--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ------
--- Data: 18/01/2017 -----------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo --------------------------------------------------------------------------
Processo nº 842/2016
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)
Relatório
1. A (A), com os restantes sinais dos autos, respondeu no T.J.B., vindo a ser condenado como autor material da prática em concurso real de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 4 meses e 15 dias de prisão, e 1 outro de “fuga à responsabilidade”, p. e p. pelo art. 89° da mesma Lei, na pena de 6 meses de prisão, e em cúmulo jurídico, na pena única de 7 meses de prisão; (cfr., fls. 177 a 182 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado, o arguido recorreu.
Motivou para concluir afirmando o que segue:
“1- Há factos alegados pelo arguido, quer na sua contestação, quer declarados em audiência de discussão e julgamento que não foram considerados provados ou não provados;
2- Não há nexo de causalidade adequada entre a colisão do carro do arguido com o automóvel ligeiro com matrícula n.° ML-X4-X1, parado por causa da luz vermelha na faixa de rodagem em sentido oposto, e a colisão que este teve a seguir com o no motociclo atrás com matrícula n.° MM-X4-X0.
3- Não se averiguou, por exemplo, se o condutor do automóvel ligeiro com matrícula n.° ML-X4-X1 tinha o carro engatado na primeira velocidade e com o pé na embraiagem; parado em ponto morto, destravado; parado em ponto morto, travado. As respostas são forçosamente diferentes, bem como diferente é a responsabilidade do arguido. Se o condutor do automóvel ligeiro com matrícula n.° ML-X4-X1 tivesse o veículo travado, a colisão arrastaria aquele veículo para trás, deixando as marcas visíveis dos pneus no chão.
4- Houve omissão de averiguação de factos relevantes para a descoberta da verdade material, que deverão conduzir à anulação do julgamento sendo que as dúvidas só poderão correr a favor do arguido de acordo com o princípio do processo penal em matéria de prova in dubio pro reo, que expressa o princípio jurídico da presunção da inocência que diz que em casos de dúvidas (por exemplo, insuficiência de provas) se favorecerá o réu.
5- A douta sentença impugnada sofre também de omissão de pronúncia quanto aos factos alegados pelo arguido na sua contestação e nas declarações que voluntariamente prestou em audiência de discussão e julgamento, os quais não contam do elenco de factos provados ou não provados, nulidade que desde já se argui.
6- Referimo-nos especialmente à justificação dada para sair do local do acidente, matéria que debalde se procurará, quer nos factos provados quer nos factos não provados, apenas sendo abordada na fundamentação da douta decisão.
7- Não estão preenchidos os requisitos constitutivos do tipo de ilícito penal previsto no artigo 89.° da LTR, que se trata de crime doloso.
8- Como é possível o arguido esquivar-se à sua responsabilidade civil ou criminal, se o seu veículo ficou no local; o arguido também ficou ferido; esteve à conversa com um dos demais intervenientes no sinistro; prontificando-se a pagar todos os prejuízos, como efectivamente veio a acontecer, tendo inclusive fornecido um número de telefone.
9- Depois, inexistiu subjectivamente a intenção do arguido isentar-se da sua responsabilidade, uma vez que na altura do acidente, só quando o arguido se apercebeu que o seu cão, transportado dentro do carro e com a colisão ficou desorientado, apanhou a porta aberta do veículo e, esse sim, fugiu só parando em casa, foi a correr atrás dele – facto este, repete-se, importante na averiguação da verdade material e que o Tribunal a quo não se pronunciou nos factos provados ou não provados.
10- Somente a seguir aos primeiros contactos e diálogos é que o arguido saiu do local, a correr (não a fugir) em busca do seu animal de estimação.
11- A sua preocupação foi encontrar o seu companheiro canídeo. Correr é diferente de fugir do local, ainda que não ouvisse mais ninguém a chamar por si, tal era a sua preocupação exponenciada no momento. A testemunha B duvidou que o arguido tenha tomado conhecimento da sua perseguição.
12- Conforme o vídeo fornecido pela testemunha C, foi exposto o diálogo entre o arguido e a testemunha aquando do acidente de viação. Depois de o seu motociclo ter sido embatido, a testemunha C dirigiu-se ao automóvel ligeiro da matrícula ML-X2-X4, que estava deitado de costas na faixa de rodagem em sentido oposto a 10 metros atrás dela. Obviamente, o arguido caído no passeio ficou ferido. A testemunha perguntou ao arguido: “é preciso telefonar?” o arguido respondeu: não, vou responder por todos os danos. O arguido ainda prestou um número de telemóvel. Conforme o vídeo, verificou-se que após o acidente, um animal correu no passeio ao lado do automóvel ligeiro da matrícula ML-X2-X4, em direcção à montanha.
13- A testemunha da parte de defesa D prestou depoimento na audiência de julgamento, dizendo que viu o arguido sair da residência com o cão no dia de ocorrência do facto e que ele foi trabalhar.
14- A acrescer a essa fixação psicológica na busca do cão, estava, de facto, uma taxa de álcool no sangue de 2,15 g/l, só por si suficiente para afastar qualquer intenção dolosa do arguido em furtar-se à responsabilidade civil ou criminal. Essa taxa de alcoolémia retira ou coíbe drasticamente uma pessoa de querer e de entender os seus actos, não sendo criminalmente responsável pela sua conduta objectiva.
