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Processo n.º 834/2016
(Recurso Cível)
    
Relator: João Gil de Oliveira
Data : 7/Dezembro/2016


ASSUNTOS:
- Legitimidade passiva na suspensão de deliberações da AG de condóminis
    
    
SUMÁRIO :
    Na providência de suspensão de deliberação da AG de condóminos devem ser demandados os condóminos que votaram favoravelmente as deliberações impugnadas e já não a Administração do condomínio.
    
O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira





Processo n.º 834/2016
(Recurso Civil)
Data : 7/Dezembro/2016

Recorrente : A

Objecto do Recurso : Sentença de absolvição da instância


    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I – RELATÓRIO
    1. A, mais bem identificado nos autos, inconformado com a decisão do Mmo Juiz que absolveu da instância a requerida os presentes autos, o Senhor Juiz a quo absolveu da instância a Requerida, Administração do Condomínio dos Edifícios B, C e D, de um pedido de suspensão de deliberações da Assemblei Geral do respectivo condomínio, por entender ter esta falta de legitimidade processual, uma vez que no seu entendimento têm legitimidade para o procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais os condóminos que as tomaram ao votá-las favoravelmente e não a Administração do condomínio, demandada no presente pedido de suspensão de deliberações de condóminos, dessa decisão vem recorrer, alegando, em síntese conclusiva:
    1. O Senhor Juiz a quo absolveu a Requerida da instância cautelar, por falta de legitimidade processual, por entender que deviam ter sido demandados os condóminos que votaram favoravelmente as deliberações e não a Administração do condomínio.
    2. O Recorrente reconhece que o disposto no n.º 2 do artigo 1352.° do Código Civil estabelece que as acções de impugnação das deliberações da assembleia de condóminos são propostas contra os condóminos que votaram favoravelmente a deliberação.
    3. Porém, à hora de entrada do pedido de suspensão o Requerente não havia ainda tido acesso à acta da assembleia cujas deliberações são objecto deste pedido, pelo que lhe era impossível descortinar quais os condóminos que votaram favoravelmente as deliberações.
    4. Foi por isso que o Recorrente demandou a Administração do condomínio enquanto entidade que representa os condóminos incertos que votaram as deliberações.
    5. A capacidade judiciária da administração do condomínio também se justifica pela razão simples de que nem sempre é possível a identificação precisa dos condóminos que carecem de ser demandados, facto que se verifica nos presentes autos.
    6. O ora Recorrente não teve outra alternativa que não demandar a Administração do condomínio em representação dos condóminos incertos de molde a que a sua pretensão não ficasse sem guarida processual.
    7. Aliás, o teor da acta junta com a contestação também não é de molde a esclarecer quem votou favoravelmente as deliberações.
    8. Assim sendo, é perfeitamente admissível a legitimidade da Administração do condomínio em representação dos condóminos incertos, devendo a decisão de absolvição da instância do douto Tribunal a quo ser revogada pelo esse Venerando Tribunal de Segunda Instância.
    Termos em que deve o presente recurso ser procedente, por provado, e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida e admitida a legitimidade processual da Administração do condomínio dos Edifícios B, C e D, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
    2. Administração do Condomínio dos Edifícios B, C e D, requerida e ora recorrida nos autos à margem identificados, vem nos termos do art. 613.°, n.º 2 do Código de Processo Civil (doravante abreviadamente designado "CPC"), apresentar as suas CONTRA – ALEGAÇÕES, dizendo, em síntese:
    i. Vem o Recorrente interpor recurso da sentença proferida a fIs. 80, que absolveu a recorrida do pedido por falta de legitimidade passiva, sem que, porém, aquela decisão mereça qualquer reparo ou censura.
    ii. O recorrente insurge-se contra o facto de a decisão em causa ter considerado a recorrida parte ilegítima, por entender que apenas têm legitimidade passiva no procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais os condóminos que as votaram favoravelmente, e não a Administração do condomínio.
