Processo n.º 407/2017
(Recurso Civil)
Relator: João Gil de Oliveira
Data : 20/Julho/2017
ASSUNTOS:
- Compensação dos dias de descanso semanal não gozados
- Compensação dos dias de trabalho em feriados obrigatórios
- Formulação de pedido genérico indevida
- Anulação parcial do julgamento e liquidação do objecto e da quantidade devidos em sede de execução de sentença
- Trabalho prestado a mais diariamente correspondente ao período de 30 minutos de apresentação prévia, habitual e obrigatória ao trabalho
- Subsídio de alimentação; natureza
- Subsídio de efectividade
- Custos do alojamento
SUMÁRIO :
1. No âmbito do Decreto-Lei n." 24/89/M de 03 de Abril, para além do pagamento do trabalho efectivamente prestado pelo recorrente em dia de descanso semanal, se a recorrida não pagou ao seu trabalhador outro qualquer acréscimo salarial, em violação ao disposto não art. 17º daquele diploma legal, este deve ser compensado a esse título com o montante devido a título do dobro do salário e não só de apenas mais um montante em singelo.
2. A formulação de um pedido genérico indevido, fora dos casos em que taxativamente é admitido nos termos do art. 392º do CPC, se não tiver sobrevindo oportunamente um despacho de aperfeiçoamento, é geradora de absolvição de instância, seja no saneador, seja na sentença final, por se tratar de um pressuposto processual inominado.
3. A quantificação do montante estará dependente do concreto apuramento de dias de descanso não gozados. Se no apuramento das compensações devidas se entra com um número de dias de trabalho que não foi objecto de prova, partindo-se de uma alegação do autor, oportunamente contestada, há uma insuficiência na sentença geradora da sua anulação nessa parte e da repetição parcial do julgamento para apuramento dessa factualidade.
4. Embora se acolha a linha jurisprudencial mais permissiva, no sentido de que sempre que o tribunal verificar o dano ou a prestação devida, mas não tiver elementos para fixar o seu valor, quer se tenha pedido um montante determinado ou formulado um pedido genérico, cumpre-lhe relegar a fixação do montante indemnizatório para liquidação em execução de sentença - mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade ao autor que tenha deduzido pedido líquido de provar o quantitativo devido, não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal, na medida em que a existência de danos já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor e só no caso de se não ter provado a existência de prestação devida é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto no posterior incidente de liquidação, estando subjacente a esta jurisprudência a ideia de que razões de justiça e de equidade impedem que se absolva a demandada uma vez demonstrada a sua obrigação -, se tiver havido já uma liquidação e o apuramento de uma base de cálculo, não havendo elementos para a compreender e alcançar, há que repetir primeiramente o julgamento para dilucidar tal questão.
5. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado pelo trabalhador em feriados obrigatórios “remunerados”, mas somente a partir de 3 de Abril de 1989, vista a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 24/89/M, a fórmula há-de corresponder ao “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal”, para além naturalmente da retribuição a que tem direito, caso tenha que trabalhar nesses feriados, a despeito da regra da dispensa obrigatória de prestação de trabalho (art.ºs 20.º, n.º 1, e 19.º, n.ºs 2 e 3), o que equivale ao “triplo da retribuição normal”.
6. Afigura-se evidente a excepcionalidade do acréscimo de trabalho, em sede do trabalho prestado a mais, em vista até dos fins ressalvados no n.º 1 do art. 10º do DL24/89/M. A partir do momento em que se obriga o trabalhador a comparecer todos os dias no local de trabalho com a antecedência de 30 minutos, sem que se conclua que se trata de um tempo de preparação e de não trabalho efectivo, esse serviço tem de ser remunerado.
7. O subsídio de alimentação ou de refeição depende da prestação efectiva de trabalho, fazendo todo o sentido que assim seja, tendo até em vista a sua natureza e os fins a que se propõe. Destinar-se-á a fazer face a um custo suplementar a suportar por quem trabalha e por quem tem de comer fora de casa ou com custos acrescidos por causa do trabalho.
8. Em relação ao subsídio de efectividade, vista a sua natureza e fins - já não se manifestam as razões que levam a considerar que a sua atribuição esteja excluída numa situação de não assiduidade justificada ao trabalho. Se o patrão autoriza uma falta seria forçado retirar ao trabalhador uma componente retributiva da sua prestação laboral, não devendo o trabalhador ser penalizado por uma falta em que obteve anuência para tal e pela qual o patrão também assumiu a sua responsabilidade.
