Processo n.º 464/2016
(Recurso Civil)
Data : 15/Junho/2017
Recorrente : A
Recorrida : B
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – RELATÓRIO
1. A (mais bem identificada nos autos) recorreu oportunamente da decisão do Exmo Senhor Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual da DSE da RAEM que deferiu o pedido de registo da marca n.º N/81XXX, requerido por B, pedindo a anulação da decisão da DSE e a recusa do registo da referida marca.
Seguidamente foram citadas a DSE (Direcção dos Serviços de Economia) e a contraparte B (com os melhores sinais nos autos), que ao recurso apresentaram respostas no sentido de lhe ser negado provimento.
A final, foi proferida douta sentença no Tribunal Judicial de Base, pela qual se decidiu julgar totalmente improcedente o recurso, mantendo, em consequência, a decisão da DSE que concedeu o registo da marca n.º N/81XXX.
Inconformada com essa sentença, A, sociedade comercial suíça, recorrente nos autos à margem referenciados, em que são recorridas B e Direcção dos Serviços de Economia da RAEM, tendo sido notificada da admissão do recurso que oportunamente interpôs da douta sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Base, veio apresentar as suas Alegações de Recurso, concluindo, em síntese:
A. Importa desde já destacar o seguinte: o Tribunal a quo entendeu serem os seguintes factos relevantes para o bom julgamento do caso:
M) A Parte Contrária integra o grupo de empresas da C
N) O produto "IWATCH" foi lançado pela C em Setembro de 2014
O) "IWATCH" veio juntar-se à família da C, cujo primeiro lançamento data de 1998, com o "IMAC", passando pelo "ITUNES", pelo "IPHONE", ao "IPAD", havendo uma vasta miríade de produtos comercializados pela C.
P) IWATCH estava conhecida em Macau
B. Ora os factos destacados resultam meramente das alegações apresentadas pela Recorrida no texto da resposta ao recurso apresentado na primeira instância, sem que os mesmos tenham sido objecto de qualquer prova ou de apreciação e valoração críticas, pelo que não deveriam terem sido valorados como foram.
C. Efectivamente tais factos não resultaram provados pois os documentos particulares juntos pela Recorrida ou respeitam a meras pesquisas efectuadas na intemet (relativamente aos quais tantas outras pesquisas dão outros tantos resultados diferentes daqueles que alega a Recorrida) ou a meros documentos particulares, sem se encontrarem, datados ou assinados, desconhecendo-se completamente o seu autor, proveniência ou fonte, mas que aparentemente foram tomados pelo Meritíssimo Juiz a quo como indiscutíveis e inabaláveis, sem deles ter feito sequer uma apreciação elementar.
D. Por conseguinte, impunha-se uma apreciação crítica pelo Meritíssimo juiz do Tribunal Judicial de Base o que não sucedeu in casu. Pelo que os factos foram mal valorados e, nessa medida, terão contribuído para uma errada e também contraditória fundamentação da sentença, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
E. Repare-se que a Recorrida e requerente da marca em análise à data de 05/12/2013 era a sociedade B e não a C Inc.; que a marca IWATCH nunca foi usada em qualquer produto, seja pela entidade aqui recorrida seja pela sociedade C a que a sentença se refere; aliás, pelo contrário, a sociedade C lançou um relógio inteligente intitulado CWatch.
F. Ora, sem uso, como é que se pode entender que uma marca adquiriu distintividade ?!
G. Mais ainda, a distintividade adquirida de uma marca deve ser aferida ao tempo da apresentação do pedido de registo, o qual in casu foi apresentado pela sociedade aqui Recorrida, a Brightflash, que aparentemente nunca usou a marca
H. Ainda assim, sem prescindir do exposto supra, ainda que se siga a linha de fundamentação do Tribunal de 1ª instância que concluiu, por outro lado, na alínea o) que a marca "IWATCH" veio juntar-se à família da C em Setembro de 2014 (o que de resto não é verdade pois que esta nunca foi usada) então como é possível ter também concluído, e com que fundamento, que a marca já era conhecida à data da apresentação do pedido quase um ano antes?
L. Mais, ainda sem prescindir do exposto supra quanto à entidade requerente do pedido não ser a C Inc: quando se verifica que no próprio site oficial da C Inc não existe a marca nem o produto IWATCH como é que se pode concluir nos termos em que o fez a sentença recorrida nomeadamente quando na referida alínea p) refere que a marca IWATCH era conhecida em Macau?
J. Como, quando e em que termos, é que a marca registanda IWATCH é conhecida em Macau se a marca não é usada, muito menos era à data do pedido? Quais são os factos existentes no processo que permitem tal conclusão? A sentença nada esclarece a este respeito pelo que não consegue a Recorrente vislumbrar em que concretos factos e evidências se apoiou o Meritíssimo juiz para sustentar a sua opinião, sendo certo que desde já se adianta que estes não existem.
K. Por outro lado, concluiu a sentença recorrida que não se verifica o disposto na alínea b) do n° 1 do art° 199, porém estranha-se a conclusão do Meritíssimo Juiz quando entende A letra I não significa necessariamente "internet", tendo deixado de atentar apenas nesta questão em particular (o que per se também é contraditório com a restante linha de fundamentação da sentença) que exactamente a alusão à letra "i" constante de outras marcas da sociedade C Inc., como a primeira a ser criada, o "iMac" tem origem no conceito de internet.
L. Por outro lado, quanto à verificação do disposto na alínea b) do n° 2 do art° 214° e do n° 1 do art° 215°. a Sentença recorrida entendeu verificarem-se dois dos três requisitos previstos na lei para que se possa falar em imitação de marca; com efeito entendeu que as marcas 70XX/M, 67XX e 88XX/M da recorrente são prioritárias face à marca em confronto, bem assim como entendeu existir identidade e afinidade entre os produtos que as marcas visam assinalar.
M. Todavia, considerou não existir semelhança gráfica, fonética, conceptual ou outra, capaz de induzir facilmente o consumidor em erro ou confusão com a marca anteriormente registada; ora é desta parte da Sentença que a recorrente discorda.
N. Com efeito, a análise operada pelo Digníssimo Juiz a quo, salvo o devido respeito, radicou em erro: concluir que basta mudar a primeira letra de cada uma das marcas em confronto para que aquelas possam ser distinguidas uma da outra é entendimento que a recorrente não pode, obviamente, perfilhar.
O. O Tribunal a quo, partiu da premissa equivocada de que a análise dos sinais em comparação de faz por dissecação analítica, separando as letras iniciais "S" e "I" que fazem parte da composição das marcas em análise, concluindo erradamente que os consumidores não confundirão as letras "S" e "I", já que são letras com pronúncia diferente e que por fazerem parte de palavras com menos letras seriam menos confusas para o consumidor.
P. O Tribunal recorrido analisou incorrectamente as marcas em confronto, sem as ver como um todo, tal como ensinam as melhores Doutrina e Jurisprudência, fazendo uma inadmissível leitura redutora dos sinais em confronto, que os divide e disseca em vez de os analisar como um todo. As marcas em confronto "SWATCH" e "IWATCH" - deverão ser comparadas no seu todo e não através de uma separação artificial dos respectivos elementos.
