Proc. nº 491/2016
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 11 de Maio de 2017
Descritores:
-Licenciatura
-Habilitações académicas não reconhecidas
-Diploma não reconhecido
-Provimento nulo
SUMÁRIO:
I. Não sofre do vício de erro sobre os pressupostos de facto o acto administrativo que declara nulo o provimento de funcionário que teve por base um diploma de licenciamento obtido numa universidade chinesa que, à época, ainda não tinha o curso superior reconhecido pelas autoridades competentes da RPC.
II. Se o art. 16º, nº2, do ETAPM estabelece que “Os provimentos efectuados com inobservância dos requisitos estabelecidos nas alíneas a), c), d), e) e f) do nº1 e do nº2 do art. 10º são nulos”, e se a alínea c), do nº1, do art. 10º do mesmo diploma (artigo que é destinado aos requisitos gerais de provimento) respeita precisamente à “habilitação académica ou profissional”, então isso significa que a declaração de nulidade por falta do referido requisito se apresenta como actividade vinculada e não discricionária.
III. Face à conclusão obtida em II, não se pode dar por violados os princípios da justiça e da boa fé, que funcionam como limites à actividade discricionária.
Proc. nº 491/2016
Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.
I - Relatório
A, Recorrente, titular do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau n.º XXXXXXX(2), residente em Macau, na ......, melhor identificada no procedimento infra referenciado, interpõe recurso contencioso da decisão do Exmº Senhor SECRETÁRIO PARA OS TRANSPORTES E OBRAS PÚBLICAS, datada de 20 de Maio de 2016 que declarou a nulidade do seu provimento como técnico da área de registo na inscrição marítima.
Na petição inicial formulou as seguintes conclusões:
“A) A decisão recorrida é ilegal por erro nos pressupostos de facto, na medida em que não atendeu ao facto de que a Recorrente está habilitada com um curso superior, que pode qualificar-se como bacharelato,
B) Sendo certo que a habilitação legalmente exigida para o cargo de «técnico», no qual foi provida, é a habilitação com «curso superior»,
C) Não tendo, necessariamente, de ser nem de se qualificar como «licenciatura»,
D) A decisão recorrida está, ainda inquinada, por violação de lei,
E) Ao sobrepor-se à avaliação e decisão discricionária do júri que seleccionou a Recorrente, quando do concurso de ingresso, e, bem assim.
F) Por violação dos princípios da justiça e da boa fé, estatuídos nos artºs. 7.º e 8.º do Código do Procedimento Administrativo,
G) Em especial a confiança suscitada na Recorrente (n.º 2 do art.º 8.º do Código do Procedimento Administrativo), sedimentada ao longo de todo o tempo em que prestou serviço, e durante o qual respondeu cabalmente às exigências do respectivo cargo, demonstrando - para além de habilitada com curso superior, - estar materialmente habilitada com as necessárias competências para as respectivas funções.
H) A decisão recorrida errou na interpretação e aplicação, nomeadamente, do disposto no art.º 14.º do Decreto-Lei n.º 11/91/M, de 4 de Fevereiro, e no Mapa n.º 2 do Anexo I à lei n.º 14/2009, de 3 de Agosto.
I) A decisão recorrida errou na interpretação e aplicação do disposto nos artºs. 10.º, n.º 1 al. c), 12.º, n.º 1 al. c), 15.º e 16.º, n.º 2 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau”.
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A entidade recorrida apresentou contestação, pugnando pela improcedência do recurso.
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Não houve lugar a alegações facultativas.
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O digno Magistrado do MP emitiu parecer no sentido da inverificação dos vícios suscitados em termos que por ora aqui damos por integralmente reproduzidos.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão bem representadas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1 - Em suplemento ao Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n. º 9, II Série, de 27 de Fevereiro de 2013, foi publicado o aviso de abertura de concurso comum de ingresso, externo, para o preenchimento de lugares de técnico de 2ª classe, 1º escalão (área de registo na inscrição marítima) da Direcção dos Serviços Marítimos e de Água, ao qual podiam candidatar-se, nos termos da alínea c) do art.º 2º do aviso, todos os indivíduos que estejam habilitados com o curso superior de Administração Pública.
2 - A foi classificada em 2º lugar, na lista definitiva do concurso supracitado e começou a desempenhar funções de técnico, 2ª classe, 1 º escalão, em 24 de Fevereiro de 2014 nessa Direcção.
3 - Conforme o ofício do CCAC n.º 0352/DSPJ/2015, o CCAC recebeu uma denúncia contra A, revelando que a sua “carta de curso”, emitida pelo “Beijing Geely Institute” (anteriormente designado por Beijing Geely University), não preenche as habilitações académicas do curso superior na área da Administração Pública.
4 - Em 30 de Abril de 2015, a Direcção recebeu o ofício n.º 0352/DSPJ/2015 do Comissariado contra a Corrupção, onde se indicou que tinha sido recebida uma participação contra a aludida trabalhadora, dando conta de que o diploma da mesma, emitido por Beijing Geely University (o então University of Beijing Geely), não era de grau académico de nível superior da área de Administração Pública.
5 - Após a recepção do ofício n.º 0352/DSPJ/2015 do CCAC, a Direcção de Serviços instaurou o processo de verificação da habilitação académica da trabalhadora em apreço.
6 - A Direcção oficiou ao Gabinete de Apoio ao Ensino Superior e à Direcção dos Serviços de Administração e Função Pública, solicitando-lhes que emitissem parecer para saber se o diploma de licenciatura em Administração de A (A), emitido pela Faculdade de Cultura e Economia de University of Beijing Geely, era ou não de grau académico de nível superior.
7 - Por meio dos ofícios n.ºs 229/GEP/GAES/2015 e 306/GEP/GAES/2015, o GAES emitiu parecer sobre o aludido diploma de licenciatura em Administração, emitido pela Faculdade de Cultura e Economia de University of Beijing Geely.
8 - Foi lavrada a proposta nº 31/DAF/DA/2016, com o seguinte teor:
“ (...)
Apontou o GAES no ofício nº 229/GEP/GAES/2015:
De acordo com as informações encontradas no site “China Higher-education Student Information”1(doravante designado por “CHSI”) criado por “China Higher Education Student Information and Career Center” que é um órgão subordinado ao Ministério da Educação da República Popular da China e competente para administrar as habilitações de nível superior, “University of Beijing Geely” é uma escola superior privada, reconhecida pelo Ministério da Educação da RPC, que lecciona ensino superior politécnico comum desde 2001, apenas admitia bacharéis e não tinha licenciados nem competência de conferir habilitação/grau académico de licenciatura.