15- Qualquer confissão ou declaração prestada debaixo da influência do álcool (uma taxa de álcool no sangue de 2,15 g/l) não pode ser levada em consideração quer logo a seguir ao acidente quer em julgamento, muito menos contra si, por levar a hiatos de memória e confusão mental reportada à data do sinistro.
16- A culpa é um elemento fundamental na escolha concreta da pena e esta estava ausente ou muito amenizada nesse tipo legal de crime.
17- Não está devidamente fundamentada a escolha em concreto da medida da pena, o afastamento do julgador pela opção legal da aplicação das medidas não privativas da liberdade e da aplicação da pena de prisão efectiva em detrimento do instituto da suspensão da pena, sobretudo quando estão em causa curtos períodos de tempo de privação da liberdade.
18- O artigo 89.° da LTR, tem uma moldura penal abstracta de pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias. A Meritíssima Juiz na 1.ª Instância escolheu a pena de 6 meses de prisão. Afigura-se-nos ter havido nessa opção uma falta de fundamento de facto e de Direito: a opção pela pena de prisão, ao invés da pena de multa como critério legal.
19- Entende o arguido, que a pena, a ser condenado pela autoria do crime p. e p. pelo art. 89.° da LTR, deveria quedar-se pela pena de multa, em valor pecuniário diário a fixar na média alta com efeitos dissuasor de futuras resoluções criminosas.
20- De qualquer das formas, no mínimo de 1 mês e máximo de 1 ano, afigura-se-nos que 6 meses de prisão é exagerado, principalmente sendo a culpa excluída ou toldada pelo álcool e ter ressarcido as vítimas.
21- Defende o arguido que o julgador não deve partir da média da pena e depois agravar de acordo com as circunstâncias objectivas que julgue pertinentes, antes devendo começar do mínimo, com as agravantes que objectivamente forem aplicáveis ao caso concreto. A média entre o limite máximo e mínimo da moldura não nos parece um critério legal.
22- Atendendo às circunstâncias previstas nos artigos 40.°, 64.° e 65.° do CP e nas demais circunstâncias do caso relacionadas com o arguido, a pena justa e adequada para a reprovação e prevenção do crime, a não ser de multa, seria de 3 meses de prisão.
23- Do mesmo modo, e seguindo o mesmo raciocínio, a pena concreta a aplicar ao arguido pelo crime de condução em estado de embriaguez, a não ser de multa, seria mais justa e adequada à reprovação e prevenção do crime a pena de prisão de 2 meses de prisão.
24- Em cúmulo jurídico, no caso de ser aplicado aos dois crimes a pena de prisão, é a mais adequada a condenação na pena de 4 meses de prisão, nos termos do artigo 71° do Código Penal de Macau.
25- Entende o arguido que ainda estão reunidos os pressupostos para que a simples censura do facto e a ameaça da pena realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, reclamando, nos termos do disposto do art. 48.° do CP, a suspensão da execução da pena pelo prazo doutamento fixado por V.Excias.
26- O recorrente considera que foram violadas, entre outras, as seguintes disposições legais: arts. 12.°, 13.°, 41.°, 43.°, 44.°, 45.°, 48.°, 64.° e 65.° do Código Penal; arts. 89.° e 90.° da LTR; arts 321.°, 355.°, n.° 1, d), e n.° 2, 356.° e 360.° do CPP.
27- Segundo o entendimento do recorrente, as normas referidas no ponto anterior deviam ter sido interpretadas e aplicadas de acordo com os pontos 1 a 25 destas conclusões”; (cfr., fls. 190 a 203).
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Respondendo, diz o Ministério Público:
“1. Do teor do CD que foi mostrado em audiência (fls. 29 e 175) podemos ver bem a ocorrência do acidente: o ML-X2-X4 conduzido pelo recorrente, por perder o controlo, embateu no ML-X4-X1 (conduzido pela 1ª testemunha B) que estava parado na faixa contrária à espera da luz vermelha do semáforo, este, na sequência do embate, foi projectado para trás e chocou contra a mota de matrícula MM-X4-X0 (conduzida pela 3ª testemunha C) que estava parada atrás dele. Na sequência do choque, a mota MM-X4-X0 e o seu condutor caíram no chão e o ML-X2-X4 conduzido pelo arguido continuou a andar ir contra a colina e capotou.
2. Perante um choque súbito, não podemos esperar que o condutor do ML-X4-X1 possa fazer qualquer acção ou reacção para controlar o carro, nem podemos exigir que o condutor do ML-X4-X1 trave o veículo a tempo, pelo exposto, o embate entre o ML-X4-X1 e o MM-X4-X0 foi provocado pela condução descuidada do recorrente.
3. Por outro lado, o recorrente insiste que abandonou o local por pretender procurar o seu cão e tinha manifestado à 3ª testemunha que ia assumir a responsabilidade pelos danos, pelo que não tinha a intenção de fugir à responsabilidade.