Q. A ligeiríssima diferença fonética não é suficiente para afastar a possibilidade de confusão entre marcas que deve ser apreciada pela impressão do conjunto deixada pelas marcas quando examinadas sucessivamente e não pelas concretas dissemelhanças que possam existir - entendimento este, sufragado pacificamente pela doutrina e jurisprudência, conforme supra na parte da fundamentação se referiu. Toma-se importante sublinhar que a posição defendida pela ora recorrente tem vindo a merecer acolhimento em diversas instâncias e jurisdições, tal como resulta nomeadamente dos documentos que foram juntos em sede de Recurso de l.ª Instância e para cujo conteúdo respeitosamente ora se remete, destacando-se a título de exemplo as proferidas pelo Instituto Estatal de Propriedade Intelectual da China (SIPO) relativamente aos registos das marcas "IWATCH", "KWATCH" e "JWATCH JW".
R. Por outro lado, o predito é verdade mesmo para casos em que não estão em comparação apenas sinais verbais, nem mesmo para sinais cuja diferença radica exclusivamente na existência de uma letra inicial na composição da marca, conforme suficientemente provado pela recorrente na Primeira Instância através da documentação junta aos autos, e da qual, a título meramente exemplificativo se indicam as decisões proferidas pelo Instituto de Propriedade Intelectual da Nova Zelândia e pela Divisão de Oposição do Instituto de Harmonização no Mercado Interno (doravante apenas IHMI) relativamente ao sinal (cfr. fls. 385v), bem como a proferida pela Divisão de Oposição do IHMI com respeito à marca comunitária n.º 9129XXX "NEWATCH", e ainda a proferida pelo Instituto Espanhol de Marcas e Patentes relativamente à marca n.º 2956XXX/X "G GWATCH".
S. Aliás, em virtude da decisão proferida na Primeira Instância toma-se necessário requerer a junção dos documentos n.º 1 a 5, nos termos das disposições conjugadas do art. 616.°, 450.°, 451.° e 468.° todos do Código de Processo Civil, também na medida em que são documentos apenas trazidos ao conhecimento da recorrente já após a data em que por esta foi apresentado o recurso junto do Tribunal Judicial de Base, mais se requerendo seja a recorrente isenta do pagamento de qualquer multa já que não estamos em presença de qualquer junção tardia. Os referidos documentos n.º 1 a 45 constituem decisões recentemente proferidas, na sua maioria relativamente ao pedido de registo da marca IWATCH.
T. De sublinhar ainda que a ora recorrente para além das acima referidas decisões proferidas relativamente à marca IWATCH, também obteve decisões favoráveis nas jurisdições de Marrocos, Honduras e Belize, entre outras, facto que deverá ser suficientemente ponderado por este Venerando Tribunal.
U. É indubitável que a marca recorrida N/81XXX IWATCH, meramente nominativa, apresenta um inegável e elevado grau de semelhança gráfica, fonética, e até conceptual com as marcas prioritárias da recorrente, reproduzindo aquelas quase integralmente, o que as toma susceptíveis de fácil confusão e/ou associação, contrariamente ao vertido na Sentença proferida. Note-se que a marca IWATCH reproduz todas as letras das marcas SWATCH à excepção de uma única - a letra "S" - cuja pronúncia é praticamente imperceptível no seu conjunto, sendo que se impõe uma vez mais observar, que é a impressão de conjunto que deve nortear a análise comparativa dos sinais, contrariamente ao efectuado pelo Tribunal Judicial de Base.
V. Conforme suficientemente alegado e demonstrado em Primeira Instância a marca IWATCH é uma expressão formada por seis letras, exactamente o mesmo número de letras que compõem as marcas da recorrente SWATCH, exactamente na mesma sequência, à excepção de uma letra apenas - a primeira letra de cada um dos sinais em comparação - apresentando assim uma estrutura gráfica e uma sequência fonética muito semelhantes, uma vez que a ordem dessas letras e a respectiva fonética é exactamente a mesma. Acresce que exceptuando o mero pormenor de uma letra apenas, as marcas em comparação são totalmente idênticas, e atendendo a que os sinais em confronto representam o mesmo conteúdo da ideia, a semelhança conceptual é também flagrante.
W. Importa igualmente referir que a Sentença ora posta em crise não coloca em causa que as marcas da recorrente são prestigiadas e gozam de reputação e, portanto, beneficiam de um âmbito de protecção mais alargado. Assim também este factor deveria ter tido como consequência que a Decisão proferida fosse no sentido da recusa da marca N/81XXX.
X. Mais, o Tribunal Judicial de Base não podia ter afirmado como fez que apenas com base nos documentos juntos já que são claramente insuficientes para demonstrar a ligação, e em especial em que consiste tal ligação; tal como não poderia dizer-se que a C é titular do registo da marca ora em análise porquanto nos termos do art. 57.° n.º 1 alínea a) e n.º 2 do Decreto-Lei N.º 97/99/M a inexistência de averbamento a favor da C - e junto do site oficial da DSE na presente data nada consta a este respeito - toma tal facto inoponível a terceiros, nomeadamente à ora recorrente.
Y. Mas ainda que se admitisse por mera hipótese académica - o que não se concede - que era a empresa C a titular do registo em causa, ainda assim nunca poderia concluir-se que a C detém qualquer monopólio sobre expressões que tenham no seu início a letra "1" e muito menos que a utilização de tal letra no início de uma denominação seja distintivo da empresa em causa. Neste tocante não poderá deixar de se referir que o que parece de facto ser usado para identificar o produto da C supostamente em causa é a expressão "C(figura)Watch" conforme resulta evidente do próprio site de intemet da C.
Z. Ora, as evidentes semelhanças visuais, fonéticas e conceptuais entre os sinais em conflito, à luz dos direitos exclusivos da recorrente sob as marcas SWATCH e reforçados pela sua reputação, conduzirá à inevitável conclusão de que o registo da marca IWATCH deverá ser recusado por se encontrarem verificados todos os requisitos previstos no art. 214.° n.º 2 alínea b) do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, assim se comprovando que a marca registanda constitui imitação das marcas da recorrente.
AA. Sempre deverá ser tida em conta a análise irrepreensível e exemplar de matéria em tudo semelhante à dos presentes autos, que corrobora o entendimento que a recorrente vem vertendo ao longo do presente recurso levada a cabo pelo Tribunal Judicial de Base na Sentença proferida no âmbito do Processo CV3-12-0040-CRJ e datada de 20/02/2014, para cujo teor integral se remete, apenas ora cumprindo sumarizar que da análise efectuada se extrai que a mera adição da letra "S" à parte inicial da expressão "MS" nunca poderá ser tomada como suficiente para lhe conferir diferenciação. Ora, a mesma ratio aplicada ao caso sub judice levaria à ora peticionada Decisão de recusa da marca IWATCH.
BB. Face ao predito, a introdução no mercado de produtos assinalados pela marca registanda iria permitir que a marca recorrida se aproveitasse da reputação das marcas da recorrente gerada através da associação mental com as marcas desta - o que desde já se repudia - pelo que o uso da marca recorrida gozará consequentemente de uma vantagem injusta e desleal da reputação e do carácter singular das marcas da recorrente pelo que, em conclusão, beneficiaria de uma "viagem gratuita" na cauda da reputação constituída da marca da recorrente, operando uma diluição desta o que claramente não se aceita. Daqui decorre que a coexistência destes sinais propiciaria situações concorrência desleal com as quais a ora recorrente não pode conformar-se.
