Processo nº 61/2017
Data do Acórdão: 26JAN2017
Assuntos:
Suspensão da eficácia
Ónus de alegar e provar
Prejuízos de difícil reparação
SUMÁRIO
1. O instituto da suspensão de eficácia visa evitar, na pendência do recurso contencioso de anulação ou da declaração de nulidade, a constituição ou consolidação de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos, irreversíveis ou pelo menos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no recurso contencioso.
2. Para o efeito, o requerente, enquanto interessado em ver suspensa a execução imediata do acto, tem o ónus de alegar e provar a verificação dos prejuízos e a existência do nexo de causalidade adequada entre a execução imediata do acto e a verificação dos prejuízos.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 61/2017
Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância
I – Relatório
A, devidamente identificado nos autos, veio, ao abrigo do disposto nos artºs 120º e s.s. do CPAC, requerer com fundamentos seguintes, a suspensão de eficácia do despacho, datado de 12DEZ2016, do Senhor Secretário para a Segurança, que em sede de recurso hierárquico, confirmou a revogação da autorização de permanência, que lhe foi concedida na qualidade de trabalhador não residente:
A, casado, de nacionalidade chinesa, portador do título de identificação de trabalhador não-residente n.º XXXXXXXX, titular do Bilhete de Identidade de Residente da República Popular da China n.º 440......7, emitido em 26 de Março de 2007, vem, nos termos dos art.º 120.º e ss. do Código de Processo Administrativo Contencioso, requerer a suspensão de eficácia do acto administrativo praticado pelo Excelentíssimo Senhor Secretário para a Segurança, com sede na Calçada dos Quartéis, em Macau, datado de 12 de Dezembro de 2016, que lhe revogou a autorização de permanência na qualidade de trabalhador não-residente, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:
I - DOS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
1.º
O requerente foi notificado no passado dia 6 de Janeiro de 2017 do acto do Excelentíssimo Senhor Secretário para a Segurança que, decidindo recurso hierárquico necessário previamente apresentado, confirmou a revogação da sua autorização de permanência na qualidade de trabalhador não-residente, ao abrigo do disposto no art. 11.º, n.º 1.3) da Lei n.º 6/2004 e do art. 15.º, n.º 1 do Regulamento Administrativo n.º 8/2010 (doc. n.º 1).
2.º
A legitimidade para a apresentação do pedido de suspensão de eficácia do acto administrativo afere-se pela legitimidade para interpor recurso contencioso do mesmo, nos termos do n.º 1 do art.º 121.º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
3.º
Não podem restar dúvidas de que o requerente é dotado de legitimidade, nos termos do disposto no art.º 33.º do referido Código, o qual dispõe que “[t]êm legitimidade para interpor recurso recurso contencioso as pessoas (...) que se considerem titulares de direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos que tivessem sido lesados pelo acto recorrido ou que aleguem interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso.”
4.º
O Tribunal de Segunda Instância é o competente para conhecer o pedido de suspensão de eficácia, nos termos do art.º 36.º, n.º 10 (em conjugação com o n.º 8)-(2) do mesmo dispositivo legal), da Lei de Bases da Organização Judiciária, aprovada pela Lei n.º 9/1999, de 20 de Dezembro de 1999.
5.º
O pedido é apresentado, nos termos do art.º 123.º, n.º 1, al. a) do Código de Processo Administrativo Contencioso, previamente à interposição do recurso contencioso.
II - DOS REQUISITOS DA SUSPENSÃO DE EFICÁCIA DO ACTO ADMINISTRATIVO
6.º
A eficácia do acto administrativo praticado pelo Secretário para a Segurança pode ser suspensa, tratando-se de um acto de conteúdo positivo, nos termos do art.º 120.º, al. a) do Código de Processo Administrativo Contencioso, pois altera - manifestamente - a situação jurídica do requerente, restringindo a sua liberdade de permanecer em Macau.
7.º
Segundo a doutrina e jurisprudência assente nesse Venerando Tribunal, o pedido de suspensão de eficácia só será deferido quando se verificarem, cumulativamente, os requisitos previstos no art.º 121.º, n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso, cuja existência o requerente se esforçará por demonstrar.
II.A - DO PREJUÍZO DE DIFÍCIL REPARAÇÃO
8.º
O requerente reside em Macau ao abrigo de autorização de permanência na qualidade de trabalhador não-residente, concedida em 2011.
9.º
O requerente já residira previamente em Macau ao abrigo de outra autorização de permanência na qualidade de trabalhador não-residente, entre os anos de 2002 e 2007.
