Processo nº 867/2016
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. Em audiência colectiva no T.J.B. respondeu A, arguido com os restantes sinais dos autos, vindo a ser condenado pela prática como autor e em concurso real de:
- 1 crime de “apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada”, p. e p. pelo art. 200°, n.° 1 e 2 do C.P.M., na pena de 6 meses de prisão;
- 4 crimes de “abuso de cartão de crédito”, p. e p. pelo art. 218°, n.° 1 do C.P.M., na pena de 8 meses de prisão; e,
- 4 crimes de “falsificação de documento”, p. e p. pelo art. 244°, n.° 1, al. b) do C.P.M., na pena de 5 meses de prisão cada;
- Em cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 2 anos de prisão e no pagamento de uma indemnização de HKD$69.050,00 ao ofendido B; (cfr., fls. 230 a 240-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado, o arguido recorreu.
Motivou para, em síntese, concluir afirmando que a decisão recorrida padece de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”, “contradição insanável da fundamentação”, “erro notório na apreciação da prova”, “violação do princípio in dubio pro reo”, “errada qualificação jurídica” e “excesso de pena”; (cfr., fls. 246 a 258).
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Respondendo, diz o Ministério Público que o recurso não merece provimento; (cfr., fls. 260 a 269-v).
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Neste T.S.I., juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:
“A impugna o acórdão de 15 de Julho de 2016, proferido no âmbito do processo comum colectivo CR4-16-0120-PCC, que o condenou na pena global de 2 anos de prisão pela autoria de um crime de apropriação ilegítima de coisa achada, quatro crimes de abuso de cartão de crédito e quatro crimes de falsificação de documento, imputando-lhe o rol de vícios e erros que arregimenta na motivação do recurso e respectivas conclusões.
Não creio que lhe assista razão, como bem resulta da esclarecida e exaustiva resposta do Ministério Público, à qual pouco se nos oferece acrescentar.
Não se detecta qualquer erro na apreciação da prova, nem se vislumbra qualquer incompatibilidade de fundamentos.
A circunstância de não ter sido considerado e valorado, como meio de prova válido, o reconhecimento efectuado durante o Inquérito, como se vê do teor do acórdão, em nada impedia que se procedesse, como sucedeu, ao reconhecimento em audiência, Este reconhecimento em audiência – que não tem naturalmente que observar estritamente a forma e os passos previstos para a fase de Inquérito e de Instrução, porque realizado perante o próprio julgador, com observância do contraditório e com os benefícios e certezas proporcionados pela imediação – foi feito, de forma inequívoca, por três das testemunhas, e ainda por uma quarta testemunha, embora desta feita de maneira menos vincada.
Este reconhecimento seguro, aliado à visualização proporcionada pelas imagens captadas em circuito interno nas lojas onde o recorrente fez compras com utilização do cartão do ofendido, permitiu ao tribunal colectivo formular um juízo fundado e seguro sobre o cometimento dos factos por parte do recorrente.
Como é sabido, a prova para a condenação penal não tem que ser exaurida ao ponto da certeza suprema, absoluta, bastando-se com a certeza acima de qualquer dúvida razoável. Ora, essa prova exigível foi produzida, conforme resulta do acórdão, cuja fundamentação e cujo exame crítico das provas se apresentam elucidativos no sentido de alicerçar e sustentar a convicção do tribunal colectivo.
Dito isto, importa acrescentar que não faz sentido o recorrente brandir o princípio in dubio pro reo e a presunção de inocência. Da leitura da acta e do exame crítico das provas não perpassa qualquer situação dúbia com que o colectivo se haja deparado sobre a realidade factual dada como provada e que permitiu a integração da conduta do arguido nos tipos de crimes por que foi condenado.
O recorrente tem a sua própria leitura da prova, que pode porventura suscitar-lhe alguma dúvida, mas não pode partir daí para sustentar que o tribunal colectivo decidiu com dúvidas acerca da autoria dos factos.
Por outro lado, não se verifica qualquer insuficiência factual na decisão quanto ao crime de apropriação ilegítima de coisa achada, nem este crime é consumido pelo crime de abuso de cartão de crédito.
Foi, na verdade, dada como provada toda a matéria da acusação que interessava à prova do cometimento do ilícito de apropriação ilegítima de coisa achada e à sua autoria, como ressuma dos pontos 2 e seguintes dos factos provados, onde é dado como assente que o ofendido B perdeu dois cartões de crédito, que estes foram encontrados pelo recorrente, que os usou em quatro operações comerciais, tal como se fossem seus, o que não pode deixar de configurar o elemento apropriação.
