Processo nº 309/2016 Data: 07.12.2016
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Defensor Oficioso.
Honorários.
Recorribilidade.
SUMÁRIO
1. A decisão que fixa honorários ao Defensor Oficioso é susceptível de recurso para o T.S.I..
2. Os honorários pelos serviços prestados no âmbito de um processo da competência do Tribunal Colectivo por um Advogado nomeado Defensor Oficioso devem ser fixados entre os limites de MOP$7.500,00 e MOP$50.000,00, sendo que no caso de se tratar de uma “intervenção ocasional” se terá de ter em conta outros valores, tal como estatuído nos pontos 9 a 11 da tabela aprovada pelo Despacho do Chefe do Executivo n.° 59/2013.
3. A remuneração em questão deve ter presente a dignidade dos profissionais forenses, (e com isto a da própria administração da justiça), sendo adequada para que os serviços prestados sejam qualificados e eficazes, ponderando-se, sempre, o volume e complexidade do trabalho produzido e o dispêndio do tempo que terá implicado.
O relator,
José Maria Dias Azedo
Processo nº 309/2016
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. Por Acórdão em 11.12.2015 proferido no Processo Comum Colectivo n.° CR2-14-0331-PCC, decidiu-se absolver o arguido A (A) da prática de 1 imputado crime de “burla”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 do C.P.M., (cfr., fls. 239 a 241 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
*
Em 17.12.2015, apresentou o Exmo. Defensor Oficioso requerimento pedindo que lhe fossem fixados honorários nos termos legais; (cfr., fls. 245).
*
Apreciando, decidiu o Exmo. Presidente do Colectivo fixar MOP$2.000,00 como honorários; (cfr., fls. 248).
*
Inconformado, do assim decidido vem o referido Defensor recorrer, alegando – essencialmente – que tal montante não respeita o que legalmente está previsto para tal matéria; (cfr., fls. 251 a 254).
*
Sem resposta, vieram os autos a este T.S.I. onde se deu observância ao estatuído no art. 406° do C.P.P.M..
*
Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer opinando no sentido da procedência do recurso; (cfr., fls. 266).
*
Colhidos os vistos dos Mmos Juízes-Adjuntos, vieram os autos à conferência.
*
Cumpre decidir.
Fundamentação
2. A questão a apreciar – do montante a fixar a título de “honorários dos Defensores Oficiosos” – não é nova, tendo já sido por várias vezes objecto de pronúncia por este T.S.I.; (cfr., v.g., os Acs. de 08.06.2006, 16.11.2006, 25.01.2007 e 01.02.2007, 08.02.2007 e 11.07.2013, Proc. n.° 135/2006, 440/2006, 592/2006, 36/2007, 64/2007 e 397/2013, respectivamente).
–– “Questão prévia”.
Suscitou o Exmo. Colega 1° Juiz-Adjunto a questão da “irrecorribilidade da decisão objecto do presente recurso”, considerando que o meio próprio para o recorrente obter a sua alteração era a “reclamação” nos termos do art. 49° do “Regime das Custas nos Tribunais”, (D.L. n.° 63/99/M de 25.10), invocando também o art. 51° deste mesmo diploma legal para justificar a mencionada irrecorribilidade.
Após (nova) reflexão sobre a questão, (pois que este T.S.I., em 2006 e 2007 decidiu julgar procedentes idênticos recursos; cfr., os Acs. deste T.S.I. supra citados), não se mostra de acolher tal entendimento.
Eis, em síntese, o porque desta nossa posição.
Desde logo, dado que, como nos parece que se pode (e deve) retirar do teor do invocado art. 49° do R.C.T., (assim como da sua epígrafe: “Reclamação e reforma da conta”), o que em causa está no mencionado preceito legal é uma (eventual) correcção do “acto de contagem” – neste sentido, cfr., v.g., S. da Costa, in “C.C.J. Anot. e Comentado”, pág. 343) – portanto, um “acto material” praticado pela Secretaria do Tribunal, e não uma “decisão judicial” proferida por um Magistrado, como é a ora recorrida.
Por sua vez, para o caso dos autos, e seja como for, também não nos parece válido o argumento no sentido de o “valor” (dos honorários) em questão não exceder a “metade da alçada do Tribunal onde a conta foi elaborada”, (cfr., art. 51° do R.C.T.), pois que de olvidar também não é que, nos termos do art. 18°, n.° 4 da L.B.O.J., (Lei n.° 9/1999), “em matéria penal (…)não há alçada”, (certo sendo também que não releva o estatuído no art. 390°, n.° 2 do C.P.P.M., onde se estatui que “o recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil é admissível desde que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal recorrido”).
De facto, e ainda que se mostre de considerar os “honorários” como parte integrante dos “encargos”, e, assim, a ter em conta em sede de “custas”, (cfr., art 75°, n.° 1, al. b) do R.C.T.), inegável se nos apresenta a “natureza penal da questão” trazida à apreciação deste T.S.I., já que não deixa de ser uma questão suscitada em matéria de “custas em processo penal”, (e daí, aliás, em nossa opinião, a redacção do art. 81° do mesmo R.C.T., que ressalva, expressamente, a aplicação do mencionado art. 51°).