10.º
O requerente tem efectivamente na Região Administrativa Especial de Macau o seu centro estável de residência e aqui planeia permanecer, ao lado da sua família, por muitos mais anos.
11.º
O requerente trabalha no restaurante B, estabelecimento que é detido pelos seus pais C e D.
12.º
O requerente habita na RAEM conjuntamente com os seus pais, cujo diaa-dia acompanha e a quem sustenta, e ainda com o seu filho, menor, que enquanto estudante também dele depende para viver.
13.º
Tanto os seus pais como o seu filho são residentes permanentes na RAEM e sempre aqui habitaram.
14.º
O requerente dedica em exclusivo as horas em que não está em casa com a família ao seu trabalho no restaurante, assegurando que este funciona na plenitude.
15.º
O restaurante B providencia não só o seu próprio sustento, como também o de toda a sua família.
16.º
O requerente tem de prestar uma especial assistência aos seus pais, pois o seu pai sofre de diabetes e a sua mãe sofre de pressão arterial elevada.
17.º
Os pais são idosos e o tempo que partilha com eles é de extrema importância para o requerente.
18.º
Também aqui na RAEM consegue acompanhar o crescimento e desenvolvimento do seu filho, menor, com quem coabita.
19.º
A revogação da autorização de permanência causa um prejuízo de difícil reparação ao requerente, pois terá de abandonar a sua família - pais e filho - com quem tem coabitado durante os últimos anos.
20.º
A família do requerente depende da sua actividade, não só para assegurar o funcionamento do restaurante, como para lhes prestar a devida assistência, sendo o filho menor e os pais já idosos.
21.º
A revogação da sua autorização de permanência causará ainda prejuízo de difícil reparação à família, pois o requerente com a sua dedicação assegura o funcionamento pleno do restaurante B.
22.º
O restaurante, como acima se disse, providencia a fonte de sustento de toda a sua família.
23.º
O facto de ter de abandonar o território implicará para o requerente um corte abrupto com as suas raízes familiares e ainda com a terra que ele tem adoptado como sua.
24.º
Efectivamente, tendo aqui vivido durante a maior parte do séc. XXI, tem criado uma ligação afectiva com as gentes de Macau e a cultura própria e específica do território.
25.º
Principalmente, o facto de ter de abandonar a RAEM vai causar um impacto estrondoso no requerente, pois vai cortar a sua proximidade com os familiares mais próximos.
II.B - DA AUSÊNCIA DE GRAVE LESÃO DO INTERESSE PÚBLICO
26.º
Afigura-se que a suspensão de eficácia do acto praticado pelo Excelentíssimo Senhor Secretário para a Segurança não causa grave lesão ao interesse público prosseguido pelo mesmo.
27.º
A revogação de autorização de permanência consubstanciou-se no facto de o requerente ter sido acusado pelo Ministério Público da prática de um crime de falsificação de documento de especial valor.
28.º
Não existe ainda condenação transitada em julgado contra o requerente, sendo certo que o art. 11.º, n.º 1.3) da Lei n.º 6/2004 - o fundamento legal invocado pela entidade requerida - refere especificamente a prática de crimes (comprovada) e não apenas a suspeita da sua prática (como, por exemplo, refere ao art. 4.º, n.º 2.2 da Lei n.º 4/2003).
29.º
Pelo que parece que o interesse público subjacente ao preceito legal não será traído por se aguardar por uma decisão final tanto no recurso contencioso de anulação que o requerente tempestivamente interporá, como no processo-crime que deu origem ao acto cuja suspensão de eficácia se requer.
30.º
Desta forma se assegura também, condignamente, ao requerente o respeito pelo princípio de presunção de inocência, visto que não existe ainda condenação definitiva transitada em julgado, e o acto cuja suspensão de eficácia se requer baseou-se em meros indícios da prática de crime.
II.C - DA INEXISTÊNCIA DE FORTES INDÍCIOS DA ILEGALIDADE DO RECURSO
3l.º
Tal requisito está directamente ligado com eventual ilegalidade adjectiva do recurso contencioso e in casu inexiste obstáculo a que o requerente venha a interpor, atempadamente, o recurso contencioso de acto administrativo que considera gravemente lesivo dos seus direitos e interesses juridicamente tutelados.
32.º
“Até porque a existência de fortes indícios da ilegalidade da interposição do recurso reporta-se às condições de interposição ou pressupostos processuais e não às condições de natureza substantiva ou procedência do mesmo.”1
33.º
O requerente está em tempo para apresentar recurso contencioso contra o acto administrativo praticado pela entidade requerida, e tempestivamente o fará.