4. No entanto, na audiência o recorrente evitou o importante para discorrer sobre o insignificante, alegando não se lembrar se tinha pedido à 3ª testemunha para não chamar a polícia, nem se lembrar se tinha negado ser o condutor perante a polícia. Mas o recorrente recordou que tinha dito à 3ª testemunha que ia procurar o cão. Porém, o vídeo mostrado em audiência comprovou que logo depois do acidente o recorrente pediu à 3ª testemunha para não chamar a polícia. E as 1ª e 3ª testemunhas declararam que o recorrente não lhes disse que ia procurar cão, ainda, o recorrente deixou do local do acidente sem ter avisado ninguém. O agente policial (5ª testemunha G) que descobriu o recorrente relatou de forma expressa que primeiro o recorrente negou ser o condutor e proprietário do veículo mas ele duvidou do que ele disse e submeteu-o ao teste de alcoolemia no ar expirado. Só depois disso é que o recorrente admitiu ser o condutor.
5. Dos factos apurados resulta que o recorrente tinha uma taxa de álcool no sangue de 2,15 g/l e a sua carta de condução foi cassada no âmbito do processo CR1-14-0084-PSM, portanto, o recorrente conduzia sem ter carta de condução na altura do acidente (cfr. o auto de notícia de fls. 57) e, ainda por cima, cometera duas contravenções de condução em estado de embriaguez (fls. 32).
6. O recorrente tem antecedentes de condução em estado de embriaguez e provocou um acidente de viação relativamente grave quando conduzia veículo sem carta de condução, razões pelas quais pediu à 3ª testemunha que não informasse a polícia do acidente, tendo-lhe dito que ia assumir a responsabilidade de indemnização. Destes factos podemos verificar que o recorrente já tinha naquele momento a ideia e acto de fugir da responsabilidade criminal emergente do acidente. Mas, quando soube que alguém já chamou a polícia, o recorrente deixou tudo nas mãos da sorte, optando por abandonar o local mesmo que estivesse aleijado.
7. Até foi encontrado pelo agente policial no sítio ao pé do local do acidente, o recorrente ainda negou ser o causador do acidente, dizendo ao agente policial que estava a passear pela colina. Destes factos resulta que o recorrente estava, naquela altura, consciente e lúcido, respondendo explicitamente às perguntas feitas pela polícia, o que mostra que ele estava a tentar enganar a polícia.
8. Caso “procurar cão” fosse a razão de abandonar o local, porque não disse à 3ª ou à 1ª testemunha a razão de deixar o local?! Até não mencionou que queria procurar cão no diálogo com o agente policial, apenas negando ser o condutor.
9. Tal como se disse na sentença do Tribunal a quo (fls. 180), a atitude e a conduta do recorrente na ocorrência do acidente mostraram que ele não queria que a polícia soubesse que ele era o condutor e a contestação feita em audiência também não era lógica, dando respostas obscuras ou dizendo “não me lembro” às perguntas importantes. Daí verifica-se que o Tribunal a quo não aceitou a sua justificação, reconhecendo, pelo contrário, que as condutas do recorrente preenchem os elementos subjectivos e objectivos previstos no artº 89º da Lei do Trânsito Rodoviário.
10. Por último, o recorrente entende ser excessiva a pena aplicada pelo Tribunal a quo.
11. De acordo com o registo criminal e contravencional do recorrente: (fl. 32)
(1) Em 24 de Dezembro de 2011, o recorrente foi condenado pela prática de uma contravenção de condução sob influência de álcool, p.p. pelo artº 96º, nº 1 do LTR, na pena de multa de $2000. O recorrente pagou a multa em 5 de Janeiro de 2012.
(2) Em 3 de Setembro de 2012, no âmbito do processo CR1-12-0636-PCT, foi condenado pela prática de uma contravenção de condução sob influência de álcool (reincidência), p.p. pelo artº 96º, nº 1 e nº 4, al. 2), do LTR, na pena de 2 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, e na sanção de inibição de condução pelo período de 1 ano e 6 meses. A sentença foi proferida em 21 de Fevereiro de 2013 e a seguir transitou em julgado. (fls. 63)
(3) No âmbito do processo CR1-14-0084-PSM, foi condenado pela prática de um “crime de desobediência qualificado”, p.p. pelo artº 92º, nº 1, da LTR, conjugado com o artº 312º, nº 2, do CP, na pena de 75 dias de multa, à taxa diária de MOP50,00, e na sanção de cassação de carta de condução. O facto ilícito ocorreu em 21 de Abril de 2014 e a sentença já transitou em julgado. (fl. 66)
12. Por outras palavras, desde o primeiro cometimento da contravenção de condução sob influência de álcool em Dezembro de 2011, o recorrente não corrigiu a sua conduta, antes pelo contrário, cometeu de novo em Setembro de 2012 (não chegou um ano) a contravenção de condução sob influência de álcool, apresentando, desta vez, uma taxa de álcool mais elevada e sendo reincidente. O recorrente já beneficiou da oportunidade dada pelo referido processo que lhe concedeu a suspensão da execução da pena aplicada e aplicou a sanção de inibição de condução.