CC. Pelo que se impunha Decisão diversa da proferida pelo Tribunal a quo: de acordo com o supra exposto, encontram-se preenchidos todos os requisitos do conceito legal de imitação de marca a que se referem os artigos 214.°, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea b) e 215.°, n.º 1 do RJPI, a saber, tanto a prioridade, como a identidade de produtos, como ainda a existência de semelhanças susceptíveis de induzirem o consumidor em erro ou confusão, pelo que deveria ter sido recusado o pedido de registo da marca de Macau n.º N/81XXX "IWATCH", e urge assim revogar a Sentença proferida.
DD. Nos termos das disposições conjugadas da alínea c), do n.º 1 do art.º 9.° do RJPI que estatui que o "(. . .) reconhecimento de que o requerente pretende fazer concorrência desleal, ou que está é possível independentemente da sua intenção; e do art. 159.° do Código Comercial da RAEM que determina no seu n.º 1 que é "(…) desleal todo o acto que seja idóneo a criar confusão com a empresa, os produtos, os serviços ou o crédito dos concorrentes." mais estabelecendo que "(…) O risco de associação por parte dos consumidores relativo à origem do produto ou do serviço é suficiente para fundamentar a deslealdade de uma prática." o registo da marca em causa nos presentes autos deveria ter sido recusado.
EE. Pelo que, se conclui que a Sentença recorrida interpretou e aplicou incorrectamente a Lei ao caso sub judice, revelando ainda uma fundamentação contraditória em si mesmo considerada, assim se impondo a sua revogação e sua substituição por Decisão que recuse o registo da referida marca.
Termos em que deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente e consequentemente revogada a sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Base e substituída por outra que anule o despacho proferido pela Direcção dos Serviços de Economia que concedeu o pedido de registo de marca n.º N/81XXX "IWATCH", determinando-se a sua recusa integral.
2. B, Parte Contrária nos autos acima mais bem identificada, vem, na sequência das alegações de recurso apresentadas por A, ao abrigo do Art. 613º, Nº 2 do CPC apresentar as suas CONTRA-ALEGAÇÕES, dizendo, em sede conclusiva:
a) A Sentença não enferma de erro na apreciação dos factos e prova e não apresenta qualquer contradição argumentativa ou na linha de raciocínio.
b) A lei que regula a Propriedade Industrial visa, prima jacie, evitar a susceptibilidade de confusão dos sinais quanto à fonte empresarial.
c) A Sentença Recorrida andou bem quando decidiu que as marcas são facilmente diferenciáveis entre si e que não existe risco de confusão no consumidor quanto à origem comercial dos produtos a assinalar com a marca impugnada.
d) Os sinais em confronto no caso sub judice são, indubitavelmente, distinguíveis entre si sob o ponto de vista gráfico, nominativo, fonético e conceptual.
e) A decisão do Tribunal a que, pela congruência argumentativa e rigor jurídico demonstrados, não merece, no entender da Parte Contrária, qualquer reparo.
f) É inegável que a marca "IWATCH" goza de elevada capacidade distintiva intrínseca, não sendo susceptível, também por isso, de ser confundida com as marcas (prioritárias ou não) da Recorrente.
g) A marca "IWATCH" é icónica e emblemática, evocativa do fenómeno conhecido por ibranding pertencente à C Inc.
h) Uma marca pode tonar-se notória e distintiva mesmo antes de ser lançada ou usada!
Torna-se claro que a Recorrente mistura uma série de conceitos que não possuem qualquer relevância para o caso concreto. Nos autos não se discute o uso da marca ou a aquisição de eficácia distintiva de uma marca pelo uso. A marca “IWATCH” é uma marca detentora de capacidade distintiva intrínseca, é a aposição da letra "I" que lhe confere identidade e individualidade. Ainda que seja só uma letra aposta a um termo descritivo "WATCH", a verdade é que é a aposição dessa letra a conferir-lhe eficácia distintiva. Aliás, tal como sucede com a marca "SWATCH"!!
i) A Recorrente tenta uma vez mais atacar a decisão recorrida quanto ao uso letra "I", arguindo que que não percebe em que factos é que o Tribunal a que se baseou para concluir que o "I" não identifica necessariamente internet. Contudo, a posição do Tribunal é clara e está de acordo com o fenómeno também conhecido por ibranding da Parte Contrária (indirectamente C Inc.) o qual é de conhecimento geral.
j) Do que resulta que, tal como entendeu o Tribunal a quo, o "I" tem vários outros significados e não é, com toda certeza um símbolo comum que identifique internet, tal como a Recorrente alega.
k) A Parte Contrária reitera o que ficou demonstrado nos autos e a DSE e o Tribunal a quo já reconheceram - a Requerente do pedido da marca registanda é uma empresa associada da C Inc. Uma marca como a "IWATCH" era muito pouco provável que fosse solicitada por uma empresa que não estivesse ligada à C Inc. e, se assim fosse, não seria a própria C Inc. a declarar que as duas empresas estão ligadas.
I) "IWATCH", "C WATCH" e (cfr. fls. 508) referem-se ao mesmo produto!! Porém, dúvidas não restam de que é a "IWATCH" a mais famosa!!
m) Em consonância com a observação irrepreensível e bem demarcada do Tribunal a quo de que não existe semelhança fonética, gráfica e conceptual entre os sinais em conflito, adere-se, in totum, à decisão do Tribunal a quo que decidiu que:
n) A palavra "SWATCH" incorporada nas marcas da Recorrente, devido à presença da consoante "S" torna-se facilmente diferençável da marca "IWACTH", sendo insusceptível de serem confundidas pelo consumidor.
o) Ao contrário do que a Recorrente faz crer, é sob uma perspectiva de conjunto, que deve entender-se que as diferenças entre ambas as marcas são suficientes para argumentar a dissemelhança entre as mesmas e, mais importante que tudo, a marca cumprirá com a sua função primordial que é a de distinguir a origem empresarial dos produtos que visa assinalar.
p) O Tribunal a quo focou-se nas diferenças que ressaltam entre as marcas sob uma perspectiva global, i.e., a presença das consoantes "S" e "I", argumentando, acertadamente, que essas diferenças são suficientes para que o consumidor e o público em geral distingam a fonte empresarial de cada uma das marcas e seus produtos.
q) O Tribunal a quo ressalta que, mesmo sem considerar a fama da Recorrente e Parte Contrária ou das marcas, é precisamente pelo facto de ser fácil de, simplesmente comparando, identificar os componentes "S" e "I" de cada uma das marcas que, combinadas com "WATCH" as tornam distinguíveis entre si pelo público.
r) O Tribunal a quo sustenta sublinhou que a sua decisão resulta do que foi provado e demonstrado: o Requerente da marca, neste caso (ao contrário do que sucede nas decisões juntas aos autos pela Recorrente em que o Requerente não é a C ou suas afiliadas), é uma afiliada de sistemas operacionais da C Inc., bem conhecidos como IPod, IPhone, IPad e IOS, etc.
s) Todas começam com um "I" (mais recentemente o ICloud, etc.) e tem sido, com a atenção deste Tribunal, já há algum tempo, mesmo antes do lançamento oficial do "IWATCH" no mercado, assunto com grande enfoque nos media e no público em geral. Nos exemplos acima mencionados, o "I" é ligado pelo público à C e há uma tendência de que é um código usado pela C. Quando um consumidor comum/médio vê "IWATCH", é de esperar razoavelmente que ligue esse produto ou serviço à C. O mesmo consumidor não iria associar, erroneamente, IIWATCH", com também conhecida marca "SWATCH" da Recorrente.
