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Proc. nº 650/2016/A
Suspensão de eficácia
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 07 de Dezembro de 2016
Descritores:
   -Suspensão de eficácia
-Acto executado
-Suspensão provisória
-Extinção da instância por inutilidade superveniente da lide

SUMÁRIO:

I. A suspensão de eficácia de acto executado só é de decretar se ela se revelar ter alguma utilidade para o requerente, tendo em atenção os efeitos que o acto ainda possa vir a produzir futuramente.

II. Quando não é esse o caso, torna-se impossível proceder-se à suspensão de um acto administrativo se ele já está totalmente executado, se os seus efeitos já se esgotaram na esfera jurídica do interessado, enfim, se nada há para suspender.

III. Na hipótese aludida em II, se a entidade administrativa, uma vez citada, vem informar aos autos que a pena disciplinar de suspensão provisória de funções foi já totalmente executada pelo requerente, fica prejudicado o conhecimento da matéria da providência, havendo antes lugar à extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide.
















Proc. nº 650/2016/A

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I - Relatório
A (A), de sexo masculino, guarda de primeira n.º xxxxxx do CPSP, melhor identificado nos autos, residente na Taipa, Rua de xxx, n.º xxx, xxxxxxxx (xxx), xxº andar x (adiante designado por “requerente”) -----
Requereu a suspensão de eficácia do ----
Despacho n. º 52/SS/2016 de 8 de Agosto de 2016 proferido pelo Secretário para a Segurança que, negou provimento ao recurso hierárquico interposto pelo requerente em 11 de Julho de 2016, e sustentou o despacho de 29 de Junho de 2016 do Comandante do CPSP, que aplicou ao requerente a pena disciplinar de suspensão de funções por 90 dias.
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Contestou a entidade administrativa defendendo a improcedência do pedido, simultaneamente informando que o acto foi integralmente já executado no dia 7 de Novembro de 2016.
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O digno Magistrado do MP opinou no sentido da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide face ao teor da referida informação.
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O requerente, notificado para se pronunciar sobre a extinção da instância, manifestou-se contra em termos que aqui damos integralmente reproduzidos.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é absolutamente competente.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
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III – Os Factos
1 - O requerente é guarda de primeira do Corpo da Polícia de Segurança Pública de Macau.
2 - No dia 29 de Junho de 2016 o Comandante do CPSP aplicou ao requerente a pena disciplinar de suspensão de funções por 90 dias.
3 - De tal decisão interpôs o requerente recurso hierárquico para o Secretário para a Segurança.
4 - O Secretário para a Segurança proferiu no dia 8 de Agosto de 2016 a seguinte decisão:
« Despacho n.º 52/SS/2016 do Secretário para a Segurança
Assunto: Recurso hierárquico
Recorrente: A
N.º do processo disciplinar: 180/2014
Acto recorrido: Despacho do Comandante do CPSP que aplicou ao recorrente a pena de suspensão de funções por 90 dias
O recorrente A, guarda de primeira do CPSP n.º xxxxxx, arguido no presente processo disciplinar, vem interpor recurso hierárquico do despacho de 29 de Junho de 2016 do Comandante do CPSP, que lhe aplicou a pena de suspensão de funções por 90 dias.
O recorrente alegou principalmente no recurso hierárquico os erros do despacho recorrido relativamente à prescrição do processo disciplinar, ao reconhecimento de factos e à aplicação da lei.
Da leitura dos dados constantes dos autos resulta prova suficiente de que o recorrente praticou os factos da infracção disciplinar constantes da acusação (fls. 183 e v dos autos), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. No entanto, os factos da infracção que decorreram antes de Setembro de 2009 devem ser excluídos da acusação por prescrição.
De acordo com os factos acusados, de Setembro de 2009 a Setembro de 2010, o recorrente abriu uma conta destinada a bate-fichas na Companhia de Entretenimento B Limitada, pertencente ao Clube de VIP internacional, na verdade, a conta foi registada em nome do recorrente e registaram-se nela transacções de quantia elevada no período entre Setembro de 2009 e Setembro de 2010. O recorrente é agente policial activo, não deve permitir a outrem usar a sua conta para praticar actividades de jogo, e também não deve participar, de forma directa ou indirecta, em qualquer actividade relacionada com o jogo.
As referidas condutas do recorrente violaram o dever de aprumo previsto pelo art.º 12.º, n.º 2, al. f) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 66/94/M de 30 de Dezembro.
