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Processo nº 570/2016
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 01 de Dezembro de 2016
Descritores:
-Revisão de sentença
-Divórcio

SUMÁRIO:

I. Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.

II. Quanto aos requisitos relativos à competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, o tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do nº1, do artigo 1200º do Código de Processo Civil, negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.



Proc. nº 570/2016

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I - Relatório
A, do sexo feminino, divorciada, de nacionalidade chinesa, portadora do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau n.º xxxxxxx(x), emitido pela Direcção dos Serviços de Identificação de Macau em 1 de Dezembro de 2014, residente na Rua de xxx n.º xx, Edificio xxxx, Bloco x, x.º andar x, Macau (doravante designada simplesmente por “1.ª Requerente”); e ---
B, do sexo masculino, divorciado, de nacionalidade chinesa, portador do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau n.º xxxxxxx(x), emitido pelo Governo de Macau em 13 de Abril de 2009 e do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Hong Kong n.º XXXXXXX(X), emitido pelo Governo de Hong Kong em 23 de Abril de 2009, residente na AV. XXX X-X, FL X, FLAT X, ED. XXX, MACAU (doravante designado simplesmente por “2.º Requerente”), ----
Instauraram o presente “processo especial de revisão e confirmação de decisões proferidas por tribunais ou árbitros do exterior de Macau”.
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O digno Magistrado do MP não se opôs ao deferimento do pedido.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1- Os requerentes contraíram entre si casamento na Região Administrativa Especial de Hong Kong da República Popular da China em 9 de Setembro de 2007.
2- No dia 21/09/2015 o Tribunal Distrital da RAEK decretou o divórcio dos requerentes nos seguintes termos:

婚姻訴訟案件編號2015年第6206號
香港特別行政區
區域法院
婚姻訴訟
案件編號2015年第6206號
A 呈請人

B 答辯人
由區域法院C暫委法官審理
暫准離婚令
在2015年9月21日法官確認呈請人與答辯人在申請離婚前,最少已連續分居一年,而答辯人同意法院作出離婚命令。
A 呈請人

B 答辯人
於2007年9月9日在 xxxxxx RESTAURANT, xx, xx CENTRE, xxx, xx, HONG KONG [CN9824]舉行婚禮的婚姻已破裂至無可挽救的地步,並頒令上述婚姻須予解除,除非自此判令作出之時起計6星期內能向法院提出此判令不應轉為絕對判令的充分因由。
日期: 2015年9月21日
司法常務官
3 – Em língua portuguesa a referida decisão apresenta o seguinte teor:
Causa matrimonial nº 6206 de 2015
Região Administrativa Especial de Hong Kong
Tribunal Distrital
Causa matrimonial
Processo nº: 6206 de 2015
********
A (A) Peticionante
E
B (B) Contestante
Julgada pelo MMº Juiz Deputado C do Tribunal Distrital
Ordem Provisória de Divórcio
Em 21 de Setembro de 2015, o Juiz confirma que a Peticionante e o contestante têm vivido separadamente há mais de um ano antes da apresentação do pedido de divórcio. O contestante consente com que o Tribunal profira ordem de divórcio.
A Peticionante
E
B Contestante
O casamento (CN9824), que foi celebrado no xxxxxx Restaurant, xx, xx Centre, xxx, xx, Hong Kong em 9 de Setembro de 2007, é irremediavelmente quebrado, assim sendo, decreta-se a dissolução de tal casamento caso não haja alguém que apresente, ao Tribunal, motivos fundamentados para a ordem não transitar em absoluta no prazo de seis semanas, contado a partir da prolação desta ordem.
Data: 21 de Setembro de 2015
4 – Esta sentença transitou em julgado, no dia 9/11/2015 (fls. 7 dos autos e 7 e 8 do apenso “traduções”).
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IV- O Direito
1. Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida;
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública. 2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”
Neste tipo de processos - de revisão formal - não se conhece do fundo ou do mérito da causa, uma vez que o Tribunal se limita a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento, nem da questão de facto, nem de direito.
Vejamos, então, os requisitos previstos no artigo 1200º do CPC.
Os documentos constantes dos autos reportam e certificam a situação invocada por ambos os autores. Revelam, além da autenticidade, a inteligibilidade da decisão do Tribunal Familiar competente da RAEHK (Jurisdição de divórcio), que decretou a dissolução do casamento dos cônjuges.
Por outro lado, a decisão em apreço não conduz a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública da RAEM (cfr. art. 20º e 273º do C.C.). Com efeito, também o direito substantivo de Macau prevê a dissolução do casamento, bem como a regulação do exercício do poder paternal. Reunidos estão, pois, os requisitos de verificação oficiosa do art. 1200º, n.1, als. a) e f), do CPC.
Além destes, não se detecta que os restantes (alíneas b) a e)) constituam aqui qualquer obstáculo ao objectivo a que tendem os autos.
Na verdade, também resulta da documentação dos autos que a sentença de divórcio já transitou.
Acrescenta-se ainda que a decisão foi proferida por entidade competente face à lei em vigor na Região Administrativa e Especial de Hong Kong e não versa sobre matéria exclusiva da competência dos tribunais de Macau, face ao que consta do art. 20º do Cod. Proc. Civil.
Também não se vê que tivesse havido violação das regras de litispendência e caso julgado ou que tivessem sido violadas as regras da citação no âmbito daquele processo ou que não tivessem sido observados os princípios do contraditório ou da igualdade das partes.
Posto isto, tudo se conjuga para a procedência do pedido (cfr. art. 1204º do CPC).
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V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder a revisão e confirmar a decisão de divórcio proferida pelo Tribunal de Família da Região Administrativa Especial de Hong Kong datada de 21/09/2015, transitada em 9/11/2015, que decretou o divórcio entre A e B, nos exactos e precisos termos acima transcritos.
Custas pelos requerentes.
TSI, 01 de Dezembro de 2016
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong



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