13. Todavia, aproximadamente um ano após o trânsito em julgado da sentença sobre a contravenção supra dita (em Abril de 2014), o recorrente (ainda estava na situação de inibição de condução) foi apanhado pela polícia a conduzir veículo na via pública. Neste processo de CR1-14-0084-PSM, o juiz deu-lhe mais uma oportunidade, aplicando-lhe a pena de multa e a sanção de cassação de carta de condução.
14. Um ano depois da ocorrência no processo criminal supra mencionado, o recorrente voltou a tomar risco, conduzido veículos depois de ter ingerido bebidas alcoólicas, facto este que mostra que o recorrente tinha consciência forte de infringir a lei, o qual ignorou as sentenças do tribunal e a segurança de outros condutores e peões, conduzindo o veículo a alta velocidade e em estado de embriaguez, o que provocou a ocorrência deste acidente.
15. Tendo em conta o registo de infracção de trânsito e o registo criminal do recorrente, bem como a sua atitude em audiência, entendemos ser certa e adequada a pena única de 7 meses de prisão aplicada ao recorrente por parte do Tribunal a quo após efectuado o cúmulo jurídico das penas aplicadas, não se verificando violação dos artºs 40º e 48º do CP”; (cfr., fls. 206 a 209 e 241 a 254).
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Em sede de vista, juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:
“Por pertinente e inteiramente certeira que se mostra a alegação de resposta da Exm.a colega da primeira instância, temos por bem acompanhá-la integralmente.
Em jeito de conclusão, apenas acrescentaremos que:
1. Não ocorre a omissão de pronúncia alegada pelo recorrente, no que respeita à justificação que apresentou, na contestação e em audiência, para se ausentar do local do sinistro.
O episódio do cão não foi considerado justificação para o arguido, ora recorrente, abandonar o local do sinistro. Que assim é demonstra-o a circunstância de haver sido considerado provado que o arguido fugiu em direcção à Estrada dos Sete Tanques e de não se haverem apurado factos em oposição com os que foram tidos por apurados. De resto, ao explicitar a formação da sua convicção, o Mm.° juiz aludiu expressa e desenvolvidamente ao invocado episódio do cão e concluiu no sentido de que No que diz respeito à fuga à responsabilidade, o arguido negou a acusação, defendendo que deixou o local por querer procurar o seu cão. No entanto, o que ele [arguido] contou (sobre o facto de deixar o local do acidente) em audiência não corresponde manifestamente aos depoimentos das testemunhas …
Diga-se, aliás, a talho de foice, que são diversas as versões que o recorrente apresentou na contestação e em audiência sobre o episódio do cão. Na contestação – a primeira vez em que fala do canídeo – refere ter ido procurar o cão e ter encontrado um vizinho que o informou que o cão já havia regressado a casa; em audiência, sustentou ter ele próprio encontrado o cão e tê-lo entregue a um vizinho.
Em suma, não ocorre a apontada omissão de pronúncia e bem andou o tribunal ao não dar crédito à justificação avançada pelo recorrente para abandonar o local do sinistro.
2. Nenhuma diligência relevante para a descoberta da verdade foi omitida.
Não restam dúvidas, e ninguém questiona, que o arguido provocou um acidente estradal, ao embater com o seu carro num veículo que circulava em sentido contrário. O sinistro ficou cabal e inequivocamente demonstrado. A maior ou menor amplitude das suas consequências, nomeadamente a eventual extensão dos danos a um terceiro veículo que seguia atrás do veículo embatido – cujo nexo de causalidade o recorrente questiona – não tem interesse decisivo para a caracterização dos ilícitos imputados ao arguido e pelos quais foi condenado.
De resto, ainda que tivesse havido preterição de diligência que pudesse reputar-se essencial para a descoberta da verdade, estaria em causa a nulidade prevista na alínea d) do n.° 2 do artigo 107.° do Código do Processo Penal, a qual, dependendo de arguição, tinha que ser suscitada, no limite, até ao encerramento da audiência, conforme resulta do n.° 3 do mesmo artigo, o que não ocorreu.
3. Mostram-se inquestionavelmente preenchidos todos os requisitos constitutivos do ilícito típico de fuga à responsabilidade.
A circunstância de o veículo ter ficado no local é perfeitamente irrelevante, tal como é indiferente o facto de o arguido ter ficado ferido. O que releva é que o arguido se ausentou injustificadamente do local, ou, dito de outro modo, e tal como resultou provado, fugiu em direcção à Estrada dos Sete Tanques.
Também a circunstância de se encontrar alcoolizado não pode servir de paliativo para afastar a intenção dolosa em furtar-se à responsabilidade civil e/ou criminal. Como ficou esclarecido, o arguido pediu à testemunha C para não chamar a polícia, e, após ter fugido e ter sido encontrado pela polícia, negou que tivesse intervindo no acidente e que fosse o condutor de um dos carros sinistrados, tendo chegado, até, a apontar uma outra viatura, estacionada nas proximidades, como sendo o seu veículo. Só admitiu os factos quando foi submetido a teste de alcoolemia. O que tudo revela um estado suficientemente consciente e escorreito para avaliar a ilicitude do abandono do local do sinistro e se determinar de acordo com essa avaliação.
