados pelo 1o réu e que este iria enfrentar processos judiciais. (quesito 10.º da Base Instrutória)
- A 2a ré não tinha dinheiro para pagar o empréstimo referido em H) dos factos assentes que o 1o réu tinha junto do Banco Industrial e Comercial da China, Limitada, Sucursal de Macau. (quesito 11.º da Base Instrutória)
- Até à interposição da presente acção, o 1o réu ainda não efectuou o pagamento do empréstimo relativo à fracção autónoma AR/C referida em I) dos factos assentes nem procedeu o cancelamento da respectiva inscrição hipotecária, figurando-se ainda como hipotecante. (quesito 12.º da Base Instrutória)
- Os ex-sócios da 2a ré, G e H e o 1o réu conheciam uns aos outros. (quesito 13.º da Base Instrutória)
- Quando o 1o réu passou a procuração referida em K) dos factos assentes, o 1o réu, I e J sabiam que a Autora tinha denunciado à Polícia Judiciária contra os actos de burla do 1o réu posteriormente julgados no processo CR1-11-0234-PCC. (quesito 14.º da Base Instrutória)
- Os ex-sócios da 2a ré, G e H auxiliaram a transmissão das fracções autónomas referidas em G) e I) dos factos assentes para a 2a ré. (quesito 15.º da Base Instrutória)
- O 1o réu, I e J sabiam bem que as fracções autónomas referidas em G) e I) dos factos assentes pertencentes ao 1º réu podiam ser penhorados para o pagamento das eventuais dívidas decorrente dos actos de burla referidos na resposta ao quesito 1.º. (quesito 16.º da Base Instrutória)
- I tem conhecimento sobre processos judiciais. (quesito 17.º da Base Instrutória)
- O preço de venda declarado das fracções autónomas referidas em G) e I) dos factos assentes constante da respectiva escritura pública de compra e venda era de MOP$803.520,00 para a fracção AR/C e MOP$803.400,00 para a fracção BR/C. (quesito 18.º da Base Instrutória)
- A 2a ré emitiu o cheque n.º 40483601 107 0119 1001 XX XXXXXX no valor de HKD$1.557.850,00 sacado sobre o “Banco Industrial e Comercial da China” datado de 22 de Outubro de 2010, pagável a L. (quesito 19.º da Base Instrutória)
- Em 17 de Novembro de 2010, o Banco Industrial e Comercial da China, debitou da conta da 2a ré a quantia de HKD$3.142.252,31 e a aplicou no pagamento do remanescente da dívida hipotecária a que se refere a inscrição hipotecária referida em H) dos factos assentes. (quesito 20.º da Base Instrutória)
    III – FUNDAMENTOS
    1. O objecto do presente recurso passa fundamentalmente pela impugnação da matéria de facto.
    Foram ouvidas 3 testemunhas: duas arroladas pela autora, também ela burladas pelo 1º R; uma, irmão do 1º R..
    O que importa, a este nível, é dilucidar a questão de saber se as vendas feitas pelo 1º R. foram vendas fantásticas de forma a evitar que a A. e demais credores que foram enganados pelo 1º Réu, factos pelos quais foi julgado e preso, encontrando-se ainda no estabelecimento prisional, se fizessem pagar pelos bens que aquele possuía e de que pretensamente se desfez.
    Importa aina atentar que subsidiariamente ao pedido de nulidade das vendas se formulou ainda na acção um pedido de impugnação pauliana a fim de ser acutelado o ressarcimento da dívida assumida para com a A.
    
    2. Atentemos na pormenorizada motivação da convicção dos Senhores juízes que efectuaram o julgamento de facto:
    “A convicção do Tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos e no depoimento das testemunhas ouvidas em audiência que depuseram sobre os quesitos da base instrutória, cujo teor se dá por reproduzido aqui para todos os efeitos legais, o que permitiu formar uma síntese quanto aos apontados factos.
    Mais especificamente, o tribunal teve em conta a prova documental que indicava claramente entre a data da denúncia criminal feita pela Autora e a data da procuração passada pelo 1º Réu a L L, e esta data e a data da venda impugnada pela Autora mediaram apenas 2 e 3 dias respectivamente.
    Tendo isso presente, o tribunal analisou o depoimento das testemunhas da Autora que, apesar de comprovadamente interessadas no desfecho da presente acção por terem sido vítimas dos actos de burla em questão (isso de acordo com o reconhecimento expresso feito aquando da contradita e o teor da certidão da sentença crime junta a fls 40 a 64), revelava isento. Com efeito, durante o seu depoimento, não poucas vezes as mesmas declararam que não tinham conhecimento de certos factos que eram favoráveis à Autora. Por exemplo, quando a 1ª testemunha foi perguntada se a mãe e o irmão (J) do 1º Réu sabiam de que a Autora fizera queixa no dia 17 de Outubro de 2010, a mesma declarou que, antes desta data, tinha falado ao telefone com a mãe do 1º Réu dando conta de que iria denunciar os factos de burla do 1º Réu se este não devolvesse o dinheiro por si reclamado; que não sabia se o J tinha esse conhecimento porque a testemunha não falara com este e não sabia se alguém falara. Quando a mesma testemunha foi perguntada se os ex-sócios da 2ª Ré conheciam o 1º Réu, a mãe e irmão do 1º Réu, declarou que não sabia. A 2ª testemunha, mãe da Autora, a muitas perguntas relativas a factos invocados pela Autora declarou que não sabia porque não acompanhou o caso pessoalmente ou que apenas sabia através da Autora.
    Tendo em conta o que ao depoimento dessas testemunhas, em especial, a da 1ª testemunha, no sentido de, pelo menos, a mãe do 1º Réu sabia da intenção de denúncia desta testemunha, o tribunal articulou também os demais documentos designadamente os que demonstram os factos constantes das respostas aos quesitos 6° e 7°; que o preço declarado na escritura de compra e venda foi apenas de MOP$1.606.920,00 para as duas fracções; que o rendimento declarado pela 2ª Ré para os anos 2009 a 2011 era zero; que houve um depósito do valor da venda (em dólares de Hong Kong) na conta da 2ª Ré no mesmo dia (22 de Outubro de 2010) em que a mesma quantia foi levantada para a emissão do cheque referido na resposta ao quesito 19°; que esta conta teve apenas 4 movimentos: estes dois acima referidos e um depósito de HK$1.000,00 em 18 de Junho de 2010 e um levantamento de HK$25,00 em 23 de Junho de 2010; o valor de fracção BR/C que tem uma área maior (154,5 m2) ser inferior ao valor da fracção AR/C que tem uma área menor (77,97 m2) situando-se ambos no mesmo prédio (o que põe em causa o seu valor); que o período de tempo decorrido entre a data da denúncia, a data da procuração e a data da compra e venda é apenas de 2 e 3 dias respectivamente; que a mãe e irmão do 1º Réu compraram a totalidade das quotas da 2ª Ré 8 meses depois.
    A isso acresce o facto de nada indicar que a 2ª Ré alguma vez visitou as fracções autónomas antes ou depois da compra ou pediu a sua entrega depois da venda, pois a testemunha dos Réus declarou que não tinha ouvido dizer que alguém esteve nas fracções para exigir a entrega das mesmas.
    Foi com base nisso que o tribunal não deu relevância ao depoimento da testemunha dos Réus na parte que diz que a mãe e o irmão do 1º Réu só tiveram conhecimento da venda depois e que o preço de venda incluía o valor das hipotecas e que a compra das quotas da 2ª Ré era apenas uma forma de recuperar os imóveis para pagar menos impostos nem a prova documental no sentido de o valor do pagamento do empréstimo hipotecário da relativo à fracção BR/C ter sido debitado da conta da 2ª Ré.
    É que, as circunstâncias do presente caso descritas nos parágrafos 2° a 5° da presente fundamentação indicam que a emissão do cheque referido na resposta ao quesito 19° e o desconto da conta da 2ª Ré para o pagamento do remanescente da dívida hipotecária referido na resposta ao quesito 20° faziam parte do plano através do qual o 1° Réu pretendia desviar os dois imóveis do seu património com o auxílio dos ex-sócios da 2ª Ré.
    Foi a partir disso que o tribunal concluiu que os ex-sócios da 2ª Ré conheciam o 1º Réu.
    No que se refere ao alegado pelos Réus de que não era de excluir que os fundos mobilizados pela 2ª Ré provinham dos próprios sócios, como acontece com muitas sociedades cujo capital é bastante baixo, deve-se realçar que nenhuma prova foi produzida pela 2ª Ré de que efectivamente assim foi. Assim, a possibilidade abstracta desacompanhada de qualquer prova não permite afastar o entendimento acima sufragado.
    Foi na conjugação de todo o expendido que o tribunal conclui que a venda feita pelo 1º Réu à 2ª Ré não passa mais de um acto para dar aparência de uma saída das fracções autónomas discutidas nos autos do património do 1º Réu a fim de fugir às suas responsabilidades.”
    
    3. A análise desta motivação contextualiza bem os elementos probatórios levados em conta e aí não se deixa de fazer uma articulação dos diversos elementos, o que conjugado com as regras da vida e experiência comum, não deixam de sufragar as conclusões a que o Colectivo chegou.
    Importa ainda atentar na relação e o posicionamento que cada uma das testemunhas tem com as partes interessadas de forma a filtrar devidamente o que dizem ou deixam de dizer.
    Não obstante, não nos eximiremos a analisar a argumentação expendida pelos recorrentes.
    Pretendem eles que os quesitos 1.º, 2.º e 13.º a 17.º da base instrutória devem ser considerados como não provados, que os quesitos 1.º, 2.º e 13.º a 16.º da base instrutória devem ser considerados não provados e os quesitos 21.º a 24.º provados.
    Com base na prova documental os quesitos 4º, 5º, 8º e 11º deveriam, em seu entender, ser dados como não provados.
    
