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Processo nº 656/2016
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 17 de Novembro de 2016

ASSUNTO:
- Marca
- Função do recurso jurisdicional
- Concorrência desleal
- Abuso de direito
SUMÁRIO:
- A função do recurso jurisdicional consiste em apreciar o mérito da decisão judicial recorrida, não visando portanto criar decisões sobre matérias novas, pelo que a Recorrente não pode, em sede de recurso, suscitar uma questão que nunca foi objecto de apreciação pelo Tribunal a quo, salvo aquelas questões de conhecimento oficioso do Tribunal.
- A concorrência desleal consiste na prática de actos contrário às normas e usos honestos com o fim de conquistar posições vantajosas no mercado em detrimento dos outros agentes económicos que nele actuam e cuja clientela, actual ou potencial, é disputada.
- O abuso de direito traduz num exercício de um direito que excede manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económica desse direito.
O Relator
Processo nº 656/2016
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 17 de Novembro de 2016
Recorrente: A – Sociedade Gestora, Limitada
Recorridas: B, Limited
Direcção dos Serviços de Economia

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 18/04/2016, julgou-se improcedente o recurso interposto pela Recorrente A – Sociedade Gestora, Limitada.
Dessa decisão vem recorrer a Recorrente, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
A. Ressalvado o mui devido respeito, a douta sentença do Tribunal a quo parece equivocar-se na interpretação de determinados factos.
B. No vertente caso, a marca registanda, N/1XXX4, "C", é uma marca nominativa e destina-se a assinalar serviços da classe 35, enquanto que a ora Recorrente é titular da marca mista, N/1XXX1, "D ", que se destina a assinalar serviços da classe 36.
C. Porque registada em primeiro lugar, a marca titulada pela ora Recorrente (N/1XXX1) tem prioridade sobre a marca registanda (N/1XXX4), sendo que facilmente podemos identificar vários pontos de afinidade ou de contacto entre as marcas registanda e registada.
D. Isto é, são idênticos os circuitos comerciais de distribuição a que ambas as marcas se destinam, bem como, estamos perante serviços concorrentes, complementares ou substituíveis entre si.
E. A ora Recorrente continua a pugnar pela recusa do registo da marca registanda, arguindo para tal que o registo da mesma sufragará uma situação de abuso de direito e da concorrência desleal, na medida em que:
a. a B Limited, quando veio a Macau registar a marca registanda (Setembro de 2003) já sabia e não podia desconhecer os planos da ora Recorrente em abrir em Macau o "Hotel C";
b. mesmo no vizinho território de Hong Kong, o registo da marca "C" só foi efectuado pela B Limited em Abril de 2003, isto é, 5 meses após o anúncio público dos planos da ora Recorrente; e
c. desde o seu registo (Setembro de 2003), a B Limited nunca utilizou a marca registanda em Macau, à semelhança do sucedido para a marca N/1XXX5 que já foi declarada extinta por caducidade.
F. Ademais, após um olhar mais atento à descrição dos serviços pretendidos marcar pela marca registada, parece-nos que a mesma ultrapassa, em muito, os limites de serviços assinalados e descritos na 7.ª Edição da Classificação de Nice.
G. Não se entende, portanto, onde nesta classe podem estar incluídos serviços como: "vendas por grosso e retalho" de uma grande variedade de mercadorias;
H. Quando, na Convenção de Nice, está expressamente designado que a classe 35 "não inclui, notadamente: - as actividades de uma empresa, cuja função primordial seja a venda de mercadorias, i.e., uma empresa dita comercial".
I. Entendendo-se, que a marca registanda pode coexistir com a marca registada, haveria sempre que ajustar os serviços que ali estão discriminados, por forma a que a convenção internacional que define tais produtos e serviços seja integralmente respeitada.
J. E que os serviços a que se destina a marca registanda que são iguais ou afins dos serviços a que se destina a marca da Recorrente - já registada - nunca poderão ser autorizados.