Nesta conformidade, tendo presente o “princípio geral” estatuído no art. 389° do C.P.P.M., onde se preceitua que “é permitido recorrer dos acórdãos, sentenças e despachos cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei”, e sendo que nos termos do seu art. 391°, n.° 1, al. d), deste mesmo Código, “tem legitimidade para recorrer, aqueles que (…) tiverem a defender um direito afectado pela decisão”, passa-se a conhecer do recurso; (neste sentido, e entre muitos, cfr., v.g., o Ac. do S.T.J. de 04.12.1996, Proc. n.° 96P1030, in B.M.J. n.° 462, pág. 227 e o da R. L. de 14.02.1995, Proc. n.° 8124, in C.J., Ano XX T.II, pág. 133, aqui citados como mera referência, podendo-se também ver os Acs. do então T.S.J. de Macau de 21.06.1995 e de 29.01.1997, Proc. n.° 335 e 605/96).
Aliás, em face do estatuído na alínea d), in fine, do art. 391° do C.P.P.M., indica-se precisamente a situação do “defensor do arguido inconformado com o montante da remuneração fixada”; (cfr., v.g., M. Leal-Henriques, in “Anot. e Com. ao C.P.P.M.”, Vol. III, pág. 166).
–– Do “recurso”.
Resulta dos autos que por despacho proferido em 19.01.2015, foi o ora recorrente nomeado Defensor do arguido, e, como tal, assegurou a defesa deste, comparecendo na audiência de julgamento realizada em 26.11.2015, (após um primeiro adiamento), tendo também comparecido à leitura do Acórdão em 11.12.2015.
Nos termos do art. 55°, n.° 5, do C.P.P.M., “o exercício da função de defensor nomeado é sempre remunerado”, sendo que preceitua também o art. 76°, n.° 1 do “Regime de Custas nos Tribunais que “os defensores que sejam advogados ou advogados estagiários são remunerados nos termos da legislação sobre o apoio judiciário”.
Em conformidade com o art. 34° da Lei n.° 13/2012, (que actualmente regula o “sistema de apoio judiciário”):
“1. Pelos serviços prestados, os patronos nomeados têm direito a receber honorários fixados pela Comissão, assim como a serem reembolsados das despesas realizadas que devidamente comprovem, não podendo exigir ou receber quaisquer outras quantias.
2. Na fixação dos honorários, deve ter-se em conta o tempo gasto, o volume e a complexidade do trabalho produzido, os actos ou diligências realizados e o valor da causa, devendo, para o efeito, o patrono nomeado apresentar à Comissão o respectivo relatório, que é assinado pelo juiz que conhece o processo judicial para o qual tenha sido concedido o apoio judiciário caso o respectivo processo tenha já sido iniciado.
3. Os honorários fixados pela Comissão não podem exceder os valores máximo e mínimo constantes da tabela de honorários aprovada por despacho do Chefe do Executivo, a publicar no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau.
4. Os valores máximo e mínimo dos honorários constantes do despacho do Chefe do Executivo referido no número anterior são fixados e actualizados, ouvida a Associação dos Advogados de Macau”.
E, por sua vez, por Despacho do Chefe do Executivo n.° 59/2013, (foram revogadas as Portarias n.° 265/96/M de 28.10 e n.° 60/95/M de 31.03, e) aprovou-se uma nova “tabela de honorários”, (tal como referido no transcrito art. 34°, n.° 3 da Lei n.° 13/2012), fixando-se, o montante de MOP$7.500,00 a MOP$50.000,00 para os processos da competência do Tribunal Colectivo, (como foi o caso dos autos).
Temos para nós que a remuneração em questão deve ter presente a dignidade dos profissionais forenses, (e com isto a da própria administração da justiça), sendo uma remuneração adequada para que os serviços prestados sejam qualificados e eficazes, ponderando-se, sempre, o volume e complexidade do trabalho produzido e o dispêndio do tempo que terá implicado; (como em sede de apreciação de idêntica questão bem se notou em recente Ac. da Rel. de Évora de 16.04.2013, Proc. n.° 345/99, in “www.dgsi.pt”, “o “fair trial”, o processo justo, não é só um processo justo para com o acusado, sua origem histórica, é também um processo que deve ser justo para todos e entre todos os intervenientes”).
Por sua vez, há que ponderar se a intervenção do Defensor foi “ininterrupta” (desde o início do processo), ou (meramente) “ocasional”, caso em que se terá de ter presente inscrito nos pontos 9, 10 e 11 da Tabela aprovada pelo citado Despacho do Chefe do Executivo n.° 59/2013.
Dest’arte, atento o exposto, sendo o ora recorrente “Advogado”, e considerando que a intervenção do recorrente não deixou de ser “ocasional” fixa-se o montante de MOP$5.000,00.
Tudo visto, resta decidir.
Decisão
3. Nos termos que se deixam expostos, em conferência, acordam conceder provimento ao recurso, fixando-se, a título de honorários, o montante de MOP$5.000,00.
Sem custas.
Macau, aos 07 de Dezembro de 2016
José Maria Dias Azedo
Tam Hio Wa
Chan Kuong Seng (entendo, porém, que a questão posta pelo Recorrente deveria ser objecto da reclamação da “decisão quanto às custas” perante o próprio Tribunal autor do acórdão em questão).
Proc. 309/2016 Pág. 12
Proc. 309/2016 Pág. 13