    4. O conteúdo dos primeiros e dos últimos resulta já da transcrição acima feita.
    Os que integram o segundo grupo (a serem dados como pretensamente provados pelos recorrentes:
     - quesito 21º - Por contrato de cessão de quotas da 2ª Ré com I e J datado de 31 de Janeiro de 2011, foi acordado que, pela quantia de HKD$8.000,00 se transmitiriam as quotas sócias para os I e J e que estes aceitariam a oneração da hipoteca incidente sobre a fracção autónoma “AR/C”?
    - quesito 22º - Em 1 de Fevereiro de 2011, I e J pagaram, a título de sinal, a quantia de de HKD$4.000.000,00 através de cashier order do Banco Wing Lung dirigido ao K Limited?
    - quesito 23º- A 6 de Maio de 2011 os I e J pagaram as quantias de HKD$1.200.000,00 mediante cheque do Banco Wing Lung dirigido a H e de HKD$300.000,00 mediante cheque emitido pelo Banco Wing Lung, dirigido a H?
    -quesito 24º- Em 26 de Junho de 2011, os I e J pagaram a quantia remanescente do valor atribuído para a cessão de quotas de HKD$2.500.000,00 mediante cashier order do Banco Tai Fung dirigido a H?
    
    5. Embora os recorrentes refiram ainda a discordância quanto ao artigo 10º, não avançam com razões concretas dessa discordância.
    Mas debrucemo-nos sobre os elementos probatórios concretizados pelos recorrentes.
    A análise dos recorrentes louva-se nos depoimentos seguintes e desenvolve-se nos termos que se passam a transcrever:
  “Prova testemunhal
  Conforme supra referido, julga-se que os depoimentos das testemunhas são fundamentais para se julgar pelo provimento da prova dos quesitos 21.º a 24.º da base instrutória. Sendo que, começamos pela testemunha dos Recorrentes, D que prestou depoimento aos quesitos 18.º a 24.º da base instrutória,
  
  Testemunha D
  Tradutor 2, 24 de Abril de 2015 11h46min08s
  Pergunta do mandatário dos Réus: "Sr. D sabe quem é o proprietário das duas fracções autónomas respeitantes a este caso, situadas na Avenida Almirante Lacerda n.º XX, R/C A e R/C B?"
  Resposta da Testemunha: "As duas fracções autónomas pertencem a A".
  P: "Sabia que A procedeu a uma escritura de compra e venda das duas fracções autónomas"
  R: “Ele vendeu as duas fracções autónomas à B有限公司 pelo valor de 8 milhões. Reparámos após a venda das fracções autónomas.”
  P: "Pode explicar à Mma. Juiz o que significa o montante de 8 milhões que referiu?"
  R: "O comprador pagou um milhão e quinhentas mil ao meu irmão e as duas hipotecas foram transferidas para ele."
  P: "O comprador pagou MOP$1,500,000.00 em dinheiro, cheque e o comprador aceitou as hipotecas do vendedor, o que chamamos de dívida. Tem conhecimento disto após a venda, isto inclui I e J."
  R: "Sim, nós só soubemos depois."
  P: “Após a venda das fracções autónomas, sabe que medidas foram tomadas por I e J.”
  R: "Nessa altura ainda estávamos a fazer negócios. Por isso, ficaram muito aborrecidos quando descobriram a venda das fracções autónomas. Dado que ainda estavam a utilizar as fracções autónomas, não tínhamos outra maneira de resolver e decidimos comprar as fracções autónomas novamente."
  P: "Decidiram comprar as fracções autónomas de volta?"
  R: “Sim.”
  P: "Quando é que a sua família comprou as fracções autónomas e de que modo?"
  R: "Em Janeiro de 2011 pagámos 11 milhões, sendo que 3 eram da hipoteca. Pagámos 8 milhões para comprar as fracções autónomas e o valor total é de 11 milhões"
  P: "De que modo a sua família comprou as fracções autónomas?"
  R: "Através da aquisição de acções da sociedade B有限公司."
  P: "Por que a sua família não o fez por intermédio de escritura pública e escolheu a compra de acções?"
  R: “Porque a forma de comprar acções é uma maneira de evitar impostos.”
  P. "Quem lhe ensinou este método?"
  R: "O advogado que tratou desta transacção ensinou-nos este método."
  P: "O advogado ensinou-vos a comprar acções?"
  R: “Sim.”
  P: "Sabe como a sua Família pagou o montante?"
  R: "Foi dividido em 3 tranches. A primeira foi de 4 milhões, a segunda de 1 milhão e meio e a terceira de dois milhões e meio.”
  P: "Como tomou conhecimento disto?"
  R: "A minha Mãe contou-me."
  P: "Este problema diz respeito à sua família?"
  R: "É importante e sério para a nossa família"
  P: "A sua família comprou as acções a quem?"
  R: "Nós comprámos as acções de B有限公司"
  P: "Eles compraram acções dos sócios? Porquê? Sabe?"
  R: "Uma das pessoas chama-se H e a outra ... não sei precisar"
  P: "Não conhece estas pessoas bem?"
  R: "Sim."
  P: "E a sua Mãe e o seu irmão mais velho?"
  R: "Não os conhecem bem. O que sabem foi por queriam comprar as fracções autónomas"
  P: "Conheceram-nos porque queriam comprar as fracções autónomas?"
  R: "Sim."
  Conforme resulta das transcrições do depoimento da testemunha, irmão do 1.º Réu, ora 1.° Recorrente, foi referido e explicado que:
  - as duas fracções autónomas foram vendidas pelo 1.° Recorrente à B有限公司 pelo valor de 8 milhões. Sendo que, foi pago o valor de um milhão e meio ao 1.° Réu, ora 1.° Recorrente e as duas hipotecas foram transferidas para o comprador (2.ª Recorrente) e, que o comprador aceitou as hipotecas incidentes sobre as duas fracções autónomas;
  - a família do 1.° Réu só teve conhecimento da venda as fracções autónomas a posteriori e "ficaram muito aborrecidos quando descobriram a venda das fracções autónomas. Dado que ainda estavam a utilizar as fracções autónomas, não tínhamos outra maneira de resolver e decidimos comprar as fracções autónomas novamente".
  - Daí que a família adquiriu as fracções não através de escritura pública de compra e vendas, mas através da aquisição das participações sociais dos sócios da sociedade B有限公司, de modo a evitar impostos.
  - Assim sendo, em Janeiro de 2011 foram pagos 11 milhões, sendo que 3 eram da hipoteca. O pagamento foi dividido em 3 tranches. A primeira foi de 4 milhões, a segunda de 1 milhão e meio e a terceira de dois milhões e meio.
  - A testemunha teve conhecimento do sucedido através da sua Mãe, e foi tratado corno um assunto importante e sério pela família. A testemunha não soube precisar o nome de um dos sócios da sociedade B有限公司, mas afirmou que conheceram os sócios através da aquisição das acções que foi realizada.
  Em suma, a testemunha corroborou os factos vertidos nos artigos 18.° a 24.° da base instrutória.
  Pelo que, os artigos artigos 21.° a 24.° da base instrutória deveriam ser julgados integralmente provados.
  Acresce que, do depoimento da testemunha resultou ainda que, como contraprova que, desconhecia os alegados actos de burla do 1.° Réu, só houve contacto com os sócios da 2.ª Ré quando descobriram a venda das fracções autónomas, pelo que, os quesitos 1.°, 10.° e 13.° deveriam ter sido julgados como não provados.
  Em face disto, G e H não poderiam ter auxiliado na transmissão das fracções autónomas para a 2ª Ré. Mais ainda, por desconhecerem os alegados actos praticados pelo 1.° Réu, I e J não sabiam que a denúncia havia sido feita, logo, a procuração que foi passada era válida. Resultando assim que, os quesitos 14.° e 15.° da base instrutória deveriam ter sido também julgados como não provados.
  Ainda no que concerne à prova testemunhal, cumpre transcrever o depoimento das testemunhas E e F.
  