Em 30 de Abril de 2014, o Ministério da Educação concordou com a criação de “Beijing Geely University” com base em “University of Beijing Geely”, bem como autorizou a referida universidade a ministrar ensino de licenciatura e conferir habilitação/grau académico, de licenciatura2, pelo que esta só admitiu, pela primeira vez, estudantes de licenciatura em 2014 e previu que só formaria os primeiros licenciados em 2018. Assim sendo, no banco de dados de CHSI não existem informações relativas às habilitações de licenciatura de “University of Beijing Geely” ou “Beijing Geely University”.
(...)
Face aos diplomas de “licenciatura” atribuídos em 15 de Junho de 2011 por “University of Beijing Geely”, conforme as informações fornecidas por CHSL na dada altura (2011), a aludida “universidade” não tinha competência para conferir habilitação de “licenciatura”, a par disso, tal habilitação de “licenciatura” não é reconhecida pelo Ministério da Educação”.
Indicou o GAES no ofício nº 306/GEP/GAES/2015:
“ (...)
Tal como foi referido nas informações disponibilizadas em CHSL desde 2001, “University of Beijing Geely” foi autorizada a leccionar ensino superior politécnico comum, apenas admitia bacharéis e não tinha licenciados nem competência de conferir habilitação/grau académico de licenciatura, posteriormente, em 2014, “University of Beijing Geely” passou a ser designada como “Beijing Geely University” mediante concordância do Ministério da Educação, bem como foi autorizada a ministrar ensino de licenciatura e conferir habilitação/grau académico de licenciatura, pelo que esta só admitiu, pela primeira vez, estudantes de licenciatura em 2014 e previu que só formaria os primeiros licenciados em 2018. Assim sendo, no banco de dados de CHSI não existem ainda informações relativas às habilitações ou certificados de licenciatura da instituição em apreço.
(...)
Conforme o documento Jiaoxue (2004) n.º 25 (Ministério da Educação da RPC), a “Norma provisória de administração de registo electrónico de certificados do ensino superior” publicada em 5 de Fevereiro de 2001 pelo Ministério da Educação, Jiaofahan (2014) n.º 105 - oficio do Ministério da Educação relativo à concordância com a criação de Beijing Geely University com base em University of Beijing Geely... e os esclarecimentos dados por CHSL verifica-se que as “habilitações de licenciatura” atribuídas em 2011 por “University of Beijing Geely” não são reconhecidas pelo Ministério da Educação da RPC.
(...) na verificação de habilitações académicas, por lógica, o Governo da RAEM não reconhece as habilitações que não sejam reconhecidas pela autoridade competente do local onde as mesmas são atribuídas.
(...)
Nos termos das disposições do Regulamento Administrativo n.º 26/2003, a verificação de habilitações académicas compete ao júri do concurso e aos serviços ou entidades públicas interessadas ou que propõem o provimento.
(...) ”.
“ (…)
7) Por oficio “Jiaofahan 2014 n.º (105)”, de 30 de Abril de 2014, do Ministério da Educação da RPC (oficio do Ministério da Educação relativo à concordância com a criação de Beijing Geely University com base em University of Beijing Geely), concordou-se com a criação dos primeiros 6 cursos de licenciatura na aludida escola: engenharia de veículos; projecto e fabricação mecânica e sua automação; ciência e técnica de informática; marketing; gestão logística; e língua inglesa.
Como tal, só depois de 2014, o Ministério da Educação da RPC é que autorizou a criação dos primeiros cursos de licenciatura em University of Beijing Geely (actual “Beijing Geely University”), que, não abrangem o “curso de licenciatura em gestão administrativa” frequentado por A (A) na aludida escola.
Por outras palavras, no período compreendido entre Setembro de 2007 e Julho de 2011, A (A) frequentou o curso de licenciatura em gestão administrativa que foi criado, sem autorização do Ministério da Educação da RPC, por University of Beijing Geely.
8) A Direcção dos Serviços de Administração e Função Pública (ofício n.º 1511200002/DPRTSP-DPP) também emitiu parecer quanto à questão de a trabalhadora em causa estar ou não habilitada com o curso superior:
“ (...)
1. Nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 50 da Lei n.º 14/2009, a habilitação académica deve ser adequada ao exercício das funções.
2. De acordo com o Mapa 2 do Anexo 1 da lei supracitada, o curso superior é a habilitação académica adequada para o exercício das funções de técnico.
3. O art.º 12º do Decreto-Lei n.º 87/89/M, de 21 de Dezembro, prevê os meios para apuramento das habilitações académicas.
4. Esta Direcção sempre considerou que, no exercício das funções de técnico, o interessado deve apresentar documento comprovativo da titularidade da habilitação de grau superior adequada ao exercício das funções na carreira a que o mesmo seja concorrido.
5. Os artigos 14º, 15º e 16º do Decreto-Lei n. º 11/91/M, de 4 de Fevereiro, prevêem o seguinte:
Graus e diplomas
Artigo 14º
(Graus e diplomas)
1. No ensino superior são conferidos os seguintes graus:
a) Bacharel;
b) Licenciado;
c) Mestre;
d) Doutor.
2. No ensino superior podem ainda ser atribuídos diplomas para cursos de duração não inferior a um ano e certificados para cursos de pequena duração.
3. Todos os cursos que confiram grau académico carecem de aprovação prévia do Chefe do Executivo sob proposta da instituição de ensino superior.
4. As instituições privadas de ensino superior podem ser autorizadas a ministrar cursos conducentes à obtenção de graus diferentes dos previstos no presente artigo, os quais poderão ser reconhecidos nos termos previstos no presente diploma.
Artigo 15º
(Bacharelato)
1. O grau de bacharel é conferido:
a) Mediante a aprovação em todas as disciplinas, monografias, seminários e estágios previstos nos planos de estudo dos cursos ministrados em instituições do ensino superior;
b) Após a conclusão da primeira fase dos cursos conducentes ao grau de licenciatura desde que o respectivo plano de estudos contemple a existência de duas fases, tendo a primeira uma duração de três anos lectivos ou seis semestres.
2. A aprovação nos cursos que conferem o grau de bacharel comprova uma formação técnica necessária ao exercício de determinadas actividades profissionais.