E posto que ambos os ilícitos integrem o título dos crimes contra o património, são diversos os valores directamente protegidos pelas respectivas normas. O tipo de ilícito do artigo 200.° do Código Penal protege o direito de propriedade da coisa objecto de perda ou de acessão, no caso, a propriedade dos cartões. Por seu turno, o tipo de ilícito do artigo 218.° do Código Penal protege o património ou os valores que podem ser mobilizados através da utilização dos cartões de crédito. Trata-se de ilícitos diversos, cujo cometimento implica acções autónomas, sendo também diferentes os bens jurídicos tutelados e podendo até ser diferentes os ofendidos.
Não ocorre, pois, relação de consumpção nem violação do princípio ne bis in idem, também não padecendo o acórdão, nesta parte, de qualquer vício.
Da mesma forma não cremos que ocorra relação de consumpção entre os crimes de abuso de cartão de crédito e os crimes de falsificação dos talões probatórios das inerentes operações automáticas de crédito.
Também aqui se nos deparam bens jurídicos diferentes, violados através de acções autónomas. Como se disse, a norma incriminadora do abuso de cartões de crédito ou garantia visa proteger o património ou os valores que podem ser mobilizados através da utilização dos cartões. Já no crime de falsificação o que está em causa é a protecção da verdade da força probatória do documento.
Não há, pois, fundamento para sustentar a aventada relação de consumpção.
Outrossim não se crê que a actuação do recorrente possa configurar uma situação de crime continuado. A variedade das lojas utilizadas e das pessoas que atenderam o recorrente, com a inevitável diferença de circunstâncias que em cada momento se depararam e que naturalmente obrigaram à renovação, em cada caso, do processo de motivação e de execução, afastam a existência de um quadro de solicitação exterior susceptível de diminuir acentuadamente a culpa, que é imprescindível à figura do crime continuado, tal como o artigo 29.°, n.° 2, do Código Penal, o recorta.
Improcede, assim, igualmente este vector argumentativo do recorrente.
Finalmente, entende o recorrente que, quer as penas parcelares, quer a pena global resultante do cúmulo jurídico, se apresentam excessivas, apontando como violados os artigos 64.°, 45.° e 48.° do Código Penal.
Mas não lhe assiste razão.
O tribunal explicou de forma clara e sustentada as razões pela opção de penas detentivas em detrimento de penas de multa, tal como justificou, fundadamente, os motivos da opção pela não suspensão da pena, motivos e razões que não merecem o mínimo reparo.
Quanto à determinação das penas parcelares teve em devida conta os fins das penas, os critérios que presidem à sua determinação e, bem assim, as demais circunstâncias atendíveis, incluindo os antecedentes criminais e a situação de clandestinidade do recorrente. E, no tocante ao cúmulo jurídico, observou as regras de punição do artigo 71.° do Código Penal, nomeadamente a do seu n.° 2.
Posto isto, e sabendo-se que os parâmetros em que se move a determinação da pena, adentro da chamada teoria da margem de liberdade, não são matemáticos, há que aceitar a solução encontrada pelo tribunal do julgamento, a menos que o resultado se apresente ostensivamente intolerável, por desajustado aos fins da pena e à culpa que a delimita, o que inquestionavelmente não é o caso.
Improcedem, pois, todos os fundamentos esgrimidos na motivação, pelo que deve ser negado provimento ao recurso”; (cfr., fls. 456 a 458).
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Cumpre decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 232-v a 234-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos, (não havendo factos por provar).
Do direito
3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou como autor da prática de 1 crime de “apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada”, p. e p. pelo art. 200°, n.° 1 e 2 do C.P.M., na pena de 6 meses de prisão, 4 crimes de “abuso de cartão de crédito”, p. e p. pelo art. 218°, n.° 1 do C.P.M., na pena de 8 meses de prisão, e outros 4 de “falsificação de documento”, p. e p. pelo art. 244°, n.° 1, al. b) do C.P.M., na pena de 5 meses de prisão cada, e em cúmulo jurídico, na pena única de 2 anos de prisão e no pagamento de uma indemnização de HKD$69.050,00 ao ofendido dos autos.
Em sede do seu recurso, e como resulta das conclusões produzidas a final da motivação apresentada, coloca o arguido e importa decidir as questões seguintes:
- “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”, pugnando pela sua absolvição quanto ao crime de “apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada”;
- “contradição insanável da fundamentação” e “erro notório na apreciação da prova”;
- “violação do princípio in dubio pro reo”;
- “erro de direito”, na qualificação jurídica da sua conduta, no que toca ao crime de “falsificação de documento”, afirmando também que a sua conduta devia integrar a prática de “um crime de abuso de cartão de crédito na forma continuada”; e,
- “excesso de pena”.