  Testemunha E
  Tradutor 2, 24 de Abril de 2015, 10h29min53s
  P: “Perguntas aos quesitos 1 a 17 ad base instrutória. Consegue-me ouvir, Sra. Testemunha? Falou em A. Conhece-o?"
  R: “Foi meu colega de escola.”
  P: “Sabe qual é o emprego dele?”
  P: "É uma espécie de.:"
  Meritíssima Juiz Presidente: "Espere um momento. Escreva a explicação."
  P: "Por favor prossiga."
  R: "Como o conheci?"
  P: "Sim."
  R: "Foi meu colega de escola no ensino médio e depois fazia negócios."
  P: "Sim."
  R: "Ele disse-me que estava no negócio da construção civil, decoração, imóveis e concertos de música, que era agente de pastilhas elásticas, esse género de coisas."
  P: "Alguma vez lhe perguntou se investia nesses negócios, se tinha tomado parte dessas actividades e deu-lhe conselhos?"
  R: "Sim."
  P: "O que lhe respondeu?"
  R: "Que investi nos seus concertos de música."
  P: "Quanto investiu?"
  R: "3 milhões."
  P: "Como correu?"
  R: "Foi como se nunca tivesse acontecido! Todos os bens foram vendidos e nunca me pagou de volta."
  P: "O que fez?"
  R: "Fizemos queixa na Polícia a 17 de Outubro de 2010."
  P: "A senhora e outras pessoas fizeram queixa na Polícia?"
  R: "Eu fiz a queixa com (…) e Apple que era a companheira de A"
  P: "O que participou?"
  R: "Antes de fazer ligar à Polícia, liguei a A e disse-lhe que estava na altura de nos pagar algum bónus ou ter retorno pelo investimento que fiz. Mas ele adiou. Entretanto deixei de saber do paradeiro dele e apresentei queixa."
  P: "Qual foi a sentença do tribunal que julgou relativamente a este assunto?"
  R: "Sim. A foi condenado a pagar-me 3 milhões, 26 milhões a C e três milhões a F."
  P: "Apresentou queixa ?”
  R: "Intentei uma acção criminal e civil."
  P: "Mencionou anteriormente que tinha vendido um bem seu?"
  R: “Eu vendi a minha casa pois não tinha dinheiro suficiente para o investimento. A casa era o único bem que tinha desde que comecei a trabalhar."
  P: "Em outras palavras, vendeu a sua fracção ..."
  R: "Para investir no negócio dele [do 1.° Réu]"
  P: "Não estava a dizer isso. Sabia que ele [o 1.° Réu] tinha bens no nome dele?"
  R: "Sim, sabia."
  P: "Sabia quantos bens ele [o 1.° Réu] possuía?"
  R: "Ele dizia-nos constantemente que a familia dele [do 1.° Réu] era rica. Do que sei ele é proprietário de duas lojas na Avenida do Almirante Lacerda e parece que tem outra perto de Ville de Mer."
  P: "Onde se localizam as duas fracções autónomas? Sabe dizer?"
  R: "As duas lojas? O, que estão debaixo da ponte."
  P: “Como é que sabe?"
  R: "Foi-me dito pela C depois de termos feito queixa na Polícia no dia 17 de Outubro. Ele ligou-nos e disse-nos para não ligar à Polícia em 19 de Outubro e fugiu para Hong Kong no dia a seguir. Mais tarde autorizou L a vender as suas duas lojas. Por fim, as duas lojas foram transferidas para alguém a 22 de Outubro. De modo a escapar às dívidas que tinha connosco, ele fugiu [o 1.° Réu)"
  P: "Qual a proveniência destas informações? Ouviu-o pela C ou chegou a ler os documentos?"
  R: "Ambos."
  P: "Que documentos leu?"
  R: "Existia um. Foi-me dito pela C que o tribunal fez uma investigação e foi confirmado como um facto."
  P: "Alguma vez mencionou que ele [o 1.° Réu] fugiu para Hong Kong para escapar às dividas?"
  R: "Sim. Fi-lo."
  P: "E no que se baseou para chegar a esta conclusão?"
  R: "Porque ele [o 1.° Réu] nunca devolveu o dinheiro. Tentei contactá-lo mas não sabia do seu paradeiro. Acredito que fugiu. Também fui a Hong Kong e fiz apresentei queixa na Polícia."
  P: "Foi a Hong Kong?"
  R: "Sim."
  P: "Alguma vez ouviu falar de G e H?"
  R: "Não, não tinha mas agora sei."
  P: "O que sabe acerca deles?"
  R: "A transferiu as lojas para B有限公司."
  P: "Qual é a relação dele [do 1.° Réu] com B有限公司?"
  R: "A mãe dele, I e o irmão dele [do 1.° Réu] são os proprietários da sociedade."
  P: "Como teve conhecimento destes factos?"
  R: "Foi apurado pelo tribunal."
  P: "Quanto gastou ele na cessão de quotas? Sabe?"
  R: "Não sei."
  P: "Quantas acções tinha a B有限公司? Sabe?"
  R: "Não sei."
  P: "Quanto despendeu A para comprar as duas lojas? Sabe?"
  R: "Não sei."
  P: "Sabe alguma coisa sobre o que falámos? Sabe?"
  R: "Também não sei."
  P: "Relativamente às fracções autónomas da Avenida do Almirante Lacerda, tinha conhecimento que estavam hipotecadas?"
  R: "Não sei mas soube posteriormente. Ele vendeu [o 1.° Réu] à 2ª Ré B有限公司, até as suas lojas estavam hipotecadas"
  P: "Como teve conhecimento disto?"
  R: "É um facto e consta de um documento. Foi-me dito pela minha Mãe que resultou da investigação."
  P: "Creio que o documento do qual consta esta informação é da Conservatória Predial. Que pensou quando leu essa informação?"
  R: "Penso que fui enganada e que perdi o dinheiro que me tinha custado a ganhar. A família dele [do 1.º Réu] e ele [o 1.º Réu] deveriam saber acerca das leis relevantes e uma vez foram acusados por enganaram pessoas por causa de dinheiro. Usaram as mesmas artimanhas para nos enganar e não nos devolveram o dinheiro."
  P: "Quer dizer que a compra e venda entre ele [o 1.º Réu] e a familia dele foram uma maneira de fugir às dívidas?"
  R: "Sim. É isso que quero dizer. Eu vi as que as lojas estavam abertas ao público naquela altura e que ele não as tinha vendido quando fui ao mercado. Por que foram vendidas as lojas a outras pessoas?"
  P: "Acalme-se. Que lojas ele não vendeu antes?"
  R: "A loja O Construction Company."
  P: "A loja O Construction Company tinha referido que já existia há muito tempo?"
  R: "Eles eram responsáveis pela gestão dos negócios da O Construction Company. Não entendo por que venderiam a outros."
  P: "Sabe quem I era? "
  R: "Não sabia. Mas depois fiquei a saber que era mãe do 1.° Réu."
  P: "Sabia quem era J?"
  R: "Eu conseguia reconhecer o irmão de A [1.º Réu] mas não sabia o nome dele. Mas depois do processo fiquei a saber o nome dele."
  P: "Alguma vez o encontrou?"
  R: "Estive uma vez com J e uma vez liguei à mãe dele [do 1.º Réu]. Disse-lhe que se o filho não devolvesse o nosso dinheiro eu apresentaria queixa. Ou sejal eu apresentaria queixa do crime à policia e torná-la-ia responsável criminal e civilmente pelos seus actos.”
  P: "Quer dizer, uma vez disse-lhe claramente que se o filho dela [o 1.º Réu] não devolvesse o dinheiro que recorreria aos tribunais?"
  R: "Eu liguei ao A [o 1.º Réu] antes de apresentar queixa na Polícia. Ele ligou-nos de volta e se o fizéssemos que nunca devolveria o dinheiro. De facto, liguei-lhe antes de apresentar queixa à Polícia mas já não consegui falar com ele. A Mãe dele [do 1.º Réu] atendeu o telefone e disse-nos que tinha convencido o filho a resolver o problema e devolver o dinheiro."
  P: "Os três sabiam que iriam responsabilizá-lo civil e criminalmente, não é verdade?"
  R: "A sabia. A sua Mãe [do 1.º Réu] também sabia. Pese embora, nunca tenha contactado o irmão dele, acredito que o irmão sabia porque eram familia."
  P: "Sabia que B有限公司 estava a gerir negócios?
  R: "Não, não sabia."
  P: "Sabe se a hipoteca dos imóveis foi cancelada ou não?"
  R: "Não sabia. Foi-me dito pela C quando intentou a acção civil que parecia que as hipotecas não tinham sido canceladas."
  P: "E quanto aos dois sócios, G e H, sabia as relações que tinham com três pessoas acima mencionadas?"
  R: "Não, não sabia."
  P: "Não sabia, ou sabia.”
  R: "Não sabia."
  P: "Em relação à B有限公司 sabia que os dois sócios transmitiram as lojas para a B有限公司, a 2.ª Ré?"
  R: "Não, não sabia. Será que pode repetir a questão, por favor”.
  P: "Por outras palavras, a sociedade B有限公司 tem dois sócios. Do que sabe, estas duas pessoas ajudaram na transferência das duas lojas localizadas na Avenida do Almirante Lacerda?"
  R: "Do meu ponto de vista, sim. Os Réus transferiram as lojas entre eles. Não faz sentido para mim. O que aconteceu foi tão dramático."
  P: "Do seu ponto de vista?"
  R: "Sim."
  P: "Falou em I. Sabe se ela esteve alguma vez envolvida em algum caso ou se foi acusada de dever dinheiro?"
  R: “Foi-me dito pela C que a família de Lai [I] deveu dinheiro muitas vezes. Que tinham ido a tribunal por causa disso"
  P: “Pelo que foi dito, concluiu que estava relacionado com questões de dívidas. Tanto quanto sabe, I e J sabiam os procedimentos legais?"
  R. “Eu penso que tinham conhecimentos da lei. Isto porque ele e os familiares já tinham sido acusados por outras pessoas Quando nós apresentámos queixa ouvimos pessoas a dizer “Oh! Ele é o Réu outra vez" Ele e a família dele [do 1.º Réu] já deveram dinheiro a outras pessoas. Por isso acho que tinham conhecimento. E o 1.º Réu, A é mais chocante, eu recebi um cheque quando o processo penal acabou. Ele era visto como o emitente do cheque mas, de facto era outra pessoa. Mais tarde, ele preencheu o seu nome no cheque mas nunca o pagou. Ele declarou que tinha aposto o seu nome no cheque em tribunal mas o tribunal e o tribunal entendeu que não era verdade."
  P: "Nada mais a perguntar, Meritíssimo."
  