3. As designações dos cursos de bacharelato serão fixadas no diploma da sua criação de acordo com os correspondentes ramos do conhecimento que constituem o objecto da escola em que se realizam, com indicação da respectiva opção, quando for caso disso.
4. Os cursos de bacharelato devem corresponder em regra a três anos lectivos ou seis semestres.
Artigo 16º
(Licenciatura)
1. O grau de licenciado é concedido mediante a aprovação em todas as disciplinas, monografias, seminários e estágios previstos nos planos de estudo dos cursos ministrados em instituições do ensino superior.
2. O grau de licenciado comprova sólida formação cultural, científica e técnica, a qual permite aprofundar conhecimentos com vista à especialização numa determinada área do saber e também, desde logo, uma adequada inserção profissional.
3. As designações dos cursos de licenciatura serão fixadas no diploma da sua criação de acordo com os correspondentes ramos do conhecimento que constituem o objecto da escola em que se realizam, com indicação da respectiva opção, quando for caso disso.
4. Os cursos de licenciatura podem revestir as seguintes modalidades:
a) Cursos com duração definida de acordo com a respectiva área científica, mas nunca inferior a quatro anos ou oito semestres, podendo os respectivos planos de estudos estar divididos em duas fases, com atribuição do grau de bacharel, após a conclusão da 1.ª fase;
b) Cursos de complemento ou especialização em determinada área do saber, com a duração de um ou dois anos lectivos, aos quais seja condicionada a matrícula e inscrição a indivíduos possuidores, no mínimo, do grau de bacharelou habilitação académica a esta legalmente equiparada, podendo ainda ser exigida aos candidatos experiência profissional adequada.
Face à verificação de habilitações académicas, o Regulamento Administrativo n.º 26/2003 prevê o seguinte:
A verificação de habilitações académicas consiste na confirmação de que as habilitações invocadas são as adequadas ao exercício de determinada função pública ou actividade profissional condicionada por intervenção de entidade pública ou para o prosseguimento de estudos e na aferição da idoneidade e autenticidade dos documentos comprovativos das habilitações académicas invocadas (vide art.º 1º)
Nos mesmos termos, a verificação de habilitações académicas nos níveis de ensino primário, secundário e superior compete, para efeitos de ingresso nos serviços e entidades públicas, ao respectivo júri do concurso (vide n.º 1 do art.º 2); a verificação de habilitações académicas nos níveis de ensino primário, secundário e superior do pessoal a prover em regime de contrato ou comissão de serviço, quando não haja lugar a concurso, é da competência dos serviços ou entidades públicas interessadas ou que propõem o provimento (vide n.º 2 do art.º 2).
Na verificação de habilitações académicas nos níveis de ensino primário, secundário ou superior, se o júri do concurso e os serviços ou entidades interessadas entenderem que há necessidade, poderão os mesmos solicitar parecer à Direcção dos Serviços de Educação e Juventude ou ao Gabinete de Apoio ao Ensino Superior.
(...) ”.
9) Os artigos 16º e 18º da “Norma provisória de administração de certificados do ensino superior comum” da República Popular da China prevêem o seguinte:
“Artigo 16º: Os certificados uniformizados são imprimidos com o seguinte conteúdo: “Diploma (certificado de conclusão da parte curricular) de Escola Superior Comum “, “Elaborado pelo Conselho Estadual de Educação da República Popular da China” e sinal contra falsificação.
Artigo 18º: Desde 1994, o Estado não reconhece os diplomas ou certificados de conclusão da parte curricular imprimidos sem o conteúdo: “Elaborado pelo Conselho Estadual de Educação”. Os certificados que foram atribuídos, antes da vigência da presente “Norma”, pelas escolas superiores comuns aos estudantes habilitados em conformidade com as respectivas regras do Conselho Estadual de Educação, são ainda reconhecidos pelo Estado e não é necessária a sua nova emissão”.
10) O artigo 13º da “Norma provisória de administração de registo electrónico de certificados do ensino superior” da República Popular da China prevê o seguinte:
“Artigo 13º: O regime de registo electrónico de diplomas (certificados de conclusão da parte curricular) foi criado e implementado em 2001. O Estado não reconhece os diplomas (certificados de conclusão da partir curricular) atribuídos a partir do referido ano que não se encontrem registados.
O tempo de atribuição de certificados é o tempo de reconhecimento de certificados registados”.
11) Indicou o CCAC no ofício n.º 0225/DSPJ/2016: “(...) relativamente à questão de provimento da trabalhadora em causa para exercício de funções de técnico nessa Direcção, conforme as informações obtidas, no momento da candidatura, tal trabalhadora apresentou a essa Direcção o diploma de licenciatura atribuída em 15 de Junho de 2011 por University of Beijing Geely, além do mais, por oficio n.º 229/GEP/GAES/2015, datado de 6 de Outubro de 2015, o GAES referiu perante essa Direcção que, “na dada altura (2011), a aludida “universidade” não tinha competência para conferir habilitação de “licenciatura”, a par disso, tal habilitação de “licenciatura” não é reconhecida pelo Ministério da Educação”, pelo que, obviamente, o diploma em apreço não comprova que a aludida trabalhadora esteja habilitada em licenciatura mencionada no diploma em causa.
Embora University of Beijing Geely seja reconhecida pelo Ministério da Educação da RPC, leccione ensino superior politécnico comum e admitisse bacharéis desde 2001, além disso, os cursos de licenciatura e superiores são, geralmente, considerados como cursos de natureza contínua e complementar, a legislação vigente em Macau não dispõe que os certificados de licenciatura atribuídos por unidade incompetente para conferir habilitação de licenciatura possam ser reconvertidos, ou considerados como certificados que comprovem aquisição de outras habilitações.
Na verdade, University of Beijing Geely não tinha, na altura, competência de ministrar ensino de licenciatura e conferir certificados de licenciatura; o curso frequentado pela aludida trabalhadora não (devia) ter sido apreciado e autorizado por unidade competente e, em consequência, não se verifica nenhuma garantia na sua aceitabilidade e qualidade; e o diploma em causa também não foi reconhecido pelo governo do local onde o mesmo era atribuído. Nestas circunstâncias, é discutível se, com base no diploma em causa, pode ou não a trabalhadora ser considerada como habilitada com o curso superior legal exigido para ingresso na carreira de técnico da Administração Pública da RAEM.