t) Quando a Recorrente refere uma série de casos que tiveram lugar noutras latitudes geográficas, deve alertar-se para o facto de essas não dizerem respeito à C Inc. ou a uma sua filial - facto este, de elevada importância, devido às especificidade que as marcas da C gozam no mercado a nível internacional e em Macau - pelo que não devem servir de inspiração ou referência para a tomada de decisão quanto à marca ora em apreço.
u) A Recorrente tenta, sem sucesso, afastar a ligação entre a B, Requerente do pedido de registo ora em discussão, e a C INC. Ora, o Tribunal a quo deu como provada essa ligação entre as duas entidades empresarias pelas explicações e documentos que foram oportunamente juntos aos autos e para os quais se remete.
v) Cumprindo ainda clarificar que, de facto, a B, Requerente do pedido de registo ora em discussão, em 6 de unho de 2D15, cedeu o presente pedido de registo N/81XXX (e o pedido de registo N/81XXX), conforme resulta de documento igualmente junto aos autos. Sucede que o mesmo ainda não foi averbado na DSE, por esta não aceitar alterações em pedidos de registo que estejam pendentes para decisão - esta a única razão pela qual o nome C Inc. não consta do pedido de registo.
w) Note-se que a fama e reputação da marca "IWATCH" no mundo, incluindo em Macau, devem ser entendidas como um facto notório, de conhecimento geral, não carecendo de alegação nem de prova (mas, sem conceder, deve considerar-se que a prova que foi junta pela Parte Contrária é suficiente para provar a notoriedade da marca "IWATCH"), nos termos do Art. 434º, n.º 1 do CPC.
x) Como resulta do exposto e provado pelo Tribunal a quo, a Parte Contrária integra o grupo de empresas da C e, por isso, previsivelmente, cada marca/produto cujo lançamento é anunciado, é de imediato uma marca com um sucesso e prestígio estrondosos e que se sabe que conterá o prefixo "I".
y) A marca "IWATCH" goza de reputação mundial de relevo, é uma marca notória e prestigiada, o que, por si só, é suficiente para o consumidor não confundir esta marca com a "SWATCH", e todas as suas outras versões, incluindo a marca “ISWATCH”.
z) Embora se possa admitir que a marca "SWATCH" é uma marca notória, o mesmo já não se pode dizer em relação à marca “ISWATCH” que se refere a um tipo ou a uma linha concreta de relógios.
aa) Perante a indubitável e evidente notoriedade e prestígio da marca "IWATCH" é absurdo considerar que o consumidor médio irá confundi-Ia com a marca "SWATCH" que é uma marca de relógios bastante individualizada, pelo que ambas as marcas podem coexistir no mercado sem se prejudicarem mutuamente.
bb) Mais, no Processo n.º CV2-15-0001-CRJ em fase de recurso para a Segunda Instância, no qual está em causa o pedido de registo N/81XXX, para “IWATCH”, na classe 9, em tudo semelhante ao pedido de registo ora em discussão, o Tribunal Judicial de Base decidiu, em sentença proferida a 9 de Dezembro de 2015, no mesmo sentido que o Tribunal a quo.
cc) Por ser relevante para a decisão no presente caso e, por só na data acima mencionada ter sido proferida a referida sentença, requer-se a junção da certidão dessa decisão nos termos do Art. 451º N.º l do CPC, na medida em que a junção desse documento só é possível neste momento.
dd) Quando Recorrente afirma que a C não pode arrogar-se o monopólio de expressões que tenham no início a letra "I" e que essa letra seja distintivo da sua empresa, deve destacar-se que, na verdade, a associação do "I" à C apenas releva quando conjugada com outras palavras que a mesma criou e/ou com cujo uso no mercado, por si ou indirectamente, fez com que o público as associasse a essa fonte empresarial. Não tendo qualquer relevância para o caso o que a Recorrente alega relativamente ao uso da expressão "C WATCH" (sendo que na marca (cfr. fls. 512) também se visualiza a letra "i" na imagem da maçã que precede a palavra "watch"), a qual surgiu muito posteriormente à data do pedido de registo de marca em apreço. Além do mais, a decisão no presente recurso deve ser tomada tendo em conta os factos à data do pedido de registo - a marca "IWATCH" permanece na memória do consumidor como pertencendo à C e continua a ser por si usada no mercado e pode querer a vir usá-la no futuro.
ee) Nada relevando igualmente para o caso sub judice a decisão do Tribunal Judicial de Base a que a Recorrente alude, na medida em a marca apresentada a registo é completamente diferente da que está em discussão nestes autos.
ff) As marcas da Recorrente e Parte Contrária, pela singularidade e características próprias de cada uma e dos respectivos mercados, podem coexistir de forma pacífica, o risco de confusão ou erro ou associação no consumidor é inexistente.
gg) Pelo exposto fica, pois, afastada qualquer hipótese ou interesse de a Parte Contrária se aproveitar da reputação da Recorrente, obtendo para si qualquer tipo de vantagem injusta.
hh) No que diz respeito aos Doc. 1 a 4 ora juntos pela Recorrente, salienta-se que as decisões deles constantes respeitam a decisões administrativas em processos de registo da marca "IWATCH" com data posterior à decisão proferida em Macau pela DSE. Consequentemente é a decisão (favorável) proferida em Macau que goza de prioridade em relação a essas decisões e que poderá ser utilizada a título referencial nessas jurisdições (mas o contrário já não vale).
ii) Quanto ao Doc. 5 é necessário perceber que nessa decisão não se faz referência à C Inc..
jj) Mais, e sem conceder no que acima foi dito, sempre se diga que as decisões constantes desses documentos foram proferidas por Instâncias Administrativas nas respectivas jurisdições e que ainda não transitaram em julgado.
kk) Sendo de enfatizar que as decisões proferidas pelas entidades administrativas congéneres e Tribunais de outras jurisdições devem servir apenas de referência para decisão na RAEM, não sendo aqui vinculativas, prevalecendo sempre a análise casuística, que deve ter em conta as características do território de Macau, nomeadamente a sua pequena dimensão geográfica e o notório reconhecimento pelo público em geral dos produtos da C, com destaque para a "IWATCH".
Face ao explanado, resulta à sanidade dos factos que os arts. 199° n° 1 c) ex vi art. 197º e 214° n° 1 b) ex vi 215° n.º 1, nem o art. 159° do CCom à luz do art. 9° n° 1 c) ex vi 214° n° 1 a) do RJPI não são infringidos pelo pedido de registo de marca que tomou o N.º N/81XXX.
Nestes termos pugna pela improcedência do recurso e que, em consequência, seja mantida a sentença recorrida.
3. Foram colhidos os vistos legais.
II – FACTOS
Vêm provados os factos seguintes:
A) Em 5 de Junho de 2013, a contraparte apresentou o pedido de marca junto dos Serviços de Patente e Marca dos EUA – pedido n.º 8595XXXX, composição da marca “IWATCH”, a registar para os produtos das Classes 9 e 14.