9. As despesas de água, electricidade, gaz e limpeza dos alojamentos parecem inerentes a um alojamento, que se tem por gratuito, não fazendo sentido impender a obrigação de pagar esses custos sobre o empregador, situação que a própria lei exclui expressamente, para mais se nem sequer se comprova que tenha sido a empregadora a comprometer-se a alojar a pessoa por si contratada. Estando aqueles custos muito ligados ao alojamento, não se compreende até que se possa estimar um valor certo de MOP 750,00 (valor que o empregador deduz de forma certa e permanente ao salário do trabalhador), como a quantia correspondente aos gastos efectuados por cada um dos trabalhadores e por cada um dos alojamentos, quantia que há-de ser necessariamente variável.
O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira
Processo n.º 407/2017
(Recurso Civil)
Data : 20/Julho/2017
Recorrentes : - A (Autor)
- B, SARL
- C
Recorridos : - Os mesmos
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – RELATÓRIO
1. A, mais bem identificado nos autos, vem interpor recurso da decisão proferida no TJB, alegando, em síntese conclusiva:
1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual foi julgada parcialmente improcedente ao ora Recorrente as quantias pelo mesmo reclamadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e feriados obrigatórios;
2. Salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de Direito quanto à concreta forma de cálculo devida pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e de feriado obrigatórios e, nesta medida, se mostra em violação ao disposto nos artigos 17.°, 19.° e 20.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, razão pela qual deve a mesma ser julgada nula e substituída por outra que atenda à totalidade dos pedidos reclamados pelo Autor na sua Petição Inicial;
Em concreto,
3. Ao condenar a Recorrida a pagar ao ora Recorrente apenas uma quantia em singelo pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal não gozado, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, na medida em que de acordo com o referido preceito se deve entender que o mesmo trabalho deve antes ser remunerado em dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, acrescido de um outro dia de descanso compensatório, tal qual tem vindo a ser seguido pelo Tribunal de Segunda Instância;
4. De onde, resultando provado que durante todo o período da relação laboral o ora Recorrente não gozou dos respectivos dias de descanso semanal deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$44.000,00 a título do dobro do salário - e não só de apenas MOP$22.000,00 correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento, devendo manter-se a restante condenação da Ré no pagamento da quantia devida a título de não gozo de dias de descanso compensatório em virtude do trabalho prestado em dia de descanso semanal;
Acresce que,
5. Contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal a quo, não parece correcto concluir que pela prestação de trabalho nos dias de feriados obrigatórios se deva proceder ao desconto do valor do salário em singelo já pago;
6. Pelo contrário, salvo melhor opinião, a fórmula correcta de remunerar o trabalho prestado em dia de feriado obrigatório nos termos do disposto no artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril - ainda que a determinar em sede de liquidação de execução de Sentença - será conceder ao Autor, ora Recorrente, um "acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuiçiio normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito" - o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal - conforme tem vindo a ser entendido pelo douto Tribunal de Segunda Instância - devendo a mesma ser determinada em sede de liquidação de execução de sentença.
Nestes termos e nos de mais de Direito que V. Exas. encarregar-se-ão de suprir, deve a douta Sentença ser julgada nula e substituída por outra que atenda aos pedidos tal qual supra formulados, assim se fazendo a já costumada JUSTIÇA!
2. A este recurso respondem a B e a C, dizendo:
I - Vem o Autor colocar em crise a douta sentença recorrida por entender que andou mal o Tribunal de Primeira Instância ao adoptar o entendimento seguido pelo Tribunal de Última Instância a respeito do pagamento do trabalho prestado em dia de descanso semanal condenando assim as Rés, Recorridas, apenas ao valor correspondente a um salário em singelo e não ao dobro pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, mais alegando o Autor que o tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos conecta do disposto na alínea a), n° 6 do artigo 17º do DL 24/89/M de 3 de Abril.
II - No entanto, e quanto à forma de cálculo adoptada para apuramento de eventual compensação quanto aos descansos semanais as Recorridas concordam com a formula adoptada pelo Tribunal a quo que mais não é do que a formula que é apresentada pelo Tribunal De Última Instancia, pois tal apuramento mais não segue senão o que está escrito na lei já que estabelece o n° 6, alínea a) do artigo 17° do aludido diploma legal que : "O trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago:
a) Aos trabalhadores que auferem salário mensal, pelo dobro da retribuição."
Referindo-se a lei ao trabalho que deve ser pago pelo dobro da retribuição e não à compensação que deve ser paga pelo dobro, referindo-se muito concretamente ao valor do trabalho efectuado em dia de descanso semanal e não ao valor da compensação.