Assim sendo, só com base no diploma de licenciatura atribuído em 15 de Junho de 2011 por University of Beijing Geely que foi apresentado pela trabalhadora em causa no momento da candidatura, não se comprova que a trabalhadora esteja habilitada com o curso superior exigido pela carreira de técnico.
É de salientar que as habilitações académicas são requisitos gerais para o desempenho de funções públicas, e que os meios comprovativos das habilitações académicas são enumerados na legislação vigente, nomeadamente o certificado de reconhecimento emitido pela entidade competente. Na abertura do concurso, os requisitos gerais para o exercício de funções públicas devem verificar-se, nos termos legais, até ao termo do prazo para apresentação de candidaturas fixado no aviso de abertura do concurso, caso contrário, são nulos os provimentos. (alínea c) do n.º 1 do art.º 10º, alínea c) do n.º 1 do art.º 12º, art.º 15º e n.º 2 do art.º 16º do E.T.A.P.M., aprovado pelo Decreto-Lei n.º 87/89/M, de 21 de Dezembro) ”.
12) Esta Direcção tinha procurado informações sobre A (A) no site “China Higher-education Student Information” (http://www.chsi.com.cn), mas nele não encontrou informações relativas ao certificado dela.
13) Esta Direcção concordou com os pareceres emitidos pelos supramencionados serviços quanto à habilitação de A (A), pelo que, em 31 de Março de 2016, por meio do ofício n.º 14/DAF/DA/2016, esta Direcção instaurou, nos termos do n.º 2 do art.º 93º e art.º 94º do Código do Procedimento Administrativo, o procedimento de audiência escrita relativo à questão de A (A) ter preenchido ou não o requisito de habilitação académica exigido para exercício de funções de técnico de 2a classe, 1º escalão. A (A) recebeu o ofício n.º 14/DAF/DA/2016, em 1 de Abril de 2016, na Divisão Administrativa e dirigiu por escrito as suas sugestões à DSAMA em 18 de Abril.
Parte II
Análise das sugestões escritas de A (A)
14) Quanto à aceitabilidade da habilitação de A (A) na RPC
Apontou-se no “Anúncio Jiaoxue (2004) n.º 25” do Ministério da Educação da RPC (anúncio que reafirma que China Higher-education Student Information é o único site que fornece informações sobre os certificados comprovativos das habilitações académicas) que, desde 2001, se implementou neste país o regime de registo electrónico dos certificados comprovativos das habilitações literárias do curso de nível superior, pelo que o Ministério da Educação pediu a China Higher Education Student Information and Career Center que prestasse serviços de consulta e autenticação na rede de registo electrónico das habilitações literárias do curso de nível superior.
No “Anúncio Jiaoxue (2004) n.º 25”, o Ministério da Educação reafirmou que “China Higher-education Student Information” (http://www.chsi.com.cn) é o único site que fornece informações sobre os certificados comprovativos das habilitações literárias do curso de nível superior deste país, e que “China Higher Education Student Information and Career Center” é um órgão especializado a que foi conferido pelo Ministério da Educação o poder de autenticação das habilitações literárias do curso de nível superior.
Indicou-se no Anúncio Jiaoxue (2007) n.º 5 do Ministério da Educação da RPC (anúncio do Ministério da Educação relativo à autenticação das habilitações literárias do curso de nível superior) que, para além do “China Higher Education Student Information and Career Center” e a entidade de autenticação de habilitações que o representa, todas as outras unidades não têm competência para efectuar a autenticação das habilitações literárias do curso de nível superior. O “China Higher Education Student Information and Career Center” criou um procedimento e regime completo de autenticação de habilitações, bem como o sistema dos serviços da entidade representante aperfeiçoado foi disponibilizado ao público no site “China Higher-education Student Information” (http://www.chsi.com.cn).
Conforme os aludidos dois anúncios do Ministério da Educação da RPC, esta Direcção entendeu que o site “China Higher-education Student Information” (http://www.chsi.com.cn) foi reconhecido pelo Ministério da Educação da RPC e é o único site oficialmente reconhecido que fornece informações de plena aceitabilidade relativas aos certificados comprovativos das habilitações literárias do curso de nível superior da RPC.
No site “China Higher-education Student Information” (http://www.chsi.com.cn) não se encontraram informações relativas aos certificados de A (A), em conjugação com os factos mencionados no ponto 7) supra, esta Direcção entendeu que houve provas suficientes para apurarem que a habilitação de licenciatura em Administração conferida por University of Beijing Geely a A (A) não foi reconhecida pelo Ministério da Educação da RPC.
15) Quanto ao direito adquirido
O direito adquirido consiste num direito cujas condições para a sua criação foram completamente alcançadas, ou seja, num direito cujos factos jurídicos, como requisitos de geração do direito, foram todos ocorridos. O reconhecimento da eficácia do direito adquirido é fundamentado na plena legalidade da aquisição do direito. Isto quer dizer que o titular do direito adquirido tem de satisfazer todas as condições legalmente previstas para a criação do direito.
Tal como acima referido, o diploma de licenciatura em Administração de A (A), emitido, em 15 de Junho de 2011, pela Faculdade de Cultura e Economia de University of Beijing Geely não foi reconhecido pelo Ministério da Educação da RPC, pela que A (A) não possui habilitação de grau académico de nível superior da área de Administração Pública exigida pelo aviso de abertura do concurso comum, de ingresso externo, para o preenchimento de lugares de técnico de 2a classe (área de registo na inscrição marítima), publicado em suplemento ao Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 9, II Série, de 27 de Fevereiro de 2013.
A (A) não possui, desde logo, habilitação académica exigida pelo aviso de abertura do concurso, não satisfazendo as condições de habilitações académicas exigidas para exercício das funções na carreira de técnico, pelo que não goza do direito adquirido para exercer funções de técnico.
16) Quanto ao reconhecimento da habilitação académica de A (A) feito por outros serviços públicos
As actividades desenvolvidas pela DSAMA devem ser realizadas em conformidade com a lei, bem como com as demais regras e ordens vinculativas. A (A) enumerou nas suas sugestões escritas as decisões tomadas pelo Fundo de Acção Social Escolar da DSEJ, pela Polícia Judiciária e pela Direcção dos Serviços das Forças de Segurança de Macau relativamente aos seus pedidos, porém, tais decisões não são legalmente vinculativas para a DSAMA.