  Tradutor 2, 24 de Abril de 2015, 10h47min40s
  Pergunta do Mandatário do 1.º Réu e 2.ª Ré: “Conhecia A certo?"
  R : “Sim.”
  P: "Conhecia G, H, I e J?"
  R "Antes o 1.º Réu burlou-nos, nós conhecíamos J. Tínhamo-lo visto e sabemos que era o irmão mais novo do 1ª Réu. Eu conheço a Mãe [do 1.° Réu] porque vi-a quando fui à fracção do 1.° Réu quando era mais nova jogar mah-jong."
  P: “Quer dizer que a senhora e J são amigos?"
  R “Não, não somos. Cumprimentamo-nos quando nos encontramos."
  P: "Neste caso, disse que ele tinha vendido algo. Sabe se depois dessa transacção ele vendeu algo [o 1.° Réu]?"
  R: “A que se refere?"
  P: "Não sabia da transacção até A vendeu as fracções à sociedade B有限公司?”
  R: "Eu soube depois que ele vendeu as fracções."
  P: "Eu julgo que falou em algo importante e espero que o diga à Meritíssima Juiz. Das informações dos autos, consegue-se provar / como diz, a compra e venda, ele já sabe."
  R: "O que é que ele sabia?"
  P: "Disse que A sabia que a senhora iria ligar à Polícia e responsabilizá-lo?"
  R: "Sim."
  P: "Como pode ver nos autos, ele voltou a Macau vindo de Hong Kong quando foi detido pela Polícia. Se ele sabia que iriam intentar uma acção contra ele, por que regressaria ele a Macau?"
  R: "Talvez o devesse perguntar a ele. Eu não sei se ele deixou dinheiro em Macau e tentou voltar para ir buscar o dinheiro. Ele burlou-me em milhões. Há muitas razões para regressar a Macau. Eu não sei e o senhor é o advogado dele [do 1.º Réu)"
  P: "Por isso tenho algumas perguntas para lhe fazer. Uma vez que disse que lhe tinha dito [ao 1.º Réu] que iria à Polícia apresentar queixar e seguir os trâmites de um processo crime contra ele, Se ele soubesse isto ...
  Meritíssima Juiz Presidente: Senhor Doutor, não precisa de discutir isto com a testemunha porque já foi declarado que não sabe. Portanto, poderá dizer o que deseja na sua parte do depoimento.
  P: "Sem problema, a sociedade B有限公司, peço mais detalhes que já perguntei. A sociedade comprou essas fracções de que forma? Sabe?"
  R: "Não sei."
  P: "Não sabe? Quer dizer que a sociedade comprou as fracções através de documentos do governo?"
  R: "Eu penso que você me enganou por dinheiro. Quero dizer que o 1.° Réu me burlou por dinheiro e não sei do paradeiro do dinheiro. Posteriormente, ele vendeu as fracções autónomas. Eu liguei à Polícia, ele transferiu as fracções para outro num curto espaço de tempo e eu investi o meu dinheiro todo naquele investimento."
  P: "Eu sei."
  R: "Eu só disse um facto."
  P: "Eu sei que tinha 3 milhões. O tribunal declarou que deveria receber os 3 milhões."
  R: "Ele precisa de nos pagar o dinheiro. Ele tinha duas fracções e não as vendeu antes. Depois eu liguei à Poícia e ele vendeu logo as fracções e fez a autorização em Hong Kong e não em Macau."
  P: "Então espera que esta acção tenha provimento?"
  R: "Eu só quero justiça. Por outro lado, o que é a verdade? Eu julgo que o tribunal irá determinar isso. Estou certa que fui enganada de modo a dar-lhe dinheiro. O processo crime declarou que ele [o 1.º Réu] deveria pagar-me o dinheiro de volta."
  P: "Este processo é acerca do cancelamento da escritura. Espera que tenha provimento?"
  R: "Eu respeito isso. Como pessoa que sou quero acreditar nele. Apesar disso, liguei à Polícia e disse que ele me devia muito dinheiro. Depois ele vendeu as fracções que foram transferidas para a Mãe. Como é que podemos acreditar nele?”
  P: “Eu sei que é testemunha hoje neste tribunal. Respeito a sua identidade enquanto testemunha. Como testemunhal espera que seja dado provimento a esta acção?"
  R: "Eu disse que se o caso é verdade, espero que sim. Sim? Eu só respeito a verdade."
  Meritíssima Juiz Presidente: "Gostaria de perguntar uma coisa. Em relação às questões perguntadas agora, gostaria de acrescentar algo. Como disse, C e outra pessoa ligaram à Polícia em 17 de Outubro de 2010? Sim? Qual é o nome da outra pessoa?"
  R: “O nome é Apple.”
  P: "Uma senhora?"
  R: “Sim.”
  P: "Sabe o nome completo dela?”
  R: "Não sei.”
  P: "A razão pela qual a senhora e outras duas pessoas ligaram à Polícia foi por causa do mesmo concerto, sim ou não?"
  R: "Apple não foi burlada pelo 1.º Réu. Ela é parceira do 1.º Réu do concerto"
  P: "Então, todos os problemas estavam relacionados com o mesmo concerto, correcto?"
  R: "Sim. Apple ajudou-o [o 1.º Réu] a organizar o concerto. Depois disso ela disse-nos que muitas coisas não foram feitas. Naquela altura descobrimos que tínhamos sido enganadas. Só isso."
  P: "Quer dizer que uma terceira pessoa ligou à Polícia como vítima, correcto?"
  R: "Eu não sei se ela teve alguma perda?"
  P: "Mas mencionou três pessoas, a senhora, C e uma terceira pessoa. E acrescentou que essa pessoa se chamava Apple. Foi com ela à Polícia. Por fim, o tribunal condenou o 1.º Réu a pagar 3 milhões e uma indemnização."
  R: "Só F"
  P: "Essa pessoa não é Apple?"
  R "Não é Apple.”
  P: "F esteve envolvido no mesmo concerto, certo? Disse que conhecia A tinha vendido duas fracções localizadas na Avenida Almirante Lacerda. Onde é a outra fracção? Sabe?"
  R: "Não me recordo. Eu fui a essas fracções quando era muito nova, Villa de Mer.”
  P: "Quer dizer que essas fracções são perto de Villa de Mer. Há algo mais que não saiba?"
  R: "Não estou certa se sim se não"
  P: "Significa que pensa que ele tinha as fracções, mas não está muito certa se ele detinha de facto as fracções e se ainda tem as fracções, certo?"
  R: "Sim."
  P: "Disse que O Construction Company se localiza na Avenida do Almirante Lacerda, que as duas fracções sempre pertenceram a O Construction Company. Como sabe, depois da venda das fracções, existiam hipotecas, certo?"
  R: "Sim. A princípio eu não sabia. Depois soube pela C."
  P:" Quando as fracções foram vendidas existiam hipotecas. Estas hipotecas foram canceladas depois da venda das fracções? Ou apesar das fracções terem sido vendidas as hipotecas mantiveram-se?"
  R: "Quando as fracções foram vendidas estavam hipotecas. Assim ... "
  P: "Quer dizer que as hipotecas não foram canceladas?"
  R:" Sim, eu achei estranho. Assim sendo, quero receber a indemnização civil."
  P: "Por outro lado, depois da compra e venda, existe alguma hipoteca nova. Disse que sabia das hipotecas prévias mas que não foram canceladas. A esta data, existe mais alguma hipoteca entre a compra e venda? Sabe? Disse que não existia mais nenhuma hipoteca.”
  R: "Não estou muito certa.”
  P: "Ou não sabe nada acerca disto?"
  R: "Não sei.”
  P: "Quer dizer que não sabe com certeza se existe uma nova hipoteca?"
  R: "Eu não sei exactamente. Quando a C decidiu intentar esta acção, o 1.° Réu tinha vendido as duas fracções com hipoteca que ainda não havia pago as dívidas. A 2.ª Ré comprou essas duas fracções e permitiu que o 1.º Réu mantivesse as duas hipotecas. Se me pedir mais detalhes não sei precisar mais nada. Mas estou certa quanto a isto"
  P: "Outra questão é que ambos pediram a A que lhes pagasse os lucros. Ambos declararam inequivocamente que A tinha que vos pagar lucros, certo? No fim ele não vos pagou, daí decidirem recolher esses lucros?”
  R: "Nós acordámos numa data, em que mês A teria que nos pagar os lucros. Ele nunca nos pagou os lucros. Mais tarde o 1.º Réu adiou e não nos pagou o dinheiro de volta e não conseguimos encontrá-lo.”
  P: "Quer dizer que tentou durante algum tempo que ele [o 1.º Réu] vos pagasse?”
  R: "Sim. E uma vez que não o conseguimos encontrar por um longo tempo, dissemos-lhe directamente que iríamos ligar à Policia e responsabilizá-lo civil e criminalmente se não nos pagasse os lucros"
  P: "Por fim, disse-lhe que ligaria à Policia se ele não pagasse o dinheiro que tinha investido no concerto. Disse que tinha dito à Mãe dele [do 1.º Réu] I acerca disto. Quando lhe disse isto?"
  R: Falei-lhe disto antes de ligar à Policia. Não o conseguíamos encontrar [o 1.º Réu] e ele não pagou o dinheiro a tempo. Telefonámos-lhe novamente antes de ligar à Policia. Falamos com a Mãe dele [do 1.º Réu], que ele tinha enganado muitas pessoas e deixámos que ela lhe ligasse para que ele enfrentasse a realidade. Para além disso, ela deveria dizer ao filho dela para pagar as suas dívidas, ou de outro modo ligaríamos à Polícia. Não sabemos se a Mãe o avisou mas A não comunicou mais connosco antes de ligarmos à Polícia.”
  P: Antes de 17 de Outubro de 2010 falou sobre isso com a mãe de A, I?"
  R: "Sim."
  P: "E disse-lhe que a aconselhava a que o filho [o 1.º Réu] lhe pagasse o dinheiro?"
  R: "Ou teria que enfrentar os factos e dizer o que aconteceu.”
  P: "Acabou de dizer que não tinha falado deste problema com J, que é o irmão mais velho de A."
  R: "Sim.”
  P: "Apesar de conhecer J, não falou com ele sobre os problemas que tinha com A com ele.”
  R: "Eu só disse que o problema era com A e a mãe dele. Mas eu penso que J deveria ter conhecimento visto serem família.”
  P: "Então não lhe falou sobre isto, mas sabia que alguém lhe teria falado acerca disto"
  P: "Se sabe diga sim. Se não sabe diga não."
  R: "Não sei.”
  