III - Pelo que a interpretação literal da lei foi bem feita pelo Tribunal a quo e pelo Tribunal de Última Instância, sendo, aliás, esta mesma interpretação a perfilhada pelo Dr. Miguel Quental, Ilustre mandatário do ora Recorrente, no seu livro "Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau", pags. 283 e 284, quando diz: "Da nossa parte, sernpre nos pareceu como mais correcto que a expressão "dobro da retribuição normal" queria significar para os trabalhadores que auferem um salário mensal o direito a auferir o equivalente a 100% da mesma retribuição, a acrescer ao salário já pago.", bem como a posição do Professor Teixeira Garcia no seu livro" Lições do Direito do Trabalho" Parte II, pago 186, nota 18.
IV - Assim. e de acordo com decisões de Tribunais Superiores de Macau, designadamente com a decisão nº 28/2007 proferida pelo Tribunal de Última Instância, de acórdão datado de 21 de Setembro de 2007, nas situações em que o trabalhador já tenha recebido o salário normal correspondente ao trabalho prestado nos dias de descanso semanal, só terá então direito a receber outro tanto, e não em dobro, porquanto o trabalhador já foi pago em singelo, pelo que, caso resulte que o Recorrente não foi pago pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal, - o que não se concede -, este apenas terá direito a receber outro tanto da remuneração diária média, mas não em dobro, tal como é reclamado, devendo, por isso, improceder o recurso apresentado pelo Recorrente.
V - O Recorrente vem também colocar em crise a sentença proferida pelo Tribunal "a quo" na parte em que faz o cálculo quanto à compensação pelo trabalho prestado em dia de feriado.
VI - Ora, entendem as Recorridas que o cálculo apurado pelo Tribunal "a quo", que vai na mesma senda do Tribunal De Última Instância, mais uma vez, faz uma interpretação acertada da lei pois de acordo com o n° 1 do artigo 20° do mesmo diploma, "O trabalho prestado pelos trabalhadores nos dias deferiado obrigatório, referidos no nº 3 do artigo anterior, dá direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal (…)", i.e. se o trabalhador prestar trabalho no dia de feriado obrigatório para além do salário que já recebeu em singelo, terá direito ao dobro a título de compensação e não ao triplo, como erradamente é interpretado pelo Recorrente, indo no mesmo sentido o Tribunal de Última Instância sendo entendimento deste Tribunal Superior que tendo o trabalhador sido remunerado em singelo pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, o mesmo só terá direito a auferir o dobro da sua retribuição (cfr. Decisão n.º 28/2007 proferida pelo Tribunal de Última Instância, acórdão datado de 21 de Setembro de 2007).
VII - Assim, caso resulte provado que o Autor, ora Recorrente, tenha trabalhado em feriados obrigatórios e se for possível determinar o número de dias que prestou trabalho em dia de feriado obrigatório - o que deveras se não concede -, tendo em conta que o Autor foi sempre remunerado pela sua prestação de trabalho em dias de feriados obrigatórios no valor de um dia de salário normal diário, o mesmo apenas teria direito a receber o dobro do salário normal diário por cada dia de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório e nunca o triplo. Devendo, por isso, improceder também aqui o recurso apresentado pelo Recorrente.
Assim, e nestes termos, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser considerado totalmente improcedente, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
3. B, S.A.R.L. e Sociedade de Jogos de Macau, S.A., com os melhores sinais dos autos, vêm interpor recurso da mesma sentença, alegando, em síntese:
1. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção procedente e condenou as Rés, ora Recorrentes, no pagamento de uma indemnização ao Autor A no valor de MOP$105.480.00 pela Ré B, sendo MOP$16.680,00 a título de subsídio de alimentação, MOP$lO.800,00 a título de subsídio de efectividade, MOP$22.000,00 a título de descanso semanais, MOP$22.000,00 a título de não gozo dos dias de descanso compensatório MOP$20.500,00 a título de comparticipação no alojamento descontadas e MOP$13.500,00 pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho em cada ciclo de 21 dias de trabalho, e no valor de MOP$ 137.775,00 pela Ré C, sendo MOP$31.300,00 a título de subsídio de alimentação, MOP$26.600,00 a título de subsídio de efectividade, MOP$48.875,00 a título de comparticipação no alojamento descontadas e MOP$30.000,00 pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho em cada ciclo de 21 dias de trabalho, acrescidas de juros moratórios à taxa legal a contar do trânsito em julgado da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório e mais condenando as Rés, ora Recorrentes, a pagar ao Autor o montante correspondente ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatórios e a Ré B às bonificações ou remunerações adicionais incluindo gorjetas pagas ao operários residentes, a liquidar em execução de sentença.