TERMOS EM QUE, contando com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser dado provimento ao pedido de suspensão de eficácia do acto administrativo, devendo notificar-se com urgência a entidade requerida com urgência para proceder à suspensão provisória do acto, nos termos do art.º 126.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, e para, querendo, contestar no prazo de 10 dias.
Citada, a entidade requerida contestou pugnando pelo indeferimento do pedido.
O Dignº Magistrado do Ministério Público emitiu o seu douto parecer de fls. 23 a 24v dos p. autos, no qual opinou no sentido de indeferimento do pedido da suspensão de eficácia.
Sem vistos – artº 129º/2 do CPAC, cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo é o próprio e inexiste nulidades.
Os sujeitos processuais gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade.
Inexistem excepções ou questões prévias que obstam ao conhecimento do presente procedimento cautelar.
De acordo com os elementos constantes doa autos, podem ser seleccionados os seguintes factos com relevância à decisão do presente pedido da suspensão de eficácia:
* O requerente, é residente da RPC e titular do Bilhete de Identidade de Cidadão da RPC e Salvo-Conduto para Hong Kong e Macau;
* Foi autorizado a trabalhar num estabelecimento denominado B na RAEM;
* Estabelecimento esse que é alegadamente detido pelos seus pais, residentes permanentes da RAEM;
* Alegou que tem um filho menor, residente permanente da RAEM, que é estudante e vive em Macau;
* Por despacho datado de 12SET2016 do Senhor Comandante Substituto da PSP, foi-lhe revogada a autorização de permanência, como trabalhador não residente, com fundamento na circunstância de em AGO2016 ter sido criminalmente acusado da prática de um crime de falsificação de especial valor;
* Inconformado com este despacho, o recorrente interpôs dele recurso hierárquico para o Senhor Secretário para a Segurança;
* Por despacho datado de 12DEZ2016, o Senhor Secretário para a Segurança negou provimento ao recurso hierárquico, tendo mantido a decisão da revogação da autorização de permanência; e
* Desse despacho foi pessoalmente notificado em 06JAN2017; e
* Mediante o requerimento que deu entrada na Secretaria do TSI, o requerente pediu a suspensão de eficácia do despacho.
Como se sabe, o instituto de suspensão de eficácia do acto administrativo traduz-se numa providência cautelar que visa obter provisoriamente a paralisação dos efeitos de um acto administrativo a produzir imediatamente na esfera jurídica do destinatário do acto, por forma a proteger, a título cautelar, os interesses que se dirijam à conservação de situações jurídicas já existentes.
Tratando-se in casu de revogação de uma autorização de permanência antes do terminus do prazo da sua validade previamente determinado e tendo em conta que a revogação implica efectivamente a alteração de uma realidade preexistente e que da execução do acto da revogação decorre um efeito ablativo de um bem jurídico detido pelo requerente, estamos obviamente perante um acto de conteúdo positivo.
Verificado o pressuposto a que se alude o artº 120º do CPAC, passemos a averiguar se se verificam os requisitos para decretar a suspensão da eficácia do acto.
Para o deferimento da tal providência, a lei exige a verificação cumulativa dos seguintes requisitos – artº121º/1-a), b) e c) do CPAC:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
Sendo de verificação cumulativa que é, a inverificação de qualquer deles implica logo o não deferimento da suspensão.
Comecemos então pelo requisito exigido na alínea c).
Em relação à inexistência dos fortes indícios da ilegalidade do recurso, podemos dizer que existem sim fortes indícios da legalidade do recurso, tendo em conta a data em que o requerente foi pessoalmente notificado do despacho de cuja eficácia ora se requer a suspensão (06JAN2017) e data em que o pedido da suspensão da eficácia deu entrada na Secretaria do TSI (12JAN2017) e a manifesta legitimidade do requerente para reagir contenciosamente contra o acto administrativo que representa a última palavra da Administração.
No que respeita ao requisito exigido na alínea b), não tendo a Administração invocado, em sede de contestação, a eventual não suspensão ser determinativa da grave lesão do interesse público que a prática do acto recorrido tem em vista, nem existindo elementos nos autos que nos levam a crer que a grave lesão do interesse público será manifesta ou ostensiva se não for imediatamente executado o acto suspendendo, é de considerar a sua verificação face ao disposto no artº 129º/1 do CPAC.
Então resta analisar a verificação ou não do requisito exigido na alínea a), ou seja, se a execução do acto causa previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso contencioso.
Para sustentar a sua tese da verificação in casu desse requisito, o requerente alega que:
8.º
O requerente reside em Macau ao abrigo de autorização de permanência na qualidade de trabalhador não-residente, concedida em 2011.