B) Em 5 de Dezembro de 2013, a contraparte apresentou junto da DSE o pedido de registo da marca n.º N/81XXX, destinada à Classe 14, aos produtos/serviços de “instrumentos cronométricos, peças de relógio, e braceletes; acessórios, peças, componentes, e estojos para todos os artigos supra mencionados”. O estilo da marca é: IWATCH.
C) No momento em que apresentou o pedido de marca referido na alínea B), a contraparte também invocou junto da DSE o direito de prioridade com base no pedido de marca n.º 8595XXXX apresentado nos EUA em 5 de Junho de 2013, isto é, o pedido mencionado na alínea A).
D) Em 19 de Maio de 2014, veio a recorrente apresentar junto da DSE a reclamação e os documentos relacionados relativamente ao pedido de registo de marca mencionado na alínea B). (vide fls. 7 a 107 dos autos administrativos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido)
E) Em 25 de Julho de 2014, a contraparte apresentou junto da DSE a contestação e os documentos relacionados. (vide fls. 110 a 170 dos autos administrativos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido)
F) Em 13 de Novembro de 2014, o chefe do Departamento da Propriedade Intelectual da DSE concordou com a Informação n.º 687/DPI/2014, proferindo o despacho de deferimento do pedido de registo da marca n.º N/81XXX. (vide fls. 176 a 191 dos autos administrativos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido)
G) O despacho acima referido foi publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 49, II Série, de 3 de Dezembro de 2014.
H) Em 31 de Dezembro de 2014, veio a recorrente interpor o presente recurso para este Tribunal.
I) A recorrente é a titular da marca n.º 70XX/M, destinada à Classe 14, aos produtos/serviços de “metais preciosos e suas ligas e objectos destas substâncias ou de “plaque” (excepto cutelaria, garfos e colheres); joalharia, pedras preciosas; relojoaria e outros instrumentos cronométricos”, com data de pedido de registo em 31 de Dezembro de 1987.
J) A recorrente é a titular da marca n.º 67XXX, destinada à Classe 14, aos produtos/serviços de “metais preciosos e suas ligas e produtos nestas matérias ou em plaqué não incluídos noutras classes; joalharia, bijutaria, pedras preciosas; relojoaria e instrumentos cronométricos”, com data de pedido de registo em 10 de Julho de 2012.
K) A recorrente é a titular da marca n.º 88XX/M, destinada à Classe 14, aos produtos/serviços de “relógios bem como partes e acessórios dos mesmos”, com data de pedido de registo em 28 de Junho de 1988.
L) A recorrente é a titular da marca n.º N/81XXX, destinada à Classe 14, aos produtos/serviços de “Metais preciosos e suas ligas e produtos em metais preciosos ou em plaqué incluídos nesta classe, designadamente estatuetas, troféus; joalharia, nomeadamente anéis, brincos, botões de punho, pulseiras, amuletos, broches, correntes, colares, alfinetes de gravata, molas de gravata, guardajóias, estojos, pedras preciosas, pedras semi-preciosas (gemas); relojoaria e instrumentos cronométricos, nomeadamente relógios, cronógrafos, relógios de pulso, correias de relógios, relógios de parede ou de sala, despertadores e peças e acessórios para os artigos atrás referidos, nomeadamente agulhas, âncoras, mecanismos de relógios (rockers), tambores, caixas para relógios, correias para relógios, mostradores para relógios, mecanismos de relógios (clockworks), correntes de relógios, movimentos de relógios, molas de relógios, vidros de relógios, estojos para relojoaria, estojos para relógios”, com data de pedido em 4 de Dezembro de 2013.
M) A Parte Contrária integra o grupo de empresas da C.
N) O produto “IWATCH” foi lançado pela C em Setembro de 2014.
O) “IWATCH” veio juntar-se à família da C, cujo primeiro lançamento data de 1998, com o “IMAC”, passando pelo “ITUNES”, pelo “IPHONE”, ao “IPAD”, havendo uma vasta miríade de produtos comercializados pela C.
P) “IWATCH” estava conhecido em Macau.
III – FUNDAMENTOS
1. O objecto do presente recurso passa pela análise das seguintes questões, tal como individualizadas nas alegações da recorrente e que foram equacionadas e respondidas na douta sentença recorrida:
A decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base da qual ora se recorre entendeu que eram três as questões a decidir:
- Se o sinal IWATCH possui capacidade suficientemente distintiva;
- Se a marca pretendida constitui imitação ou reprodução das marcas da recorrente;
- Se a concessão do registo da marca IWATCH causa concorrência desleal.
2. Estas questões foram tratadas na douta sentença recorrida da seguinte forma:
“1. A capacidade distintiva do sinal IWATCH
Segundo a recorrente, o sinal IWATCH é composto por letra inglesa “I” e palavra inglesa “WATCH”, e “I” significa INTERNET e “WATCH” relógio, tendo a combinação o sentido de SMART WATCH, ou seja, relógio inteligente. Pelo que a mesma acha que IWATCH só indica uma espécie de produtos em geral, sem que possua uma capacidade suficientemente distintiva para que o consumidor possa distinguir os produtos ou serviços prestados por diferentes empresas. Nos termos do artigo 197.º e artigo 199.º, n.º 1 do RJPI aprovado pelo DL n.º 97/99/M de 13 de Dezembro, o sinal IWATCH não pode, evidentemente, ser registado como marca.
Cumpre agora apreciar os fundamentos do recurso.
Nos termos do artigo 197.º do RJPI aprovado pelo DL n.º 97/99/M de 13 de Dezembro,
Só podem ser objecto de protecção ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas. (sublinhados nossos)
De acordo com o disposto acima referido, o requisito mais fundamental para que o sinal ou conjunto de sinais seja registado como marca é a sua capacidade de distinguir adequadamente os produtos e serviços duma empresa. Isto é, o respectivo sinal tem que possuir uma capacidade suficientemente distintiva para ser registado como marca.
Acresce que, o artigo 199.º, n.º 1 do RJPI enumera expressamente os seguintes sinais não susceptíveis de protecção:
a) Os sinais constituídos exclusivamente pela forma imposta pela própria natureza do produto, pela forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico ou pela forma que confira um valor substancial ao produto;
b) Os sinais constituídos exclusivamente por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos;
c) Os sinais ou indicações que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio;
d) As cores, salvo se forem combinadas entre si ou com gráficos, dizeres ou outros elementos por forma peculiar e distintiva.
No caso vertente, é de crer que a recorrente teve como fundamento a alínea b) acima referida para invocar que o sinal IWATCH não é susceptível de protecção jurídica.
No entanto, salvo o devido respeito por opinião diferente, não concordo com o entendimento da recorrente. Primeiro, a letra “I” não necessariamente representa INTERNET, ou produto inteligente, especialmente quando temos em conta outros produtos fabricados e vendidos pela contraparte, tais como IPAD, IPHONE e IMAC, podemos descobrir que todos estes produtos têm a letra “I” como a letra inicial dos seus nomes. Acresce que, os referidos produtos são amplamente conhecidos pelo consumidor médio, pois é mais provavelmente que o sinal IWATCH leve as pessoas a pensar que o referido relógio é um novo produto da C, ao invés de associá-lo com a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor ou a proveniência geográfica do mesmo.