2. As Recorrentes vêm impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, nomeadamente a matéria fáctica vertida no ponto G e H da Matéria Assente e ainda nos quesitos 1 a 19 da Base Instrutória, porquanto da prova produzida em sede de julgamento nunca poderiam os referidos quesitos terem sido provados, tendo sido, salvo devido respeito, incorrectamente julgada pelo Douto Tribunal a quo e por outro lado, a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento, estando em crer que a decisão assim proferida pelo douto Tribunal de Primeira Instância padece dos vícios de erro de julgamento e erro na aplicação do direito, ou caso assim não seja entendido de nulidade por falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do Autor ora, Recorrido.
3. Ficou assente e provado que entre 1 de Julho de 1997 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1ª Ré (B), prestando funções de "guarda de segurança"enquanto trabalhador não residente (Cfr. Doc. 1 (A)), que o Autor foi recrutado pela Sociedade E - Serviços de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de prestação de Serviço n° 5/96 celebrado entre a referida Agencia de emprego e a 1ª Ré ( B( cfr. doc. 2 e 3 )(B), e que por força do Despacho n° 01949/IMO/SEF/2003 do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM de 17/07/2003 foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da 1ª Ré (B) e para a 2ª Ré (C) com efeitos a partir de 21/07/2003 ( Cfr. Doc . 4 (C).
4. Que entre 22/07/2003 e 31/01/2009, o Autor esteve ao serviço da 2ª Ré (C), prestando funções de "guarda de segurança" enquanto trabalhador não residente (D) e que durante todo o tempo que prestou trabalho o Autor prestou trabalho nos locais (postos de trabalho) indicados pelas Rés (E), durante o período em que prestou trabalho as Rés pagaram ao Autor a quantia de MOP$ 7,500.00 a título de salário base mensal (F) e que durante todo o período da relação de trabalho com as Rés o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos (G), durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia: Turno A: das 08h às 16h; Turno B: das 16h às 00h e Turno C: das 00h às 08h(H).
5. Resulta do ponto 3.1 do Contrato de Prestação de Serviços n° 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de "( ... ) $20,00 patacas diárias por pessoa, a titulo de subsidio de alimentação." (1°) e que entre 01/07/1997 e 21/07/2003, a 1ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a titulo de subsidio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentas e/ou géneros (2°) e entre 22/07/2003 e 31/01/2009, a 2ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a titulo de subsidio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentas e/ou géneros (3º).
6. Ficou também provado que do Contrato de Prestação de Serviços n° 5/96 que "( ... ) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se a Autor) este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª outorgante (leia-se as Rés) paga aos operários residentes no território." (4°) e que entre 01/07/1997 e 21/07/2003 a 1ª Ré (B) nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas (5°) e ainda resultou do ponto 3.4 Do Contrato de Prestação de Serviços n° 5/96 celebrado entre a 1ª Ré e a Agencia de Emprego ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) "( ... ) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço" (6°) sendo também provado que durante todo o período da relação laboral o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (7º)
7. Que entre 01/07/1997 e 21/07/2003 a 1ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia de subsídio de efectividade (8°) e que entre 21/07/2003 e 31/01/2009 a 2ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia de subsídio de efectividade (9°) e ainda que entre 01/07/1997 e 31/12/2002 a 1ª Ré (B) nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição (10°), nem a nunca a 1ª Ré concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição (11°) nem fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório do trabalho prestado em dia de descanso semanal (12°) nem nunca conferiu ao Autor um outro dia de descanso compensatório (13°).
8. Mais ficou provado que entre 01/07/1997 e 21/07/2003 o Autor prestou a sua actividade durante os feriados obrigatórios para a 1ª Ré (14°) e que a 1ª Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios (15º) bem como ficou provado que entre 22/07/2003 e 31/12/2008 o Autor prestou a sua actividade durante os feriados obrigatórios para a 2ª Ré (16°) e que a 2ª Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional ( leia-se um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios (17°)
9. Durante o período em que o Autor prestou trabalho para as Rés procedeu ao desconto da quantia de HKD750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de "comparticipação nos custos de alojamento" (18°) e que aquando do recrutamento do Autor no Nepal foi garantido ao Autor que teria direito a alimentação e alojamento gratuitos em Macau (18° A) e a referida dedução no salário do Autor era operado de forma automática e independentemente de o trabalhador (leia-se do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela 1ª Ré (18° B)
10. Tendo também ficado provado que as Rés nunca pagaram ao Autor uma qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas em cada ciclo de 21 dias de trabalho consecutivo (19°).