Atendendo à gravidade dos referidos actos ilegais, e às circunstâncias agravantes e atenuantes da responsabilidade disciplinar, não se revela excessiva ou desproporcionada a pena de suspensão de funções por 90 dias, aplicada ao recorrente nos termos do art.º 236.º do EMFSM.
Sustento a decisão recorrida, afastando, no entanto, os factos da infracção que decorreram antes de Setembro de 2009 mencionados no despacho recorrido.
Com base nisso, no exercício das competências me delegadas pelo art. º 4.º da Ordem Executiva n.º 6/1999 e pela Ordem Executiva n.º 111/2014, e nos termos do art.º 292.º, n.º 3 do EMFSM, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 66/94/M de 30 de Dezembro, e do art.º 161.º, n.º 1 do CPA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M de 11 de Outubro, nego provimento ao recurso hierárquico em causa.
Determino a notificação do presente despacho ao recorrente e ao seu advogado nos termos dos art.ºs 70.º a 72.º do CPA.
Em 8 de Agosto de 2016, no Gabinete do Secretário para a Segurança.
Secretário para a Segurança
(Ass.- vide o original)
C ».
5 - A pena de suspensão começou a ser cumprida no dia 10 de Agosto e terminou no dia 7 de Novembro de 2016.
6 - A notificação para a contestação nos presentes autos teve lugar no dia 7 de Novembro.
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IV – O Direito
Seria este o momento para apreciar os fundamentos invocados pelo requerente na petição inicial tendentes à demonstração dos requisitos próprios da procedência da providência.
Contudo, como se viu, a pena disciplinar foi totalmente executada no dia 7 de Novembro.
Estamos, pois, perante uma situação que obriga eventualmente à sua subsunção ao disposto no art. 122º do CPTA.
Ora, como é facilmente apreensível, a suspensão de acto executado só é de decretar se o requerente alegar factos que demonstrem alguma utilidade que para ele tem a suspensão, tendo em atenção os efeitos que o acto ainda possa vir a produzir (Ac. TSI, de 21/02/2002, Proc. nº 190-A/2001).
Quando não é esse o caso, torna-se impossível proceder-se à suspensão de um acto administrativo se ele já está totalmente executado, se os seus efeitos já se esgotaram na esfera jurídica do interessado, enfim, se nada há para suspender (neste sentido, em termos de direito comparado, v.g., Acs. do STA, de 12/02/1986, Proc. nº 021276; de 8/02/2001, Proc. nº 047072).
Foi o que aqui aconteceu.
Efectivamente, no dia (7/11/2016) em que a entidade administrativa foi citada para contestar (fls. 17) concluiu o requerente o cumprimento da suspensão disciplinar decretada.
Certo é que a citação foi efectuada no último dia da execução, circunstância que levou o requerente a defender que não teria sido cumprido o art. 126º do CPAC alusivo à suspensão provisória.
Contudo, é preciso atentar que a citação ocorreu às 16h 43m 50s de uma Sexta-feira, conforme se pode comprovar no Website dos Correios de Macau a partir do registo RR180023102MO de fls. 14 vº.
Ora, recebida a carta para citação pelos serviços próprios dedicados à recepção de correspondência postal, nada mais natural que toda a correspondência desse dia, na qual estaria incluída a carta expedida pelo tribunal, demorasse algum tempo a ser entregue ao destinatário final, ou seja ao próprio Secretário para a Segurança.
É certo que a entidade administrativa, uma vez recebida efectivamente a citação e tomado o contacto com o conteúdo da carta, deve impedir “com urgência” (art. 126º, nº1, do CPAC) que a execução se inicie ou prossiga. Porém, impedir com urgência pode não significar “imediatamente” se, por exemplo, for preciso acomodar a orgânica interna do funcionamento dos serviços à decisão de impedimento.
De resto, e mesmo que a carta fosse entregue imediatamente ao seu destinatário, à luz dos mais puros critérios de sensatez e razoabilidade, um período de cerca de 45 minutos (tantos quantos os que faltariam para o termo desse dia de trabalho na função pública: Despacho nº 21/GM/95) não deixa de ser perfeitamente enquadrável no intervalo de tolerância entre o conhecimento do facto, a decisão urgente a tomar e o cumprimento da ordem de impedimento.
Isto quer dizer, em suma, que perigo da lesão que o requerente pretendia evitar com a providência cedeu o lugar à lesão propriamente dita, a providência perdeu pertinência e utilidade, o que nos termos do art. 287º, al. e), do CPC justifica a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide.
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V – Decidindo
Face ao exposto, com prejuízo do conhecimento da matéria da providência, acordam em julgar extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do art. 229º, al. e), do CPC, “ex vi” art. 1º do CPAC.
Custas pelo requerente (art. 377º, nº1, do CPC), com taxa de justiça em 1 UC (arts. 87º e 89º, nº1, do RCT).
TSI, 07 de Dezembro de 2016
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Fui Presente Lai Kin Hong
Joaquim Teixeira de Sousa



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