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Processo nº 1068/2015
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 11 de Maio de 2017
Descritores:
-Revisão de sentença
-Divórcio

SUMÁRIO:

I. Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.

II. Quanto aos requisitos relativos à competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, o tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do nº1, do artigo 1200º do Código de Processo Civil, negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.



Proc. nº 1068/2015

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I - Relatório
I - A, do sexo feminino, divorciada, de nacionalidade chinesa, titular do BIRPM n.º XXX, residente no XXX, Macau, vem requerer a revisão e confirmação da sentença que decretou o divórcio entre si e B.
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O requerido, representado pelo MP, porque citado editalmente, não apresentou contestação.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos Processuais
O tribunal é absolutamente competente.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1 - A requerente e o requerido contraíram casamento em 27 de Outubro de 2005, sob o registo na Conservatória do Registo de Casamentos do Instituto de Assuntos Civis da Cidade de Kaiping da Província de Guangdong da RPC (doc. 1).
2 - Em 20 de Abril de 2011, o Tribunal Popular da Cidade de Kaiping da Província de Guangdong da RPC dissolveu a relação matrimonial por meio de divórcio, cujo teor consta duma conciliação cível, para os efeitos jurídicos adequados, aqui se dá por integralmente reproduzido (vide doc. 2).
3 – O teor da decisão judicial é o seguinte:
“CONCILIAÇÃO CÍVEL
N.º 414 da série Jiang Kai Fa Min Yi Chu Zi (2011)
Autor, B, do sexo masculino, nascido a 21 de Fevereiro de 1982, de etnia Han, residente na Província de Guangdong, Cidade de Kaiping, XXX e actualmente na XXX.
Ré, A, do sexo feminino, nascida a 13 de Fevereiro de 1984, residente da RAEM, residente no XXX, Macau.
Após admitida a acção de divórcio litigioso intentada, em 20 de Abril de 2011, pelo autorBcontra a ré A, este Tribunal formou o juízo colectivo e presidiu a audiência de julgamento, de forma aberta, em processo comum nos termos da lei. O autorB e a ré A compareceram na acção. O autor alegou que ele e a ré contraíram o casamento sob o registo, em 27 de Outubro de 2005, e não tinham filhos, veio o autor intentar a acção de divórcio com fundamento de ruptura conjugal, uma vez que os dois não se conheceram muito bem e contraíram casamento sem prudência, viveram em separação a longo tempo.
Durante o processo de audiência, a ré afirmou o que o autor alegou, consentindo o divórcio.
Durante o processo de conhecimento da causa, tendo presidido a conciliação este Tribunal, as partes chegaram voluntariamente ao seguinte acordo:
O autorB e a ré A chegaram ao acordo de divórcio.
A quantia no valor de RMB150,00 (metade das custas de admissão no valor de RMB300,00) fica a cargo do autor A.
As partes acordaram em que esta conciliação produzirá efeitos jurídicos depois de por assinatura ou impressão digital.
Este Tribunal confirmou o acordo supracitado por não violar a lei.”
4 - A sentença transcrita transitou em julgado (vide doc. 2 e 3).
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IV – O Direito
1. Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida;
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública. 2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”
Neste tipo de processos - de revisão formal - não se conhece do fundo ou do mérito da causa, uma vez que o Tribunal se limita a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento, nem da questão de facto, nem de direito.
Vejamos, então, os requisitos previstos no artigo 1200º do CPC.
Os documentos constantes dos autos reportam e certificam a situação invocada pela requerente. Revelam, além da autenticidade, a inteligibilidade da decisão do Tribunal competente da RPC, que homologou o acordo de dissolução do casamento que a unia ao requerido.
Por outro lado, a decisão em apreço não conduz a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública da RAEM (cfr. art. 20º e 273º do C.C.). Reunidos estão, pois, os requisitos de verificação oficiosa do art. 1200º, n.1, als. a) e f), do CPC.
Além destes, não se detecta que os restantes (alíneas b) a e)) constituam aqui qualquer obstáculo ao objectivo a que tendem os autos.
Na verdade, também resulta da documentação dos autos que a decisão judicial já transitou.
Acrescenta-se ainda que a decisão foi proferida por entidade competente face à lei em vigor na República Popular da China não versa sobre matéria exclusiva da competência dos tribunais de Macau, face ao que consta do art. 20º do Cod. Proc. Civil.
Também não se vê que tivesse havido violação das regras de litispendência e caso julgado ou que tivessem sido violadas as regras da citação no âmbito daquele processo ou que não tivessem sido observados os princípios do contraditório ou da igualdade das partes.
Posto isto, tudo se conjuga para a procedência do pedido (cfr. art. 1204º do CPC).
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V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder a revisão e confirmar a decisão de divórcio proferida pelo Tribunal Popular da Cidade de Kaiping da Província de Guangdong da RPC que decretou o divórcio entre A e B, nos exactos e precisos termos acima transcritos.
Custas pela requerente.
TSI, 11 de Maio de 2017
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong



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