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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------
--- Data: 25/05/2017 --------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo -----------------------------------------------------------------------------
Processo nº 393/2017
(Autos de recurso penal)

(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)

Relatório

1. A, arguido com os restantes sinais dos autos, vem recorrer do Acórdão do T.J.B. que o condenou como autor da prática de 1 crime de “furto qualificado”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 2, al. e) do C.P.M., na pena de 4 anos de prisão, alegando – em síntese – que excessiva é a pena que lhe foi decretada e que lhe devia ser suspensa na sua execução; (cfr., fls. 249 a 250-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Respondendo, diz o Ministério Público que o recurso não merece provimento; (cfr., fls. 255 a 259).

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Neste T.S.I., juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação (cfr. fls.249 a 250v. dos autos), o recorrente pediu a redução da pena aplicada no Acórdão recorrido e a suspensão da execução da pena a decretar, arrogando que a razão determinante da sua prática do crime consistia em carecer dinheiro para curar a doença da sua avó, era primário e confessou os factos que lhe tinham sido imputados.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações da ilustre Colega na sua Resposta (vide. fls.255 a 259 dos autos), no sentido do não provimento do recurso em exame.
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No ordenamento jurídico de Macau, a atenuação especial da pena é de aplicação excepcional, e não é qualquer das circunstâncias previstas no n.°2 do art.66° do Cód. Penal ou semelhantes logo capaz de accionar o regime de atenuação especial, antes tem de apreciar todo o quadro da actuação do agente para ponderar a atenuação especial e encontrar a medida concreta da pena. Pois, «Para poder beneficiar da atenuação especial da pena prevista no art.66.° do Código Penal, é necessário que se verifica uma situação de diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena, em resultado da existência de circunstâncias com essa virtualidade.» (Acórdão do TUI no Processo n.°20/2004)
Em boa verdade, o recorrente não apresentou mínima prova capaz de demonstrar a doença da sua avó. De outra banda, à luz das doutrinas e jurisprudências autorizadas, afigura-se-nos que a arrogada carência de dinheiro para curar a doença da avó não pode ser equacionada na previsão na d) do n.°2 do art.66° do Código Penal.
Repare-se que as circunstâncias arrogadas pelo recorrente em seu favor – primário e confissão do crime (認罪聲明) – vêem devidamente ponderadas e valorizadas pelo Tribunal a quo ao graduar a pena aplicada no quatro anos de prisão. E não se descortinas, de acordo com a matéria de facto provada, outras circunstâncias de atenuação especial.
Para os devidos efeitos, impõe-se ter presente que são sensíveis a elevada gravidade da ilicitude e a forte intensidade do dolo – para além do dolo directo no crime de furto qualificado já consumado, manifestou ele a intenção e vontade de voltar a cometer outro crime na RAEM, pois bem, o Tribunal a quo deu como provado o seguinte facto: «11) 2016年6月21日中午,嫌犯再次經關閘邊境站入境澳門時隨即被警方攔截進行調查。»
De outro lado, não se pode perder da vista o facto dado por provado no sentido de que «13) 但嫌犯從XX第XX座XX樓XX室單位內拿去的財物仍下落不明。» Este facto provado, só por si, demonstra convincentemente que falta ao recorrente o arrependimento sincero e, assim, é fortemente censurável a sua conduta.
Nesta linha de perspectiva e tomando como parâmetro a moldura penal consagrada no n.°2 do art.198° do CPM – a de prisão de dois a dez anos, entendemos que a pena de quatro anos de prisão, aplicada pelo tribunal a quo no Acórdão em exame, é equilibrada e inatacável.
Nos termos do preceito no n.°1 do art.48° do CPM, a justeza da pena aplicada de 4 anos de prisão determina necessariamente, não só o decaimento do pedido de redução desta pena, mas também a manifesta inviabilidade do pedido de suspensão da execução.
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O n.°1 do art.48° do CPM revela que a suspensão da pena de prisão depende do preenchimento cumulativo de dois pressupostos: o formal e objectivo traduz em a pena aplicada não ser superior a três anos; e o material traduz-se na razoável conclusão (do julgador) de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam, adequada e suficientemente, as finalidades da punição. E à luz deste segmento legal, tal conclusão tem de angular-se em apreciação e valorização prévias, de índole prudente e prognóstico, de personalidade do agente, das condições da sua vida, da conduta anterior e posterior ao crime e das circunstâncias deste.
Interessa ter na mente que mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão, não será decretada a suspensão se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. (Acórdãos do TSI nos Processos n.°242/2002, n.°190/2004 e n.°192/2004)
Reflectindo a personalidade do recorrente – dolo directo, intenção de voltar a cometer outro crime em Macau, gravidade da ilicitude, a não revelação do paradeiro dos bens por si subtraídos e a manifesta falta de arrependimento, não podemos deixar de entender que é decerto infundado e descabido o pedido de suspensão da execução.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso”; (cfr., fls. 273 a 274-v).

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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 241 a 242-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou como autor da prática de 1 crime de “furto qualificado”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 2, al. e) do C.P.M., na pena de 4 anos de prisão.