    iii. O recorrente começa por reconhecer - e bem - nas motivações de recurso que, nos termos do art. 1352º, n.º 2, do CC: e do art. 343º do CPC as acções de impugnação das deliberações da assembleia de condóminos são propostas contra os condóminos que as aprovaram.
    iv. Porém, defende que não lhe restou alternativa senão demandar a administração do condomínio, enquanto entidade que representa os condóminos incertos que votaram as deliberações, estribando-se no facto de não ter forma de saber quais os condóminos que tinham votado as deliberações, porque, segundo alega, não lhe tinha sido fornecida cópia da acta relativa à assembleia.
    v. Ora, o recorrente não demandou a administração do condomínio, enquanto entidade que representa os condóminos incertos que votaram as deliberações, conforme é facilmente perceptível pela leitura da petição da providência cautelar.
    vi. Em momento algum na sua petição, o recorrente se referiu aos condóminos que votaram favoravelmente nas deliberações da assembleia geral de 17 de Janeiro de 2016, e muito menos que a requerida estivesse a ser demandada enquanto representante judicial destes.
    vii. O recorrente afirmou na sua petição, de facto, que até à data não lhe havia sido facultada cópia da acta da assembleia geral de condóminos, não obstante esta ter sido solicitada pelo seu ilustre advogado – art. 28º e 29º da PI -, o que se reputa como falso, porquanto no dia 28/01/2016 foi entregue uma cópia da referida acta no escritório do ilustre advogado do recorrente, em mão própria, conforme se pode comprovar pelo doc. 2 junto com a oposição, no qual consta a sua assinatura e carimbo, como confirmação da sua recepção.
    viii. Por outro lado, a deve ser proposta contra os condóminos que nelas votaram, competindo a sua representação ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito, nos termos do art. 1352º, n.º 2, do CC e do art. 343º do CPC.
    ix. A legitimidade passiva nas acções de impugnação das deliberações da assembleiageral de condóminos pertence exclusivamente aos condóminos que as votaram, os quais são os únicos titulares do interesse relevante em contradizer estas acções - art. 58º do CPC - , com a particularidade de serem representados pelo administrador ou pela pessoa que a assembleia designar para esse efeito.
    x. Esta representação judiciária não pode ser confundida com a extensão da personalidade judiciária a que alude o art. 40° do CPC.
    xi. Com efeito, uma coisa são os poderes de representação judiciária dos condóminos que votaram as deliberações impugnadas e outra diversa é a personalidade judiciária atribuída ao condomínio, quando estejam em causa actos ligados às funções da administração, situação em que a legitimidade para agir em juízo cabe ao administrador, como decorre expressamente do art. -1359º n.ºs l e 2, do CC:.
    xii. Quer isto dizer que sornen te nas acções respeitantes a partes comuns pode a administração ser demandada; já no que respeita às acções de impugnação de deliberações da assembleia de condóminos, e bem assim aos procedimentos cautelares de suspensão das mesmas, somente os condóminos teriam legitimidade passiva e não a administração, ainda que em representação daqueles.
    xiii. Quanto ao argumento invocado pelo recorrente, de que apenas demandou a administração porque não tinha como saber quem eram os condóminos que aprovaram as deliberações na assembleia de 17 de Janeiro de 2016, sob pena de serem afectados os seus direitos de garantia de acesso aos tribunais, basta dizer que a acção principal do presente apenso foi intentada contra os condóminos incertos que votaram as deliberações impugnadas, representados pelo administrador, o que só por si contradiz a própria argumentação acima expendida pelo recorrente.
    xiv. Pelo que não se encontram afectados os direitos de garantia de acesso aos tribunais. como aparentemente o recorrente pretende fazer crer, visto que podia - e devia - ter demandado os condóminos incertos, da mesma forma em que o fez na acção principal de impugnação de deliberações, falecendo, portanto, todos os argumentos invocados pelo recorrente no seu recurso.
    Termos em que,
    E com o douto suprimento de V. Exªs, deverá o recurso interposto ser declarado totalmente improcedente, mantendo-se integralmente a douta sentença recorrida.
    3. Foram colhidos os vistos legais.
    