11. Os fundamentos aduzidos pelo douto Tribunal na resposta à matéria de facto:
Traduziram-se em súmula no seguinte: "Concretamente, atendemos ao depoimento prestado pela testemunha apresentada pelo Autor, com a razão de ciência que melhor resulta da acta da audiência, que revelou conhecimento directo dos factos sobre que depôs, num depoimento que se revelou sóbrio e não comprometido. tendo explicado que não era política da Ré permitir o gozo de descansos semanais (não sendo tal trabalho sido pago alem de um dia normal): explico ainda, a este propósito, que nunca foi dado qualquer dia de descanso compensatório. Explicou ainda a testemunha que não foi pago qualquer subsídio de electividade ou qualquer compensação pela prestação de trabalho em dias de feriado obrigatório: quanto a estes últimos, a resposta restritiva decorre da circunstância de a testemunha ter explicado que o Autor (à sua semelhança) gozava 24 dias de férias anuais, não tendo, no entanto, conseguido concretizar exactamente o período em que tal sucedia, razão por que não houve prova suficiente dos dias de feriado obrigatório em que o Autor prestou trabalho.
Explicou ainda a testemunha que nunca foram pagas quaisquer quantias a título de subsídio de alimentação, gorjetas ou outras remunerações além do salário. Mais explicou a testemunha que a Ré não forneciam refeições mas tão só um local onde os trabalhadores podiam tomar a refeição que traziam de casa. A testemunha inquirida afirmou ainda que, a título de alojamento, a Ré cobrava a quantia mensal de 750HKD mesmo que os trabalhadores optassem por residir fora das residências fornecidas pela Ré. Mais relatou ainda a testemunha, de forma detalhada, como se processavam os turnos de trabalho e a sua rotatividade, precisamente nos termos queficaram provados.
12. Cumpre ainda referir que nenhuma prova de sentido contrário foi produzida, quer testemunhal, quer documental, que permitisse pôr em causa o depoimento prestado em audiência pela testemunha, nomeadamente nenhum registo que comprove ter o autor alguma vez faltado ao serviço ou que lhe tivesse sido paga qualquer quantia, e a que titulo, além do que resultou provado (…).»
13. Entendeu o Digno Tribunal a quo em levar para a Especificação a matéria vertida nos quesitos 18° A) e 18 B), facto que as ora Recorrentes reclamaram por entenderem que face à impugnação feita em Contestação e ao facto de não disporem dados para determinarem da efectivação de tais turnos e, atento o estipulado no artigo 13°, n° 2 da Lei 7/2008 das Relações de Trabalho, a lei apenas obriga o empregador a manter e conservar os registos dos trabalhadores durante a vigência da relação de trabalho e por um período de três anos após a sua cessação.
14. Mas no caso concreto a cessação da relação de trabalho ocorreu há mais de três anos e por isso as Rés não mais tinham em seu poder elementos que lhe permitissem confinuar tal facto e por isso a Recorrente não concorda e rejeita também tal decisão a qual também impugna, considerando que tal matéria deve fazer parte da Base Instrutória e nunca da Matéria Assente, pelo que deste modo violou a douta sentença recorrida a aplicação da lei e o disposto no artigo 13°, 3 da Lei 7/2008, pelo que deverá a sentença proferida ser revogada e substituída por outra que declare a passagem da matéria vertida nos pontos G e H, para a Base Instrutória com as demais consequências legais.
15. No entanto, e caso assim não seja entendido, da prova produzida em sede de julgamento a resposta a todos os quesitos e a fundamentação supra transcrita teriam necessariamente de ser diferentes, pelo que estamos perante um claro erro de julgamento, pois no vertente processo, foi deferida a documentação das declarações prestadas na audiência de julgamento, existindo por isso suporte de gravação, o que permitirá ao douto Tribunal de Segunda Instância melhor avaliar, e decidir, sobre o ora invocado erro na apreciação da prova, aqui expressamente se requerendo a reapreciação da matéria de facto, nos termos admitidos no art. 629º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi art. 1º do Código de Processo do Trabalho.
16. A Recorrente, ao invocar no presente recurso o erro na apreciação da prova, que, na sua óptica, inquina a decisão proferida pelo douto Tribunal a quo, não pretende apresentar apenas uma simples discordância relativamente à interpretação dos factos feita por aquele douto Tribunal, tendo bem presente o dispositivo do art. 558º do Código de Processo Civil, e a natureza insindicável da livre convicção relativamente à apreciação da prova efectuada pelo Tribunal recorrido, e estando bem ciente da jurisprudência afirmada nos Tribunais Superiores da RAEM mas a verdade é que é entendimento da Recorrente que tal erro de julgamento se verifica na situação dos autos, e que o vício apontado à decisão recorrida resulta dos próprios elementos constantes dos autos, que por si só são contraditórios, ou com recurso às regras da experiência comum.
