--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------------
--- Data: 09/12/2016 ---------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. José Maria Dias Azedo -----------------------------------------------------------------
Processo nº 889/2016
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)
Relatório
1. A (A), com os restantes sinais dos autos, respondeu no T.J.B., vindo a final, a ser condenado como autor da prática de 1 crime de “auxílio”, p. e p. pelo art. 14°, n.° 2 da Lei n.° 6/2004, na pena de 5 anos e 9 meses de prisão; (cfr., fls. 122 a 127 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado, o arguido recorreu.
Na sua motivação e conclusões de recurso, imputa à decisão recorrida o vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”, pugnando por uma alteração da qualificação jurídica da sua conduta, no sentido de ser condenado como autor de 1 crime do art. 14°, n.° 1 – e não art. 14°, n.° 2 – da Lei n.° 6/2004, considerando também excessiva a pena aplicada; (cfr., fls. 136 a 151).
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Em Resposta, considera o Ministério Público que o recurso não merece provimento; (cfr., fls. 154 a 157-v).
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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Na Motivação fls.137 a 151 dos autos, o recorrente solicitou a convolação da subsunção processada no Acórdão em crise para o crime p.p. pelo n.°1 do art.14° da Lei n.°6/2004 e, em consequência disso, a nova graduação da pena, e subsidiariamente, a redução da pena cominada nesse aresto, alegando sucessivamente a insuficiência para decisão da matéria de facto provada e a violação do disposto nos arts.65°, 40° e 48° do CPM.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações do ilustre Colega na Resposta (cfr. fls.154 a 157v.), no sentido do não provimento do presente recurso.
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Vê-se solidamente consolidada a jurisprudência que proclama (a título exemplificativo, vide. Acórdão do TUI nos processos n.°12/ 2014 e n.°): «Para que se verifique o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, é necessário que a matéria de facto provada se apresente insuficiente, incompleta para a decisão proferida, por se verificar lacuna no apuramento da matéria de facto necessária a uma decisão de direito adequada, ou porque impede a decisão de direito ou porque sem ela não é possível chegar-se à conclusão de direito encontrada.» e «Ocorre o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada quando a matéria de facto provada se apresente insuficiente para a decisão de direito adequada, o que se verifica quando o tribunal não apurou matéria de facto necessária para uma boa decisão da causa, matéria essa que lhe cabia investigar, dentro do objecto do processo, tal como está circunscrito pela acusação e defesa, sem prejuízo do disposto nos artigos 339.° e 340.° do Código de Processo Penal.».
No que concerne ao crime de auxílio qualificado, convém ter presente que «Comete o crime de “auxílio” (qualificado) p. e p. pelo n.°2 do art.14°, da Lei n.°6/2004, o arguido que transporta pessoas indocumentadas para Macau a troco de pagamento de quantias monetárias acordadas, ainda que este pagamento seja, num primeiro momento, efectuado a terceiros e não directamente ao arguido.» (Acórdão do Venerando TSI no Processo n.°913/2012)
No caso sub iudice, o Tribunal a quo deu por provado que o recorrente actuara a propósito de obter interesse de dinheiro ilegítimo (10. 嫌犯在自由、自願及有意識的情況下,故意以快艇運載五名未獲在本澳逗留或居留的合法文件的人士進入澳門,目的是獲得不正當金錢利益。)
A matéria de facto dada por provada pela Tribunal a quo demonstra seguramente o preenchimento in casu de todos os requisitos constitutivos do crime de auxílio p. e p. pelo n.°2 do art.14° da Lei n.°6/2004, pelo que sustenta, de feição suficiente e virtuosa, a condenação do recorrente em praticar, como autor material e na forma consumada, o referido crime.
O que conduz peremptoriamente a que não se verifique a arrogada insuficiência para decisão da matéria de facto provada. Daqui resulta a irremediável improcedência do pedido de convolação da subsunção e nova graduação da pena supra apontado.
Considerando o argumento e raciocínio nas 8 a 13 conclusões da Motivação, colhemos que o recorrente cometeu, intencional ou negligentemente, o erro na denominação do vício que ele quis invocar. Pois, o que ele tentou a fazer consiste, no fundo, em questionar a suficiência da prova para suportar o 10 facto provado, implica isto que o vício por si arrogado devia ser reconduzido no erro notório na apreciação de prova, em vez da insuficiência para decisão da matéria de facto provada.
Tendo em conta que o vício de erro notório na apreciação de prova é do conhecimento oficioso, consignemos aqui que em esteira da douta jurisprudência fixada nos arestos tirados pelo Alto TSI nos seus Processos n.°528/2010 e n.°913/2012, não existe este vício. Com efeito, como bem mencionou o Tribunal a quo na parte «事實之判斷» do Acórdão em escrutínio, três indivíduos indocumentados de nome respectivamente B, C e D afirmaram, nas declarações para memória futura, que tiveram pago dinheiro, a título de despesas, a um indivíduo desconhecido.