4. As penas encontradas para os crimes imputados ao arguido, aliás correcta e justificadamente escolhidas e determinadas, não se mostram excessivas. Incluindo a pena de 6 meses, relativa à fuga à responsabilidade, que fica aquém do meio da moldura penal. Note-se que, tal como a sentença observa, o arguido vira anteriormente cassada a sua carta de condução. Nestas circunstâncias, cada vez que ousa conduzir veículos automóveis, fá-lo sem que possua a necessária habilitação legal, o que significa que comete o inerente crime, merecendo a sua conduta especial censurabilidade e sendo provável que procure furtar-se à responsabilidade criminal. Por isso, e atendendo aos seus antecedentes, não se pode considerar a pena excessiva. Aliás, os parâmetros em que se move a determinação da pena, adentro da chamada teoria da margem de liberdade, não são matemáticos, havendo que aceitar a solução encontrada pelo tribunal do julgamento, a menos que o resultado se apresente ostensivamente intolerável, por desajustado aos fins da pena e à culpa que a delimita, o que não se crê ser o caso.
Também não era caso de suspensão de execução da pena, como o tribunal proficientemente justificou.
E, finalmente, também não se impunha a substituição da pena de prisão, ou a justificação da exigência do seu cumprimento, nos termos do artigo 44.°, n.° 1, do Código Penal, porquanto, em situações de concurso, como sucede, só depois de achada a pena unitária haverá que discorrer, sendo caso disso, sobre a aplicação daquele inciso, que, no caso vertente, se mostra inaplicável porquanto a pena excede os 6 meses.
Ante o exposto, o nosso parecer vai no sentido de ser negado provimento ao recurso”; (cfr., fls. 256 a 258).
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Em sede de exame preliminar constatou-se da manifesta improcedência do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Deu o T.J.B. como provada a seguinte matéria de facto:
“A 5 de Junho de 2015, pelas 13h00, o arguido A ingeriu em casa bebidas alcoólicas.
No mesmo dia, pelas 18h23, o arguido conduzia o veículo ligeiro de matrícula ML-X2-X4, circulando na Estrada Lou Lim Ieok, no sentido Rotunda Tenente Pedro José da Silva Loureiro - Estrada Almirante Marques Esparteiro.
Quando o veículo ligeiro de ML-X2-X4 conduzido pelo arguido chegou ao Edifício Windsor Arch na Estrada Lou Lim Ieok, por não manter uma distância adequada com o carro na faixa contrária, embateu no veículo ligeiro de matrícula de MM-X4-X0 que estava parado na faixa contrária à espera do sinal de semáforo, este, na sequência do embate, foi projectado para trás e chocou a seguir contra o motociclo de matrícula MM-X4-X0 que estava atrás dele. E o veículo ligeiro de matrícula de ML-X2-X4 conduzido pelo arguido continuou a andar ir contra a colina e capotou.
A colisão provocou danos ao veículo ligeiro de matrícula de ML-X4-X1 e motociclo de matrícula de MM-X4-X0 e o veículo ligeiro de matrícula de ML-X2-X4 conduzido pelo arguido também sofreu muitos danos graves.
A colisão também causou ferimentos no condutor, B, e na passageira, E, do veículo ligeiro de matrícula de ML-X4-X1 e no condutor do motociclo de matrícula de MM-X4-X0, C.
Na sequência do acidente, o arguido caiu no chão e ficou ferido. O condutor do motociclo de matrícula de MM-X4-X0, C aproximou-se do arguido e este pediu a C que não chamasse a polícia para tomar conta da ocorrência.
Em seguida, aproveitando o momento em que C estava a falar com o outro ofendido e o peão que presenciou o acidente e informou a polícia do acidente e o momento em que os três ofendidos estavam à espera da chegada de agente policial, o arguido foi se embora, fugindo em direcção à Estrada de Sete Tanques.
B notou que o arguido estava a fugir do local, foi logo atrás dele para apanhá-lo, mas sem sucesso.
Pouco tempo depois, o agente policial que tomou conta da ocorrência apanhou o arguido ao pé do poste de iluminação público 744B03 na Rua Cidade de Lisboa. O agente policial perguntou-lhe se era o interveniente do acidente de viação ocorrido na Estrada Lou Lim Ieok, mas o arguido negou.
Na altura, o arguido exalava um forte cheiro a álcool, o que levou o agente policial submetê-lo ao teste de alcoolemia no ar expirado, tendo acusado uma taxa de alcoolemia de 2,27 g/l.
O arguido requereu a realização de contraprova do teste de alcoolemia, por isso, foi levado ao Centro Hospitalar de São Januário, onde lhe foi realizado o teste de alcoolemia através da colheita de sangue, cujo resultado revelou uma taxa de 2,15 g/l no sangue.
Da investigação efectuada posteriormente pela polícia, resulta que, na altura do acidente, o arguido não possuiu qualquer habilitação para conduzir, porquanto, por sentença proferida pelo tribunal em 21 de Abril de 2014 foi-lhe aplicada a sanção de cassação de carta de condução. Tal sentença transitou em julgado em 14 de Maio de 2014.