Nesta conformidade, a DSAMA ainda necessita de analisar e verificar, com base nos factos obtidos na investigação realizada, se A (A) possui ou não habilitação de grau académico de nível superior da área de Administração Pública exigida pelo aviso de abertura do concurso comum, de ingresso externo, para o preenchimento de lugares de técnico de 2a classe (área de registo na inscrição marítima), publicado em suplemento ao Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 9, II Série, de 27 de Fevereiro de 2013.
17) Quanto às recomendações do CCAC e ao parecer do GAES
17.1 Recomendações do CCAC
Dispõe-se na alínea 12) do art.º 4º (Competências) da Lei n.º 10/2000 (Comissariado contra a Corrupção da Região Administrativa Especial de Macau), alterada pela Lei n. º 4/2012, que ao CCAC compete dirigir recomendações directamente aos órgãos competentes com vista à correcção de actos ou procedimentos administrativos ilegais ou injustos, ou à prática de actos devidos.
Os n.ºs 5 e 6 do art.º 12º da mesma lei prevêem que em caso de não aceitação ou de aceitação parcial das recomendações referidas na alínea 12) do artigo 4º, o órgão recomendado necessita de ter fundamento legal e motivo ponderoso.
As recomendações dirigidas pelo CCAC têm fundamento legal e motivo ponderoso, pelo que esta Direcção tem de aceitá-las, adoptando medidas de correcção.
17.2 Parecer do GAES
Nos termos do n.º 1 do art.º 5º da Lei n.º 14/2009, a habilitação académica deve ser adequada ao exercício das funções. Conforme o Mapa 2 do Anexo I da lei supracitada, o curso superior é a habilitação académica adequada para o exercício das funções de técnico.
Nos termos do art.º 5º (Parecer) do Regulamento Administrativo n.º 3/2003 (sic), para efeitos da verificação de habilitações académicas, os serviços ou entidades públicas interessadas podem solicitar parecer ao GAES, consoante se trate de habilitações académicas do ensino, superior.
Ao abrigo do Decreto-Lei n.º 11/98/M, de 6 de Abril, o GAES é um serviço próprio destinado a tratar do sistema do ensino superior, bem como a coordenar e a gerir os assuntos relacionados com o ensino superior, ou seja, um gabinete técnico responsável pelo apoio, acompanhamento e desenvolvimento do ensino superior na RAEM, bem como pelo reconhecimento de habilitações académicas do ensino superior, nomeadamente através da definição e divulgação de critérios ou orientações no âmbito da verificação de habilitações académicas do ensino superior. Assim sendo, as entidades competentes para o provimento podem adoptar o parecer do GAES, decidindo sobre o provimento.
Em suma, não se verifica a violação dos princípios da legalidade e da boa fé na adopção do parecer emitido pelo GAES, na aceitação das recomendações dirigidas pelo CCAC e na tomada das medidas de correcção.
Parte III
Conclusão
18) Finda a análise, esta Direcção considera que o diploma de licenciatura em Administração de A (A), emitido, em 15 de Junho de 2011, pela Faculdade de Cultura e Economia de University of Beijing Geely, não comprova que A (A) tenha habilitação de grau académico de nível superior da área de Administração Pública exigida pelo aviso de abertura do concurso comum, de ingresso externo, para o preenchimento de lugares de técnico de 2ª classe (área de registo na inscrição marítima), publicado em suplemento ao Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de' Macau n.º 9, II Série, de 27 de Fevereiro de 2013.
19) Pelo exposto, esta Direcção propõe que:
19.1 O Exmo. Sr. Secretário reconheça, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.º 10º, alínea c) do n.º 1 do art.º 12º, art.º 15º e n.º 2 do art.º 16º do E.T.A.P.M., aprovado pelo Decreto-Lei n. º 87/89/M, de 21 de Dezembro, que A (A) não possui habilitação de grau académico de nível superior da área de Administração Pública exigida pelo aviso de abertura do concurso comum, de ingresso externo, para o preenchimento de lugares de técnico de 2ª classe (área de registo na inscrição marítima), publicado em suplemento ao Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 9, II Série, de 27 de Fevereiro de 2013;
19.2 Mais propõe ao Exmo. Sr. Secretário que reconheça a nulidade do provimento de A (A) para exercício de funções de técnico da área de registo na inscrição marítima, por não se verificar os requisitos gerais para o exercício das funções de técnico de 2ª classe (área de registo na inscrição marítima), até ao termo do prazo para apresentação de candidaturas fixado no aviso de abertura do concurso.
20) Caso as propostas supracitadas sejam autorizadas pelo Exmo. Sr. Secretário, esta Direcção irá acompanhar a execução da referida decisão”.
9 – Relativamente a essa proposta, a Ex.ma Directora dos Serviços emitiu a seguinte opinião:
“Relativamente ao extracto da proposta n. º 31/DAF/DA/2016 de 6/5/2016 Assunto: provimento nulo - técnico de 2.ª classe - área de registo na inscrição marítima
1. O aviso do concurso comum, de ingresso externo, do técnico de 2.ª classe, 1.º escalão, área de registo na inscrição marítima, foi publicado no Suplemento do Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 9, II Série, de 27 de Fevereiro de 2013. Nos termos da alínea c) do artigo 2.º do referido aviso, os candidatos deviam estar habilitados com o curso superior na área da Administração Pública.
2. A foi classificada em 2º lugar, na lista definitiva do concurso supracitado e começou a desempenhar funções de técnico, 2ª classe, 1 º escalão, em 24 de Fevereiro de 2014 nesta Direcção.
3. Conforme o ofício do CCAC n.º 0352/DSPJ/2015, o CCAC recebeu uma denúncia contra A, revelando que a sua “carta de curso”, emitida pelo “Beijing Geely Institute” (anteriormente designado por Beijing Geely University), não preenche as habilitações académicas do curso superior na área da Administração Pública.
4. Esta Direcção enviou ofícios ao Gabinete de Apoio ao Ensino Superior e aos SAFP para se pronunciarem sobre se a referida “carta de curso”, titulada por A, na área de Administração Pública do Instituto Económico e Cultural da Beijing Geely University, possui ou não as habilitações de curso superior.
5. Segue-se o resumo do parecer do GAES: De acordo com a informação fornecida pelo China Higher-Education Student Information (CHSI) website -- the China Higher Education Student Information and Career Center (CHESICC) responsible for qualification management, directly under the Ministério da Educação, a “Beijing Geely University” é uma escola superior privada; tendo o reconhecimento do Ministério da Educação, a “Beijing Geely University” começou, em 2001, a ministrar cursos de bacharelato, formando apenas bacharéis e não licenciados, não tendo competência para conferir habilitações em licenciatura/grau de licenciatura.