Como – bem – nota o Ministério Público na sua Resposta e atrás transcrito Parecer, cremos que o recorrente não tem razão, havendo-se que negar provimento ao recurso.
–– Vejamos, começando pelos vícios relativos à “decisão de matéria de facto”.
Pois bem, tem este T.S.I. entendido que o vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” apenas ocorre “quando o Tribunal não se pronuncia sobre toda a matéria objecto do processo”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 10.03.2016, Proc. n.° 95/2016, de 02.06.2016, Proc. n.° 1062/2015 e de 19.01.2017, Proc. n.° 549/2016).
Quanto ao vício de “contradição insanável da fundamentação”, tem-se definido como aquele que ocorre quando “se constata incompatibilidade, não ultrapassável, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão”; (cfr., v.g. os recentes Acs. deste T.S.I. de 12.01.2017, Proc. n.° 142/2016, de 26.01.2017, Proc. n.° 776/2016 e de 16.02.2017, Proc. n.° 341/2016).
Em síntese, quando analisada a decisão recorrida se verifique que a mesma contém posições antagónicas, que mutuamente se excluem e que não podem ser ultrapassadas.
Por sua vez, o “erro notório na apreciação da prova” apenas existe quando “se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores”.
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 12.01.2017, Proc. n.° 498/2016, de 26.01.2017, Proc. n.° 776/2016 e de 16.02.2017, Proc. n.° 341/2016).
Como também já tivemos oportunidade de afirmar:
“Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.
O princípio da livre apreciação da prova, significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que pré-determinam ou hierarquizam o valor dos diversos meios de apreciação da prova, pressupondo o apelo às “regras de experiência” que funcionam como argumentos que ajudam a explicar o caso particular com base no que é “normal” acontecer.
Não basta uma “dúvida pessoal” ou uma mera “possibilidade ou probabilidade” para se poder dizer que incorreu o Tribunal no vício de erro notório na apreciação da prova; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 12.01.2017, Proc. n.° 382/2016, de 19.01.2017, Proc. n.° 549/2016 e de 26.01.2017, Proc. n.° 744/2016).
E mostrando-se de manter o assim entendido, à vista está a solução.
Com efeito, o Colectivo a quo emitiu pronúncia sobre “toda a matéria objecto do processo”, apenas por manifesto equívoco se podendo falar de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”
Quanto à alegada “contradição insanável da fundamentação”, a mesma se apresenta a solução, pois que não se vislumbra qualquer “incompatibilidade” ou oposição entre o decidido ou entre a (própria) decisão e fundamentação.
Quanto ao “erro”, vejamos.
Fundamentando a sua decisão (convicção) consignou o Colectivo a quo o que segue:
“Durante a audiência de julgamento, o arguido exerceu o direito a guardar silêncio.
Durante o julgamento, foi lido o auto para memória futura fornecido pela testemunha, i.e. a vítima B, no juízo de instrução criminal, cujo conteúdo se dá por transcrito aqui.
Durante a audiência de julgamento, a empregada de balcão C fez declarações em relação ao curso pelo que os factos do presente processo tinham acontecido. Ela é empregada de balcão de VERSUS. No dia da ocorrência do caso, ela estava responsável por atender um indivíduo do sexo masculino que fazia as compras. A testemunha reconheceu no juízo in loco, e confirmou que esse indivíduo do sexo masculino que tinha feito as compras era igual ao arguido do presente processo, em termos de estatura e características fisionómicas; era a mesma pessoa. Durante o acontecimento do caso, esse indivíduo do sexo masculino escolheu 3 peças de mercadoria no valor total de MOP$10,100.00, em seguida, puxou o cartão de crédito em caso para pagar; e assinou como "B" na conta. Mais tarde, ele obteve as peças de mercadoria com sucesso e deixou a loja. Durante o julgamento, depois de reproduzir o disco-vídeo e pedir à testemunha identificar de novo, a testemunha confirmou que, no dia do acontecimento do caso, o indivíduo do sexo masculino que tinha feito as compras com o cartão de crédito em causa na loja dela era o próprio arguido.
