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Processo nº 665/2016
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 19 de Janeiro de 2017
Descritores:
-Revisão de sentença
-Divórcio
- Regulação do poder paternal

SUMÁRIO:

I. Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.

II. Quanto aos requisitos relativos à competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, o tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do nº1, do artigo 1200º, negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.

III. É de confirmar a decisão da Conservatória do Registo Civil de Lisboa que homologou o divórcio por mútuo consentimento entre os autores, bem como o acordo relativamente ao exercício do poder paternal sobre o filho comum de ambos.














Proc. nº 665/2016

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I – Relatório
A, divorciada, residente em Macau na Praça de Lobo de ávila XXXXXXXXXXXX ---
e ---
B, divorciado, residente em Macau na Praça de Lobo de ávila, XXXXXXXXXXXXX, intentaram a presente acção de revisão e confirmação de da decisão de divórcio proferida pela Conservatória do Registo Civil de Lisboa.
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O digno Magistrado do MP não se opôs ao deferimento do pedido.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos Processuais
O Tribunal é absolutamente competente.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
Inexistem quaisquer outras excepções ou questões prévias de que cumpra conhecer.
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III - Os Factos
1º - Os requerentes contraíram casamento em Macau em 9 de Abril de 2005 (doc. fls. 17).
2º - Por decisão proferida pela Conservatória do Registo Civil de Lisboa em 28 de Maio de 2014, transitada em julgado no mesmo dia, foi decretado o divórcio por mútuo consentimento requerido por ambos os requerentes e homologado o acordo quanto ao exercício das responsabilidades parentais.
3º - A decisão referida tem o seguinte teor:
Conservatória do Registo Civil Lisboa
Acta de conferência
PROC. DIVÓRCIO Nº 38013/2014
Em 28 de Maio de 2014
PRESENTES:
Conservador: Lic. C
Requerentes:
- B, representado pela Dra. D, por ausente no estrangeiro e
- A, representada pela Dra. E
Iniciada a conferência prevista nos artºs 14º nº 3 do D.L. nº 272/2001, de 13 de Outubro, 1776 do Código Civil e 995º nº 1 do Código do Processo Civil, foi dito pelos representantes legais que persistem na intenção de se divorciarem.
Confirmaram que contraíram casamento em 09 de Abril de 2005, não têm bens comuns a partilhar, têm um filho menor cujas responsabilidades parentais se encontram acauteladas nos termos do art.º 14º nºs 4 e 6 do D.L. nº 272/2001, de 13 de Outubro, não carecem de prestação de alimentos, o casamento foi contraído segundo o regime imperativo de separação de bens e não há morada de família a que dar destino.
Informados da existência dos serviços de mediação familiar, declararam prescindir dos mesmos.
Seguidamente o Conservador proferiu a seguinte DECISÃO
Os requerentes acima identificados, contraíram casamento em 09-04-2005. Requereram o divórcio por mútuo consentimento em 07-05-2014.
A Conservatória é competente em razão da matéria.
As partes são legítimas e têm capacidade jurídica.
Homologo o acordo quanto ao exercício das responsabilidades parentais - artº 1778º do Código Civil.
Verificados os requisitos dos artºs 1775º do Código Civil, 272º e seguintes do Código do Registo Civil e 14º nº 3 do D.L. nº 272/2001, de 13 de Outubro, decreto o divórcio por mútuo consentimento, ficando, consequentemente, dissolvido o casamento.
As partes declararam que renunciam ao prazo de recurso nos termos do artº 632º nº 1 do Código de Processo Civil, ex-vi do artº 231º do Código do Registo Civil.
Notifique e anote.
Proceda, após trânsito, ao registo por averbamento ou efectue as comunicações a que houver lugar.
4º - O acordo sobre o exercício do poder paternal tem o seguinte teor:
Os requerentes A e B, vêm requerer a homologação do acordo da regulação das responsabilidades parentais em relação ao seu filho menor, com os seguintes fundamentos:
1º - O filho menor dos requerentes é confiado à guarda e cuidados da mãe e a residir com esta.
2º - As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho serão exercidas, em comum, por ambos os progenitores, nos termos que vigoraram na constância do matrimónio, 'salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro, logo que possível.