17. Nos presentes autos foi ouvida uma só testemunha D, cujo testemunho se encontra transcrito e pode ser ouvido no CD 1 gravado em 15.11.2016 com início na passagem 10.03.01 até 11.55.04. e no qual se pode verificar que depoimento da única testemunha ouvida em julgamento é genérico sem que tivesse a testemunha conseguido concretizar se em relação ao Autor as coisas se passavam como se haviam passando em relação a si mesma, pois mais parece um verdadeiro depoimento de parte, não se podendo olvidar que a testemunha foi Autor numa acção em tudo semelhante àquela em que veio depor, o que tende a revelar a parcialidade do seu depoimento,
18. Por isso, nunca poderia o Tribunal a quo ter dado como provado que o Autor não recebeu os subsídios a que alega ter direito, ou que nunca faltou sem conhecimento e autorização das Rés, ou que aquele nunca gozou dias de descanso semanal ou se, a cada 21 dias, trabalhava 16 horas em cada período de 24, tanto mais que o próprio Autor ora afirma que não teve nenhum descanso semanal ora afirma que nunca deu qualquer falta injustificada ou que nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem conhecimento e autorização prévia por parte da 1ª Ré (cfr. Quesito 7º) afirmando o Autor ao longo do seu articulado inicial que gozou de períodos de ausência ao trabalho (Cfr. artigos 13° e 14° da PI) para a testemunha vir depois dizer que o mesmo trabalhou continuamente e nunca descansou (transcrição a partir do minuto 06:30 da gravação feita em 15/11/2016 em 10.03.14), por isso com todo o devido respeito que, como se disse é muito, parece insuficiente admitir que a procedência do pedido do Autor seja feita com base num único depoimento genérico.
19. Isto quando à Ré se tornou impossível contradizer documentalmente o depoimento da testemunha porquanto a presente demanda só se iniciou volvidos mais de 5 anos sobre o termo da relação laboral, não estando a mesma portanto obrigada a manter nos seus arquivos a documentação atinente a todos os seus trabalhadores. Pelo que também aqui pecou o Digno Tribunal a quo quando deu como provados tais factos, pelo que após reapreciação da prova efectuada em juízo por parte desse Venerando Tribunal da Segunda Instância deverá ser proferido douto Acórdão que julgue procedente o invocado vício de erro de julgamento ao dar por provados todos os quesitos da Douta Base Instrutória, os quais serão de dar por não provados.
20. Mas ainda que improceda o recurso na parte respeitante à impugnação da decisão que dirimiu a matéria de facto, urge ainda questionar se o Autor teria direito a receber todos os créditos que reclama nos termos em que a sentença ora posta em crise os concedeu e a resposta só pode ser em sentido negativo, assim e no que diz respeito ao subsídio de alimentação e do subsídio de efectividade o Douto Tribunal a quo condenou as ora Recorrentes a pagarem ao Autor compensações a título de subsídio de alimentação e a título de subsídio de efectividade tendo o douto Tribunal a quo dado como provado os supra transcritos quesitos 1°, 2°, 3°, 6°, 8° e 9°. Tendo fundamentado a condenação da seguinte forma: "Quanto ao subsídio de alimentação resulta provado em 9) que era devido ao Autor o pagamento de 20 patacas diárias a tal título. Resulta ainda provado que entre 01 de Julho de 1997 (...) e 21 de Julho de 2003 a 1ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (cfr. Facto 10) pelo que tem o Autor direito a receber a tal titulo a quantia de MOP$16.680,00 (834 dias x MOP$20) Resulta ainda provado que entre 22 de Julho de 2003 e 31 de Janeiro de 2009 a 2ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (cfr. Facto 11) pelo que tem o Autor direito a receber a tal titulo a quantia de MOP$31.300,00 (1565 dias x MOP$20). Quanto ao subsídio de efectividade resulta este previsto no Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96 (cfr. facto 14) e não foi pago pela 1ª Ré ao Autor sendo que entre 01 de Julho de 2001 (...) e 21 de Julho de 2003 o Autor não deu qualquer falta ao serviço sem conhecimento e autorização prévia da Ré (cfr. Facto 15) pelo que lhe é devida a quantia de MOP100 x 4 dias x 27 meses, isto é MOP10.800,00». Resulta ainda provado que não foi pago pela 2ª Ré ao Autor (Cfr. Facto 17) sendo que entre 22 de Julho de 2003 e 31 de Julho de 2009 o Autor não deu qualquer falta ao serviço sem conhecimento e autorização prévia da Ré (cfr. facto 15) pelo que lhe é devida a quantia de MOP 100 x 4 dias x 27 meses, isto é MOP0 10.800,00»
21. Numa situação semelhante à dos autos em que à data da contratação do Autor estava em vigor o Despacho n.º 12/GM/88, de 1 de Fevereiro - o qual regia a contratação de trabalhadores não residentes e tal como tem sido já entendido pelos Tribunais Superiores da RAEM, o contrato de prestação de serviços funciona como uma garantia do mínimo das condições remuneratórias a cumprir por parte da entidade promitente ou empregadora, sendo portanto de analisar se aquando do início da relação laboral os trabalhadores ficaram individualmente prejudicados face ao resultado que teriam se a entidade empregadora cumprisse apenas com aqueles mínimos das condições remuneratárias. Ora, por confrontação entre os valores mínimos prometidos por parte da entidade empregadora - e resultantes do contrato de prestação de serviços e o montante salarial pago ao Autor, resulta evidente que este ficou com condições remuneratórias muito superiores às previstas no aludido contrato de prestação de serviços.
