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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------------
--- Data: 24/05/2017 ---------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. José Maria Dias Azedo -----------------------------------------------------------------

Processo nº 370/2017
(Autos de recurso penal)

(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)

Relatório

1. B (B), (1°) arguido com os restantes sinais dos autos, respondeu em audiência Colectiva no T.J.B., vindo a ser condenado como autor material da prática em concurso real de 1 crime de “tráfico de estupefacientes” e 1 outro de “consumo ilícito de estupefacientes”, p. e p. pelos art°s 8, n.° 1 e 14° da Lei n.° 17/2009, fixando-lhe o Tribunal as penas parcelares de 4 anos e 6 meses e 2 meses de prisão respectivamente, e, em cúmulo jurídico, a pena única de 4 anos e 7 meses de prisão; (cfr., fls. 370 a 379-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado, o arguido recorreu, imputando ao Acórdão recorrido o vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”, pugnando pela sua condenação como autor de 1 crime de “produção e tráfico de menor gravidade”, p. e p. pelo art. 11° da dita Lei, pedindo também a redução e suspensão da execução da pena em que foi condenado; (cfr., fls. 402 a 410).

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Respondendo, diz o Ministério Público que o recurso não merece provimento; (cfr., fls. 423 a 428).

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Neste T.S.I., juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:

“B, identificado nos autos, recorre do acórdão condenatório de 24 de Fevereiro de 2017, que lhe impôs uma pena de prisão de 4 anos e 7 meses, resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares de 4 anos e 6 meses pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes previsto e punível pelo artigo 8.°, n.° 1, da Lei 17/2009, e de 2 meses pela prática de um crime de consumo de estupefacientes previsto e punível pelo artigo 14.° da referida Lei 17/2009.
Na motivação e respectivas conclusões coloca à consideração do tribunal de recurso o vício de insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, de que diz padecer o acórdão recorrido, pedindo a revogação da decisão impugnada e a sua substituição por outra que, em vez de o condenar pelo crime do artigo 8.°, n.° 1, o condene pelo crime do artigo 11.°, n.° 1, da Lei 17/2009, fixando, a final uma pena inferior a 3 anos de prisão, com suspensão da sua execução pelo período de dois anos.
Estamos em crer que não lhes assiste razão, exactamente pelos fundamentos avançados na resposta do Ministério Público em primeira instância.
O recorrente parte de um pressuposto errado para justificar a sua tese. E o erro reside em considerar que, ao peso de 3,993 gramas considerado no acórdão recorrido como produto destinado a venda, haveria que retirar a porção de estupefaciente destinado ao consumo do próprio recorrente.
É certo que o tribunal considerou que o recorrente é consumidor, e puniu-o, aliás, também a esse título. Mas, dada a matéria provada, é seguro que o tribunal não necessitava de fazer a operação de destrinça entre o que, daquelas 3,993 gramas, era para consumo próprio do recorrente e aquilo que, dessas 3,993 gramas, ficava destinado a venda. Na verdade, de acordo com a matéria considerada provada nos pontos 13 a 15, o recorrente, por já ter consumido parte da droga que anteriormente trouxera consigo, e receando ser censurado pelo Ah XX, solicitou ajuda ao co-arguido C, o qual, deslocando-se para Macau na madrugada de 29 de Novembro de 2015, ajudou o recorrente a “rentabilizar”, através de mistura, cerca de 5 gramas de Ketamina, que reembalaram, para venda aos compradores de estupefacientes. Pois bem, foi esta a Ketamina que viria a ser apreendida na operação da noite de 29 e madrugada de 30 de Novembro, cujo peso líquido puro perfaz as referidas 3,993 gramas. Portanto, provado como ficou que esta quantidade de droga estava destinada a venda, é óbvio que o tribunal não carecia de apurar o que quer que fosse quanto a um hipotético consumo dessa droga por parte do recorrente. Sob pena de, aí sim, poder incorrer em contradição.
Não há dúvida de que a referida porção de 3,993 gramas, destinada a venda, como vimos, excede a quantidade de referência de consumo para cinco dias. Portanto, é de afastar a hipótese de punição por tráfico de menor gravidade.
E sendo assim, como é, não há qualquer margem para diminuição da pena, ao ponto de comportar a suspensão da respectiva execução.
Em suma, improcedem os fundamentos do recurso e os reparos que dirige ao acórdão recorrido, pelo que o nosso parecer vai no sentido de ser negado provimento ao recurso”; (cfr., fls. 527 a 528).

