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Processo nº 840/2016
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por sentença proferida pela Mma Juiz do T.J.B. nos Autos de Processo Sumário n.° CR2-16-0163-PSM, decidiu-se condenar A (A), arguido com os sinais dos autos, como autor da prática de 1 crime de “desobediência qualificada”, p. e p. pelo art. 92°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007 e art. 312°, n.° 2 do C.P.M., na pena de 4 meses de prisão, determinando-se, ainda, a cassação da sua licença de condução; (cfr., fls. 40 a 44-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado, o arguido recorreu para, em síntese, dizer (tão só) que excessiva é a pena e que a decisão recorrida viola o art. 48° do C.P.M., pedindo a “suspensão da execução da pena”; (cfr., fls. 57 a 61).

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Respondendo, diz o Ministério Público que o recurso merece provimento; (cfr., fls. 63 a 64-v).

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Admitido o recurso e remetidos os autos a este T.S.I., deu-se observância ao estatuído no art. 406° do C.P.P.M..

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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação de fls.57 a 61 de autos, o recorrente pediu a execução da suspensão da pena de quatro meses de prisão aplicada na douta sentença em escrutínio, assacando-lhe a violação do disposto no art.48.° do CPM.
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O n.°1 do art.48° do CPM revela que a suspensão da pena de prisão depende do preenchimento cumulativo de 2 pressupostos: o formal traduz em a pena aplicada não ser superior a 3 anos; e o material consubstancia-se na razoável conclusão (do julgador) de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam, adequada e suficientemente, as finalidades da punição. E à luz deste comando legal, tal conclusão tem de angular-se em apreciação e valorização prévias, de índole prudente e prognóstico, de personalidade do agente, das condições da sua vida, da conduta anterior e posterior ao crime e das circunstâncias deste.
Interessa ter na mente que mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao infractor, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão, não será decretada a suspensão se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. (Acórdãos do TSI nos Processos n.°242/2002, n.°190/2004 e n.°192/2004)
Nesta linha de perspectiva, e sem prejuízo do elevado respeito pela opinião diferente, inclinamos a entender que a douta sentença posta em crise não merece censura, e o recurso não ganhará procedência.
Em primeiro lugar, o recorrente não alegou razão ponderosa para justificar a sua condução em 26/09/2016, que teve lugar apenas quatro meses depois da condenação, e o encargo familiar por si invocado não é virtuoso para sustentar o pedido de suspensão da execução.
Em segundo, de acordo com a douta jurisprudência que assevera que no caso de detenção em flagrante delito, pouco valor tem a confissão integral e sem reserva dos factos pelo arguido para a descoberta da verdade (vide. arestos do TSI nos Procs. n.°201/2009 e n.°436/2016), parece-nos que a confissão do recorrente, só por si, não justifica o pedido da suspensão da execução.
Afinal, considerando o antecedente criminal e o alto grau do dolo do recorrente, afigura-se-nos que o pedido da suspensão da execução não é consentida pela prevenção geral que se destina a proteger a segurança pública, bem como a vida e integridade física do público.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso”; (cfr., fls. 72 a 72-v).

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Passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos como tal elencados na sentença recorrida a fls. 41-v a 42, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos, (não havendo factos por provar).

Do direito

3. Insurge-se o arguido dos autos contra a sua condenação como autor material de 1 crime de “desobediência qualificada”, p. e p. pelo art. 92°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007 e art. 312°, n.° 2 do C.P.M., na pena de 4 meses de prisão.

Pede (apenas) a “redução” e “suspensão da execução da pena” decretada.

Vejamos.

–– O crime pelo arguido cometido é punido com pena de prisão até 2 anos ou pena de multa até 240 dias; (cfr., art. 92°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007 e art. 312°, n.°2 do C.P.M.).

Repetidamente tem este T.S.I considerado que “a atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 21.07.2016, Proc. n.° 483/2016, de 22.09.2016, Proc. n.° 561/2016 e de 13.12.2016, Proc. n.° 258/2016).

E, de forma evidente, não nos parece que a situação dos autos constitua uma situação “extraordinária” ou “excepcional”.

No caso, a alegada “confissão dos factos” tem pouco valor atenuativo, dado que foi o arguido detido em flagrante delito.

Desta forma, e quanto à “natureza” e “medida da pena”, não se vislumbram motivos para censurar a decisão recorrida.

Na verdade, o arguido não é primário, tendo já sido condenado em pena de prisão suspensa na sua execução, cometendo o crime dos autos em pleno período de suspensão, o que afasta, de todo, qualquer consideração no sentido de aplicação da uma pena de multa por inverificação dos pressupostos do art. 64° do C.P.M., assim como a de se ter a pena de 4 meses de prisão, (a 3 meses do seu limite mínimo, e a 20 do seu máximo), como excessiva.

Dest’arte, continuemos.

–– Nos termos do art. 48° do C.P.M.:

“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.

Sobre a matéria já teve este T.S.I. oportunidade de dizer que:

“O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 21.07.2016, Proc. n.° 483/2016, de 29.09.2016, Proc. n.° 550/2016 e de 13.12.2016, Proc. n.° 258/2016).

E, como temos também entendido, o instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 14.01.2016, Proc. n.° 863/2015 e de 16.06.2016, Proc. n.° 254/2016).

No caso dos autos, e como se referiu, o arguido ora recorrente, não é primário.

Em 26.04.2016, foi condenado pela prática de um crime de “condução sob influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas”, na pena de 5 meses de prisão suspensa na sua execução por 2 anos, e na inibição de condução por 1 ano e 6 meses, tendo o recorrente entrega a sua carta de condução à P.S.P. em 27.05.2016, sendo que o crime dos autos ocorreu em 26.09.2016, (não tendo o arguido esboçado qualquer justificação para a sua prática), a 5 meses da anterior condenação, (e, assim, no período de suspensão da execução da pena de 5 meses de prisão em que tinha sido condenado), e a 4 da aludida entrega da carta de condução.

Revela, assim, uma total ausência de vontade de aproveitar as oportunidades que lhe foram dadas e de levar uma vida em conformidade com as normas de convivência social, fazendo descaso absoluto da solene advertência que lhe foi feita com a anterior condenação, tornando evidentes as fortes razões de prevenção criminal especial, (e geral, em virtude do tipo e natureza dos crimes cometidos), e que, no caso, comprometem, de todo, a pretendida suspensão da execução da pena, (de 4 meses de prisão em que foi condenado).

Temos vindo a considerar que se devem “evitar penas de prisão de curta duração”.
Porém da mesma forma temos entendido que, não é de suspender a execução da pena de prisão ainda que de curta duração, se o arguido, pelo seu passado criminal recente, revela total insensibilidade e indiferença perante o valor protegido pela incriminação em causa, continuando numa atitude de desresponsabilização e de incapacidade para tomar outra conduta; (cfr., v.g., o Ac. deste T.S.I. de 15.10.2015, Proc. n.° 847/2015 e de 12.11.2015, Proc. n.° 714/2015, e Decisão Sumária de 01.06.2016, Proc. n.° 31/2016, de 14.07.2016, Proc. n.° 391/2016 e de 18.10.2016, Proc. n.° 667/2016).

Dest’arte, há pois que decidir como segue.

Decisão

4. Em face do exposto, em conferência, nega-se provimento ao recurso.

Pagará o arguido 6 UCs de taxa de justiça.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique.

Macau, aos 26 de Janeiro de 2017
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 840/2016 Pág. 12

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