O Ministério da Educação concordou, em 30 de Abril de 2014, com a criação do “Beijing Geely Institute”, tendo como base a “Beijing Geely University”, e concedeu-lhe a autorização para ministrar cursos de licenciatura, para conferir grau de licenciado. Por isso, a “Beijing Geely University” abriu pela primeira vez as matrículas em 2014 para licenciados e prevê-se que os primeiros estudantes serão licenciados em 2018. Deste modo, da base de dados do CHESICC não constam informações sobre as habilitações em licenciatura da “Beijing Geely University “ nem da “Beijing Geely Institute”.
Em relação à “carta de curso” emitida pela “Beijing Geely University”em 15 de Junho de 2011, de acordo com as informações obtidas do CHESICC, a “Beijing Geely University”, na altura (2011) não tinha competência para atribuir cartas de curso e as habilitações não eram reconhecidas pelo Ministério da Educação.
De acordo com o documento educativo n.º 25 (2004) do Ministério da Educação do interior da China; de acordo com as «disposições transitórias para o registo electrónico dos certificados/diplomas/carta de curso das habitações do ensino superior», emitidas em 5 de Fevereiro de 2001 pelo Ministério da Educação e de acordo com o oficio do Ministério da Educação enviado à “Beijing Geely University”, em que foi autorizada a criação do Beijing Geely Institute, tendo como base a “Beijing Geely University” e de acordo com informações obtidas do CHESICC, pode-se concluir que as habitações de licenciatura em 2011 conferidas pela “Beijing Geely University” não foram reconhecidas pelo Ministério da Educação do Interior da China.
Quanto à apreciação das habitações académicas, as habilitações que não sejam reconhecidas pela autoridade competente do local, não devem ser reconhecidas também pelo governo da RAEM.
6. Entre Setembro de 2007 e Julho de 2011, A frequentou, na “Beijing Geely University”, o curso de licenciatura na área da Administração Pública, cuja criação não foi autorizada pelo Ministério da Educação da China.
7. No entender do CCAC: mediante apenas a carta de curso emitida em 15 de Junho de 2011 pela “Beijing Geely University”, entregue pela A no momento de inscrição, não é possível provar que a interessada possui as habitações do curso superior exigidas para a carreira de técnico.
Quanto ao concurso, todos os candidatos foram obrigados a preencher os requisitos gerais para desempenhar funções na Função Pública, antes do termo do prazo de inscrição previsto no aviso do concurso, sob pena de ser nulo o provimento.
8. Esta Direcção concordou com os pareceres emitidos pelas entidades supracitadas quanto às habilitações académicas de A. Esta Direcção abriu audiência escrita sobre se A possui ou não habilitações académicas necessárias ao desempenho das funções de técnico, 2ª classe, 1º escalão. Em 18 de Abril, A apresentou resposta, por escrito, a esta Direcção.
9. Na opinião desta Direcção, o China Higher-education Student Information (CHSI) website é um website reconhecido pelo Ministério da Educação, e é o único website onde se podem consultar certificados/diplomas/carta de curso do ensino superior da RPC. As informações fornecidas por este website têm alta aceitabilidade.
10. Na opinião desta Direcção, as provas são suficientes para provar que as habilitações da licenciatura adquiridas por A na “Beijing Geely University” não foram reconhecidas pelo Ministério da Educação.
11. Não possuindo, desde o princípio, as habilitações exigidas no aviso do concurso, A não tem o direito de desempenhar as funções de técnico.
12. Adoptar o parecer do GAES, aceitar as recomendações do CCAC e tomar as medidas de correcção não violam o princípio da legalidade e o princípio da boa-fé.
Conclusão:
13. Após a análise, esta Direcção considera que a “carta de curso” de A, emitida em 15 de Junho de 2011, pela “Beijing Geely University”, não está em conformidade com a habilitação académica de curso superior na área da Administração Pública exigida no aviso do concurso comum, de ingresso externo, do técnico de 2.ª classe, 1.º escalão, área de registo na inscrição marítima, publicado no Suplemento do Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 9, II Série, de 27 de Fevereiro de 2013.
14) Face ao exposto, propõe-se a:
14.1 V. Ex. o Secretário para os Transportes e Obras Públicas, que se digne reconhecer, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 10.º, alínea c) do n.º 1 do artigo 12.º, artigo 15.º e n.º 2 do artigo 16.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, aprovado pelo Decreto-Lei n. º 87/89/M, de 21 de Dezembro, que A não possui as habilitações do curso superior na área da Administração Pública, exigidas no aviso do concurso comum, de ingresso externo, de técnico de 2.ª classe, 1.º escalão, área de registo na inscrição marítima, publicado no Suplemento do Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 9, II Série, de 27 de Fevereiro de 2013.
14.2 Considerando que A não possuía os requisitos gerais para desempenhar funções de técnico 2a classe no termo do prazo de inscrição do aviso do concurso, propõe-se ao STOP reconhecer que é nulo o provimento para técnico da área de registo na inscrição marítima.
15. Caso o proposto mereça a autorização do STOP, esta Direcção vai acompanhar a execução da decisão supracitada.
A Directora
XXX”
10 - O Ex.mo Secretário para os Transportes e Obras Públicas tomou a seguinte decisão em 20/05/2016:
“Concordo”
***
IV – O Direito
1 – Introdução
Recorde-se que a recorrente ficou graduada em 2º lugar no concurso comum de ingresso externo para o preenchimento de lugares de técnico de 2ª classe, 1º escalão, para o qual tinha apresentado um diploma de licenciatura emitido pela universidade chinesa privada Beijing Geely University.
Findo o processo de graduação, a recorrente iniciou funções de técnico de 2ª classe, 1º escalão, na Direcção dos Serviços de Assuntos marítimos e de Água no dia 24 de Fevereiro de 2014.
Viria, posteriormente, a saber-se que, afinal, o documento de licenciatura não tinha sido reconhecido pelas entidades competentes da RPC, por se ter apurado que aquela universidade só iniciou os cursos de licenciatura em 2014, pelo que só em 2018 produziria os primeiros graduados licenciados.
A questão que urge resolver nos presentes autos resume-se, então, ao seguinte: Seria possível, pelo acto administrativo aqui impugnado, ser declarada a nulidade do provimento da recorrente como técnico da área de registo na inscrição marítima?
