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Processo n.º 379/2017 Data do acórdão: 2017-6-29 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– roubo
– desistência do crime
– art.º 23.º, n.º 1, do Código Penal
S U M Á R I O
No caso dos autos, foi por o arguido ter descoberto que estava prestes a conseguir ser perseguido com êxito pela ofendida que ele deitou a carteira desta para rua perto de um caixote de lixo, daí que se se pudesse falar de alguma desistência do crime de roubo, essa desistência nunca seria espontânea para os efeitos a relevar do disposto no art.º 23.º, n.º 1, do Código Penal, dado que independentemente do demais, a desistência do crime para ser relevante tem de ser espontânea, o que não acontece quando o agente foi obrigado a desistir.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 379/2017
(Autos de recurso penal)
Recorrente (arguido): B (B)




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido a fls. 330 a 335v dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR2-16-0457-PCC do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou como autor material de um crime consumado de roubo, p. e p. pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea b), do Código Penal (CP), com referência à circunstância prevista no art.º 198.º, n.º 2, alínea f), do mesmo diploma, na pena de cinco anos e seis meses de prisão, veio o arguido B, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), alegando, materialmente, que a factualidade provada nos autos, aliás não impugnada por ele, constitui um caso de desistência do crime nos termos e para os efeitos do art.º 23.º, n.º 1, do CP, pelo que ele deve passar a ser punido como autor material de um crime consumado de ofensa simples à integridade física do art.º 137.º, n.º 1, do CP, e que, subsidiariamente falando, a sua conduta de roubo só deve ser punida a título de roubo tentado (em vez de consumado), e que por fim, ainda subsidiariamente falando, merece ele a redução da pena nos termos gerais (cfr. com mais detalhes, a motivação do recurso apresentada a fls. 342 a 355v dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público no sentido de improcedência (cfr. a resposta de fls. 357 a 360).
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 370 a 372), opinando também pela confirmação do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Não sendo impugnada a matéria de facto já dada por provada em primeira instância, é de tomá-la na íntegra como fundamentação fáctica do presente acórdão de recurso, nos termos permitidos pelo art.º 631.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, ex vi do art.º 4.º do Código de Processo Penal.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, conhecendo.
Desde já, improcede a tese do arguido de desistência do crime, porquanto: o facto provado 8 (descrito no 5.º parágrafo da página 5 do texto do acórdão recorrido, a fl. 332 dos autos) demonstra que foi por o arguido ter descoberto que estava prestes a conseguir ser perseguido com êxito pela senhora ofendida dos autos que ele deitou a carteira da ofendida para rua perto de um caixote de lixo, daí que se se pudesse falar de alguma desistência do crime de roubo, essa desistência nunca seria espontânea para os efeitos a relevar do disposto no art.º 23.º, n.º 1, do CP, dado que independentemente do demais, a desistência do crime, de que se fala neste artigo, “para ser relevante tem de ser espontânea, o que não acontece, v.g., quando o agente foi obrigado a desistir” (neste sentido, cfr. M. LEAL-HENRIQUES e M. SIMAS SANTOS, in CÓDIGO PENAL DE MACAU, 1997, Macau, página 70, primeiro parágrafo, anotação doutrinária essa já seguida no acórdão deste TSI, de 19 de Maio de 2016, no Processo n.º 902/2015.
E agora da questão da tentativa: também a razão não está no lado do arguido, porque na esteira da posição jurídica já veiculada minuciosamente a propósito do conceito de “subtracção” no acórdão deste TSI, de 13 de Novembro de 2014, no Processo n.º 543/2014, e sem mais desenvolvimento aqui por ocioso, a matéria de facto descrita e dada por provada no acórdão ora recorrido (veja-se, em concreto, os factos provados 1 a 5 e 13 a 15) já preenche cabalmente o tipo-de-ilícito, na forma consumada (e não tentada, como pretende o recorrente), de roubo qualificado do art.º 204.º, n.º 2, alínea b), do CP.
Por fim, da medida da pena: ponderadas, à luz dos padrões da medida da pena vertidos nos art.os 40.º, n.os 1 e 2, e 65.º, n.os 1 e 2, do CP, todas as circunstâncias fácticas já apuradas pelo Tribunal a quo e descritas como provadas no texto da decisão recorrida, a pena de cinco anos e seis meses de prisão achada aí dentro da correspondente moldura penal de três a quinze anos de prisão, está ainda dentro da razoabilidade, pelo que é de respeitar a decisão recorrida nesta matéria.
Do analisado acima, resulta indicada a manutenção do julgado, sem mais indagação, por já estar logicamente prejudicada ou precludida, sobre todo o remanescente argumentado na motivação do recurso.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar não provido o recurso.
Custas pelo arguido, com três UC de taxa de justiça e três mil patacas de honorários a favor do seu Ex.mo Defensor Oficioso.
Macau, 29 de Junho de 2017.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
(vencido porque entendo que conforme os factos provados pelo Tribunal a quo, o arguido não tinha a carteira da ofendida da forma pacífica, pelo que o crime cometido pelo arguido deveria ser da forma tentada.)



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