Na verdade, a marca SWATCH possuída pela recorrente também é constituída pela letra “S” e palavra inglesa “WATCH”. Pelo que não se pode negar a capacidade distintiva dum sinal pelo facto de este ser constituído por letras ou palavras inglesas simples. Razão pela qual, o sinal IWATCH pode ser o objecto da protecção de marca pelo não preenchimento do disposto no artigo 199.º, n.º 1, al. b) do RJPI e preenchimento do disposto no artigo 197.º, ambos do RJPI.
*
2. Imitação das marcas
A segunda questão a analisar é se a marca IWATCH pretendida pela contraparte B constitui imitação das marcas ,, ,e .
Ao abrigo do disposto no artigo 214.º, n.º 2, al. b) do RJPI aprovado pelo DL n.º 97/99/M de 13 de Dezembro, o pedido de registo também é recusado sempre que a marca ou algum dos seus elementos contenha “reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem, para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou que compreenda o risco de associação com a marca registada”.
O artigo 215.º do mesmo Regime define expressamente o que seja reprodução ou imitação de marca, da seguinte forma:
1. A marca registada considera-se reproduzida ou imitada, no todo ou em parte, por outra, quando, cumulativamente:
a) A marca registada tiver prioridade;
b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins;
c) Tenham tal semelhança gráfica, nominativa, figurativa ou fonética com outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
2. Considera-se reprodução ou imitação parcial de marca, a utilização de certa denominação de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada, ou somente do aspecto exterior do pacote ou invólucro com as respectivas cores e disposição de dizeres, medalhas e recompensas, de modo que pessoas analfabetas os não possam distinguir de outras adoptadas por possuidor de marcas legitimamente utilizadas.
Da disposição acima referida podem ser tirados os seguintes requisitos cumulativos da imitação de marca:
1. A marca imitada tem prioridade;
2. As marcas pretendidas e já registadas destinam-se a produtos ou serviços idênticos ou afins; e
3. A marca pretendida tem tal semelhança gráfica, nominativa, figurativa ou fonética com a marca registada que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada.
Quanto à prioridade, cumpre indicar que a recorrente é a titular das seguintes marcas:
- Marca n.º 70XX/M, destinada à Classe 14, com data de pedido de registo em 31 de Dezembro de 1987;
- Marca n.º 88XX/M, destinada à Classe 14, com data de pedido de registo em 28 de Junho de 1988.
- Marca n.º N/81XXX, destinada à Classe 14, com data de pedido em 4 de Dezembro de 2013.
- Marca n.º 67XXX, destinada à Classe 14, com data de pedido de registo em 10 de Julho de 2012.
Segundo os factos dados como provados, a “IWATCH” tem prioridade sobre a marca n.º N/81XXX da recorrente, já que a contraparte, ao pedir o registo da marca “IWATCH”, também invocou junto da DSE o direito de prioridade com base no pedido de registo da marca n.º 8595XXXX por esta apresentado nos EUA em 5 de Junho de 2013. O invocado direito de prioridade foi admitido pela DSE, e a recorrente não suscitou dúvida relativamente a isso.
Pelo que se pode afastar de imediato a possibilidade de “IWATCH” imitar.
Razão pela qual, o conhecimento desta causa deve focar a eventual imitação das marcas registadas, e .
Quanto ao segundo requisito, quer dizer a identidade ou afinidade dos produtos ou serviços a que as marcas destinam-se a assinalar, tendo em conta que todas as marcas em causa são destinadas a assinalar produtos da Classe 14, verifica-se, sem dúvida, tal requisito.
Portanto, analisaremos principalmente se existe entre as marcas a situação prevista no artigo 215.º, n.º 1, al. c).
Segundo a recorrente, a marca pretendida IWATCH é, literal e foneticamente, muito semelhante às marcas já registadas as, e , sendo a única diferença a letra inglesa antes da palavra WATCH.
Cumpre indicar que, no julgamento de existir ou não reprodução ou imitação entre marcas, deve analisar-se a composição integral destas ao invés de simplesmente alguma parte componente, regre essa admitida pela doutrina1 e jurisprudência2.
Para verificar a existência ou não de imitação de marca, é importante julgar se a semelhança ou afinidade irá induzir facilmente o consumidor em erro ou confusão ou compreende um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
Portanto, o núcleo do terceiro requisito está, de facto, em saber se a marca pretendida é susceptível de causar um risco de confusão, quer em sentido lato, quer estrito. Quanto a esse aspecto, o estudioso luso Luís Couto Gonçalves refere:
“A doutrina dominante tem ligado esse risco ao conceito de “confusão em sentido amplo”. Assim sendo passa a haver o conceito de confusão em sentido estrito para as situações-típicas em que haja o risco do público-consumidor confundir a origem dos produtos ou serviços, e o conceito de confusão em sentido amplo para as situações-atípicas em que o público consumidor, reconhecendo a diferente origem dos produtos ou serviços, incorra no risco de pensar existir uma qualquer relação de tipo jurídico, económico ou comercial entre as diferentes origens(…)”.
Certo é que, é relativamente subjectiva a questão de se vai causar confusão para o consumidor, já que diferentes pessoas podem ter diferentes opiniões relativamente a uma mesma marca. No caso vertente, entretanto, a maior semelhança entre a marca IWATCH e as marcas registadas , e é a palavra da língua inglesa “WATCH” que, como se sabe, significa relógio e é usual na linguagem corrente e também representa uma espécie de produtos. Pelo que a própria palavra “WATCH” não tem a capacidade distintiva necessária para ser marca. No que tange às marcas em causa, estas são constituídas, principalmente, pela palavra “WATCH” e letra “S” ou “I” que é adiada à sua frente. Apesar de tais conjuntos poderem fornecer um básico carácter distintivo, estes são, objectivamente, sinais com capacidade distintiva relativamente fraca. Na verdade, a sua capacidade distintiva vem, para além das gráficas, letras ou fonética dos sinais, também do facto de estes ser conhecidos pela maioria dos consumidores em Macau. É de crer que a marca de relógio SWATCH não é estranha ao consumidor em Macau, já que os produtos associados com a marca estão no mercado de Macau há muitos anos e são amplamente conhecidos pelo consumidor. Por outro lado, embora os produtos de relógio associados com IWATCH fossem lançados há tempo relativamente curto, é de crer que tanto o consumidor de produtos electrónicos como o consumidor médio conhece a empresa “C” que lançou o referido produto de relógio, já que a empresa já lançou vários produtos electrónicos altamente populares, tais como IMAC, IPAD e IPHONE, que se iniciam com a letra “I”. Ora a marca em causa IWATCH também tem a letra “I” como a sua parte componente, o que facilmente leva as pessoas a associar o relógio com um novo produto electrónico da empresa “C”, de forma que o distinga facilmente com a Marca SWATCH da recorrente.
Acredito que a concessão do registo do sinal IWATCH não vai induzir facilmente o consumidor em erro ou confusão nem compreende o risco de associação do sinal com marca anteriormente registada. Pelo que a marca ora concedida IWATCH não constitui a imitação das marcas registadas , e .
Já que não há imitação, não é necessário analisar se as marcas possuídas pela recorrente são notoriamente conhecidas ou prestigiadas.
*
3. Concorrência desleal
Ultimamente, a recorrente pede que o Tribunal recuse o registo da marca da contraparte pela concorrência desleal. O fundamento desse pedido baseia-se principalmente na sua invocação da imitação pela contraparte. No entanto, como acima se referiu, o Tribunal entende que as marcas da contraparte e da recorrente não induzem o consumidor em confusão, pelo que não prejudicam a sua escolha correcta entre os produtos das duas partes. Por outras palavras, é impossível existir a concorrência desleal invocada pela recorrente.
