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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------
--- Data: 15/11/2016---------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo -----------------------------------------------------------------------------

Processo nº 771/2016
(Autos de recurso penal)

(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. a) e b) do C.P.P.M.)

Relatório

I. Por Acórdão de 22.06.2012, foi A, arguido com os sinais dos autos, condenado pela prática como autor material e em concurso real de 1 crime de “ofensa qualificada à integridade física”, p. e p. pelos art°s 137°, n.° 1, 140°, 129°, n.° 2, al. h) e 336°, n.° 2, al. c), todos do C.P.M., na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, e outro de “ameaça”, p. e p. pelo art. 147°, n.° 1 do mesmo Código, na pena de 9 meses de prisão, fixando-lhe o Colectivo a pena única de 1 ano e 9 meses de prisão, e condenando ainda o mesmo arguido no pagamento ao ofendido de uma indemnização no montante de MOP$2.000,00 e juros; (cfr., fls. 160 a 165-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Após notificado, e porque inconformado, o arguido recorreu, imputando à referida decisão condenatória a violação dos art°s 48° e 64° do C.P.M.; (cfr., fls. 235 a 242).

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Perante este recurso, decidiu o Tribunal que o arguido devia aguardar os ulteriores termos do processo em prisão preventiva; (cfr., fls. 186 a 187).

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Do assim decidido, interpôs também o arguido recurso (que subiu nos autos); (cfr., fls. 193 a 201).

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Respondendo, diz o Ministério Público que os recursos não merecem provimento; (cfr., fls. 225 a 226-v e 245 a 246-v).

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Neste T.S.I., juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:

“(…)
I. Quanto ao recurso da decisão de prisão preventiva
Argumenta o recorrente que a ex-mulher e os filhos necessitam dos seus cuidados, não havendo indícios de que os vá abandonar ou que vá abandonar o seu património em Macau, igualmente não havendo indícios de que vai deixar Macau juntamente com a ex-cônjuge e os filhos.
A partir dessa suposta falta de indícios, e porque, no seu critério, os crimes que estão em causa não são delitos de alta gravidade, conclui que bastavam as medidas de apresentação periódica e de proibição de se ausentar de Macau para dar guarida às exigências processuais cautelares reclamadas pela situação.
Não podemos concordar com a tese do recorrente.
Como bem salienta a Exm.a Colega na sua douta resposta à motivação do recurso, para a qual remetemos, a situação de revelia do recorrente, neste como noutros processos, fala por si. O recorrente tem-se furtado patente e reiteradamente à acção da justiça. Não é crível que agora – quando provavelmente vai ter que cumprir penas de prisão, posto que as respectivas condenações não tenham passado ainda em julgado – vá cumprir a sua carta de intenções de permanecer à disposição da justiça.
Existe um efectivo perigo de fuga, apenas acautelável através da medida coactiva de prisão preventiva.
Como está por demais evidenciado nos autos, um dos crimes que lhe estão imputados é punível com pena de prisão até quatro anos, pelo que, em face desse real perigo, aquela medida coactiva mostra-se aplicável e revela-se adequada à luz dos princípios e regras estabelecidos nos artigos 176.° e seguintes do Código do Processo Penal, que em nada saem beliscados.
A argumentação do recorrente mostra-se, em suma, manifestamente improcedente, pelo que o recurso deve ser rejeitado.
II. Quanto ao recurso do acórdão condenatório
Na motivação deste recurso, o recorrente entende que o acórdão peca por não ter decretado a suspensão da execução da pena.
Para alicerçar esse entendimento, chama novamente em seu auxílio a família, assegurando que, devido aos problemas de saúde que a assolam, não poderá passar sem a ajuda do recorrente. A partir desta afirmação, e voltando a repisar que os crimes em causa não são delitos de alta gravidade, assevera ser reduzida a possibilidade de cometer novos crimes no futuro, o que, a seu ver, justificava um juízo de prognose favorável e a pretendida suspensão de execução da pena.
Tal como o Ministério Público da 1.ª instância explica, na sua acertada resposta, não estão reunidas as condições para o recorrente poder beneficiar da almejada suspensão da execução da pena. Longe disso!
O artigo 48.° do Código Penal postula que o tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Trata-se de um poder-dever, que alguns autores denominam de discricionariedade vinculada, sujeito à verificação dos requisitos, formal e material, previstos na norma.
Apesar de se encontrar preenchido o pressuposto formal da suspensão, não o está o pressuposto material, conforme aliás o tribunal bem ponderou.
Na verdade, tomando em conta os aspectos a considerar nos termos daquele normativo, não é de todo possível formular um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do recorrente no futuro, dada a indiferença revelada perante a censura e ameaça de anteriores punições, como o Ministério Público faz notar na sua resposta.
Daí que a argumentação invocada se revele totalmente improcedente, por manifestamente desadequada à reiterada infracção dos valores jurídico-penais por parte do recorrente.
Bem andou o acórdão recorrido ao não suspender a execução da pena aplicada ao recorrente, mostrando-se também este recurso manifestamente improcedente, pelo que igualmente deve ser rejeitado”; (cfr., fls. 350 a 351-v).

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Em sede de exame preliminar constatou-se da manifesta improcedência do recurso que tem como objecto o Acórdão do T.J.B., e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), passa-se a decidir.