  Tradutor 2, 24 de Abril de 2015, 11h03min49s
  Mandatário dos Réus: De acordo com o artigo 543.º o Código de Processo Civil, o mandatário dos Réus pediu a contradita, com os seguintes fundamentos. No processo com o n.º CR1-11-0234-PCC, o 1.º Réu é o Arguido e a testemunha assistente e o 1.º Réu foi condenado a pagar MOP$3,094,000.00. De acordo com o depoimento das testemunhas parte do seu depoimento não deveria ser tido em conta porque tem uma posição privilegiada, o seu testemunho não deveria ser tido em consideração, e espera-se que a verdade seja reposta nos presentes autos, que a testemunha pode executar as fracções em crise nos presentes autos de modo a que o 1.º Réu lhe pague a sua dívida. Asssim sendo, requer-se que V. Exa defira o presente pedido.
  
  Tradutor 2, 24 de Abril de 2015, 11h09min50s
  Meritíssima Juiz Presidente: “O Tribunal tem em linha de conta os factos que a Autora trouxe aos autos. Ouvimos a testemunha que falou sobre os factos trazidos a este tribunal. O tribunal aceita o pedido de contradita dos Réus. Agora gostaríamos de perguntar, foi dito que também procurava a responsabilização civil e criminal de A. De modo a satisfazer esse propósito, quando ligou à Polícia o quando está no julgamento, disse expressamente que queria ser assistente no processo. Entende a qualidade desta figura jurídica?
  R "Quando eu estive envolvida no processo crime?"
  P: "Autorizou que um advogado a ajudasse a acompanhar o caso e requerer que fosse assistente?"
  R: "Sim."
  P: "Quer dizer, num processo, não só pediu uma indemnização mas também um advogado que desse seguimento ao processo crime. Torna-se parte do processo crime e não é só ofendida. Não estou certa que tenha entendido exactamente isto."
  R: "Significa que encontrei um advogado que acompanhasse o processo acerca de actividade de fraude. Se for verdade, espero que possa pedir pela sua responsabilização civil."
  P: "De modo a satisfazer esse propósito o seu advogado disse-lhe que foi assistente num processo crime? Ou não tem certeza da diferença entre assistente e ofendida?"
  R "Eu sou a vítima e também autorizei o advogado a ajudar-me a pedir a responsabilização civil e criminal."
  P: "Para além disso, também disse que o tribunal decidiu que o arguido teria que a indemnizar no montante de MOP$3,000,000.00"
  R: "À volta de MOP$3,000,000.00."
  P: "MOP$3,094,500.00, conversão de dólares de Hong Kong para Patacas. Em conclusão, não se recorda do valor exacto que ele [o 1.º Réu] nesse processo.”
  R: "Ele não me pagou a indemnização.”
  P: "Por outro lado, C coloca em causa a compra e venda de A e B有限公司. Se a acção tiver provimento irá executar as duas fracções comerciais de A?"
  R: "Eu tenho vindo a preparar este processo. C fê-lo e eu estou a preparar a informação, só que não é suficiente, mas não estou muito certa. Depois de C ter investigado tudo, naquela altura eu soube que ele transferiu as propriedades inúmeras vezes. À primeira pensei que ele já não tinha dinheiro nenhum.”
  P: "Quer dizer que prepara-se para o montante de MOP$3,000,000.00.”
  R: "Sim.”
  P: "Que dizer que não desistirá de recuperar o seu dinheiro.”
  R: "Se a compra e venda não for verdadeira estou certa que vou recuperar o meu dinheiro. Uma vez que os seus imóveis foram transferidos para a Mãe ele não precisa de pagar-me."
  P: "Bem, não vamos discutir se a compra e venda é verdadeira. Em conclusão, se o 1.º Réu tiver dinheiro não desistirá de recuperar a indemnização de MOP$3,000,000.00? Mesmo que a compra e venda não seja falsa?"
  R: "Sim.”
  
  Do depoimento da testemunha E resulta que pouco ou nada sabe quanto à compra e venda das fracções autónomas AR/C e BR/C, em que moldes se realizou esta compra e venda, e muito menos em relação à cessão de quotas realizada.
  Fala reiteradamente que foi enganada, burlada, tendo sempre por base o processo crime no qual o 1.º Réu foi condenado mas, quanto ao essencial, apenas parte de suposições obviamente infundadas para afirmar que o 1.º Réu fugiu às suas responsabilidades e ficcionou uma compra e venda das fracções autónomas ora em crise.
  Refere também que falou com o 1.º Réu, com os seus familiares, mas nada disso pode provar que o 1.º Réu, ora 1.º Recorrente sabia que tinha sido feita uma queixa, bem como os seus familiares. Por outro lado, também não se consegue fazer prova que, por esta razão, foi outorgada uma procuração para fugir às dívidas.
  Igualmente ficou por provar que os ex-sócios da 2.ª Ré conheciam a mãe e irmão do 1.° Recorrente, I e J e que esta cessão de quotas foi orquestrada de modo a fugir a dívidas e escamotear o que de facto foi um contrato de compra e venda de duas fracções e um contrato de cessão de quotas!
  Em sede de contradita ficou patente o interesse que a testemunha tem no provimento da presente acção, pois, sendo declarada nula a compra e venda das fracções autónomas e procedendo-se ao cancelamento dos registos na Conservatória do Registo Predial, a testemunha poderá intentar uma acção de execução contra o 1.oRéu e, assim, executar os imóveis.
  
  Ora, salvo o devido respeito, o depoimento da testemunha está inquinado, e, serve para demonstrar que os quesitos 1.º, 2.º, 13.º a 17.º da base instrutória deveriam ter sido julgados como não provados.
  Por seu turno, o depoimento da 2ª testemunha da Autora não andou muito distante do depoimento da 1.ª testemunha arrolada pela Autora, ora Recorrida.
  Senão vejamos.
  