Durante a audiência de julgamento, a empregada de balcão D fez declarações em relação ao curso pelo que os factos do presente processo tinham acontecido. Ela é empregada de balcão de ERMENEGILDO ZEGNA. No dia da ocorrência do caso, ela estava responsável por atender um indivíduo do sexo masculino que fazia as compras. A testemunha reconheceu no juízo in loco, e confirmou que esse indivíduo do sexo masculino que tinha feito as compras era igual ao arguido do presente processo, em termos de estatura e características fisionómicas; era a mesma pessoa. Durante o acontecimento do caso, esse indivíduo do sexo masculino escolheu 3 peças de mercadoria no valor total de MOP$22,650.00, em seguida, puxou o cartão de crédito em caso para pagar; e assinou como " C " na conta. Mais tarde, ele obteve as peças de mercadoria com sucesso e deixou a loja. Durante o julgamento, depois de reproduzir o disco-vídeo e pedir à testemunha identificar de novo, a testemunha confirmou que, no dia do acontecimento do caso, o indivíduo do sexo masculino que tinha feito as compras com o cartão de crédito em causa na loja dela era o próprio arguido.
Durante a audiência de julgamento, a empregada de balcão E fez declarações em relação ao curso pelo que os factos do presente processo tinham acontecido. Ela é empregada de balcão de MONTBLANC. No dia da ocorrência do caso, ela estava responsável por atender um indivíduo do sexo masculino que fazia as compras. A testemunha reconheceu no juízo in loco, e não conseguiu confirmar com a certeza 100% que esse indivíduo do sexo masculino que tinha feito as compras fosse igual ao arguido do presente processo, em termos de estatura e características fisionómicas; e que fosse a mesma pessoa. Durante o acontecimento do caso, esse indivíduo do sexo masculino escolheu 3 peças de mercadoria no valor total de MOP$11,100.00, em seguida, puxou o cartão de crédito em caso para pagar; e assinou como "B" na conta. Mais tarde, ele obteve as peças de mercadoria com sucesso e deixou a loja. Durante o julgamento, não se conseguiu reproduzir o respectivo disco-vídeo com sucesso.
Durante a audiência de julgamento, a empregada de balcão F fez declarações em relação ao curso pelo que os factos do presente processo tinham acontecido. Ela é empregada de balcão de BURBURRY. No dia da ocorrência do caso, ela estava responsável por atender um indivíduo do sexo masculino que fazia as compras. A testemunha reconheceu no juízo in loco, e confirmou que esse indivíduo do sexo masculino que tinha feito as compras era igual ao arguido do presente processo, em termos de estatura e características fisionómicas; era a mesma pessoa. Durante o acontecimento do caso, esse indivíduo do sexo masculino escolheu 2 peças de mercadoria no valor total de MOP$25,200.00, em seguida, puxou o cartão de crédito em caso para pagar; e assinou como "B" na conta. Mais tarde, ele obteve as peças de mercadoria com sucesso e deixou a loja. Durante o julgamento, depois de reproduzir o disco-vídeo e pedir à testemunha identificar de novo, a testemunha confirmou que, no dia do acontecimento do caso, o indivíduo do sexo masculino que tinha feito as compras com o cartão de crédito em causa na loja dela era o próprio arguido.
Durante a audiência de julgamento, o primeiro investigador da PJ fez declarações sobre a investigação no presente processo na qual tinha participado e sobre as medidas de investigação já tomadas. Esta testemunha e agente policial afirmou que, através dos discos-vídeo fornecidos pelas lojas envolvidas no caso, comparando com os registos internos da PJ, por meio de fotos o arguido tinha sido descoberto, Esse agente policial afirmou que, segundo a sua experiência, a percentagem de correspondência chegou a 90% (comparando em termos de estatura, altura, aparência). Além disso, no momento do acontecimento do caso, o arguido não teve qualquer registo fronteiriço de entrada e saída; ele terá entrado em Macau clandestinamente.
Durante a audiência de julgamento, o segundo investigador da PJ fez declarações sobre a investigação no presente processo na qual tinha participado e sobre as medidas de investigação já tomadas. Esta testemunha e agente policial afirmou que, também tinha participado no processo de identificação fotográfica. Segundo a sua experiência, a percentagem de correspondência foi superior a 70% (comparando em termos de estatura, altura, aparência). No presente processo, suspeitava-se que teria havido um assistente que praticou o crime em conjunto. Eis porque nos trechos, no curto período de tempo em que o arguido entrou em lojas diferentes, ele não tinha nada nas suas mãos.
Segundo os autos de reconhecimento de pessoa a fls. 86, 93, 101, e 108 dos autos, tendo em conta o facto de que no presente processo, ao elaborar-se os autos de reconhecimento de pessoa na PJ, de acordo com o que disseram as testemunhas da PJ presentes, não se mudou a roupa do arguido. Na altura o arguido estava vestido com roupa de prisioneiro (porque se encontrava em prisão preventiva por um outro caso), e estava inserido em 2 "actores" com roupas normais, então foi fácil para as testemunhas identificarem o arguido como quem tinha cometido o caso.