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A Recorrida B, Limited respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 100 a 110 dos autos, cujo teores aqui se dão por integralmente reproduzidos, pugnando pela improcedência do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
1. Em 18 de Setembro de 2003 a parte contrária (B, Limited) requereu o registo de marca N/1XXX4 para a classe 35, exemplar que aqui se reproduz: C, para assinalar os seguintes serviços: Gestão de hotel e negócios, serviços de promoção e marketing; serviços de consultadoria organizativa e negócios; administração de hotel e negócios; serviços de avaliação, aconselhamento e inspecção; serviços contabilísticos; serviços publicitários; aluguer de "hoardings" e "billboards" publicitários; vendas por grosso e retalho de tintas, vernizes e lacas, produtos de higiene pessoal, sabões, perfumaria, cosméticos, loções para o corpo e para o cabelo, óleos essenciais, preparações para limpar e para lixiviar, velas, preparações sanitárias e farmacêuticas, ferragens e pequenas pecas de quinquilharia em metal, cutelaria, lâminas e ferramentas manuais, computadores, maquinas calculadoras, aparelhos e instrumentos eléctricos, ópticos, fotográficos e cinematográficos, aparelhos para a gravação, transmissão ou reprodução de som ou imagem, óculos e óculos de sol, aparelhos para iluminação, aquecimento, geração de vapor, cozinhar, refrigerar, secar, ventilar, fornecer água e para fins sanitários, joalharia, pratas, pedras preciosas, instrumentos de relojoaria e cronométricos, instrumentos musicais, revistas, livros e matérias impressas, cartões, papel e produtos de cartão, fotografia, papelaria, maquinas de escrever e artigos de escritório, couro e imitação de couro e produtos feitos nestes materiais, malas, bolsas, carteiras, "holders" em couro, sacos, bagagem, chapéus-de-chuva, vestuário, calcado, chapelaria, espelhos, molduras para fotografias, cabides para vestuário, tapetes, mobiliário, utensílios para a cozinha e para a casa, têxteis, artigos de costura, carpetes e coberturas, coberturas de mesa e de cama, jogos, brinquedos e artigos de desporto, géneros alimentícios e bebidas, carne, peixe, aves e caca, frutos e vegetais cozidos, secos e preservados, geleias, molhos de frutos, ovos, leite e produtos lácteos, óleos alimentares e gorduras, cafe, cha, cacau, açúcar, arroz, farinha, pão e bolos, condimentos, frutos e vegetais frescos, cerveja, agua mineral, sumos de frutos e outras bebidas não alcoólicas, bebidas alcoólicas, produtos florais, tabaco, artigos para fumadores e fósforos; serviços de supermercado; retalho de alimentos e de produtos para a casa; arranjo e condução de convenções ou conferencias de negócios ou comerciais; providenciar de informação para educação, treino, entretenimento, fins culturais e sociais via internet; demonstração de produtos para fins promocionais ou publicitários; distribuição de amostras e lembranças, arranjo, condução e organização de exibições para fins de negócios e comerciais, organização de exibições para fins de publicidade comercial, organização de shows de moda, shows de produtos e feiras para fins publicitários comerciais; serviços publicitários no exterior, relações públicas, aluguer de espaços publicitários, pesquisa negocial, promoção de vendas para outros, disseminação de material publicitário, arranjo de montras; aluguer de "billboards"; publicidade; serviços de centro comercial. 
2. O pedido de registo foi publicado no B.O. n.º 49, II série, de 03/12/2003.
3. Em 02/02/2004 as sociedades A - SOCIEDADE GESTORA, LIMITADA, E, SARL, F, LIMITADA e G S.A. apresentaram reclamação ao pedido de registo.
4. Em 04/03/2004 a parte contrária contestou as reclamações.
5. Foi feito o exame da marca e por despacho de 22/02/2005 foi o pedido de registo recusado pelo Departamento da Propriedade Intelectual da Direcção dos Serviços de Economia (DPI).
6. A parte contrária interpôs recurso judicial desse despacho que tomou o n.º CV2-05-0006-CRJ tendo sido decidido, por sentença transitada em julgado, que o despacho aludido em 5 se deveria considerar intempestivo por não estar ainda definitivamente decidida a questão de saber a quem pertencem as expressões marcárias C e (H).