  Testemunha F
  Tradutor 2, 24 de Abril de 2015, 11h22min26s
  Pergunta do Mandatário da Autora: "Acabou de dizer que conhecia A. Como o conheceu?"
  R: "Por causa da minha filha e da colaboração em negócios. Conheci-o quando a minha filha [a Autora] lhe deu o dinheiro."
  P: "Investiu nos negócios de A?"
  R: "Investi MOP$3, 000,000. 00 no seu negócio."
  P: "Recebeu os MOP$3,000,000.00 ?"
  R: "Ainda não recebi o dinheiro."
  P: "Alguma vez lhe disse [ao 1.º Réu] que queria que ele pagasse esse dinheiro? Ele disse-lhe que pagaria?"
  R: "No início ele adiou mas era a minha filha que falava com ele na maior parte das vezes. Até agora não nos pagou nada."
  P: "Como ele [o 1.º Réu] não pagou que medidas tomou?"
  R "Eu fiz uma queixa."
  P: "Fez uma queixa dele. Ligou à Polícia?"
  R: "Sim."
  P: "Quando ligou à Polícia, sabe?"
  R: "Em 2010."
  P: "Foi também à esquadra da Polícia?"
  R: "Não. Foi só a minha filha à esquadra da Polícia."
  P: "Sabe se A tem imóveis?"
  R: "Não estou certa. Ouvi que tem imóveis."
  P: "Onde obteve esta informação?"
  R: "Através da minha filha. Eles arranjaram alguém para investigar o caso."
  P: "Significa que sabe isto através da sua filha?"
  R: "Sim. "
  P: "Alguma vez ouviu os nomes de G e H?"
  R: "Ouvi os nomes, são pessoas da sociedade B有限公司 mas nunca os vi."
  P: "Onde ouviu esses nomes?”
  R: "Quando a minha filha intentou uma acção contra ele [o 1.º Réu], fomos ao tribunal e ouvi esses nomes. Mas não sei quem são essas pessoas."
  P: "Alguma vez outros os nomes de I e J?"
  R: "Sim. I é a mãe do 1.º Réu e J é o irmão mais novo dele. Vi-os no tribunal."
  P: "Sabe qual é o capital social da sociedade B有限公司?" R: "Ouvi que é mais ou menos MOP$20,000.00."
  P: "Onde ouviu isto?"
  R: "A minha filha e a Sra. E ligaram à Polícia para receberem o dinheiro. Eu entendi isto na última sentença, discutimos este assunto e ouvi esta informação da sociedade."
  P: "Alguma vez ouviu falar sobre as fracções autónomas A/RC e B/RC?"
  R: "Sim, ouvi."
  P: "Como?"
  R: "O Instituto de Habitação tem o registo desses imóveis."
  P: "Alguma vez viu o registo desses imóveis?"
  R: "A minha filha viu."
  P: "Tanto quanto sabe qual é a relação entre B有限公司 e as duas fracções?"
  R: "Ouvi que as duas fracções pertenciam a G e H mas depois foram vendidas à mãe de A, I."
  P: "Sabe desta informação porque ouviu?"
  R: “Sim.”
  P: "Onde ouviu esta informação?"
  R: "Esta informação pode ser vista no registo predial. Eu poderia saber quem era o proprietário àquela data."
  P: “Sabe se quando a sociedade comprou essas duas fracções existia algum ónus, por exemplo uma hipoteca?”
  R: "Sim, tinha."
  P: "Como sabe?"
  R: “Ouvi isto.”
  P: “Quem lhe disse?”
  R: "A minha filha sabia e contou-me."
  P: "Quando a sociedade comprou as fracções a hipoteca tinha sido cancelada?"
  R: "Não sei ao certo."
  P: “Tanto quanto sabe qual é a relação entre I e J e o 1.° Réu?”
  R: "I é a mãe o 1.° Réu e J é o irmão mais novo de sabia que A que burlou a minha filha."
  P: "Disse que I e J sabiam que A estava envolvido no caso de burla e sabia que iria ser responsabilizado legalmente?”
  R: “Ela [I] deveria saber, isto porque I é a mãe dele.”
  P: "Sabe se a sociedade B有限公司 faz negócios ou está activa?"
  R: "Tanto quanto sei a sociedade não faz negócios nem está ano activo, de acordo com o que resulta da investigação"
  P: "Que informações investigou e que informações viu?"
  R: "Eu ouvi pela minha filha e pela Sra. E se a sociedade tinha pago impostos ao Governo ou não, que a sociedade não tem negócios."
  P: "I e J, G e H dão-se entre si?"
  R: "I é a mãe de A."
  P: "Quero dizer, G e H, sim ou não?"
  R: "Não sei exactamente."
  P: "Sabe exactamente se G e H fizeram algo para ceder as fracções da sociedade?”
  R: "Não sei."
  P: “Nada mais a perguntar, Meritíssima.”
  Meritíssima Juiz Presidente: "Dr. Tang, que quer esclarecer relativamente à última pergunta?"
  P: “Ainda relativamente ao quesito 15.º, gostaria de perguntar se G e H auxiliaram de algum modo na cessão das fracções autónomas à 2.ª Ré?”
  Meritíssima Juiz Presidente: "Algum problema Dr. Leong?”
  Pergunta do Mandatário dos Réus: "Sabe todas estas informações pelo que ouviu da sua filha?"
  R: “Tive alguma informação anteriormente no tribunal.”
  P: “O valor de MOP$3,000,000.00 que investiu é o valor que a sua filha investiu. Investiu no negócio com a sua filha. entretanto a sua filha e A mantiveram contacto?”
  R: “Eu vi o A.”
  P: "I e A?"
  R: “Nunca vi nenhum deles.”
  P: "O tribunal por meio de sentença declarou que tinha direito a receber uma indemnização do processo crime?"
  R: “Sim. A foi declarado culpado e condenado a prisão e a pagar uma indemnização.”
  P: "Quanto ele tinha que pagar?"
  R: “Não me recordo do valor exacto.”
  P: “Disse que investiu cerca de MOP$3,000,000.00.”
  R: "Sim, o valor é MOP$3,000,000.00 que eu e a minha filha investimos conjuntamente."
  P: "Como testemunha desta acção espera que tenha provimento?"
  R: "Sim, é o que quero precisamente. A burlou a minha filha. Hoje estou aqui porque espero que A devolva o dinheiro à minha filha.”
  P: "Quer receber o dinheiro de volta?"
  R: "Também espero que sim. Ele também deveria pagar o dinheiro à Sra. E porque ele também a burlou."
  P: “Se A tiver imóveis irá executar os imóveis dele de modo a que receba o dinheiro?”
  R: “Sim, quero.”
  P: “Se a sua filha ganhar, o Réu terá os imóveis.”
  R: "Quem tem os imóveis?"
  P: “Sabe qual é o objectivo desta acção?”
  R: "A minha filha que receber o dinheiro que foi burlada por A."
  P: "O objectivo desta acção é também anular a compra e venda destas fracções. Sabia?"
  R: “Ouvi isto.”
  Meritíssima Juiz Presidente: "Foi-lhe perguntado se sabe sobre G e H agora mesmo e disse que tinha ouvido esses nomes mas que não sabia quem eram. Por outro lado. Alguma vez teve contacto com I e J?"
  R: "Nós estivémos envolvidos num negócio, por vezes a minha filha não tinha tempo e eu tinha que a ajudar a dar dinheiro ao A. Por isso, vi-o."
  P: "Eu estou a perguntar se alguma vez entrou em contacto com I e J? Alguma vez falou com I e J? Significa que viu-os no julgamento e antes disso nunca entrou em contacto com eles."
  R: "Sim."
  P: "Nunca falou com eles, só viu A?"
  R: “Sim.”
  (…)
  Mandatário dos Réus: "Meritíssima, faço o mesmo pedido, da contradita e o fundamento é o mesmo da primeira testemunha."
  Meritíssima Juiz Presidente: "Pedido de contradita?"
  R: “Sim, Meritíssima.”
  Meritíssima Juiz Presidente: "Como a razão é a mesma o tribunal defere o pedido."
  Meritíssima Juiz Presidente: "Gostaria de lhe perguntar relativamente ao processo crime, também apresentou queixa do 1.° Réu. Apesar disso diz que a sua filha apresentou queixa. Este envolvida nessa queixa?"
  R: “A Polícia chamou-me para interpretar a situação.”
  P: "Quer dizer que deu o seu testemunho à Polícia. Alguma vez autorizou um advogado a ajudá-la a ser ressarcida do dinheiro? Sabe disso?"
  R: “Nunca autorizei um advogado.”
  P: "Não é esse o caso. Estamos a falar do processo crime anterior, sabe exactamente se autorizou um advogado a ajudá-la a receber o dinheiro do 1.º Réu?"
  R: "Eu não autorizei o advogado mas a minha filha autorizou."
  P: "Tem a certeza ou não? Autorizou um advogado a intentar um processo contra o 1.º Réu por a ter burlado? E um advogado ajudá-la-ia a receber o dinheiro, sabe ao certo se autorizou um advogado?"
  R: "Naquela altura a minha filha queria receber o dinheiro. Quando demos o testemunho, a Polícia perguntou pelo dinheiro e o valor de MOP$3,000,000 pertence-me e à minha filha.”
  P: "Eu não falei acerca do seu testemunho. Quero dizer se sabe se autorizou um advogado? Ou a sua filha é responsável por todas essas coisas? Alguma vez assinou documentos a autorizar que fosse pedida uma indemnização? Sabe isso ao certo?"
  R: "Todas essas coisas foram feitas pela minha filha. Não sei exactamente.”
  P: "No processo crime, o 1.º Réu foi condenado a pagar-lhe? Sabe?"
  R: “Não sei exactamente e não sei responder.”
  P: "Não sabe se a indemnização foi pedida em seu nome ou da sua filha?"
  R: "Nós pedimos a indemnização no nome da minha filha. Quando prestei o meu depoimento eles perguntaram-me se tinha investido dinheiro neste negócio. Eu disse que os MOP$3,000,000.00 era meus e da minha filha"
  P: "Resumindo, quando a sua filha pediu uma indemnização incluía os seus MOP$3,000,000.00 ou não? Ou ela só pediu a parte dela? Sabe?"
  R: "Não sei exactamente porque não pediu o montante."
  P: "Ok: Em conclusão, a sua filha é que trata de tudo. Mas que método ela usou para pedir a indemnização, em seu nome ou da sua filha, não sabe exactamente."
  R: “Esqueci-me.”
  P: "Tendo em conta que investiu MOP$3,000,000.00 também quer que A lhe pague esse dinheiro e à sua filha. Tem interesse nisso, certo? Se A tiver dinheiro quer que lhe pague?"
  R: "Sim."
    
    Conforme resulta do depoimento desta testemunha, todos os factos que relatou no tribunal advieram do que a sua filha, Autora nos presentes autos lhe disse ou de documentos que viu posteriormente à acção ter sido intentada. Pois tem parece-nos que tal depoimento é insuficiente, incongruente e desprovido na maior parte das vezes de qualquer sentido.
    Mais uma vez, a testemunha fala sobre a condenação do 1.° Réu em sede do processo crime mas nada soube dizer relativamente ao contrato de compra e venda, contrato de cessão de quotas, se alegadamente a família do 1.° Réu agiu em conluio com os sócios da 2.ª Ré, quem eram os sócios da 2.ª Ré e se auxiliaram de qualquer modo o L" Réu e a família deste na compra e venda, bem como na cessão de quotas!
    Ou seja, o que se retira deste depoimento é virtualmente nada! Mas mais, esta testemunha também tem todo o interesse em que acção tenha provimento, como foi destacado na contradita, e só vem confirmar que os quesitos 1.°, 2.°, 13.° a 16.° não deveriam ter sido julgados provados!
    Termos em que, deverá ser revogado o acórdão proferido sobre a matéria de facto por violação dos artigos 386.º e ss do Código Civil e, consequentemente, com base nos meios de prova mencionados os artigos 21.º a 24.º da base instrutória passem a ser dados como provados e os artigos 1.º, 2.º, 13.º a 16.º devem ser julgados como não provados.”
    
    6. Posto isto, vista esta alegação dos recorrentes há que ponderar e decidir em termos da matéria de facto.
    Com todo o respeito por opinião contrária, não se deixa de observar que o depoimento da testemunha – irmão mais novo do 1º Réu, não deixando de ter interesse nas casas transmitidas, onde a família vivia e que pretensamente veio a adquirir, na sequência da pretensa venda por parte do 1º R. a uma sociedade que não tinha capital para tais aquisições, para se livrar do património que garantiria as sua dívidas para com a Autora – não tem a força e virtualidade para infirmar o juízo produzido sobre a matéria de facto.
    O facto de dizer que a família não tinha conhecimento da venda nada demonstra em sentido contrário ao que comprovado vem, o que, de todo o modo, não deixa de ser contrariado pela testemunha da A., ainda que também ela “enganada” pelo 1.º R. e presumivelmente interessada. Na verdade, o depoimento da 1º testemunha é inequívoco ao dizer que ela própria tinha falado com a mãe do 1º R, dos problemas que ele tinha criado e da queixa que se propunha fazer à Polícia.
    Muito da convicção parte, como assinalado, da conjugação dos diversos elementos, da conjugação das datas das vendas, do trajecto que os bens seguiram, dos antecedentes e responsabilidades assumidas, da avaliação da capacidade aquisitiva da sociedade, das transferências operadas com os ónus existentes, da intervenção dos familiares do 1.º Réu nessas operações.
    