A recorrente acha que não. E para tanto concluir, invoca os vícios de:
- Erro sobre os pressupostos de facto;
- Violação dos princípios da justiça e da boa fé;
- Violação de lei (violação dos arts. 14º do DL nº 11/91/M, de 4 de Fevereiro e Mapa 2, do anexo I, à Lei nº 14/2009, de 3 de Agosto; 10º, nº1, al. c), 12º, nº1, al. c), 15º, 16º, nº2, do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau).
*
2 – Do erro sobre os pressupostos
Segundo a tese da recorrente, o acto sindicado teria falhado na parte em que considerou que ela não era titular de um curso superior de Administração Pública. E o raciocínio é este: Mesmo que a referida Universidade não tivesse competência para conferir o grau de licenciatura, ao menos teria que ser-lhe reconhecido o bacharelato, que também é um curso superior, tal como o de licenciatura. Estaria, portanto, aí o erro sobre os pressupostos de facto.
Ou seja, para si, perante a impossibilidade de ser reconhecida a licenciatura (o mais), então deveria ser-lhe reconhecida a detenção do grau de bacharelato (o menos), o que, nestas circunstâncias, significaria que estava em condições de aceder ao concurso e ser provido no lugar.
Mas, não tem razão. Antes de mais nada, o curso da recorrente no período compreendido entre Setembro de 2007 e Julho de 2011 era um “curso de licenciatura em gestão administrativa”, cuja criação não tinha sido autorizada pelo Ministério da Educação da RPC. Sendo assim, a falta de autorização contamina todo o curso, independentemente do grau académico.
Como o expende o digno Magistrado do MP, em termos que aqui se transcrevem e sufragam:
“A recorrente candidatou-se ao concurso aberto pela Capitania dos Portos para preenchimento de vagas de técnico de 2.º classe, da área de registo na inscrição marítima, conforme aviso publicado no B.O. n.º 9, II Série, de 27 de Fevereiro de 2013.
A habilitação com curso superior de Administração Pública era um dos requisitos exigidos para desempenho de funções nos lugares postos a concurso. Para prova dessa habilitação, a recorrente apresentou um diploma de licenciatura em Administração, emitido pela escola superior privada University of Beijing Geely.
No procedimento administrativo que culminou com a declaração de nulidade ora impugnada esclareceu-se que, por ocasião da emissão do diploma, em 2011, a entidade emitente, posto que reconhecida pelo Ministério da Educação da República Popular da China, não estava autorizada a conferir graus académicos de licenciatura; e também se apurou que, em nome da recorrente, não está registado qualquer diploma de grau académico superior, no site “China Higher-education Student Information”, no qual têm que estar registados todos os diplomas obtidos a partir do ano de 2001.
Pois bem, para caracterizar o invocado erro nos pressupostos de facto (destaque nosso), o que a recorrente sustenta, no fundo, é que, tendo concluído a licenciatura em Administração numa universidade que estava autorizada a conferir o grau de bacharelato, e constituindo a licenciatura um grau superior ao de bacharelato, ela está, por maioria de razão, habilitada com o bacharelato em Administração, que é também considerado um curso superior. Logo, quando se apresentou a concurso, a recorrente reunia o necessário requisito de habilitação.
Temos para nós que as coisas não podem ser encaradas com esta linearidade. Desde logo, e independentemente do que o júri do concurso possa ter deliberado sobre a questão da validade da licenciatura, nos termos dos artigos 1.º e 2.º do Regulamento Administrativo n. º 26/2003 - se é que porventura algo deliberou nessa matéria -, crê-se que não teria cabimento o reconhecimento em Macau de uma licenciatura que não é reconhecida no ordenamento jurídico onde é obtida. Por outro lado, se essa licenciatura é obtida num curso que funciona à revelia e sem autorização das entidades oficiais competentes, e não pode consequentemente ser reconhecida como curso superior, toma-se óbvio que a eventual existência, nesse curso, de um patamar que confira o grau de bacharel, não pode igualmente lograr obter reconhecimento como curso superior. E tanto é assim que, como supra se referiu, não está registado, em nome da recorrente, qualquer diploma de grau académico superior, no site “China Higher-education Student Information”, onde têm que estar registados todos os diplomas obtidos a partir do ano de 2001 (destaque nosso).
Tanto basta, cremos, para afastar a hipótese de erro nos pressupostos de facto, vício que, assim, se mostra improcedente”.
Improcede, pois, o vício invocado.
*
3 – Da violação dos princípios da justiça e da boa fé.
A este respeito, recorremos, mais uma vez, ao parecer do digno Magistrado do MP, cujo teor se transcreve:
“Quanto à violação dos princípios da boa fé e da justiça (destaque nosso) a recorrente começa por afirmar que o acto recorrido desautoriza a soberana e discricionária decisão do júri do concurso, para depois invocar o tempo de serviço, o bom desempenho funcional e a renovação do contrato como valores que não podem, à luz daqueles princípios, ser preteridos com base em questão meramente formal relativa ao seu diploma de habilitações académicas.
Não se sabe se o júri do concurso procedeu à verificação da habilitação académica da recorrente, nos moldes previstos no Regulamento Administrativo n.º 26/2003. Como quer que seja, a questão não pode colocar-se no plano da desautorização do júri. O que interessa é saber se o acto recorrido podia/devia ou não declarar nulo o provimento que se seguiu à graduação da recorrente em lugar que lhe permitiu o ingresso numa das vagas postas a concurso. A este respeito, constata-se que o artigo 16.º, n.º 2, do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, fulmina de nulidade, entre outros, o acto de provimento efectuado com inobservância, do requisito habilitação académica exigido para o desempenho de funções públicas nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea c), do referido Estatuto, requisito que, no caso, não estava preenchido. Ora, a nulidade pode ser invocada e declarada a todo o tempo, por qualquer órgão administrativo ou por qualquer tribunal - artigo 123.º, n.º 2, do Código do Procedimento Administrativo. Ou seja, um eventual erro ou uma possível omissão do júri, em matéria de requisitos exigidos para o desempenho de funções públicas aos candidatos em concurso, não produz o efeito de convalidar habilitações académicas e respectivo diploma, tomando-os adequados e idóneos para o exercício da função pública visada pelo concurso.