7. Nessa sequência, o processo administrativo em apenso ficou suspenso até ao trânsito em julgado das decisões a serem proferidas nos processos judiciais relativos às marcas N/1XXX2, N/1XXX6 e N/1XXX3, o que já se verificou, tendo tais marcas sido recusadas por decisão judicial.
8. A marca N/1XXX4, para serviços da classe 35 foi novamente examinada e por despacho de 12/01/2015 foi o seu registo concedido, tendo o mesmo sido publicado na II série do Boletim Oficial n.º 5 de 04 de Fevereiro.
9. A parte contrária é titular da marca “C”, em Hong-Kong para as classes 3.ª, 14.ª, 16.ª, 18.ª, 30.ª, 35.ª, 36.ª, 37.ª, 40.ª, 43.ª, 44.ª e 45.ª
10. A parte contrária apresentou em Hong Kong o primeiro pedido de registo da marca C para serviços da classe 35.ª, no dia 04 de Abril de 2003.
11. A “B, LIMITED” é titular do registo da marca C, N/1XXX3, para a classe 36ª.
12. A “B, LIMITED” foi titular do registo da marca C, N/1XXX5, para a classe 42ª, cuja caducidade foi confirmada judicialmente.
13. A marca da parte contrária, C, N/1XXX5, destinava-se a assinalar os seguintes serviços da 42ª: Serviços de acomodação e de catering; provisão de acomodação em casas, hotéis e quartos (outros que não o aluguer de apartamento e casas); serviços prestados por hotéis, motéis, pensões, campos de férias, provisão de quartos de acomodação, alimentos e bebidas, serviços de "catering"; serviços de "babysitting"; serviços de cuidados de crianças, serviços de dia para crianças e facilidades de creche; serviços de restaurante e de jantar; serviços de bar; serviços de "cocktail lounge"; serviços de bar de vinhos; serviços prestados por restaurante, cafetarias, cafés, "snack bars", "sandwich bars", cantinas, "coffee bars", "coffee shops" e salões de chá; serviços de reservas para marcação de acomodação e de refeições; provisão de facilidades para conferências; provisão de facilidades para hospedar exibições; provisão de facilidades para exibições.
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III – Fundamentação
1. Da questão da prioridade do registo da marca da Recorrente N/1XXX1:
Para a Recorrente, a sua marca N/1XXX1 tem prioridade sobre a marca registanda N/1XXX4 na medida em que são idênticos os circuitos comerciais de distribuição a que ambas as marcas de destinam, bem como, estão perante serviços concorrentes, complementares ou substituíveis entre si.
Trata-se duma questão nova que apenas foi suscitada em sede do recurso jurisdicional, ou seja, tal questão nunca foi alegada e apreciada na jurisdição de 1º grau.
Como é sabido, a função do recurso jurisdicional consiste em apreciar o mérito da decisão judicial recorrida, não visando portanto criar decisões sobre matérias novas, pelo que a Recorrente não pode, em sede de recurso, suscitar uma questão que nunca foi objecto de apreciação pelo Tribunal a quo, salvo aquelas questões de conhecimento oficioso do Tribunal.
Pois, segundo o princípio da estabilidade da instância previsto no artº 212º do CPCM, segundo o qual uma vez citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei.
Ora, no caso em apreço, se admitisse a questão nova em crise, que não é de conhecimento oficioso do Tribunal, como fundamento do recurso jurisdicional da Recorrente, significaria permitir uma alteração da causa de pedir por parte da mesma, o que viola o citado princípio da estabilidade da instância.
No mesmo sentido, vejam-se o Ac. do TUI, de 27/2/008, proferido no Proc. nº 58/2007, bem como os Acs. do TSI, de 16/07/2015 e de 26/05/2016, proferidos, respectivamente, nos Procs. nºs. 266/2015 e 35/2016.
Face ao exposto, não é de conhecer a questão nova em crise.
2. Do abuso direito e da concorrência desleal:
Sobre as questões em epígrafe, a sentença recorrida pronunciou-se pela forma seguinte:
   “...
   A recorrente pretende, essencialmente, que o tribunal avalie e declare que a parte contrária não vai fazer uso da marca N /1XXX4, para a classe 35.ª, à semelhança do que foi reconhecido judicialmente relativamente à marca N/1XXX5, para assinalar serviços da classe 42.ª
   Em resposta, a requerente do registo defende que não existe na lei qualquer fundamento de recusa que tenha por base a pressuposição de que não vai usar a marca que lhe foi concedida.