Para isso, este tribunal colectivo considera que, o procedimento de reconhecimento de pessoa acima referido violou o art.º 134.º, n.º 2 do CPP; e nos termos do n.º 4 do mesmo artigo, o reconhecimento que não obedecer ao disposto neste artigo não tem valor como meio de prova; então não será adoptado.
Para isso, o julgamento provou os factos. O juízo, de acordo com a lei de experiência, analisando lógica e sinteticamente bem como confirmando os meios de prova, tais como as declarações feitas pelo arguido durante o julgamento, o depoimento das várias testemunhas e empregadas de loja, os 2 agentes policiais investigadores, e as provas documentais constantes dos autos, sobretudo as fotas obtidas dos vídeos gravados no local, constantes dos autos, os trechos de vídeo in loco reproduzidos durante o julgamento, e as provas documentais constantes dos autos, considera que há suficientes pravas para provar os factos provados, e podem ser dados como assentes.
Este juízo entende que, através das provas acima mencionados, sobretudo o facto de que, dentro das 4 empregadas de loja, 3 confirmou com a certeza absoluta que o arguido no presente processo tinha sido o indivíduo do sexo masculino que tinha usado os cartões de crédito em causa para fazer as compras no dia do acontecimento do caso; a outra afirmou que não estava certa 100%, mas afirmou que mais cedo quando estava a prestar o depoimento na PJ, tinha mais certeza. Neste momento o arguido está mais gordo do que antigamente; e que na altura estava com os óculos e agora não. No julgamento, este tribunal colectivo também visualizou os trechos de vídeo de compras no momento do acontecimento do caso fornecidos pelas lojas. Comparando o indivíduo do sexo masculino em causa no disco-vídeo com o ora arguido em termos de estatura e figura, o segundo parece mais gordo, mas grosso modo (em termos de penteado, altura, contorno, aparência, são muito semelhantes), sobretudo de acordo com um momento (i.e., no trecho de vídeo da loja BURBERRY, esse indivíduo do sexo masculino empurrou os óculos para a cima da cabeça), este juízo consegue, com clareza, comparar as aparências desso indivíduo do sexo masculino com o arguido como ora está, são a mesma pessoa. Por último, através da análise das outras provas nos autos, embora uma das empregadas de loja não tenha conseguido decidir definitivamente, no entanto, as horas do acontecimento do caso, esse indivíduo do sexo masculino, no curto período de tempo, apareceu em 4 lojas para fazer as compras, com as mesmas roupas e decorações. Através dos vídeos e fotos, pode-se ver com facilidade que foram a mesma pessoa. Então, dado que 3 das empregadas de loja conseguiram identificar com clareza que o arguido foi o indivíduo do sexo masculino que tinha feito as compras no momento do acontecimento do caso, então, o indivíduo que apareceu na MONTBLANC pode ser razoavelmente decidido como o próprio arguido. Para isso, este juízo entende que, as provas nos autos podem suficientemente dar como certo que o arguido praticou os factos na acusação, i.e., na hora do acontecimento do caso, no local do acontecimento do caso, utilizou os cartões de crédito de outrem em causa e falsificou a assinatura no cartão de crédito de outrem, para fazer as compras, com a intenção de obter interesses ilegítimos”.
E, parente isto, claro fica também que nenhum erro – muito menos, notório – na apreciação da prova cometeu.
Aliás, ponderou e valorizou adequada e correctamente a prova dos autos, (tendo mesmo afastado a validade de 1 “reconhecimento”), apresentando-se-nos que nenhuma censura merece o decidido, sendo assim de se ter por definitivamente fixada a matéria de facto, e de notar que, na parte em questão, mais não faz o recorrente que (tentar) controverter a dita factualidade, insistindo numa versão dos factos que pelo Colectivo foi já afastada, o que, como é óbvio, não colhe.
Continuemos.
–– Em relação ao princípio “in dubio pro reo” tem este T.S.I. considerando que o mesmo se equipara “com o da “presunção da inocência do arguido” e impõe que o julgador valore sempre, em favor dele, um “non liquet”.
Perante uma situação de dúvida sobre a realidade dos factos constitutivos do crime imputado ao arguido, deve o Tribunal, em harmonia com o princípio “in dubio pro reo”, decidir pela sua absolvição”; (cfr., v.g. os recentes Acs. deste T.S.I. de 02.06.2016, Proc. n.° 1062/2015, de 22.09.2016, Proc. n.° 528/2016 e de 26.01.2017, Proc. n.° 744/2016).