3º - O pai pagará à mãe, até ao dia 8 de cada mês, a título de pensão de alimentos, a quantia de 500 euros, mensais, actualizável anualmente de acordo com os índices de inflação fixados pelo I.N.E. (ou segundo o aumento do ordenado do pai), tendo essa actualização início em Janeiro de cada ano.
4º - A quantia referida no número anterior será paga pelo pai, mediante transferência bancária para conta à ordem da mãe, com o número 15XXXXXX, do Banco BCP/Millenium, com o NIB 0033 0001 XXXX XXXX.
5º - O menor passará os fins de semana alternadamente com cada um dos progenitores, (ou o mesmo passará o primeiro fim de semana de cada mês com a mãe e os outros fins de semana com o pai, devendo este ir buscá-lo a casa da mãe às 20 horas de sexta-feira e levá-lo às 20 horas de domingo.
6º - Em épocas festivas - Páscoa, Natal e Fim de Ano, o menor passará a véspera com um e o dia com o outro, alternadamente, sendo que no presente ano o menor almoçará com o pai e jantará com a mãe.
7º - No aniversário de cada um dos progenitores o menor jantará com o aniversariante.
No aniversário do menor, este passará parte do dia com cada um dos progenitores, almoçando com um e jantando com o outro, alternadamente.
8º - O período de férias escolares do Verão do menor serão repartidas entre os progenitores de igual maneira e de forma a que este passe com o pai, no mínimo de 15 dias.
Os progenitores combinarão previamente, entre si, qual o período de férias que o menor passará com cada um deles.
9º - Fora destes períodos, o pai, poderá estar com o menor sempre que o desejar, devendo para o efeito, comunicar à mãe, com a antecedência mínima de 24 horas, sem prejuízo dos superiores interesses do menor.
5º - A decisão da Conservatória acima transcrita transitou no dia 28 de Maio de 2014 (fls. 5).
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IV - O Direito
1. Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida; 342/2009 28/34
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública. 2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”
Neste tipo de processos não se conhece do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, uma vez que o Tribunal se limita a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento, nem da questão de facto, nem de direito.
Vejamos então os requisitos previstos no artigo 1200º do CPC.
Ora, os documentos constantes dos autos reportam e certificam a situação de divórcio entre requerente e requerido, que foi decretada por decisão da Conservatória do Registo Civil de Lisboa.
Revelam, além da autenticidade, a inteligibilidade da decisão que homologou o acordo dos pais sobre o exercício do poder paternal do filho comum de ambos.
Por outro lado, a decisão em apreço não conduz a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública (cfr. art. 20º e 273º do C.C.). Com efeito, também o direito substantivo de Macau prevê o divórcio e a regulação do exercício do poder paternal.
Assim, cremos estarem reunidos os requisitos de verificação oficiosa do art. 1200º, n.1, als. a) e f), do CPC.
Além destes, não se detecta que os restantes (alíneas b) a e)) constituam aqui qualquer obstáculo ao objectivo a que tendem os autos. Na verdade, o trânsito da decisão já ocorreu em 28/05/2014. A decisão foi proferida por entidade competente e não versa sobre matéria exclusiva da competência dos tribunais de Macau, face ao que consta do art. 20º do Cód. Proc. Civil.
Também não se vê que tivesse havido violação das regras de litispendência e caso julgado ou que tivessem sido violadas as regras da citação no âmbito daquele processo ou que não tivessem sido observados os princípios do contraditório ou da igualdade das partes.
Posto isto, tudo se conjuga para a procedência do pedido (cfr. art. 1204º do CPC).
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V - Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder a revisão e confirmar a decisão proferida pela Conservatória do Registo Civil de Lisboa no Processo nº 38013/2014, que homologou o divórcio por mútuo consentimento entre os autores A e B, bem como o acordo sobre o exercício do poder paternal sobre o filho comum de ambos, de nome Daniel del Barco Peres Américo, nos precisos termos acima transcritos.
Custas pelos autores.
TSI, 19 de Janeiro de 2017
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong




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