   Vejamos.
   A espécie de direito de propriedade industrial que aqui está em apreciação é o título de marcas, tendo este como objecto o sinal ou conjuntos de sinais susceptíveis de representação gráfica (…) que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas (cfr. artigo 197.º do RJPI).
   O artigo 201.º b) do RJPI atribui o direito ao registo de marca aos comerciantes, para assinalar os produtos do seu comércio; registo esse que, uma vez efectuado, será válido por sete anos, renovável por iguais períodos, nos termos do artigo 218.º do mesmo diploma legal.
   Note-se que, segundo preceitua o artigo 223.º do RJPI, a utilização da marca é facultativa, sem prejuízo das disposições legais relativas à caducidade do direito à marca.
   Ora, tendo a marca sido concedida à parte contrária em Janeiro de 2015 e sido imediatamente objecto do presente recurso judicial, é por demais evidente que não pode este tribunal tecer considerações e muito menos decidir se a parte contrária vai ou não fazer uso desta marca.
   Nunca a questão da sua caducidade foi alegada ou conhecida…
   No processo citado pela recorrente (CV2-12-0033-CRJ) o recurso visava sindicar uma decisão administrativa que julgou procedente um pedido de declaração de caducidade dessa marca pelo seu não uso. Com efeito, nesse processo, a ora recorrente e outras sociedades associadas apresentaram um pedido de declaração da caducidade da marca com fundamento na falta de utilização séria e foi esse pedido que foi apreciado pela DSE e depois sindicado judicialmente.
   Assim, regressando à análise dos seus argumentos iniciais, e ressalvando sempre melhor juízo, cremos ser evidente que a questão da caducidade da marca não pode ser apreciada no âmbito deste recurso e que a recorrente, se assim o entender, terá de desencadear o respectivo procedimento administrativo de declaração de caducidade da marca N/1XXX4, à semelhança do que fez relativamente à marca N/1XXX5.
   Vejamos, então, se há, efectivamente, algum fundamento absoluto ou relativo de recusa da nossa marca.
   Segundo o artigo 213.º do RJPI o registo é concedido se não tiver sido revelado fundamento de recusa e as reclamações, se as houver, forem consideradas improcedentes.
   Para o efeito, a recorrente invoca o artigo 9.º, alíneas b) e c) do RJPI, ou seja, a violação de regras de ordem pública ou os bons costumes e o reconhecimento de que o requerente do registo de uma marca pretende fazer concorrência desleal ou que esta é possível independentemente da sua intenção.
   Relativamente à primeira proibição invocada não podemos deixar de concordar e aderir às considerações tecidas pela parte contrária. Com efeito, tal como se refere na resposta a proibição incide sobre a constituição da marca em si mesma e não sobre o eventual uso que dela se possa fazer.
   A ordem pública deve entender-se como o conjunto de princípios jurídicos, económicos e sociais que vigoram num determinado ordenamento jurídico – são as marcas que os consumidores entendem aceitáveis.
   Ora, a marca “C” não é susceptível de atentar contra a ordem pública ou aos bons costumes uma vez que qualquer pessoa a aceita como sendo neutra desse ponto de vista (não é obscena, não é uma blasfémia, não choca nenhum grupo da sociedade), e, esta conclusão extrair-se-á independentemente do operador económico que a utilize, dado que a própria recorrente revela interesse na utilização de tal expressão.
   Quanto ao segundo motivo de recusa dir-se-á que a factualidade apurada também não é permite reconhecer-se que a requerente do registo pretende fazer concorrência desleal ou que esta é possível independentemente da sua intenção.
   O registo da parte contrária foi requerido em Macau em Setembro de 2003 (invocando-se o facto de ter sido deduzido pedido de registo da marca C para serviços da classe 35.ª, em Hong-Kong, no dia 04 de Abril de 2003), daí que tenha sido considerado prioritário na RAEM, por força de decisões judiciais transitadas em julgado e por confronto com as marcas da recorrente.
