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Processo nº 873/2016 Data: 07.12.2016
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Liberdade condicional.
Pressupostos.


SUMÁRIO

1. A liberdade condicional não é uma “medida de clemência”, constituindo uma medida que faz parte do normal desenvolver da execução da pena de prisão, manifestando-se como uma forma de individualização da pena no fito de ressocialização, pois que serve um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, equilibradamente, recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão.

2. É de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social.

O relator,

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Processo nº 873/2016
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A, com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Coloane (E.P.C.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no art. 56° do C.P.M.; (cfr., fls. 305 a 309 que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).

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Em resposta, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 311 a 311-v).

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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer opinando no sentido da procedência do recurso; (cfr., fls. 318 a 318-v).

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Corridos os vistos legais dos Mmos Juízes-Adjuntos, e nada obstando, vieram os autos à conferência.

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Passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):

– por Acórdão do T.J.B. de 28.02.2007, foi, A, ora recorrente, condenado pela prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes (agravado)”, na pena de 12 anos e 6 meses de prisão e MOP$50.000,00 de multa ou 333 dias de prisão alternativa;
– o mesmo recorrente, deu entrada no E.P.C. em 20.10.2005, e em 29.09.2014, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 19.04.2018, se pagar a multa, e em 18.03.2019, se o não fizer;
– durante o período de reclusão foi disciplinarmente punido em 2012;
– se lhe vier a ser concedida a liberdade condicional, tenciona voltar a viver em TAIWAN, de onde é natural.

Do direito

3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do art. 56° do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.

Cremos porém que se deve julgar improcedente a pretensão deduzida.

Vejamos.

— Preceitua o citado art. 56° do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:

“1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.
3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
   
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. n.° 1).

“In casu”, atenta a pena que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 20.10.2005, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.

Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do n.° 1 do referido art. 56°.

Com efeito, importa ter em conta que a liberdade condicional não é uma “medida de clemência”, constituindo uma medida que faz parte do normal desenvolver da execução da pena de prisão, manifestando-se como uma forma de individualização da pena no fito de ressocialização, pois que serve um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, equilibradamente, recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão; (cfr., v.g., J. L. Morais Rocha e A. C. Sá Gomes in “Entre a Reclusão e a Liberdade – Estudos Penitenciários”, Vol. I, em concreto, “Algumas notas sobre o direito penitenciário”, IV cap., pág. 41 e segs.).

Na esteira do repetidamente decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 23.06.2016, Proc. n.° 430/2016, de 03.11.2016, Proc. n.° 726/2016 e de 24.11.2016, Proc. n.° 798/2016).

Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.

Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?

Cremos que de sentido negativo deve ser a resposta.

Com efeito, no caso, para além de difícil ser o necessário juízo de prognose favorável quanto à vida do ora recorrente se reposto em liberdade, isto, devido à sua punição disciplinar e à (total) ausência de perspectivas de emprego e de apoio familiar, atento o tipo de crime cometido, (o de “tráfico de estupefacientes”), os seus prejuízos e malefícios para a saúde pública, (muito) fortes são as necessidades de prevenção criminal (geral), especialmente, tendo-se em conta que na situação dos autos, em causa está um “crime transfronteiriço”, (em que o estupefaciente – quase 700 gramas de heroína – entra em Macau por via aérea escondido numa sandália), e, ponderando na pena aplicada e no período de pena que falta cumprir, apresenta-se-nos que, por ora, viável também não se mostra de considerar como verificado o pressuposto do art. 56, n.° 1, al. b) do C.P.M., pois que, importa acautelar a repercussão de tal criminalidade na sociedade, o que equivale a dizer que não podem ser postergadas as exigências de tutela do ordenamento jurídico, (cfr., F. Dias in “Dto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 528 e segs.), havendo igualmente que salvaguardar a confiança e as expectativas da comunidade no que toca à validade da norma violada através do “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada”; (cfr., F. Dias in “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 106).

Assim, em face das expostas considerações, e verificados não estando os pressupostos do art. 56°, n.° 1 do C.P.M., há que confirmar a decisão recorrida.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 4 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Macau, aos 7 de Dezembro de 2016




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José Maria Dias Azedo
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Chan Kuong Seng
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Choi Mou Pan
(附表決聲明)
















上訴案第873/2016號



表决聲明

作為原裁判書製作人不同意大多數的意見,特發表以下不同意見:
在本案中,上訴人入獄後,雖然於2011年6月21日因“未獲監獄長許可而與其他囚犯、公務員或監獄外之人士訂立合同”而違反第40/94/M號法令第七十四條第p)項的規定,而被科處在普通囚室作隔離5日及並剝奪放風權利2日,但是在此之後,上訴人在沒有任何違規的行為出現,被列為“信任類”,行為總評價被評為“良”。原審法院也充分肯定了上訴人這方面的積極因素,也認為上訴人在法罪的特別預防方面顯示出正面的結論。那麼,我們就要看看在預防犯罪以及維護社會、法律秩序的考慮方面的因素決定是否應予以維持被上訴的決定。
雖然,我們一直認為,囚犯的犯罪後的表現,尤其是在服刑期間在主觀意識方面的演變情況顯示出有利的徵兆,亦不是當然地等同於假釋出獄後不會對社會安寧及法律秩序造成危害,這不單取決於其本人的主觀因素,而更重要的是考慮這類罪犯的假釋所引起的消極社會效果,假釋決定使公眾在心理上無法承受以及對社會秩序產生一種衝擊等負面因素,但是,在本案中,上訴人所犯罪的時間為2005年,自其入獄後,澳門關於反販毒的刑事法律以及所體現的立法精神有了改變和發展,除了上訴人所被依據第5/91/M號法令第10條g項加重處罰的情節已經在第17/2009號法律不成為特定的加重情節外,在近幾年的司法實踐顯示,上訴人所涉及販毒的毒品重量的行為所被判處的刑罰鮮有超過上訴人所已經實際服刑的期間,即使在考量犯罪的一般預防方面的因素尤其是從上訴人所犯罪的嚴重性來看,甚至從澳門這個依賴旅遊業的國際性城市的對像上訴人那樣以旅客身份來澳實施此類販毒行為這個最嚴重之一的犯罪懲罰要求的因素,上訴人的良好服刑表現和實踐,在變革中刑事政策面前,我們應該得出的結論是,我們已經達到了基於社會法律秩序的懲罰要求的目的,提前釋放已經不會對社會、法律秩序帶來另外一次的衝擊。
因此,本人認為上訴人已經具備所有的假釋條件,其上訴理由成立,而否決假釋的決定應予以撤銷。
2016年12月7日

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