Depois de ter ingerido bebidas alcoólicas, o arguido tinha uma taxa de álcool no sangue de 1,2 g/l, mas ainda conduziu a viatura na via pública.
O arguido agiu livre, voluntaria e conscientemente, sabendo bem que tinha provocado um acidente mas ausentou-se do local do acidente sem informar a polícia, com intenção de fugir à eventual responsabilidade criminal.
O arguido sabia bem que a sua conduta era ilegal e punida por lei.
O registo criminal revela que o arguido tem os seguintes antecedentes criminais:
Foi condenado em 21 de Abril de 2014, no âmbito do processo CR1-14-0084-PSM, pela prática de um “crime de desobediência qualificado”, na pena de 75 dias de multa, à taxa diária de MOP50,00, perfazendo a multa global de MOP3.750,00 que seria convertida na pena de prisão de 50 dias no caso de não ser paga a multa ou substituída por trabalho. Além disso, foi-lhe aplicada a sanção de cassação de carta de condução. O arguido pagou a multa imposta em 26 de Maio de 2014.
Mais se apurou que o arguido praticou duas contravenções de condução em estado de embriaguez em 24 de Dezembro de 2011 e 3 de Setembro de 2012, respectivamente (cfr. fls. 32 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
Provaram-se ainda as condições pessoais e económicas do arguido:
O arguido tem o 6º ano de escolaridade, é aposentado, não tem rendimentos e não tem alguém a seu cargo”; (cfr., fls. 178 a 179 e 224 a 228).
Seguidamente, em sede de “factos não provados”, consignou o Tribunal que “Não se provaram os factos em oposição com os factos apurados”.
Por sua vez, e expondo os motivos da sua “convicção”, consignou o Tribunal a quo o que segue:
“O arguido prestou voluntariamente declarações em audiência, confessando ter conduzido o veículo depois de ter ingerido bebidas alcoólicas. Alegou querer ir a restaurante comer e, por ser mais conveniente, conduziu o carro mesmo que estivesse na situação de cassação de carta de condução, mas negou ter a intenção de fugir após a ocorrência do acidente. O mesmo explicou que ficou ferido no acidente e sentiu tonturas e o cãozinho que estava no carro desapareceu, portanto, por ser preocupado com o cão e querer procurá-lo, disse a um dos condutores que iria voltar para resolver o acidente depois de encontrar o cãozinho, não notando que alguém estava a correr atrás dele. Acrescentou que encontrou o cão ao pé da casa dele e entregou-o a um vizinho para ele tratar do cão e ele sentou-se a seguir no lancil a descansar. Não se recorda se falou com o agente policial sobre o acidente e, por fim, admitiu ser o condutor.
A testemunha B, E e C prestaram depoimentos em audiência. Além disso, foi autorizado o pedido de ambas as partes de se mostrar o vídeo apresentado por C enquanto B e C estavam a depor em audiência.
Alegou a testemunha B que saiu do carro quando o condutor da mota se aproximou dele para saber se estava bem. No local estava um peão que lhes ajudou a chamar a polícia. Naquele momento, alguém descobriu que o arguido se foi embora na direcção contrária do local do acidente, pelo que foi correr atrás dele. A mesma testemunha acrescentou que não tinha certeza se o arguido falou com alguém antes de se ir embora e que ele não conseguiu apanhá-lo por ter lesões no pé, referindo que tinha certeza se o arguido sabia que ele estava a correr atrás dele. A testemunha recebeu indemnização pecuniária alguns dias depois do acidente.
A testemunha E alegou ficar no carro após o acidente por se sentir tonta, até à chegada do agente policial, pelo que não sabia a situação concreta sobre a fuga do arguido.
A testemunha C confirmou ter apresentado a gravação de imagens feita pela câmera instalada no capacete dela. Acrescentou que um pouco depois de um peão de sexo feminino ter informado a polícia, viu que o arguido se levantou ao lado do veículo dele e abandonou o local do acidente a velocidade de andar a pé. Visto isto, o condutor do veículo ligeiro B correu logo atrás dele para apanhá-lo, mas sem sucesso. A testemunha alegou não ter ouvido no local que alguém disse que ia procurar cão, entendendo a mesma testemunha que embora o arguido dissesse que ia pagar indemnizações quando estava deitado no chão com ferimentos, a testemunha sentiu que o arguido não parecia quer tomar a responsabilidade. Porquanto, passados alguns dias depois de prestar declarações no Ministério Público, a testemunha, com os dados fornecidos pelo Ministério Público, telefonou ao arguido para exigir a indemnização. Só depois disso é que o arguido lhe pagou indemnizações através do seu advogado. Além disso, o arguido abandonou o local do acidente sem manifestar nada.
A gravação de imagens apresentada pela testemunha C mostra claramente a conversa inteira entre o arguido e a mesma testemunha na ocorrência do acidente. Na sequência do embate, a testemunha C virou-se para trás e dirigiu-se ao veículo de matricula de ML-X2-X4 que ficou capotado a distância de 10 metros na faixa contrária. O arguido, aparentemente ferido, estava deitado na berma da estrada. “Precisa de telefonar?”, a testemunha perguntou ao arguido e este respondeu: “Não é preciso telefonar, vou me responsabilizar pelos danos.” O arguido deu um número de telemóvel. A gravação também mostra que um animal pequeno correu passando pelo veículo de matrícula de ML-X2-X4 em direcção à colina após o acidente.