Razão pela qual, o recurso improcede nesta parte. “
3. Questão muito próxima à que se discute nestes autos foi já tratada neste TSI, no acórdão de 23/6/2016, Proc. n.º 348/2016, confirmando-se a decisão aí proferida na 1ª Instância em termos idênticos aos que foram seguidos na sentença ora recorrida e, no essencial, mantemos aqui a mesma posição.
4. Em relação à questão da distintividade da marca remetemo-nos para o excurso plasmado na douta sentença acima transcrita, considerando-se, em suma que a marca “IWATCH”, não obstante constituída pelo núcleo mais impressivo de um objecto comum e generalizado, como seja o caso do relógio, aquela letrinha que a antecede, o “i” faz toda a diferença, sugerindo uma série de interpretações para que inculca ali a sua aposição.
Não tem razão a recorrente, nos termos acima consignados, ao pretender ligar necessariamente essa letra a “internet”, não obstante noutros ordenamentos esse entendimento ter sido acolhido, como se observa de documentação junta aos autos.
5. Passamos então à segunda questão e se reconduz à confundibilidade das marcas.
Nesta particular questão somos a apartarmo-nos do entendimento vertido naquela douta sentença, ora recorrida, e aproximamo-nos do entendimento já sufragado neste Tribunal, nos termos do aresto acima referenciado.
Não é preciso elucubrar muito sobre a confundibilidade, sendo certo que há aí sempre uma carga de subjectividade muito grande. O que para mim é confundível, já o poderá não ser para outra pessoa.
O que está em causa é a a possibilidade de confusão entre “IWATCH” e “iswatch”, o que releva para efeito do disposto nos artigos 214. 2,b), 215º e 219º do RJPI. Se uma marca imita ou se confunde com outra previamente registada não deve ser admitida a registo.
Claro que que depois há outras regras que jogam com a protecção das marcas notórias e de prestígio que por ora não interessa analisar.
6. Os critérios para se apreciar da confundibilidade estão no artigo 215º supra citado.
A doutrina glosa aqueles critérios:
“A comparação que define a semelhança verifica-se entre um sinal e a memória que se possa ter doutro.
É que o consumidor médio quase nunca se defronta com os dois sinais, um perante o outro, no mesmo momento; a comparação que entre eles pode fazer não é assim simultânea, mas sucessiva…
é a memória do primeiro que existe quando o segundo aparece, pelo que nesse momento, apenas as semelhanças ressaltam.
(…)
Na apreciação do risco de confusão, há que ter em atenção a força distintiva dos sinais em causa, pois os sinais fortes estão por natureza, especialmente vocacionados para perdurarem na memória do público.”3
Face ao exposto, afigura-se haver o risco de confusão entre as referidas marcas, desde logo, porque se trata do mesmo produto que se passa a designar quase da mesma forma, com um grande enfoque na componente fonética, onde o “s” único elemento destrinçador pode bem sumir-se na pronúncia ou na audição, especialmente numa zona geográfica em que o destinatário comum desses produtos não usa o inglês como língua veicular.
Muito embora respeitando entendimento diverso, somos a equacionar a possibilidade de confusão entre aquelas marcas, possibilidade que se adensa na exacta medida do que se nos dá conta do que se vem passando noutros ordenamentos, desde o Reino Unido à China, sobre esse risco de confundibilidade. Referência esta que não se configura de forma alguma como decisiva, visto que essas decisões ou entendimentos não vinculam na ordem interna da RAEM, pretendendo-se apenas frisar a diversidade e subjectividade ínsita nesta abordagem.
7. Optando-se pela tese da distintividade, o problema fica resolvido, com a possibilidade de convivência das duas marcas diferentes e inconfundíveis.
Mas para quem, como nós, opte pela possibilidade de ocorrer o risco de confusão, então o problema tem de ser resolvido pela regra da prioridade do registo, na linha do já anteriormente decidido nesta instância, tal como acima visto.
Neste caso, a ora recorrente A, em princípio, teria prioridade porquanto pediu o registo na RAEM um dia mais cedo do que a recorrida B, não fora o caso de esta ter registado anteriormente e no prazo de 6 meses no EUA, prevalecendo-se do direito de prioridade consagrado no art. 4º da Convenção de Paris para a Protecção da Propriedade Industrial, em vigor em Macau, sendo os EUA um país signatário dessa convenção.
Dispõe o artigo 4º da Convenção de Paris para a Protecção da Propriedade Industrial:
“Aquele que tiver apresentado, em termos, pedido de patente de invenção, de depósito de modelo de utilidade, de desenho ou modelo industrial, de registo de marca de fábrica ou de comércio num dos países da União, ou o seu sucessor, gozará, para apresentar o pedido nos outros países, do direito de prioridade durante os prazos adiante fixados.
2) Reconhece-se como dando origem ao direito de prioridade qualquer pedido com o valor de pedido nacional regular, formulado nos termos da lei interna de cada país da União ou de tratados bilaterais ou multilaterais celebrados entre países da União.
3) Deve entender-se por pedido nacional regular todo o pedido efectuado em condições de estabelecer a data em que o mesmo foi apresentado no país em causa, independentemente de tudo o que ulteriormente possa, de algum modo, vir a afectá-lo.
B) Em consequência, o pedido apresentado ulteriormente num dos outros países da União antes de expirados estes prazos não poderá ser invalidado por factos verificados nesse intervalo, designadamente por outro pedido, pela publicação da invenção ou sua exploração, pelo oferecimento à venda de exemplares do desenho ou do modelo ou pelo uso da marca, e esses factos não poderão fundamentar qualquer direito de terceiros ou posse. Os direitos adquiridos por terceiros antes do dia da apresentação do primeiro pedido que serve de base ao direito de prioridade são ressalvados nos termos da lei interna de cada país da União.
C) — 1) Os prazos de prioridade atrás mencionados serão de doze meses para invenções e modelos de utilidade e de seis meses para os desenhos ou modelos industriais e para as marcas de fábrica ou de comércio.
2) Estes prazos correm a partir da data da apresentação do primeiro pedido; o dia da apresentação não é contado.
3) Se o último dia do prazo for feriado legal ou dia em que a Secretaria não se encontre aberta para receber a apresentação dos pedidos no país em que a protecção é requerida, o prazo será prorrogado até ao primeiro dia útil que se seguir.
(…)
D) — 1) Quem quiser prevalecer-se da prioridade de um pedido anterior deverá formular declaração em que indique a data e o país desse pedido. Cada país fixará o momento até ao qual desta declaração deverá ser efectuada.
(…)”
A matéria relativa ao direito de prioridade das marcas e outros direitos está também regulamentada no Cap. II do RJPI (incorrectamente denominado de Direito de Propriedade), em termos que não se apartam muito dos regulados na Convenção, dispondo-se no art. 15º:
“1. Salvo os casos previstos no presente diploma, o direito de propriedade industrial é concedido àquele que primeiro apresentar regularmente o pedido acompanhado de todos os documentos exigíveis para o efeito.
2. Se os pedidos forem remetidos pelo correio, a remessa deve ser efectuada sob a forma de correiro (leia-se correio) registado ou equivalente, aferindo-se a precedência pela data de registo.