9.º
O requerente já residira previamente em Macau ao abrigo de outra autorização de permanência na qualidade de trabalhador não-residente, entre os anos de 2002 e 2007.
10.º
O requerente tem efectivamente na Região Administrativa Especial de Macau o seu centro estável de residência e aqui planeia permanecer, ao lado da sua família, por muitos mais anos.
11.º
O requerente trabalha no restaurante B, estabelecimento que é detido pelos seus pais C e D.
12.º
O requerente habita na RAEM conjuntamente com os seus pais, cujo dia-a-dia acompanha e a quem sustenta, e ainda com o seu filho, menor, que enquanto estudante também dele depende para viver.
13.º
Tanto os seus pais como o seu filho são residentes permanentes na RAEM e sempre aqui habitaram.
14.º
O requerente dedica em exclusivo as horas em que não está em casa com a família ao seu trabalho no restaurante, assegurando que este funciona na plenitude.
15.º
O restaurante B providencia não só o seu próprio sustento, como também o de toda a sua família.
16.º
O requerente tem de prestar uma especial assistência aos seus pais, pois o seu pai sofre de diabetes e a sua mãe sofre de pressão arterial elevada.
17.º
Os pais são idosos e o tempo que partilha com eles é de extrema importância para o requerente.
18.º
Também aqui na RAEM consegue acompanhar o crescimento e desenvolvimento do seu filho, menor, com quem coabita.
19.º
A revogação da autorização de permanência causa um prejuízo de difícil reparação ao requerente, pois terá de abandonar a sua família - pais e filho - com quem tem coabitado durante os últimos anos.
20.º
A família do requerente depende da sua actividade, não só para assegurar o funcionamento do restaurante, como para lhes prestar a devida assistência, sendo o filho menor e os pais já idosos.
21.º
A revogação da sua autorização de permanência causará ainda prejuízo de difícil reparação à família, pois o requerente com a sua dedicação assegura o funcionamento pleno do restaurante B.
22.º
O restaurante, como acima se disse, providencia a fonte de sustento de toda a sua família.
23.º
O facto de ter de abandonar o território implicará para o requerente um corte abrupto com as suas raízes familiares e ainda com a terra que ele tem adoptado como sua.
24.º
Efectivamente, tendo aqui vivido durante a maior parte do séc. XXI, tem criado uma ligação afectiva com as gentes de Macau e a cultura própria e específica do território.
25.º
Principalmente, o facto de ter de abandonar a RAEM vai causar um impacto estrondoso no requerente, pois vai cortar a sua proximidade com os familiares mais próximos.
Os alegados prejuízos de difícil reparação são de ordem económica, e da ordem familiar e da ordem afectiva.
Em síntese, os tais prejuízos consistem na perda da fonte de rendimento não só para o sustento dele próprio, como também para o dos seus pais e do seu filho, a causar pelo alegado não funcionamento da plenitude do estabelecimento B e na impossibilidade de prestar assistência aos seus pais que padecem de problemas de saúde e de coabitar o seu filho menor e acompanhar o seu crescimento, assim como na quebra do seu laço afectivo com Macau.
Ora, como se sabe, o instituto da suspensão de eficácia visa evitar, na pendência do recurso contencioso de anulação ou da declaração de nulidade, a constituição ou consolidação de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos, irreversíveis ou pelo menos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no recurso contencioso.
Para o efeito, o requerente, enquanto interessado em ver suspensa a execução imediata do acto, tem o ónus de alegar e provar a verificação dos prejuízos e a existência do nexo de causalidade adequada entre a execução imediata do acto e a verificação dos prejuízos.
In casu, se é certo que se pode dar por provada a impossibilidade de permanecer na RAEM como trabalhador não residente, não é menos verdade que a alegação das “perdas”, “impossibilidades” e “quebra” não passa de ser expressões vagas e meramente conclusivas, pois o requerente limita-se alegar as tais perdas, impossibilidades e quebra para concluir pela existência dos prejuízos de difícil reparação, no entanto, nada foi dito para concretizar em que termos as “perdas”, “impossibilidades” e “quebra” gerarão os tais prejuízos de difícil reparação nem meios probatórios apresentados para sustentar os factos demonstrativos da probabilidade da verificação daqueles prejuízos e o nexo de causalidade entre as “perdas”, “impossibilidades” e “quebra” e os alegados prejuízos.
Portanto o presente pedido não pode deixar de ser condenado ao insucesso.
Mesmo assim, tecemos algumas considerações antes de decidir.