Além disso, o contraponto que a recorrente estabelece, por um lado, entre valores ligados ao tempo de serviço, bom desempenho funcional e renovação do contrato, e aquilo que, por outro lado, denomina de questão meramente formal relativa ao seu diploma de habilitações académicas, pretendendo sobrelevar aqueles em detrimento desta, não evidencia qualquer violação dos princípios da boa fé e da justiça, tratando-se antes de um problema de reposição da legalidade, com o qual a Administração tinha que lidar e para o qual não se prefigurava outra solução juridicamente sustentável. É que o curto período de tempo em que a recorrente exerceu funções, após o provimento objecto de declaração de nulidade, não permitia sequer equacionar solução que passasse pelo recurso à figura do agente putativo, que hoje em dia encontra previsão no próprio Código do Procedimento Administrativo, através da norma do artigo 123.º, n.º 3.
Improcede também o vício de violação de lei por ofensa dos princípios da justiça e da boa fé”.
Fazemos nosso, com a devida vénia, o teor do parecer acabado de reproduzir. Apenas nos basta acrescentar que os princípios invocados são limites internos à actividade administrativa discricionária, como é sabido.
Ora, e tal como resulta do art. 16º, nº2, do ETAPM, “Os provimentos efectuados com inobservância dos requisitos estabelecidos nas alíneas a), c), d), e) e f) do nº1 e do nº2 do art. 10º são nulos”.
E a alínea c), do nº1, do art. 10º (artigo que é destinado aos requisitos gerais de provimento) respeita precisamente à “habilitação académica ou profissional”.
Quer isto dizer que a nulidade por falta do referido requisito se apresenta como actividade vinculada e não discricionária. Consequentemente, estes princípios não podem ser tidos por violados no presente caso.
*
4 – Da violação de lei
Está agora em apreço, a invocada violação dos arts. 14º do DL nº 11/91/M, de 4 de Fevereiro e Mapa 2, do anexo I, à Lei nº 14/2009, de 3 de Agosto e 10º, nº1, al. c), 12º, nº1, al. c), 15º, 16º, nº2, do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau.
Quanto ao primeiro dos preceitos (art. 14º, do DL nº 11/91/M), ele reza assim:
Artigo 14º
(Graus e diplomas)
1. No ensino superior são conferidos os seguintes graus:
a) Bacharel;
b) Licenciado;
c) Mestre;
d) Doutor.
2. No ensino superior podem ainda ser atribuídos diplomas para cursos de duração não inferior a um ano e certificados para cursos de pequena duração.
3. Todos os cursos que confiram grau académico carecem de aprovação prévia do Chefe do Executivo sob proposta da instituição de ensino superior.
4. As instituições privadas de ensino superior podem ser autorizadas a ministrar cursos conducentes à obtenção de graus diferentes dos previstos no presente artigo, os quais poderão ser reconhecidos nos termos previstos no presente diploma.
Ora, não vemos como possa o artigo transcrito ter sido postergado com o acto em escrutínio. Na verdade, se através dele a recorrente pretende dizer-nos que o bacharelato também é um grau de ensino superior, isso em nada abona a defesa da sua tese – de que possui o grau de bacharel – pois, como se disse, não foi reconhecida na RPC nenhum grau de ensino superior a partir do curso que frequentou na supra citada Universidade.
Por outro lado, quanto ao Mapa 2 do Anexo I à Lei nº 14/2009, de 3 de Agosto, do que se trata é simplesmente da sistematização do regime das carreiras, por reporte aos arts. 17º e 55º, nº2 do diploma. Mas, sendo assim, não vislumbramos em que medida estas normas e mapa aludidos tenham sido desrespeitados.
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No que se refere aos artigos 10º, nº1, al. c), 12º, nº1, al. c), 15º e 16º, nº2, do ETAPM, também nos parece, sinceramente, que os não podemos dar como violados.
Aliás, sobre o conteúdo dos arts. 10º, nº1, al. c) e 16º, nº2 já nos manifestámos atrás. Ora, não encontramos no acto em apreço maneira nenhuma de integrar qualquer violação à dispositividade das respectivas normas. Se a recorrente não dispunha da habilitação necessária ao provimento, então os preceitos citados, bem como o art. 15º, foram correctamente observados.
Não se explica bem a recorrente quanto à invocação do art. 15º.
Veja-se o que diz o artigo:
Artigo 15º
(Verificação dos requisitos)
Os requisitos gerais e especiais para o exercício de funções públicas devem verificar-se até ao termo do prazo para apresentação de candidaturas fixado no aviso de abertura do concurso, caso a ele haja lugar, ou, nos restantes casos, à data do respectivo despacho de autorização de provimento.
Se o que pretende é dizer que a declaração foi tardia, por ultrapassar os limites temporais nele referidos, está enganada.
Este artigo limita-se a estabelecer que os requisitos para o exercício de funções devem estar adquiridos na esfera dos interessados naquelas faixas de tempo. Ele não quer dizer que os requisitos devem ser escrutinados (leia-se, avaliados administrativamente) dentro daqueles prazos.
E sendo assim, uma vez que a situação substantiva da recorrente não se alterou até ao termo dos aludidos prazos, então o que se pode dizer é que a Administração agiu em pleno respeito da previsão do preceito.
E fê-lo através do acto impugnado, e cerca de dois anos depois do provimento, em virtude de só então ter tomado conhecimento concreto e seguro do caso. Sendo a situação material da recorrente enquadrável no preceito que ao caso comina a nulidade, então nenhum obstáculo, quanto a isso, encontramos na sua prolação (cfr. art. 123º, nº2, do CPA).
***
V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso contencioso, confirmando o acto impugnado.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça em 4 UC.
TSI, 11 de Maio de 2017
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Mai Man Ieng
1 China Higher-education Student Information é o único site que fornece informações sobre os certificados comprovativos das habilitações literárias do curso de nível superior da China. Desde 2001, no Interior da China, implementou-se o regime de registo electrónico dos certificados comprovativos das habilitações literárias do curso de nível superior, pelo que não são reconhecidos pelo Estado os diplomas (certificados de conclusão da parte curricular) atribuídos a partir do referido ano que não sejam registados.
2 Jiaofahan (2014) n.º 105: oficio do Ministério da Educação relativo à concordância com a criação de Beijing Geely University com base em University of Beijing Geely, Tal oficio está disponibilizado no site do Ministério da Educação: www.moe.edu.cn/publicfiles/business/htmlfiles/moe/s181/201405/xxgk _128902html
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491/2016 1