   Note-se que do “breve contexto histórico” feito pela recorrente na sua petição inicial resulta claro que o Hotel “C” de Macau só foi aberto ao público em Novembro de 2003, ou seja, já depois do registo da marca ter sido requerido pela B Limited, pelo que não vislumbramos como pode a recorrente arrogar-se o direito de impedir a sua utilização pela parte contrária, nem cremos que exista fundamento para se afirmar que o consumidor médio de Macau, ao deparar-se com esta marca o vá associar exclusivamente à recorrente ou aos produtos que a mesma comercializa
   Como é sabido, a doutrina e a jurisprudência têm enunciado três pressupostos da concorrência desleal:
   1. a prática de um acto de concorrência (o acto de concorrência é aquele que é idóneo a atribuir, em termos de clientela, posições vantajosas no mercado). A concorrência pode procurar não a conquista directa da clientela, mas ter como objectivo primordial a disputa de fornecedores, distribuidores, vendedores, ou dos próprios trabalhadores. Estes actos continuam a ser actos de concorrência, porque através deles o que se procura é o melhor apetrechamento da empresa para a conquista de posições vantajosas no mercado. Com efeito, a conquista de posições vantajosas no mercado é feita em detrimento dos outros agentes económicos que nele actuam e cuja clientela, actual ou potencial, é disputada.
   Deste modo, o acto de concorrência, para verdadeiramente o ser, tem como seu elemento co-natural, implícito na própria noção, o perigo de dano, ou seja, a sua idoneidade ou aptidão para provocar danos a terceiro.
   2. que esse acto seja contrário às normas e usos honestos; 
   3. de qualquer ramo de actividade económica. 
   Tendo sido requerido o registo da marca N/1XXX4 antes de a recorrente desenvolver a sua própria actividade marcária no Território julgamos que o seu comportamento não consubstancia, nem é susceptível de consubstanciar qualquer acto de concorrência desleal, traduzindo-se o seu comportamento num mero acto de gestão que é coerente com actividade que desenvolvia em Hong Kong e que, à data do registo, fundamentava o seu interesse empresarial nesta região vizinha, ambas regiões especiais da RPC.
   Por fim, a recorrente pugna pela verificação dos pressupostos fácticos necessários ao preenchimento da figura do abuso de direito.
   Como é sabido é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social e económico desse direito - cf. artigo 326.º do Código Civil.
   A doutrina e a jurisprudência têm enunciado que o abuso de direito requer um excesso manifesto dos limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social e económico do direito, no sentido de tal excesso tem que ser patente, ostensivo, qualificado em razão da sua intensidade e ou extensão, não bastando um simples excesso.
   Ora, a parte contrária limitou-se a requerer o registo de uma marca de que já era titular em Hong-Kong, para assinalar o mesmo tipo de serviços ali prestados e, como supra se fez notar, nessa data tratava-se de uma marca livre, sem que os factos permitam concluir que a parte contrária pretendia beneficiar do nome no mercado e/ou da clientela angariada pela recorrente. Aliás, nessa altura a recorrente estava, como narrou, a iniciar a sua actividade hoteleira nesta região.
   Assim, na nossa perspectiva, os factos não caracterizam, de modo algum, qualquer procedimento incorrecto por parte da parte contrária integrador da figura do abuso de direito.
   Por tais razões, e sem necessidade de maiores desenvolvimentos, julgamos que não se verificam os fundamentos de recusa absoluta invocados pela recorrente, nem outros de que nos cumprisse, nesta sede, conhecer.
   Decisão:
   Pelo exposto, julga-se totalmente improcedente o recurso interposto por A-SOCIEDADE GESTORA, LIMITADA e, em consequência, mantém-se o despacho recorrido....”.
Trata-se de uma decisão que aponta para a boa solução do caso com a qual concordamos na sua íntegra.
Assim e com a devia vénia, fazemos como nossos fundamentos para negar provimento ao recurso, nos termos do nº 5 do artº 631º do CPCM.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a sentença recorrida.
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Custas pela Recorrente.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 17 de Novembro de 2016.

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Ho Wai Neng
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José Cândido de Pinho
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Tong Hio Fong




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