É verdade que com a execução imediata do acto suspendendo, o requerente perderá o seu direito de permanecer em Macau como trabalhador não residente.
Ora, não podemos esquecer que aqui está em causa a revogação de uma autorização de permanência concedida a um não residente para trabalhar em Macau como mão-de-obra importada não especializada.
Ora, não tendo em vista conferir direito de residência propriamente dito, a tal autorização administrativa justifica-se pelas necessidades do mercado de trabalho e dos diversos sectores da economia da RAEM – artº 8º/2 da Lei nº 21/2009, e não visa assegurar aos não residentes na RAEM a possibilidade de ajudar os seus familiares para explorar um determinado estabelecimento comercial situado em Macau nem a de coabitar e tomar conta dos descendentes menores aqui residentes.
É verdade embora que com a autorização de permanência para trabalhar em Macau, o requerente podia contribuir para o bom funcionamento do estabelecimento detido pelos seus pais, para onde foi autorizar a trabalhar na qualidade de mão-de-obra importada, e aproveitar para coabitar e tomar conta do seu filho menor aqui residente, o certo é que ele não podia esperar que o seu estatuto de trabalhador não residente lhe pudesse assegurar sempre a possibilidade de o fazer tal como foi alegado, antes devia saber que a sua situação era meramente precária e sempre contar com a possibilidade de não renovação de autorização de permanência, por razões que se prendem pura e simplesmente com a eventual alteração posterior das condições do mercado de trabalho de Macau.
Além disso, os alegados prejuízos resultante da eventual não manutenção do pleno funcionamento do estabelecimento B não podem ser entendidos como prejuízos pessoais do requerente, pois, havendo-os, são da sua entidade patronal.
Portanto, os tais argumentos não podem ser tidos em conta.
Por outro lado, no que respeita à perda do sustendo do seu próprio, é de lembrar a doutrina autorizada do Venerando Tribunal de Última Instância reafirmada no seu Acórdão de 10JUL2013 no processo nº 37/2013, que dita que é de considerar como de difícil reparação o prejuízo consistente na privação de rendimentos geradora de uma situação de carência quase absoluta e de impossibilidade de satisfação das necessidades básicas e elementares.
Ora, se é certo que a execução imediata do acto que determinou o revogação da autorização de permanência implica a cessação do seu direito de trabalhar na RAEM e da sua relação laboral com a entidade patronal em Macau, não é menos verdade que o requerente poderá perfeitamente trabalhar e ganhar a sua vida em outros sítios do mundo, nomeadamente na China continental, donde é proveniente e onde tem direito de residir e trabalhar.
Naturalmente a execução imediata do acto suspendendo não tem, de per si, a virtualidade de implicar a privação de rendimentos geradora de uma situação de carência quase absoluta e de impossibilidade de satisfação das necessidades básicas e elementar.
Finalmente, quanto à alegada quebra do laço afectivo com Macau, não se vê em que termos o tal laço poderá ficar quebrado, de forma irreversível ou pelo menos dificilmente reparável, com a simples perda da qualidade de trabalhador não residente no curto período de tempo que corresponde à pendência do recurso contencioso de anulação do acto administrativo de cuja eficácia ora se requer a suspensão, pois o requerente pode sempre vir visitar e permanecer em Macau, a outro título, nomeadamente a de turista.
Cremos portanto que, sem mais delongas, é de concluir pela inverificação do requisito exigido no artº 121º/1-a) do CPAC, o que implica o indeferimento da pretendida suspensão.
Em conclusão:
1. O instituto da suspensão de eficácia visa evitar, na pendência do recurso contencioso de anulação ou da declaração de nulidade, a constituição ou consolidação de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos, irreversíveis ou pelo menos de difícil reparação, para os interesses que o requerente visa assegurar no recurso contencioso.
2. Para o efeito, o requerente, enquanto interessado em ver suspensa a execução imediata do acto, tem o ónus de alegar e provar a verificação dos prejuízos e a existência do nexo de causalidade adequada entre a execução imediata do acto e a verificação dos prejuízos.
Resta decidir.
III – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam indeferir o pedido de suspensão do despacho, datado de 12DEZ2016, do Senhor Secretário para a Segurança que determinou a revogação da autorização de permanência anteriormente concedida ao requerente.
Custas pelo requerente, com taxa de justiça fixada em 5UC.
Registe e notifique.
RAEM, 26JAN2017
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
Mai Man Ieng
1 Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo da República de Portugal n.º 46219, de 5/772000, apud Acórdão n.º 66/2012 do Tribunal de Segunda Instância.
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Susp.ef. 61/2017-20