Como ensina F. Dias, segundo o princípio “in dubio pro reo”, «a persistência de dúvida razoável após a produção da prova tem de actuar em sentido favorável ao arguido e, por conseguinte, conduzir à consequência imposta no caso de se ter logrado a prova completa da circunstância favorável ao arguido»; (in “Direito Processual Penal”, pág. 215).
Conexionando-se com a matéria de facto, este princípio actua em todas as vertentes fácticas relevantes, quer elas se refiram aos elementos típicos do facto criminalmente ilícito – tipo incriminador, nas duas facetas em que se desdobra: tipo objectivo e tipo subjectivo – quer elas digam respeito aos elementos negativos do tipo, ou causas de justificação, ou ainda, segundo uma terminologia mais actualizada, tipos justificadores, quer ainda a circunstâncias relevantes para a determinação da pena.
Porém, importa atentar que o referido o princípio (“in dubio pro reo”), só actua em caso de dúvida (insanável, razoável e motivável), definida esta como “um estado psicológico de incerteza dependente do inexacto conhecimento da realidade objectiva ou subjectiva”; (cfr., Perris, “Dubbio, Nuovo Digesto Italiano”, apud, Giuseppe Sabatini “In Dubio Pro Reo”, Novissimo Digesto Italiano, vol. VIII, págs. 611-615) .
Por isso, para a sua violação exige-se a comprovação de que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes, e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o arguido; (neste sentido, cfr. v.g., o Ac. do S.T.J. de 29.04.2003, Proc. n.° 3566/03, in “www.dgsi.pt”).
Daí também que, para fundamentar essa dúvida e impor a absolvição, não baste que tenha havido versões dispares ou mesmo contraditórias, sendo antes necessário que, perante a prova produzida, reste no espírito do julgador – e não no do arguido ou recorrente – alguma dúvida sobre os factos que constituem o pressuposto da decisão, dúvida que, como se referiu, há-de ser “razoável” e “insanável”; (cfr., os Acs. deste T.S.I. de 17.03.2016, Proc. n.° 101/2016 e de 28.04.2016, Proc. n.° 239/2016).
In casu, e como de uma mera leitura ao Acórdão recorrido se constata, em momento algum teve o Colectivo a quo qualquer dúvida (ou hesitação) quanto à decisão a proferir, tendo mesmo assim, decidido contra o arguido.
Nesta conformidade, também não ocorre violação ao dito princípio in dubio pro reo.
–– Passemos agora para a “decisão de direito”.
Como se deixou relatado, foi o arguido ora recorrente condenado pela prática como autor em concurso real de 1 crime de “apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada”, p. e p. pelo art. 200°, n.° 1 e 2 do C.P.M., na pena de 6 meses de prisão, 4 crimes de “abuso de cartão de crédito”, p. e p. pelo art. 218°, n.° 1 do C.P.M., na pena de 8 meses de prisão, e outros 4 de “falsificação de documento”, p. e p. pelo art. 244°, n.° 1, al. b) do C.P.M., na pena de 5 meses de prisão cada, e em cúmulo jurídico, na pena única de 2 anos de prisão e no pagamento de uma indemnização de HKD$69.050,00 ao ofendido dos autos.
Em relação ao crime de “apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada”, p. e p. pelo art. 200°, n.° 1 e 2 do C.P.M., evidente se apresenta que há que confirmar o decidido.
Com efeito, “provado” está que o ofendido perdeu os 2 cartões de crédito, que o arguido os “encontrou” e que os “manteve em sua posse”, (vindo mesmo a utilizá-los), agindo livre e deliberadamente, bem sabendo que proibida e punida era a sua conduta.
Vejamos agora da sua condenação por 4 crimes de “abuso de cartão de crédito”.
Diz o arguido que devia ser (apenas) condenado como autor de “1 só crime na forma continuada”.
Eis o que se nos oferece de dizer.
Nos termos do art. 29° do C.P.M.:
“1. O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente.
2. Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”.
E como já tivemos oportunidade de consignar:
“A realização plúrima do mesmo tipo de crime pode constituir: a) um só crime, se ao longo de toda a realização tiver persistido o dolo ou resolução inicial; b) um só crime, na forma continuada, se toda a actuação não obedecer ao mesmo dolo, mas este estiver interligado por factores externos que arrastam o agente para a reiteração das condutas; c) um concurso de infracções, se não se verificar qualquer dos casos anteriores”; (cfr. v.g., o Ac. da Rel. de Porto de 25.07.1986, in B.M.J. 358°-267, aqui citado como mera referência, e Acórdão do ora relator de de 25.10.2012, Proc. n.° 653/2011, de 27.09.2012, Proc. n.° 681/2012 e de 26.05.2016, Proc. n.° 1044/2015).