Sem prejuízo do respeito pela opinião diferente, os factos dados por provados pelo douto Tribunal a quo imbuem-nos a firme convicção de que a matéria de facto provada é adequada, suficiente e segura para se chegar à aludida decisão condenatória.
Assim, e em conformidade com as sensatas jurisprudências acima citadas, afigura-se-nos inquestionável que não se verifica in casu a invocada insuficiência para decisão da matéria de facto provada, sendo vedado pelo art.114° do CPP os argumentos do recorrente supra mencionados.
De acordo com o 8 facto provado, o recorrente transportou cinco (5) indivíduos indocumentados. De outro lado, o recorrente negou a prática dolosa do crime imputado a si e, na audiência, não respondeu a pergunta de «為何嫌犯沒有懷疑是在進行不法行為». Tudo isto indicia razoavelmente a elevada gravidade da ilicitude e forte intensidade do dolo.
Sendo assim, à luz da moldura penal consagrada no n.°2 do art.14° da Lei n.°6/2004, e dos parâmetros prescritos no art.65° do CPM, temos por nós que a pena de 5 anos e 9 meses de prisão efectiva imposta pelo Tribunal a quo é justa para o recorrente e adequada para as finalidades de prevenção, não tendo cabimento o 2° pedido do recorrente”; (cfr., fls. 173 a 174-v).
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Em sede de exame preliminar constatou-se da manifesta improcedência do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 123 a 124, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.
Do direito
3. Vem o arguido dos autos recorrer do Acórdão do T.J.B. que o condenou como autor material de 1 crime de “auxílio”, p. e p. pelo art. 14°, n.° 2 da Lei n.° 6/2004, na pena de 5 anos e 9 meses de prisão.
Considera que o mesmo padece de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”, pugnando por uma alteração da qualificação jurídica da sua conduta, no sentido de ser condenado como autor de 1 crime do art. 14°, n.° 1 – e não art. 14°, n.° 2 – da Lei n.° 6/2004, considerando também excessiva a pena aplicada.
Mostra-se porém evidente que carece de razão.
Vejamos.
–– Repetidamente tem este T.S.I. afirmado que:
O vício de insuficiência da matéria de facto provada para a decisão apenas ocorre “quando o Tribunal não se pronuncia sobre toda a matéria objecto do processo”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 14.01.2016, Proc. n.° 1053/2015, de 10.03.2016, Proc. n.° 95/2016 e de 02.06.2016, Proc. n.° 1062/2015).
E, no caso nenhuma “insuficiência” existe, pois que o Tribunal investigou e emitiu pronúncia sobre toda a matéria objecto do processo, não apresentando esta qualquer lacuna que inviabilize uma adequada qualificação jurídico-penal.
Continuemos.
Estatui o dito art. 14° da Lei n.° 6/2004 que:
“1. Quem dolosamente transportar ou promover o transporte, fornecer auxílio material ou por outra forma concorrer para a entrada na RAEM de outrem nas situações previstas no artigo 2.º, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.
2. Se o agente obtiver, directamente ou por interposta pessoa, vantagem patrimonial ou benefício material, para si ou para terceiro, como recompensa ou pagamento pela prática do crime referido no número anterior, é punido com pena de prisão de 5 a 8 anos”.
E, no caso dos autos, provado está que acordado estava a “compensação” do arguido pela sua tarefa em “transportar pessoas indocumentadas para Macau” e que houve efectivo “pagamento de quantias pecuniárias”, ainda que não feitos na pessoa do arguido ora recorrente, e que este obteve “vantagem patrimonial”.
E como já decidiu este T.S.I., “não obstante não receber dinheiro dos ilegais, não deixa de se mostrar integrada a previsão típica do crime do n.º 2 do art. 14º da Lei 6/2004, de 2 de Agosto de 2004, se o arguido conluiado com outrem foi enviado para Macau para tratar de encaminhar imigrantes ilegais que pagaram por essa vinda aos co-agentes do arguido no Interior da China”; (cfr., os Acs. deste T.S.I. de 22.07.2010, Proc. n.° 528/2010, de 28.02.2013, Proc. n.° 913/2012 e de 26.07.2013, Proc. n.° 412/2013).
Assim, no caso, face ao que provado ficou, inquestionável é que a conduta do arguido ora recorrente integra a prática de 1 crime p. e p. pelo n.° 2 do art. 14° da Lei n.° 6/2004.
–– Nesta conformidade, e sendo o crime cometido punido com a pena de prisão de 5 a 8 anos de prisão, evidente é que nenhuma censura merece pena de 5 anos e 9 meses de prisão fixada ao arguido ora recorrente, (apenas a 9 meses acima do mínimo legal), nada mais se mostrando de dizer, e sendo de se decidir em conformidade.
Decisão
4. Em face do exposto, decide-se rejeitar o presente recurso.
Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 4 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.
Registe e notifique.
Nada vido de novo, e após trânsito, devolvam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 09 de Dezembro de 2016
José Maria Dias Azedo
Proc. 889/2016 Pág. 10
Proc. 889/2016 Pág. 11