Os guardas da PSP F e G, que tomaram conta do acidente, depuseram em audiência. Declarou o guarda policial G que viu que o arguido estava sentado descalço no lancil a uma distância a pé de 5 minutos do local do acidente. Como a aparência do arguido e as roupas que trazia corresponderam à descrição feita pela pessoa que chamou a polícia, aproximou-se dele para esclarecer. Na altura, o arguido negou ser o condutor que causou o acidente, referindo que estava a passear pela colina. Quando foi perguntado porque estava descalço, o arguido respondeu “Tenho que me calçar para passear na colina?” “Não posso cair?” A testemunha alegou que o arguido insistiu em negar ser o condutor causador do acidente e apontou a um veículo que estava ao lado e disse que aquele era o seu carro. O mesmo não disse mais nada quando a testemunha lhe contou que alguém deixou um mini cooper ali. O arguido só admitiu ser o condutor causador do acidente depois de ser submetido ao teste de pesquisa de álcool no ar expirado e requerido a realização de contraprova do teste de alcoolemia. A testemunha continuou a depor que, durante a investigação, o arguido nunca disse que deixou do local por pretender procurar o seu cão e a testemunha também não viu nenhum cão no local, só apareceu um homem que alegou ser o filho do arguido.
A testemunha de defesa, D, declarou em audiência que o cão da família é sempre tratado pelo arguido. No dia do acidente, ele apercebeu-se que o arguido saiu de casa com o cão e, depois disso, ele foi trabalhar. O acidente foi contado a ele pelo seu pai. Agora o seu pai já deixou de bebidas alcoólicas, já não conduz, ficando, por causa deste caso, com um ar macilento.
O Tribunal baseou a sua convicção na análise crítica e conjugada das declarações do arguido e depoimentos testemunhais prestadas em audiência, conjugada com as provas produzidas em audiência, nomeadamente a gravação de imagens, o teor da sentença e as demais provas, reconhecendo o facto de que o arguido sabia bem que a sua carta tinha sido cassada, mas ainda conduziu a viatura mesmo que não tivesse a habilitação para conduzir e tivesse ingerido bebidas alcoólicas.
No que diz respeito à fuga à responsabilidade, o arguido negou a acusação, defendendo que deixou do local por querer procurar o seu cão. No entanto, o que ele contou (sobre o facto de deixar do local do acidente) em audiência não corresponde manifestamente aos depoimentos das testemunhas B e C. As testemunhas B e C e testemunha policial G relataram o acidente de forma detalhada e objectiva, sendo os seus depoimentos críveis. Além disso, segundo a agravação de imagens, o arguido tinha dado o seu número de telefone à testemunha C, que se aproximou dele para verificar se ele estava bem, e prometeu assumir a responsabilidade pelos danos causados, pedindo, no entanto, à testemunha para não telefonar para pedir apoio e afastando-se do local. Este facto, conjugado com a conduta e reacção do arguido (negou ser interveniente no acidente enquanto foi investigado pelo agente policial), segundo as regras lógica e da experiência comum, constata-se que o arguido não tinha vontade de revelar à polícia que ele era o condutor causador do acidente, não querendo que a testemunha C informasse a polícia da ocorrência. Tudo isto, conjugado com o facto de o arguido conduzir depois de ter ingerido bebidas alcoólicas e a cassação da sua carta de condução por ter praticado o crime de desobediência qualificado, segundo as regras da experiência e o senso comum, conclui-se que há provas suficientes nestes autos de que, pelo menos, o arguido abandonou o local por pretender fugir à responsabilidade criminal, pelo que foi dada como provada a factualidade”; (cfr., fls. 179 a 180 e 228 a 233).
Do direito
3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou como autor material da prática em concurso real de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 4 meses e 15 dias de prisão, e 1 outro de “fuga à responsabilidade”, p. e p. pelo art. 89° da mesma Lei, na pena de 6 meses de prisão, e em cúmulo jurídico, na pena única de 7 meses de prisão.
E como atrás já se deixou consignado, evidente nos parece que carece de razão, sendo de se acompanhar e dar como reproduzidas as considerações pelo Ministério Público tecidas em sede da Resposta ao recurso assim como no Parecer em sede de vista apresentado, onde, de forma clara e cabal, se rebatem todas as questões pelo arguido colocadas em sede do seu recurso.
Seja como for, não se deixa de consignar o que segue.
–– Quanto à “omissão de pronúncia quanto a factos constantes da contestação”.
Pois bem, reconhece-se que “formula (tabelar)” pelo Tribunal a quo utilizada na sua decisão em relação aos “factos não provados” não é a mais feliz, podendo aparentar a alegada omissão.
Todavia, de uma mera leitura à fundamentação exposta no que toca à “convicção” e “decisão” (e que atrás se deixou transcrita), dúvidas não há que o Tribunal se debruçou sobre a versão pelo arguido apresentada na sua “contestação” (e em audiência), afastando-a, (e assim, dando-a como “não provada”), não deixando de explicitar, adequadamente os motivos para tal entendimento.