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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão “provados” e “não provados” os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 373 a 376, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou como autor de 1 crime de “tráfico de estupefacientes” e outro de “consumo ilícito de estupefacientes”, p. e p. pelos art°s 8, n.° 1 e 14° da Lei n.° 17/2009, fixando-lhe o Tribunal as penas parcelares de 4 anos e 6 meses e 2 meses de prisão, respectivamente, e, em cúmulo jurídico, a pena única de 4 anos e 7 meses de prisão.

Considera que o mesmo padece de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”, pugnando pela sua condenação como autor de 1 crime de “produção e tráfico de menor gravidade”, p. e p. pelo art. 11° da dita Lei, pedindo também a redução e suspensão da execução da pena em que foi condenado.

Porém, e como se deixou adiantado, evidente se nos apresenta a improcedência do recurso.

Vejamos.

Repetidamente temos afirmado que o vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” apenas ocorre “quando o Tribunal não se pronuncia sobre toda a matéria objecto do processo”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 19.01.2017, Proc. n.° 549/2016, de 16.03.2017, Proc. n.° 164/2017 e de 30.03.2017, Proc. n.° 169/2017, podendo-se também sobre o dito vício em questão e seu alcance, ver o recente Ac. do Vdo T.U.I. de 24.03.2017, Proc. n.° 6/2017).

E, no caso, como – bem – se nota no transcrito Parecer do Ministério Público, (que aqui se dá como reproduzido), claro é que inexiste o alegado vício de “insuficiência”, já que o Tribunal a quo apreciou e emitiu pronúncia sobre toda a “matéria objecto do processo”, elencando a factualidade da acusação que resultou “provada” e não provada, (notando-se que a contestação pelo recorrente apresentada era meramente “tabelar”), e fundamentando, em nossa opinião, adequadamente, esta sua decisão.

Por sua vez, evidente se nos apresenta também a inexistência do assacado “vício” assim como correcta se mostra a “qualificação jurídico-penal” da conduta do ora recorrente, pois que, inversamente ao que este alega, e para além de apurado estar que a “Ketamina” apreendida nos autos – com o peso total líquido de 3,993g – era para “tráfico”, não se pode esquecer que “provado” ficou ainda que o ora recorrente veio a Macau na madrugada do dia 28.11.2015, trazendo consigo 10 a 14 gramas de Ketamina para aqui vender de acordo com instruções de um tal “AH XX”, o que efectivamente veio a suceder, tendo, no dia 30.11.2015, pelas 02H20, efectuado uma transacção de uma porção (0,399g) deste estupefaciente com D, pela qual recebeu MOP$500,00.

É verdade que provado está também que na sua estadia em Macau, consumiu parte do estupefaciente que trouxe para venda, todavia resulta claro da factualidade dada como assente que o “remanescente”, (0,761g + 0,513g + 2,32g, que com a soma das 0,399g vendidas ao D, perfaz o total de 3,993g), era destinado ao “tráfico”.

E, parente isto, sendo a quantidade de referência para uso diário desta substância de 0,6 g, mostra-se-nos que evidente é que a de “Ketamina” em questão nos presentes autos é superior à prevista no art. 11° da Lei n.° 17/2009 para efeitos da pretendida qualificação da conduta do ora recorrente como a prática de 1 crime de “tráfico de menor quantidade”, manifestamente improcedente se apresentando o recurso na parte em questão.

E, então, aqui chegados, pouco há a dizer.

Com efeito, a peticionada “redução da pena” e “suspensão da sua execução” eram consequências que o recorrente extraía da aludida “alteração da qualificação jurídico-penal da sua conduta”, e, como se viu, sendo esta inviável, visto está que aquelas pretensões deixam de ter qualquer justificação (de facto e de direito).

Seja como for, não se deixa de consignar também que face à factualidade dada como provada, atenta a moldura penal para o crime de “tráfico de estupefacientes” – 3 a 15 anos de prisão; cfr., art. 8° da Lei n.° 17/2009 – e tendo presentes os critérios do art. 40° e 65° do C.P.M., motivos não há para se alterar a pena fixada para o dito crime, o que, por sua vez, torna inaplicável o art. 48° do C.P.M. para uma eventual suspensão da execução da pena, por em causa estar uma pena de prisão em medida “superior a 3 anos”.

Dest’arte, e sendo o presente recurso “manifestamente improcedente”, impõe-se a sua rejeição.

Decisão

4. Em face do exposto, decide-se rejeitar o recurso.

Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 4 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).

Em conformidade com o decidido, e por não se terem alterados os pressupostos que levaram à prisão preventiva do arguido ora recorrente, aguardará o mesmo os ulteriores termos processuais na mesma situação processual.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, devolvam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 24 de Maio de 2017

José Maria Dias Azedo

Proc. 370/2017 Pág. 10

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