Do mesmo modo, Maia Gonçalves, (referindo-se a idêntico artigo do C.P. Português), considera que com o preceito em questão – o art. 30° – se perfilha “o chamado critério teleológico para distinguir entre unidade e pluralidade de infracções, atendendo-se assim ao número de tipos legais de crime efectivamente preenchidos pela conduta do agente, ou ao número de vezes que essa conduta preencheu o mesmo tipo legal de crime. (...) É claro que embora o artigo o não diga expressamente, não se abstrai do juízo de censura (dolo ou negligência). Depois de apurada a possibilidade de subsunção da conduta a diversos preceitos incriminadores, ou diversas vezes ao mesmo preceito, tal juízo de censura dirá a última palavra sobre se, concretamente, se verificam um ou mais crimes, e se sob a forma dolosa ou culposa. Isto se deduz do uso do advérbio efectivamente e dos princípios basilares sobre a culpa”; (vd., “C.P.P. Anotado”, 8ª ed., pág. 268).
“Posto que para que uma conduta seja considerada delituosa se torna necessário que para além de antijurídica seja, igualmente, culposa, a culpa apresenta-se – assim – como elemento limite da unidade da infracção, pois que sendo vários os juízos de censura, outras tantas vezes o mesmo tipo legal de crime se torna aplicável, de onde se nos depare uma pluralidade de infracções.
Assente, então, que sempre que se verifique uma pluralidade de resoluções criminosas, se verifica uma pluralidade de juízos de censura, a dificuldade residirá, apenas, em verificar se numa determinada situação concreta existe pluralidade de resoluções criminosas ou se o agente age no desenvolvimento de uma única e mesma motivação criminosa”.
Isto é, o critério teleológico (e não naturalístico) adoptado pelo legislador na destrinça entre unidade e pluralidade de infracções, pressupõe o juízo de censurabilidade, pelo que haverá tantas infracções quantas as vezes que a conduta que o preenche se tornar reprovável.
No mesmo sentido, e em relação ao Código de 1886 afirmava já E. Correia que:
“Se a actividade do agente preenche diversos tipos legais de crime, necessariamente se negam diversos valores jurídicos e estamos, por conseguinte, perante uma pluralidade de infracções. Mas porque a acção, além de antijurídica, tem de ser culposa, pode acontecer que uma actividade subsumível a um mesmo tipo mereça vários juízos de censura. Tal sucederá no caso de à dita actividade corresponderem várias resoluções, no sentido de determinações de vontade, de realização do projecto criminoso”, e que “certas actividades que preenchem o mesmo tipo legal de crime e às quais presidiu pluralidade de resoluções devem ser aglutinadas numa só infracção, na medida em que revelam considerável diminuição da culpa. Tal sucederá, quando a repetição da actividade for facilitada, de modo considerável, por uma disposição exterior das coisas para o facto”; (cfr., “Direito Criminal”, Vol. 2, págs. 201, 202, 209 e 210, e ainda em “Unidade e Pluralidade de Infracções”, pág. 338).
Por sua vez, e tratando mais especificamente da matéria do “crime continuado”, também já teve este T.S.I. oportunidade de afirmar que:
“O conceito de crime continuado é definido como a realização plúrima do mesmo tipo ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”, e que, a não verificação de um dos pressupostos da figura do crime continuado impõe o seu afastamento, fazendo reverter a figura da acumulação real ou material”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 14.01.2016, Proc. n.° 1067/2015, de 26.05.2016, Proc. n.° 1044/2015 e de 19.01.2017, Proc. n.° 870/2016).
Também por douto Acórdão de 24.09.2014, Proc. n.° 81/2014, (e com abundante doutrina sobre a questão), voltou o Vdo T.U.I. a afirmar que:
“O pressuposto fundamental da continuação criminosa é a existência de uma relação que, de fora, e de maneira considerável, facilite a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente, isto é, de acordo com o direito”, e que,
“Os tribunais devem ser particularmente exigentes no preenchimento dos requisitos do crime continuado, em especial na diminuição considerável da culpa do agente, por força da solicitação de uma mesma situação exterior”.
Aqui chegados, vejamos.
No caso dos autos, provado está que os apontados “4 crimes” foram cometidos após o arguido se ter apropriado de 2 cartões de crédito de “B” e de os ter utilizado (como se seus fossem) no pagamento de compras que efectuou em (4) lojas de um centro comercial de Macau: 1 deles, por 3 vezes, e o outro, por 1 vez.