3. No caso de dois pedidos relativos ao mesmo direito serem simultâneos ou de terem idêntica prioridade, não lhes é dado seguimento sem que os interessados resolvam previamente a questão da prioridade por acordo ou no tribunal cível competente.
4. Se o pedido não for desde logo acompanhado de todos os documentos exigíveis para o efeito, a prioridade conta-se do dia e hora em que for apresentado o último documento em falta.
5. Se o objecto do pedido for alterado em relação à publicação inicial do aviso no Boletim Oficial, esse facto implica a publicação de novo aviso e a prioridade da alteração é contada da data em que esta foi requerida.
No artigo 16º:
1. Aquele que tiver apresentado regularmente pedido de concessão de direito de propriedade industrial previsto no presente diploma, ou direito análogo, em qualquer dos países ou territórios membros da OMC ou da União, ou em qualquer organismo intergovernamental com competência para conceder direitos que produzam efeitos extensivos a Macau, ou o seu sucessor, goza, para apresentar o pedido em Macau, do direito de prioridade estabelecido na Convenção da União de Paris para a Protecção da Propriedade Industrial.
2. Reconhece-se como dando origem ao direito de prioridade qualquer pedido com o valor de pedido regular, formulado nos termos da lei interna de cada país ou território membro da OMC ou da União, ou de tratados bilaterais ou multilaterais celebrados entre países ou territórios membros da OMC ou da União.
3. Entende-se por pedido regular todo o pedido efectuado em condições de estabelecer a data em que o mesmo foi apresentado no país ou território em causa, independentemente de tudo o que ulteriormente possa, de algum modo, vir a afectá-lo.
4. Em consequência do disposto no número anterior, o pedido apresentado ulteriormente em Macau, antes de expirado o prazo de prioridade, não pode ser invalidado por factos verificados nesse intervalo, designadamente por outro pedido ou pela publicação do objecto do pedido ou pela sua exploração.
No artigo 18.º:
1. A DSE exige dos que invoquem o direito de prioridade a apresentação de cópia do primeiro pedido, devidamente autenticada pela entidade receptora, bem como de certificado da data da sua apresentação e, se necessário, de uma tradução para uma das línguas oficiais.
2. A exigência referida no número anterior pode ser feita em qualquer momento, mas o requerente pode satisfazê-la até ao termo do prazo de 3 meses a contar da data do pedido.
(…)”
8. Este pedido de prioridade não deixou de ser aceite pela DSE, muito embora tenha vindo a fixar-se no argumento da distintividade, argumento que foi acolhido no TJB, razão por si só suficiente para conceder o registo requerido “IWATCH” que considerou compatível com o registado como “iswatch”.
Nesta conformidade, mesmo que se entenda que as marcas são confundíveis, passa a relevar o critério da prioridade nos termos acima consagrados. O que significa que a prioridade vai ser aferida em função de um pedido feito no âmbito geográfico dos países da Convenção e dentro de um prazo de seis meses. Tal como se o pedido feito num país terceiro signatário fosse feito em Macau. Pelo que a recorrida beneficia da prioridade no registo.
Como já acima se disse, a não haver confundibilidade, não há razão para disputa sobre a realização de um único registo que exclua o outro com o qual não se confunde.
Daí, ainda que por outras razões e fundamentos, não deixará a ora recorrida B de ter direito a que o registo seja realizado a seu favor, não havendo outras razões que a tal impeçam.
Aliás, este requisito da prioridade, com assento na ordem interna ou internacional, como é o caso, não deixa de ser um factor contemplado no artigo 215º, n.º 1, a) do RJPI. Só nesse caso se colocará a questão da disputa de duas marcas confundíveis que lutam pelo mesmo espaço; só aí se coloca a questão de saber qual a que prefere, aquela que é prioritária. Não havendo reprodução ou imitação de marca já essa questão não se coloca, como parece ser óbvio.
9. Posto isto, prejudicado fica o conhecimento da questão relativa à quebra das regras concorrenciais.
Para quem opte pela tese da confundibilidade, para que se propende, a questão só se colocaria para a marca que não beneficia da prioridade, a da recorrente, mas essa é questão que não se põe, não só porque lhe foi concedido um registo que não foi impugnado e porque a contraparte, a B, ora recorrida, defende nos autos que as marcas se não confundem e a possibilidade de convivência comercial das duas marcas no mesmo ordenamento.
10. Relacionada com esta questão, invoca-se a violação das regras protectoras da notoriedade de uma dada marca, como seria o caso da “swatch”.
Mas se bem atentarmos não é esta a marca que se disputa e confronta nestes autos, mas sim “iswatch”. São coisas diferentes. Ainda que comercializados pelo mesmo grupo empresarial os bens que são objecto de incidência das apontadas marcas, são estas (as marcas) que aqui relevam e já não os bens as que se destinam. Isto é, ainda que se reconheça a notoriedade e o prestígio da marca “swatch”, tal não abrange a marca “iswatch”, donde não se poder relevar este argumento no dissídio entre as partes e que aqui tem por objectivo o impedimento ou não registo da marca “IWATCH”.
11. A ora recorrente, ab initio, impugna a fixação da matéria de facto, ao dizer que não se fez prova nos autos de que a pretensa marca “IWATCH” está ligada aos produtos da “C” e de que esses produtos são conhecidos e comercializados como tal em Macau.
Na verdade, parece ter razão a recorrente, não se vendo com base e em que provas se forjou esse entendimento, para além de uma aparente suposição de que assim pudesse ser. Como bem se alcança, entre os diversos produtos da “C” o “iwatch” não aparece identificado sob essa designação, ao contrário de outros produtos como o “ipad”, o “ipod”, o “iphone”, antes como “Cwatch”.
Adivinham-se, por mera conjectura, as dificuldades advindas de regras comerciais em torno da disputa da requerida marca por esse mundo fora.
De qualquer modo, esta questão e esta crítica a um julgamento de facto, ínsito à decisão ora recorrida, não releva minimamente para a dilucidação do thema que ora nos ocupa. Ou seja, mesmo que se provasse o contrário, ou não se provasse coisa nenhuma sobre essa concreta factualidade, em nada se alteraria o ora decidido, a partir do ponto em que se admitem duas marcas com carácter distintivo, passíveis de serem registadas, independentemente da concepção que se tenha sobre a sua confundibilidade e sobre a prioridade que qualquer delas deva merecer sobre a outra.
Também para quem entenda que as marcas em presença não são confundíveis, essa matéria de facto continua a mostrar-se irrelevante, na exacta medida em que não é pela notoriedade, implantação, acolhimento junto do consumidor ou prestígio das marcas a que estejam ligadas que a questão é dirimida.
Pelas apontadas razões somos a confirmar a decisão proferida com fundamento na prioridade do pedido de registo obtida ao abrigo do art. 4º da Convenção de Paris, prioridade que foi aceite pela DSE e não impugnada nos autos.
No mais nos remetemos para a douta sentença recorrida.
IV – DECISÃO
Nos termos e fundamentos expostos, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Macau, 15 de Junho de 2017,
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 Direito de Marcas, Luís M.Couto Gonçalves, 2ª Ed., p.137.
2 Cfr. Acórdãos do TSI, processos n.º 436/2011 e n.º 842/2012.
3 - Carlos Olavo, citando Ferrer Correia, Propriedade Industrial, Almedina, 1997, 51
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