Entende que “excessiva” é a pena, que devia ser “especialmente atenuada”, e que devia ser “suspensa na sua execução”, nenhuma razão lhe assistindo.

Vejamos.

Ao crime pelo recorrente cometido cabe a pena de prisão 2 a 10 anos; (cfr., art. 198°, n.° 2, al. e) do C.P.M.).

Nos termos do art. 66° do C.P.M.:

“1. O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
2. Para efeitos do disposto no número anterior são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:
a) Ter o agente actuado sob influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência;
b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida;
c) Ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados;
d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta;
e) Ter o agente sido especialmente afectado pelas consequências do facto;
f) Ter o agente menos de 18 anos ao tempo do facto.
3. Só pode ser tomada em conta uma única vez a circunstância que, por si mesma ou em conjunto com outras, der lugar simultaneamente a uma atenuação especial da pena expressamente prevista na lei e à atenuação prevista neste artigo”.

Como temos vindo a considerar “a atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 13.12.2016, Proc. n.° 258/2016, de 19.01.2017, Proc. n.° 530/2016 e de 26.01.2017, Proc. n.° 840/2016).

No caso, para justificar a pretendida atenuação, diz o recorrente que “cometeu o crime por precisar de dinheiro para assistir médicamente a sua avó”, o que não está “provado”, não se podendo ter em conta o assim alegado, invocando também a alínea d) do n.° 2 do art. 66° do C.P.M., onde se prevê como circunstância para uma (possível) atenuação especial da pena o facto de “Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta”.

Contudo, também não se pode dar por verificada tal “circunstância”, bastando para tal conclusão atentar-se que o “furto” dos autos ocorreu no dia 30.04.2015, vindo o arguido a ser detido pouco mais de (apenas) 1 ano depois, (em 21.06.2016), e julgado em 22.02.2017, não se podendo assim considerar que decorreu “muito tempo”.

Não se olvida que do Acórdão recorrido consta que o arguido “admitiu os factos” em audiência de julgamento.

Todavia, e independentemente do demais, tal “confissão” tem pouco valor atenuativo visto que o ora recorrente já estava identificado, tendo sido detido à entrada de Macau, trazendo (novamente) consigo equipamento próprio para abrir e arrombar fechaduras, (como fez da vez que veio para cometer o furto dos autos), não se podendo considerar a situação dos autos como “extraordinária” ou “excepcional” para se poder accionar o comando legal do art. 66° do C.P.M. para efeitos de uma atenuação especial como pretendido é.

Por sua vez, cabe também dizer que nenhuma censura nos merece a medida concreta da pena, fixada em 4 anos de prisão, pois que, tendo presente a moldura penal aplicável, atento os critérios do art. 40° e 65° do mesmo C.P.M., e assente estando que o recorrente veio intencionalmente do Continente a Macau para cometer o crime dos autos, trazendo (já) consigo “equipamento” para tal efeito, evidente é o seu dolo directo e – muito – intenso, a justificar a pena em questão, a 2 anos dos mínimo legal e a 6 anos do seu máximo, não sendo de se olvidar também as fortes necessidades de prevenção criminal deste tipo de crime de “furto por arrombamento”.

Com efeito, há que ter presente que “Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 19.01.2017, Proc. n.° 530/2016, de 09.03.2017, Proc. n.° 180/2017 e 23.03.2017, Proc. n.° 241/2017).

E, acompanhando o Tribunal da Relação de Évora temos igualmente considerado:

“I - Também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico, pelo que o tribunal de recurso deve intervir na pena (alterando-a) apenas e só quando detectar incorrecções ou distorções no processo de determinação da sanção.
II - Por isso, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de apreciação livre reconhecida ao tribunal de 1ª instância nesse âmbito.
III - Revelando-se, pela sentença, a selecção dos elementos factuais elegíveis, a identificação das normas aplicáveis, o cumprimento dos passos a seguir no iter aplicativo e a ponderação devida dos critérios legalmente atendíveis, justifica-se a confirmação da pena proferida”; (cfr., Ac. de 22.04.2014, Proc. n.° 291/13, in “www.dgsi.pt”, aqui citado como mera referência, e Decisão Sumária do ora relator de 14.10.2016, Proc n.° 695/2016, de 04.01.2017, Proc. n.° 887/2016 e de 07.02.2017, Proc. n.° 35/2017).

Recentemente, e no mesmo sentido decidiu este T.S.I. que: “Não havendo injustiça notória na medida da pena achada pelo Tribunal a quo ao arguido recorrente, é de respeitar a respectiva decisão judicial ora recorrida”; (cfr., o Ac. de 24.11.2016, Proc. n.° 817/2016).

Dest’arte, e em causa não estando uma pena de prisão em “medida não superior a 3 anos”, inviável é também a pretendida suspensão da execução da pena.

Tudo visto, e apresentando-se o presente recurso manifestamente improcedente, resta decidir em conformidade.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, decide-se rejeitar o recurso.

Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 4 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 25 de Maio de 2017
Proc. 393/2017 Pág. 14

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