    II – FACTOS
    Com pertinência, têm-se por assentes os factos seguintes:
    A intentou procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais contra a Administração do condomínio de três edifícios que identificou.
    Citada a requerida veio, entre o mais, invocar a sua ilegitimidade para ser aqui demandada.
    Por falta de legitimidade foi a requerida absolvida da instância cautelar no Tribunal de 1ª Instância.
    III – FUNDAMENTOS
    1. Vem o Recorrente interpor recurso da sentença proferida a fls. 80, que absolveu a recorrida da instância por falta de legitimidade passiva.
    O objecto do presente recurso passa, pois, por saber se a requerida, a Administração do Condomínio dos edifícios B, C e D, é ou não parte legítima na presente suspensão de deliberações sociais.
    2. Somos a sufragar a douta decisão proferida, enquanto consignou:
    “(…)
    Como já se referiu no despacho liminar da acção principal apensa, de que este procedimento cautelar é dependente (art. 328°, n.º 1 do CPC), têm legitimidade para o procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais os condóminos que as tomaram ao votá-las favoravelmente (cfr. fls. 36 da acção principal apensa e art. 1352°, n° 2 do CC).
    A legitimidade depende de lei expressa ou da titularidade da relação material controvertida na qualidade de sujeito (art. 58° do CPC). No caso da suspensão de deliberações sociais há lei expressa atribuidora de legitimidade passiva. Não tem, pois, a requerente legitimidade para ser demandada.
    Assim, por falta de legitimidade, vai a requerida absolvida da presente instância cautelar.”
    3. Na verdade, apenas têm legitimidade passiva no procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais os condóminos que as votaram favoravelmente, e não a Administração do condomínio, aliás, como o próprio recorrente começa por reconhecer nas suas alegações de recurso, dizendo que, nos termos do art. 1352º, n.º 2, do CC e do art. 343º do CPC, as acções de impugnação das deliberações da assembleia de condóminos são propostas contra os condóminos que as aprovaram.
    Defende, porém, que não lhe restou alternativa senão demandar a administração do condomínio, enquanto entidade que representa os condóminos incertos que votaram as deliberações, estribando-se no facto de não ter forma de saber quais os condóminos que tinham votado as deliberações, porque, segundo alega, não lhe tinha sido fornecida cópia da acta relativa à assembleia.
Mas este desiderato não deixa ser desmentido, porquanto o recorrente não demandou a Administração do condomínio, enquanto entidade representante dos condóminos incertos que votaram as deliberações.. Em momento algum, na sua petição, se menciona essa qualidade, se afirma que a requerida é chamada em representação daqueles que votaram favoravelmente nas deliberações da Assembleia Geral de 17 de Janeiro de 2016. Não há sequer referência aos condóminos que votaram favoravelmente a deliberação a suspender.
    4. O facto de eventualmente o recorrente não ter acesso à acta, donde poderia resultar a informação sobre os condóminos a demandar não pode servir de “ desculpa” para fazer intervir um órgão que não tem capacidade para tal, na medida em que sempre poderia ser aquele instado judicialmente a fornecer os elementos, em particular a acta, de forma a poder tornar actuante o princípio da tutela judicial efectiva dos direitos e interesses da parte interessada em os fazer valer em juízo.
    Para além de que esse facto, de que até à data não lhe fora facultada cópia da acta da assembleia geral de condóminos, não obstante esta ter sido solicitada pelo seu ilustre advogado - art. 28° e 29° da PI -, não deixa de ser igualmente desmentido, porquanto no dia 28/01/2016, segundo alega, foi entregue uma cópia da referida acta no escritório do ilustre advogado do recorrente, em mão própria. conforme se pode comprovar pelo doc. 2 junto com a oposição, no qual consta a sua assinatura e carimbo, como confirmação da sua recepção, se bem que o documento é de 26/1/2016, data da entrega da providência em tribunal. De todo o modo, este facto ilustra bem que parece não haver uma intenção de recusa em se facultar a acta de forma a identificar os votantes citandos, bem se podendo presumir, até porque não vem alegado o pedido e a recusa, muito menos comprovados tais factos, limitando-se o recorrente a afirmar que até ”à hora da entrada do pedido de suspensão das deliberações objecto dos presentes autos não tinha sido fornecida ao Requerente cópia da acta da Assembleia”.
    5. A acção de impugnação das deliberações da Assembleia Geral de condóminos deve ser proposta contra os condóminos que nelas votaram, competindo a sua representação ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito, nos termos do art. 1352°, n.º 2, do CC e do art. 343° do CPC, pelo que, mesmo a admitir a intervenção da Administração, sempre ela teria de ser legitimada, para esse efeito, pela AG.
    A legitimidade passiva pertence, assim, exclusivamente aos condóminos que votaram as deliberações impugnadas, os quais são os únicos titulares do interesse relevante em contradizer estas acções - art. 58° do CPC -, com a particularidade de serem representados pelo administrador ou pela pessoa que a assembleia designar para esse efeito.
    Com efeito, uma coisa são os poderes de representação judiciária dos condóminos que votaram as deliberações impugnadas e outra diversa é a personalidade judiciária atribuída ao condomínio, quando estejam em causa actos ligados às funções da administração, situação em que a legitimidade para agir em juízo cabe ao administrador, como decorre expressamente do art. 1359° n.ºs 1 e 2, do CC.
    Como bem observa a requerida – e a ser verdade o que afirma, em face dos elementos constantes da acção principal que não se mostra apensa - já a acção principal do presente apenso foi intentada contra os condóminos incertos que votaram as deliberações impugnadas, representados pelo administrador, o que parece contradizer a própria argumentação acima expendida pelo recorrente, pois não se vê razão, mesmo na impossibilidade de acesso à acta em se demandaram os condóminos incertos que aprovaram a deliberação, para não se ter feito, isto é, demandado, quem ali o foi.
    Nesta conformidade e sem necessidade de outros desenvolvimentos o recurso não deixará de improceder.
    IV – DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
    Custas pela recorrente.
               Macau, 7 de Dezembro de 2016,
               João A. G. Gil de Oliveira
               Ho Wai Neng
               José Cândido de Pinho


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