Fundamentação

II. Do “recurso do Acórdão do T.J.B”.

Dos factos

1. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 161 a 162, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

2. Vem o arguido dos autos recorrer do Acórdão do T.J.B. que o condenou como autor material e em concurso real de 1 crime de “ofensa qualificada à integridade física”, p. e p. pelos art°s 137°, n.° 1, 140°, 129°, n.° 2, al. h) e 336°, n.° 2, al. c), todos do C.P.M., na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, e outro de “ameaça”, p. e p. pelo art. 147°, n.° 1 do mesmo Código, na pena de 9 meses de prisão, fixando-lhe o Colectivo a pena única de 1 ano e 9 meses de prisão, e condenando ainda o arguido no pagamento ao ofendido de uma indemnização no montante de MOP$2.000,00 e juros.

É de opinião que o Acórdão recorrido viola os art°s 48° e 64° do C.P.M., solicitando a aplicação de uma pena não privativa da liberdade; (multa ou pena de prisão suspensa na sua execução).

Sendo – apenas – estas as questões colocadas – e não impugnando o recorrente a “decisão da matéria de facto” e a sua “qualificação jurídica”, que também não merecem censura – vejamos.

Preceitua o art. 64° do C.P.M. que: “Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

E, nos termos do art. 48° do C.P.M.:

“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.

Em relação ao transcrito comando legal tem este T.S.I. entendido que “o artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 16.06.2016, Proc. n.° 254/2016, de 21.07.2016, Proc. n.° 483/2016 e de 29.09.2016, Proc. n.° 550/2016).

Na verdade, o instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo, posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 14.01.2016, Proc. n.° 863/2015 e de 16.06.2016, Proc. n.° 254/2016).

Perante o que se deixou consignado, ponderando na factualidade dada como provada, e face à “personalidade” pelo ora recorrente revelada, evidente se mostra que inviável é uma decisão favorável às suas pretensões.

Admite-se que, no caso, (e como bem se nota no Parecer que se deixou transcrito) aplicável é o art. 64° do C.P.M., o mesmo se dizendo em relação ao art. 48° quanto à “suspensão da execução da pena”, dado que observado está o pressuposto formal da “pena de prisão em medida não superior a 3 anos”.

Porém, e como – igualmente bem – se expôs na decisão recorrida e no dito Parecer, não se mostra de accionar os aludidos preceitos dado que, atentos os elementos fácticos da situação sub judice, que o Tribunal a quo não deixou de ponderar, adequada não se apresenta uma pena não privativa da liberdade.

Há pois que ter presente – e não olvidar – que o recorrente tem um C.R.C., com várias condenações, por crimes de “roubo”, “furto de uso de veículo”, “arma proibida”, e outros de “ofensa à integridade física”, e “ameaça”, tendo já cumprido pena de prisão e beneficiado de liberdade condicional, (cfr., fls. 140 a 146), evidentes sendo assim as fortes necessidades de prevenção especial (e geral) e que afastam, in totum, a possibilidade de aplicação de uma pena não privativa da liberdade ao abrigo dos citados art. 64° ou 48° do C.P.M..

Como também considerava Jescheck: “o tribunal deve dispor-se a correr um risco aceitável, porém se houver sérias dúvidas sobre a capacidade do réu para aproveitar a oportunidade ressocializadora que se lhe oferece, deve resolver-se negativamente a questão do prognóstico”; (in, “Tratado de Derecho Penal” – Parte General – Granada 1993, pág. 760, e, no mesmo sentido, o Ac. da Rel. de Lisboa de 05.05.2015, Proc. n.° 242/13, in “www.dgsi.pt”).

Com efeito, perante a (repetida) insistência na prática de ilícitos criminais por parte de um arguido, (como é o caso), revelando, claramente, não ser merecedor de um “juízo de prognose favorável”, outra solução não existe que não seja uma “medida detentiva”, sob pena de manifestação de falência do sistema penal para a protecção de bens jurídicos e autêntico “convite” à reincidência; (neste sentido, cfr., v.g., o Ac. da Rel. de Guimarães, de 13.04.2015, Proc. n.° 1/12).

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III. Como atrás se deixou consignado com o recurso do Acórdão condenatório do T.J.B. subiu um outro recurso pelo recorrente interposto da “decisão que decretou a sua prisão preventiva”; (cfr., fls. 193 a 201).

Verificando-se que nenhuma censura merece o aludido Acórdão condenatório do T.J.B., (que com o atrás exposto, se confirma na sua íntegra), e constatando-se que o ora recorrente se encontra a cumprir pena de prisão decretada no âmbito de outro processo, (o Proc. n.° CR3-11-0180-PCC, cuja pena se extinguirá em 06.01.2018, cfr., fls. 278), e que só finda esta passará a ficar à ordem destes autos, inútil se torna a apreciação deste recurso do arguido.

Tudo visto, resta decidir.

Decisão

IV. Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso do Acórdão pelo T.J.B. prolatado, não se conhecendo do recurso interposto da decisão que aplicou ao recorrente a medida de coacção de prisão preventiva.

Pagará o arguido 6 UCs de taxa de justiça, e 3 UCs pela rejeição.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$2.500,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, devolvam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 15 de Novembro de 2016
José Maria Dias Azedo
Proc. 771/2016 Pág. 14

Proc. 771/2016 Pág. 15