    7. No que aos documentos respeita, eles servem de suporte à matéria que vem comprovada.
    O referido contrato-promessa (documentos 2 e 4 juntos com o requerimento de 5 de Novembro de 2013) não se mostra decisivo: comprova tão-somente que foi elaborado esse contrato, mas não se comprova que tenha havido a transferência do dinheiro ou sequer os factos que ali se relatam. Como se sabe, uma coisa é descrever o relatado num contrato; outra, é a comprovação de que o ali relatado se verificou efectivamente. Também assim acontece, mesmo numa escritura pública. O que é verdade é o que ali consta como percepcionado pelo notário, nomeadamente a intervenção dos outorgantes naquele dia e local e o que perante ele dissera; agora se o que disseram é verdade, isso é outra história. Nada mais que não resulte do que se dispõe no artigo 365º, n.º 1 do CC; no que aos documentos particulares respeita rege o art. 370.º, não podendo o contrato promessa ter mais força do que a escritura por via da qual se dá o contrato à execução. Ou seja, não é por existir um contrato promessa que se tem de validar uma compra e venda que se tem por simulada.
    
    8. Em relação aos documentos 5 a 8 e 9 a 10, juntos com o requerimento de 5 de Novembro de 2013, também com eles não se destrói a tese da existência de um negócio simulado, pois não é difícil configurar que até podem ter sido emitidos, o que é diferente do dinheiro ter saído da conta do sacador e entrado efectivamente na esfera do beneficiário.
    Para além de que, mesmo que tal tivesse acontecido, importa não esquecer que são os familiares do 1º R. (mãe e irmão mais velho) que acabam por adquirir os prédios por via da aquisição das quotas na 2.ª Ré, donde se pode configurar que o dinheiro sempre poderia vir a ficar na disponibilidade do 1.º com a ajuda e intervenção dos seus familiares.
    
    Quanto ao extracto da conta bancária da sociedade ele não prova de forma alguma qualquer situação folgada da sociedade. Aliás, deixa muitas dúvidas o movimento existente e respeitante à entrada e saída do mesmo montante de HKD 1557850,00, valor que entra como cash e sai como transferência, o que aponta para uma operação forjada, na medida em que se estranha que a actividade reflectida nessa conta bancária da sociedade no período de Junho a Outubro de 2010 se exprima nessa única operação para além de um saldo inicial de HKD 975,00.
    Nada a apontar ao juízo de facto desenvolvido pelos Mms juízes ainda nesta matéria.
    
    9. Passemos agora ao ponto 4 das alegações, respeitante aos documentos n.ºs 4 e 5 juntos com a contestação e doc. n.º 1 com o requerimento de 13 de Janeiro de 2014.
    Esse documento emitido pelo banco pode comprovar o movimento efectuado, mas a partir do momento em que se configura uma situação forjada entre o 1º Réu e os ex-sócios da 2ª ré para de 2livrar2 dos seus bens, toda a aparência de realidade tem de ser interpretada no sentido de que mais não é do que uma roupagem para que a mentira soe a verdade.
    Isso mesmo foi devidamente explicado na interpretação dos factos do Colectivo, tal como acima transcrito e explicitações complementares, como resulta de fls 350 a 352, explicações que aqui se acolhem e se dão por reproduzidas:
    “Os Réus reclamam contra as respostas aos quesitos 4°, 5°, 8° e 21 a 24 ° da base instrutória.
    Nos termos do artigo 556°, n.º 5, do CPC, "Feito o exame, qualquer dos advogados pode reclamar contra a deficiência, obscuridade ou contradição da decisão ou contra a falta de fundamentação." (sublinhado nosso).
    Do preceito transcrito, vê-se, sem margem para dúvidas, que a deficiência, contradição e falta de fundamentação se referem à decisão e não à apreciação efectuada pelo Tribunal da prova produzida. Isto é, as partes só podem reclamar contra a deficiência ou contradição nas respostas dadas e a falta de fundamentação nas respostas dadas e não contra eventuais vícios no processo de apreciação a não ser os casos referidos no artigo 558°, n° 2, do CPC.
*
    Segundo os Réus houve falta de fundamentação para a resposta dadas ao quesito 4° e contradição nas respostas dadas aos quesitos 4° e 19°.
    Não assiste razão aos Réus por força das seguintes razões.
    Quanto à contradição na decisão, ao responder ao quesito 19°, o tribunal propositadamente eliminou expressão "pagou a quantia de HK$1.557.850,00" dando apenas o facto objectivo da emissão do cheque neste valor. Essa redacção está em conformidade com o que foi referido no 7° parágrafo da fundamentação: " ... a emissão do cheque referido na resposta ao quesito 19° e o desconto da conta da 2ª Ré para o pagamento do remanescente da divida hipotecária referido na resposta ao quesito 20° faziam parte do plano através do qual o 1° Réu pretendia desviar os dois imóveis do seu património com o auxilio dos ex-sócios da 2° Ré."
    Além disso, dessa resposta ao quesito 19° não se retira que a 2ª Ré tinha fundos no valor do cheque porque ter dinheiro depositado numa conta é uma coisa e ser este dinheiro bens do titular da conta é outra. Aliás, a esse propósito foi referido no parágrafo 4° da fundamentação, "o tribunal articulou também os demais documentos designadamente os que ... demonstram ... que o rendimento declarado pela 2° Ré para os anos 2009 a 2011 era zero; que houve um depósito do valor da venda (em dólares de Hong Kong) na conta da 2ª Ré no mesmo dia (22 de Outubro de 2010) em que a mesma quantia foi levantada para a emissão do cheque referido na resposta ao quesito 19°; que esta conta teve apenas 4 movimentos: estes dois acima referidos e um depósito de HK$1.000,00 em 18 de Junho de 2010 e um levantamento de HK$25,00 em 23 de Junho de 2010 ... " São precisamente esses factos que demonstram a falta de fundos por parte da Ré que levou a que o tribunal desse como não provado que a 2ª Ré pagou o preço.
    Com o expendido também se vê que não houve falta de fundamentação.
*
    Entendem os Réus que há contradição de decisão na resposta dada ao quesito 5° porque consta dos autos uma certidão de uma escritura pública na qual vem referido que o valor de MOP$1.606.920,00 já foi recebido.
    O que os Réus pretendem dizer é: constando de um documento autêntico que o preço foi já recebido o tribunal não podia dar uma resposta em sentido diferente.
    Trata-se de uma questão que tem a ver com a forma como o tribunal apreciou a prova com a qual os Réus não concordam. Portanto, o problema suscitado pelos Réus tem a ver com uma eventual incorrecta apreciação da prova apresentada e não consubstancia qualquer contradição da decisão.
    A escritura pública em questão é um documento autêntico com força probatória plena.
    No entanto, essa força só abrange os factos que referem como praticados pela autoridade, oficial público ou notário respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora - artigo 365°, n° 1, do CC.
    Com efeito, "Se, no documento, o notário afirma que, perante ele, o outorgante disse isto ou aquilo, fica plenamente provado que o outorgante o disse, mas não fica provado que seja verdadeira a afirmação do outorgante, ou que esta não tenha sido viciada por erro, dolo ou coacção, ou que o acto não seja simulado ... Um exemplo: numa escritura de compra e venda de imóveis o vendedor declara que recebeu o preço convencionado; o documento só faz prova plena de que esta declaração foi proferida perante o notário, nada impedindo que mais tarde se prove que ela foi simulada e que o preço ainda não foi pago .... " - cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil anotado, Vol. I, 4ª edição revista e actualizada, pg 327 a 328 (sublinhado nosso)
    Afastada a força probatória plena do citado documento em relação ao facto constante do quesito 5°, o tribunal pode apreciar livremente as provas produzidas.
    Ora, os fundamentos invocados pelos Réus traduzem-se na forma como os mesmos valoram das provas produzidas que não foi acolhida pelo Tribunal. Não correspondem a deficiência, contradição ou falta de fundamentação a que se refere o artigo 556°, n.º 5, do CPC. Eles destinam-se a pôr em causa a convicção do Tribunal em flagrante violação ao disposto no art. 558°, n° 1, do CPC. Pelo que, não se verificam qualquer vício indicado no artigo 556°, n.º 5, do CPC acima transcrito.
    Assim vai indeferida a reclamação relativa ao quesito 5° da base instrutória.
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    Relativamente ao quesito 8° da base instrutória, entendem os Réus que houve deficiência e falta de fundamentação porque consta da escritura pública de compra e venda que o preço foi recebido.
    Não se verificam os problemas indicados visto que no 7° parágrafo da fundamentação consta que: " ... a emissão do cheque referido na resposta ao quesito 19° e o desconto da conta da 2ª Ré para o pagamento do remanescente da dívida hipotecária referido na resposta ao quesito 20° faziam parte do plano através do qual o 1° Réu pretendia desviar os dois imóveis do seu património com o auxílio dos ex-sócios da 2ª Ré."
    Novamente, o que está em causa é a forma como os Réus valaram a prova. Como a escritura pública em questão não tem força probatória plena quanto à verdadeira vontade dos contraentes como foi já expendido mais acima, o tribunal é livre na sua apreciação deste documento e das demais provas. Os Réus não podem atacar a convicção o tribunal apenas porque apreciaram as provas de uma forma diferente.
    Pelas mesmas razões acima referidas, essa reclamação não pode deixar de improceder.
*
    Em relação aos quesitos 21° a 24°, defendem os Réus que os mesmos deviam ter sido dados como provados porque os documentos juntos a fls. 139 a 141 e 191 a 213 os demonstram.
    Os documentos em questão são meros documentos particulares sem especial força probatória e sujeitos ao princípio da livre apreciação.
    Os Réus pretendem pôr em causa a convicção do tribunal porque vai oram de forma diferente essas provas o que não é permitido.
    Também pelas mesmas razões acima referidas, essa reclamação improceder.”
    