22. Se as Recorrentes se tivessem limitado a cumprir com os mínimos a que se obrigaram, o Autor teria auferido um salário idêntico ao nível médio dos salários praticados para desempenho equivalente, num mínimo de $100.00 patacas diárias, acrescida de $20,00 patacas diárias por pessoa a título de subsídio de alimentação, ou seja, MOP$3,600.00 mensais, ao qual poderia acrescer um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço.
23. Mas a verdade é que, caso se considere que auferia MOP$7.500,00, ou seja, mais do dobro dos aludidos montantes, ficam assim devidamente cumpridas e verificadas as condições remuneratórias mínimas previstas no contrato de prestação de serviços. Assim, salvo devido respeito por melhor opinião, tendo no caso concreto as ora Rés efectivamente proporcionado ao Autor uma remuneração muito superior àquela a que se comprometeu por força do contrato de prestação de serviços, não se vislumbra em que medida se possa ter o referido contrato de prestação de serviços por violado e nem em que medida possa o Autor considerarse prejudicado. Ademais, uma interpretação parcelar dos contratos procurando retirar "o melhor dos dois mundos" não poderá deixar de se ter por abusiva e, consequentemente, ilegítima nos termos do artigo 326º do Código Civil de Macau, conforme havia sido invocado em sede de contestação, pelo que nunca poderia proceder os pedidos formulados pelo Autor a titulo de subsídio de alimentação e de efectividade.
24. Mas ainda que assim não se entenda sempre se diga que, o pedido formulado a título de subsídio de alimentação não poderia proceder, pois entendeu o douto Tribunal a quo que o Autor teria direito a receber MOP20 por 834 dias de trabalho que mediaram entre o dia 09 de Abril de 2001 (atenta a prescrição dos créditos reclamados pelo Autor) e 21 de Julho de 2003 e 1565 dias que mediaram entre 22 de Julho de 2003 e 31 de Janeiro de 2009. No entanto, não se comprovou que entre 09 de Abril de 2001 e 31 de Julho de 2009 o Autor tenha trabalhado 2399 dias, mas sim o que se provou foi que durante o período em que o Autor prestou trabalho nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés resultando assim assumido pelo Autor que teve períodos de "dispensa ao trabalho remunerados e/ou não remunerados e autorizados pela Rés" por se pergunta então quantos dias o Autor faltou ao trabalho com conhecimento e autorização da Rés ?
25. A parca matéria fáctica alegada pelo Autor não pode conduzir, sem mais, à procedência do pedido e tendo resultou apurado que o Autor teve férias, que deu faltas ao serviço e que pediu dias de dispensa com autorização das Rés mas não se comprova (nem tão pouco foi alegado) quais são esses dias e se não foram alegados esses dias, e sendo os subsídios de alimentação e de efectividade atribuídos em função da efectiva prestação de trabalho, como poderá o Tribunal determinar quais os dias em que o Autor trabalhou e quais efectivamente os dias em que o Autor tem direito a tais subsídios? É que, o subsídio de alimentação, conforme tem vindo a ser entendimento unânime da doutrina e jurisprudência, trata-se de um acréscimo salarial que pressupõe necessariamente a prestação efectiva de trabalho por parte do seu beneficiário e tal entendimento tem sido aliás doutamente defendido por esse Venerando Tribunal de Segunda Instância em diversos arestos dos quais se destaca o proferido em 13.04.2014 no processo 414/2012 e lançando mão à douta decisão, para que houvesse condenação das Rés, ora Recorrentes, no pagamento desta compensação, deveria o Autor ter alegado e provado quantos foram os dias de trabalho efectivamente por si prestados, não tendo acontecendo, estando, aliás, a decisão em contradição com a factualidade provada (cfr.resposta ao quesito 9°, 10°, 11°, 14°, 15° e 16°).