Parente isto, adequado – e razoável – não é considerar-se que padece a decisão recorrida do imputado vício de “omissão de pronúncia”.
–– Diz o arguido que “Não há nexo de causalidade adequada entre a colisão do carro do arguido com o automóvel ligeiro com matrícula n.° ML-X4-X1, parado por causa da luz vermelha na faixa de rodagem em sentido oposto, e a colisão que este teve a seguir com o no motociclo atrás com matrícula n.° MM-X4-X0”.
Ora, face ao que “provado” está – e notando-se que não padece a decisão da matéria de facto de qualquer dos vícios do art. 400°, n.° 2, al. a), b) e c) do C.P.P.M. – evidente é que não colhe o assim alegado, bastante se nos apresentando (também aqui) uma leitura aos § 3°, 4°, e 5° para assim se concluir.
Com efeito, se – nomeadamente – provado está que o veículo conduzido pelo arguido embateu no veículo de matrícula MM-X4-X0, e que “este, na sequência do embate, foi projectado para trás e chocou a seguir contra o motociclo de matrícula MM-X4-X0 que estava atrás dele”, (cfr., § 3°, da matéria de facto), à vista está a solução para a questão, ociosas sendo outras considerações.
–– Quanto à “qualificação jurídico-penal da conduta” e “pena”.
Várias são as considerações pelo arguido tecidas em relação a estas matérias e que como já se referiu, foram de forma clara e adequada abordadas na Resposta e Parecer do Ministério Público, pouco havendo a acrescentar.
No que toca ao crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, basta ver que submetido a exame de pesquisa de álcool revelou estar com uma taxa de alcoolemia de 2,27 g/l, e que posteriormente em novo teste através de colheita de sangue revelou uma taxa de 2,15 g/l.
Em relação ao crime de “fuga à responsabilidade”, p. e p. pelo art. 89° da mesma Lei, tenha-se pois em conta que provado está que, depois do embate, o arguido “pediu a C que não chamasse a polícia para tomar conta da ocorrência”, que “Em seguida, aproveitando o momento em que C estava a falar com o outro ofendido e o peão que presenciou o acidente e informou a polícia do acidente e o momento em que os três ofendidos estavam à espera da chegada de agente policial, o arguido foi se embora, fugindo em direcção à Estrada de Sete Tanques”, que “B notou que o arguido estava a fugir do local, foi logo atrás dele para apanhá-lo, mas sem sucesso”, e que “o agente policial que tomou conta da ocorrência apanhou o arguido ao pé do poste de iluminação público 744B03 na Rua Cidade de Lisboa” e “perguntou-lhe se era o interveniente do acidente de viação ocorrido na Estrada Lou Lim Ieok, mas o arguido negou”.
Ora, da transcrita matéria resulta – com clareza – que o arguido “fugiu do local”, não conseguindo, porém, ter sucesso nesta sua iniciativa, e, assim, provado estando igualmente que “O arguido agiu livre, voluntaria e conscientemente, sabendo bem que tinha provocado um acidente mas ausentou-se do local do acidente sem informar a polícia, com intenção de fugir à eventual responsabilidade criminal”, visto está que cometeu o crime em questão.
Quanto às penas, (parcelares e única), as mesmas apresentam-se justas, atento os critérios dos art°s 40°, 65° e 71° do C.P.M., tendo-se, em nossa opinião, dado adequado relevo às necessidades de prevenção criminal geral – atentos os graves danos deste tipo de criminalidade rodoviária – e especial, isto, em virtude dos antecedentes do arguido, com duas anteriores condenações por “condução em estado de embriaguez”, e estando já condenado por um outro de “desobediência qualificada”, e vindo a cometer os crimes dos autos, conduzindo, embriagado, e sem habilitação legal para o fazer em virtude da cassação da sua carta de condução.
Não se olvida que em causa está uma pena de prisão de 7 meses de prisão e que temos dito que se devem evitar penas de prisão de curta duração.
Porém, não é de suspender a execução da pena de prisão ainda que de curta duração, se o arguido, pelo seu passado criminal recente, revela total insensibilidade e indiferença perante o valor protegido pela incriminação em causa, continuando numa atitude de desresponsabilização e de incapacidade para tomar outra conduta; (cfr., v.g., o Ac. deste T.S.I. de 15.10.2015, Proc. n.° 847/2015 e de 12.11.2015, Proc. n.° 714/2015, e Decisão Sumária de 01.06.2016, Proc. n.° 31/2016, de 14.07.2016, Proc. n.° 391/2016 e de 18.10.2016, Proc. n.° 667/2016).
Em face do que se deixou exposto, há pois que confirmar a decisão recorrida.
Decisão
4. Em face do exposto, decide-se rejeitar o presente recurso.
Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 4 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Registe e notifique.
Nada vido de novo, e após trânsito, devolvam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 18 de Janeiro de 2017
José Maria Dias Azedo
Proc. 842/2016 Pág. 36
Proc. 842/2016 Pág. 35