    10. Na verdade o facto de os sócios poderem emprestar dinheiro à sociedade e esta poder girar com esse dinheiro, impunha-se, neste caso, a comprovação desses empréstimos, o que não aconteceu. Reforça a dúvida o facto de não haver um suporte escrito de um empréstimo de alguns milhões feito à sociedade.
    E a prova que se pretende fazer, através de uma outra sociedade (doc. de fls 263 a 266), no sentido de que um fundo insuficiente não impede um património imobiliário elevado, prova apenas que assim é com aquela sociedade, o que não implica que o mesmo aconteça com a 2.ª Ré.
    
11. Dos Documentos n.º 11 e 12 juntos com o requerimento de 05 de Novembro de 2013 e do dos Documentos n.° 1 e n.º 2 do requerimento de 22 de Abril de 2015.
Estará em causa a comprovação do quesito 8º: “O 1.º réu não tinha vontade de vender as fracções autónomas referidas em G) e I) dos factos assentes à 2.ª ré, nem esta tinha vontade de as adquirir.”
Dizem os recorrentes que os documentos em causa são duas avaliações realizadas às fracções autónomas e com tal pretende-se demonstrar que o quesito 8.° não deveria ter sido dado como provado.
Isto porque, através da junção dos referidos documentos pode-se provar que a compra aqui em causa foi uma verdadeira compra e venda e, não, um acto simulado. A fracção autónoma "AR/C" foi avaliada em HKD$4,230,000.00 e a fracção autónoma "BR/C" em HKD$2,790,000.
À data da celebração da escritura de compra e venda foi pago o valor de HKD$1,557,850.00, equivalente para efeitos fiscais a MOP$1.606.920,00 pelas fracções autónomas "AR/C" e "BR/C", sendo que tal se deveu ao facto de as duas fracções estarem oneradas com duas hipotecas, no montante de MOP$2.784.375,00 e HKD$3.850.000,00, equivalente para efeitos fiscais a MOP$3.965.500,00, respectivamente.
Ora, o valor descrito no relatório de avaliação vai de encontro ao valor pago pelo imóvel à data da realização da escritura de compra e venda, à qual acresciam as hipotecas incidentes sobre as fracções.
Com todo o respeito por esta argumentação, mas tais avaliações não afastam a tese da simulação. É que os valores declarados podem ter exactamente correspondência com o valor real para que tudo assuma uma aparência de realidade.
Não obstante, não se deixa de observar, como observou o tribunal, que, tendo uma fracção o dobro da área da outra, ambas sitas no mesmo prédio, também aí não se compreende a aproximação dos valores. Mas, o que é mais importante, como se assinalou, é que nada disto se mostra decisivo para afastar a resposta dada ao quesito, para não referir sequer a natureza particular dos documentos que, se comprovam o que ali se insere, não comprovam a que o descrito seja real. Na verdade, no documento particular descreve-se um facto que por ele se releva, mas isso não significa que essa revelação seja verdadeira.
Também os documentos apresentados em 22 de Abril de 2015 não são decisivos, antes evidenciam a fragilidade da tese das rés.
Pretendem estes que o 1º réu teria de pagar à Sociedade organizadora dos concertos HKD 1.380.000,00 e daí a necessidade de venda dos prédios.
Ora, o que se verifica é que a carta de intenção foi lavrada em 10 de Agosto de 2010 e o pagamento do concerto devia ter lugar antes de 15 de Outubro de 2010 no Cotai Arena da O. Se assim era, não se compreende que a venda só tivesse ocorrido em 22 de Outubro de 2010, a não ser que tivesse ocorrido algum empréstimo a favor do 1º R., o que igualmente não se comprova.
Ainda por aqui continua a falecer razão aos recorrentes.

12. No ponto (6) da s alegações, incidente sobre as provas documentais, os recorrentes indicam que se contradizem as respostas aos quesitos 11.º e 20.º da base instrutória.
A resposta ao quesito 11.º da base instrutória fpi a seguinte: “A 2a ré não tinha dinheiro para pagar o empréstimo referido em H) dos factos assentes que o 1o réu tinha junto do Banco Industrial e Comercial da China, Limitada, Sucursal de Macau.”
E a resposta ao quesito 20.º: “Em 17 de Novembro de 2010, o Banco Industrial e Comercial da China, debitou da conta da 2a ré a quantia de HKD$3.142.252,31 e a aplicou no pagamento do remanescente da dívida hipotecária a que se refere a inscrição hipotecária referida em H) dos factos assentes.
É possível conciliar ambas as afirmações. Do facto de se retirar da conta da Ré dinheiro para as referidas aquisições, daí não decorre necessariamente que o dinheiro fosse seu ou que não tivesse lá sido posto. Perdoe-se-nos a crueza desta proposição, mas a partir do momento em que, conjugando todos os factos e perante uma atitude defraudatória dos interesses de terceiros, nomeadamente da A., não é difícil que se tivesse montado um esquema devidamente orquestrado para dar uma aparência de verdade aos negócios que foram celebrados, tudo com o fim de pôr o património próprio, garantia das suas responsabilidades a salvo.
Na verdade, sempre importaria convencer que a quantia de mais de três milhões de dólares de Hong Kong debitada da conta da 2ª ré a esta pertencia a esta. Raciocínio, aliás, explanado pelo tribunal recorrido, ao dizer:
“É que, as circunstâncias do presente caso descritas nos parágrafo 2º a 5º da presente fundamentação indicam que a emissão do cheque referido na resposta do quesito 19º e o desconta da conta da 2ª Ré para o pagamento do remanescente da dívida hipotecária referido na resposta ao quesito 20º faziam parte do plano através do qual o 1º Réu pretendia desviar os dois imóveis do seu património com o auxílio dos ex-sócios da 2ª Ré.”

13. Posto isto, sufragando o julgamento de facto que sem por correcto, nada mais Há a acrescentar ao doutamente vertido na sentença recorrida, mostrando-se verificados todos os pressupostos dos negócios simulados que assim se têm por nulos.
Por isso mesmo, somos a transcrever o segmento da sentença pertinente, que aqui se acolhe e dá por reproduzida, o que se faz ao abrigo e para efeitos do disposto no artigo 631º.º, n.º 5 do CPC.
“Razão pela qual, os factos dados como provados acima referidos suscitam a dúvida sobre a conformidade da declaração das partes com a sua vontade.
*
Além disso, o mais importante é que dos factos provados resulta que o 1º réu não tinha vontade de vender à 2ª ré as duas fracções em causa, nem esta tinha vontade de as adquirir.
Nestes termos e face aos factos acima referidos, isto é, no dia 22 de Outubro de 2010, o 1º réu, representado por seu procurador L, fez a declaração de vender as referidas fracções junto da 2ª ré, que, por seu turno, declarou adquirir os dois imóveis junto do 1º réu. Daí que as declarações feitas pelo 1º réu e 2ª ré naquele tempo não estavam em conformidade com as suas vontades reais.
*
Quanto à razão por que os dois réus fizeram declarações não conformadas com as suas vontades, os factos provados mostram que o 1º réu, aquando de conferir poderes a L, já tinha conhecimento de que a autora tinha feito queixa denunciada à PJ em relação aos seus actos de burla, e sabia que as fracções em causa poderiam ser penhoradas pelo tribunal para pagar as obrigações provenientes dos actos de burla; e as condutas em causa praticadas pelos então sócios da 2ª ré destinavam-se puramente a ajudar o 1º réu a transmitir tais imóveis à 2ª ré.
Tendo em conta os factos acima referidos e o de que o 1º réu deveu à autora mais de vinte milhões de patacas, a finalidade dos dois réus é, obviamente, fazer a autora crer simuladamente que o 1º réu não tinha património para pagar as dívidas, ou fazer com que a autora não consiga pedir ao tribunal a penhora das duas fracções em causa para satisfazer o crédito a que tinha direito.
Daí que o negócio de compra e venda realizado pelo 1º réu e 2ª ré em 22 de Outubro de 2010 é, verdadeiramente, simulado por preencher a circunstância referida no artigo 232.º, n.º 1 do CC.
O negócio simulado é nulo ao abrigo do artigo 232.º, n.º 2 do CC.
A respectiva inscrição também deve ser cancelada pela nulidade do próprio negócio.
Nestes termos, procede o pedido da nulidade do referido negócio de compra e venda e do cancelamento da respectiva inscrição.“
14. Na verdade, como se assinalou no Proc. 143/2014 deste TSI “O que importa, na invocação de um negócio simulado é que se alegue a face visível do que se passou entre os simuladores, que esse negócio seja descrito com clareza e seja de molde a configurar um negócio celebrado com a intenção de enganar terceiros, no caso, invocando-se ainda o prejuízo dos interesses do autor.”
No caso observam-se os diferentes requisitos da simulação, tal como previstos no art. 232º do CC: acordo entre declarante e declaratário, intuito de enganar terceiros e divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante. Como está bem de ver, é difícil encontrar uma prova directa para alguns destes requisitos, pois, em relação ao primeiro, os participantes no acordo simulatório estão interessados no seu secretismo e, em relação aos dois requisitos seguintes, integram eles matéria de facto do foro íntimo, volitivo e anímico que, no mais das vezes, só por uma elevação do julgador, a partir da conjugação de todos os elementos circunstanciais e pelas regras do senso comum e da normalidade da vida, será possível atingir.
Tudo visto e ponderado, o recurso não eixará de soçobrar.

    IV – DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
    Custas pela recorrente.
Macau, 29 de Setembro de 2016,
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 Conforme a certidão constante de fls. 65 a 92 dos autos, o número de registo correcto é XXXXXX.
2 Conforme a certidão de fls. 65 a 92 dos autos, o ano correcto é 2000.
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64/2016 1/70