Resulta, igualmente da descrita factualidade que a “actuação” do arguido teve lugar no dia 01.05.2015, e que as 4 compras foram efectuadas às 5H00, 5H30, 5H45 e 6H00 da tarde deste (mesmo) dia, verificando-se assim que presente está a circunstância da “proximidade temporal” e “(alguma) homogeneidade da conduta”.
Porém, poder-se-à dizer que existiu a necessária “situação exterior que facilitou a repetição da conduta (após a primeira compra)”?
Ponderando na questão, e inevitável sendo que a mesma terá que ser apreciada em conformidade com os “ingredientes do caso”, cremos que adequada é a consideração pelo Ministério Público tecida no seu douto Parecer, onde opina que “(…) A variedade das lojas utilizadas e das pessoas que atenderam o recorrente, com a inevitável diferença de circunstâncias que em cada momento se depararam e que naturalmente obrigaram à renovação, em cada caso, do processo de motivação e de execução, afastam a existência de um quadro de solicitação exterior susceptível de diminuir acentuadamente a culpa, que é imprescindível à figura do crime continuado, tal como o artigo 29.°, n.° 2, do Código Penal, o recorta”.
Com efeito, não obstante a aludida “proximidade temporal” e a notada “homogeneidade da conduta”, (e para além de ter o arguido utilizado os 2 cartões de crédito), os (4) estabelecimentos onde foram os mesmos utilizados são distintos, (situando-se um no 1° andar e os outros 3 no R/C), sendo que as transacções implicaram a intervenção de pessoas também distintas, (outros empregados da loja), outra sendo a “situação”, tendo o arguido que desenvolver toda uma conduta – apresentando os cartões de crédito do ofendido – para (conseguir) efectuar os pagamentos, ocultando ao empregado a sua verdadeira identidade, apresentando-se-nos, assim, que, no mínimo, existia uma renovação do “risco” (de fracasso) da operação.
E, nestes termos, também aqui não se acolhe a pretensão da condenação do arguido pela prática do crime em questão na “forma continuada”.
E, continuando, o mesmo se nos mostra de dizer em relação à pretendida absolvição pelos crimes de “falsificação de documento”, pois que – e como igualmente se nota no referido Parecer – diferentes sendo os bens jurídicos protegidos com a norma jurídica, afastada estando qualquer concurso (aparente) de normas.
–– Por fim, vejamos da(s) penas(s).
Ponderando na matéria de facto dada como provada, da qual se destaca que o arguido não é primário e agiu em situação de “clandestinidade”, (art. 22° da Lei n.° 6/2004), que causou um prejuízo no valor total de MOP$69.050,00, (MOP$10.100,00 + MOP$22.650,00 + MOP$11.100,00 + MOP$25.200,00), e atentas as respectivas molduras penais e os critérios do art. 40°, 64° e 65° do C.P.M., cremos que excessivas não são as penas parcelares, o mesmo sucedendo com a pena única que se apresenta em total sintonia com o estatuído no art. 71° do mesmo Código.
Por fim, e como se referiu, não sendo o arguido “primário”, e cometendo o crime em situação de “clandestinidade”, fortes são as necessidades de prevenção criminal – especial e geral – o que inviabiliza (também) a aplicação do preceituado no art. 48° do C.P.M. para efeitos de se decidir por uma suspensão da execução da pena única que lhe foi fixada.
Tudo visto, resta decidir.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.
Pagará o arguido a taxa de justiça de 8 UCs.
Registe e notifique.
Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 16 de Março de 2017
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa (Vencido com declaração de voto junto.)
Processo nº 867/2016 (Autos de recurso penal)
Data: 16/03/2017
Declaração de voto
Vencida por seguintes razões:
Não concordo com a decisão condenatória do arguido recorrente pela prática de 4 crimes de falsificação de documento, p.p. pelo art.244º nº1 al.b) do Código Penal, por entender que os tais recibos de consumo “falsificados” pelo arguido só servem para a prática dos crimes de abuso de cartão de crédito em causa, e carecem a autonomia. Assim sendo, entendo que os crimes de falsificação de documento por serem crimes instrumentais, deveriam ser absorvidos pelos crimes de abuso de cartão de crédito, p.p. pelo art.218º nº1 do Código Penal, e deveria o arguido ser absolvido desses 4 crimes de falsificação de documento, p.p. pelo art.244º nº1 al.b) do Código Penal.
A Segunda Adjunta
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Tam Hio Wa
Proc. 867/2016 Pág. 38
Proc. 867/2016 Pág. 37