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Processo n.º 611/2016 Data do acórdão: 2017-5-4 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– tráfico ilícito de estupefacientes
– art.º 391.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal
S U M Á R I O
Atento o pensamento legislativo do art.º 391.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, um arguido condenado no crime de tráfico ilícito de estupefacientes não pode recorrer da decisão condenatória dele com fundamento de que foi erradamente absolvido um co-arguido seu nesse crime inicialmente acusado.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 611/2016
(Autos de recurso penal)
Recorrente (1.º arguido): A (A)



ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido a fls. 512 a 522v dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR3-15-0460-PCC do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que inclusivamente o condenou como co-autor material de um crime consumado de tráfico ilícito de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 8.º, n.º 1, da Lei n.º 17/2009, de 10 de Agosto (doravante chamada como Lei de droga), na pena de sete anos e seis meses de prisão, e como autor material de um crime consumado de consumo ilícito de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 14.º da mesma Lei, na pena de dois meses de prisão, e, em cúmulo jurídico dessas duas penas, finalmente na pena única de sete anos e sete meses de prisão, veio o 1.º arguido A recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para se insurgir contra a decisão referente ao crime de tráfico de estupefacientes, defendendo e rogando, para o efeito, e na sua essência, que: a) foi errada a absolvição do 3.º arguido, absolvição essa que fez desviar a conduta ilícita de tráfico de droga, cometida principalmente pelos 2.º e 3.º arguidos e outros, em direcção apenas aos 1.º e 2.º arguidos, para além de fazer padecer o acórdão recorrido do vício de contradição insanável da fundamentação, porquanto se o Tribunal recorrido deu sobretudo por não provados o envolvimento e os factos de aferição do dolo do 3.º arguido na prática da conduta de tráfico de droga dos 1.º e 2.º arguidos, então não poderia ter dado, nomeada e simultaneamente, por assente que “quando os três arguidos apanharam um táxi, os 2.º e 3.º arguidos pediram ao taxista o número de telefone deste, com a finalidade de uma melhor conveniência em relação ao tráfego automóvel, na actividade de tráfico de droga superveniente”, e eis um dos pontos da contradição insanável da fundamentação do aresto condenatório, que dá para fazer reenviar o processo para novo julgamento; b) e subsidiariamente falando, se não foi o recorrente quem indicou à Polícia o local onde haveria mais droga e identificou à Polícia os 2.º e 3.º arguidos, ele próprio só seria responsável por um crime de consumo ilícito de estupefacientes, e não também pelo crime de tráfico ilícito de estupefacientes, pelo que atendendo a essa colaboração sua prestada para a descoberta da verdade, a pena do seu crime de tráfico deveria ser especialmente atenuada nos termos do art.º 18.º da Lei de droga, de maneira que dentro da moldura penal resultante dessa atenuação especial poderia ser ele punido numa pena entre três anos e seis meses e quatro anos de prisão, até porque, fosse como fosse, a sua conduta seria menos grave do que a do 2.º arguido (cfr. com mais detalhes, a motivação do recurso apresentada a fls. 534 a 542 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Digno Procurador-Adjunto junto do Tribunal a quo no sentido de improcedência da argumentação do recorrente (cfr. a resposta de fls. 548 a 549v).
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 571 a 573), pugnando também pela manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se o seguinte:
– a fundamentação fáctica e jurídica do acórdão recorrido encontra-se escrita a fls. 515v a 521v dos autos, cujo teor se dá por aqui integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
– o Tribunal a quo absolveu o 3.º arguido da inicialmente acusada prática, em co-autoria material com o 1.º arguido ora recorrente e o 2.º arguido não recorrente, de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Pois bem, quanto à questão principal de alegada existência da contradição insanável da fundamentação no acórdão recorrido, é de observar que atento o pensamento legislativo do art.º 391.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, o 1.º arguido ora recorrente não pode recorrer desse aresto com fundamento de que foi erradamente absolvido o 3.º arguido, para pretender fazer sindicar, mas processualmente em desfavor deste arguido, da justeza desta absolvição, pelo que fica prejudicado o conhecimento deste vício aludido no art.º 400.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Penal (uma vez que os factos provados e não provados citados pelo recorrente para sustentar a verificação deste vício têm a ver com a inicialmente acusada participação do 3.º arguido no crime de tráfico de estupefacientes).
E agora do pedido da atenuação especial da pena nos termos do art.º 18.º da Lei de droga: há que naufragar esta tese do recorrente, porquanto é jurisprudência constante deste TSI de que só é de accionar o mecanismo de atenuação especial da pena permitido neste preceito legal quando o contributo dado pelo agente na recolha de prova for decisivo para o desmantelamento de grupo ou organização de tráfico ilícito de droga.
Entretanto, como da matéria de facto dada por provada no acórdão recorrido resultam constatadas a posição relativamente subalterna do recorrente em relação ao 2.º arguido na prática da conduta de tráfico ilícito de estupefacientes (notando-se que o recorrente e o 2.º arguido foram igualmente condenados em primeira instância em sete anos e seis meses de prisão pela co-autoria de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes), e a contribuição dada pelo recorrente para o reconhecimento do 2.º arguido e para a identificação do local de guarda da droga em causa, há que reduzir em termos gerais a pena do tráfico de estupefacientes do recorrente, aos padrões plasmados nos art.os 40.º, n.os 1 e 2, e 65.º, n.os 1 e 2, do Código Penal. Assim ponderando, é de passar a condenar o recorrente em seis anos e nove meses de prisão pelo crime de tráfico ilícito de estupefacientes, e na nova pena única de seis anos e dez meses de prisão (resultante do cúmulo jurídico, operado nos termos do art.º 70.º, n.os 1 e 2, do Código Penal, dessa nova pena do tráfico de estupefacientes com a pena de dois meses de prisão já achada pelo Tribunal recorrido para o crime de consumo de estupefacientes dele).
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em conceder parcial provimento ao recurso, passando a condenar o arguido recorrente na pena de seis anos e nove meses de prisão pela co-autoria material de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes do art.º 8.º, n.º 1, da Lei n.º 17/2009, de 10 de Agosto, e na pena única de seis anos e dez meses de prisão (resultante do cúmulo jurídico desta pena com a pena já achada no acórdão recorrido para o seu crime de consumo ilícito de estupefacientes do art.º 14.º da mesma Lei).
Pagará o recorrente 2/3 das custas do recurso, com duas UC de taxa de justiça em correspondência a esse grau de decaimento do recurso.
Macau, 4 de Maio de 2017.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)



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