26. Pelo que, salvo devido respeito por melhor opinião, não tendo sido alegados nem provados os factos essenciais de que depende a atribuição do mencionado subsídio de alimentação, ou seja, a prestação efectiva de trabalho, não poderia o douto Tribunal ter condenado a Recorrente nos termos em o fez, padecendo assim a douto sentença nesta parte do vício de erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito, devendo consequentemente ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do pagamento de compensação a título de subsidio de alimentação.
27. Quanto ao subsídio de efectividade veio a apurar-se que o mesmo fazia parte do contrato de prestação de serviços 5/96 e ainda que o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré, mas por definição e conforme resulta do aludido contrato de prestação de serviços, o subsídio de efectividade visa premiar a efectiva prestação do trabalho e o Contrato de Prestação de Serviços é claro ao prever que o subsidio de efectividade pressupunha que "[...] no mês anterior não tenha dada qualquer falta ao serviço." (Sombreado nosso), sendo irrelevante que o trabalhador tenha faltado por motivo justificado ou mesmo sob autorização prévia, sendo que nos presentes autos não foi feita qualquer prova relativamente à assiduidade do Autor, não se tendo apurado quantos dias de trabalho efectivo ele prestou e nem quantas vezes faltou ao serviço, muito antes pelo contrário, resulta dos autos (e da matéria de facto provada) que o Autor deu faltas ao serviço, ainda que justificadas, não tendo porém sido tais faltas quantificadas, nem se determinando quando foram dadas., não estando o Tribunal a quo em condições de concluir que em cada um dos meses em que durou a relação laboral o Recorrido não deu faltas ao serviço por forma a concluir que tinha o mesmo direito a perceber um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias. Ou sej a, é insuficiente a matéria de facto apurada nos presentes autos que permita ao Tribunal a quo sustentar a condenação das Recorrentes a pagar ao Recorrido qualquer montante a título de subsídio de efectividade, devendo assim ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene as Recorrentes a pagarem ao Recorrido a compensação a título de subsídio de efectividade e de subsídio de alimentação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n° 2 do artigo 564° do CPC.
28. Quanto à compensação do trabalho prestado em dia de descanso semanal, o Tribunal a quo por provado o constante nos quesitos 10°, 11°, 12° e 13, no entanto, tendo resultado que o recorrido teve faltas ainda que justificadas, como pode o Tribunal entender decidir o n° de dias devidos e não gozados pelo Recorridos a que se faz alusão a fls. 221 verso e 222 da sentença? Pois estando provadas as dispensas ao trabalho ainda que remuneradas e os 24 dias de férias anuais, tal como referido pelo Meritíssimo Juiz a quo no relatório da resposta à matéria de facto, sem que a testemunha conseguisse determinar em que dias o Autor gozou tais dias de férias anuais (Cfr. agravação CD l-excerto 11.10.24 de 00.33 a 04:40) nunca poderia o Tribunal ter condenado a Recorrente B ao pagamento da quantia de MOP$ 22.000,00 + MOP$ 22.000,00 (descansos compensatórios) sem que se provasse o número de dias concretos que o Autor deixou de gozar o seu descanso semanal.
29. Verifica-se assim uma errada aplicação do Direito e erro no julgamento da matéria de facto por parte do Tribunal a quo na condenação da recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e em quantia indefinida quanto aos feriados obrigatórios, já que o mesmo raciocínio se aplica a este pedido de crédito, em violação do princípio do dispositivo consagrado no art. 5° do CPC e bem assim o disposto nos artigos 17° e 19° do DL 24/89/M.
30. Mas mais se diga quanto à questão dos descansos semanais e feriados obrigatórios, já que foram juntos aos autos pela Recorrida B em audiência de discussão e julgamento públicas - formas de certidões da Direcção dos Serviços de Finanças com os rendimentos anuais do Autor onde se pode verificar que o Autor, por exemplo no ano de 2001 auferiu um rendimento superior ao que este admite auferir na petição inicial.Com efeito, pode verificar-se que nesse ano de 2001 auferiu MOP$102,087.00, ora, deduzindo a esta quantia o imposto profissional no valor de MOP$1.730,00 e imposto de selo no valor de MOP$87.00, resulta que o Autor auferia por mês (MOP$102087 - MOP$1730 – 87 = MOP$100.270,00:12meses = MOP$8,355) e se está assente que o Recorrido auferia MOP$7.500,00 com poderá este justificar os MOP$855,00 que recebia para além do vencimento? Deste valor em excesso apenas se pode concluir aquilo que as Recorrentes sempre alegaram na sua contestação, que se o Recorrido trabalhou nos descansos semanais e feriados estes foram pagos e a prova está nesta remuneração adicional de MOP$855,00, mesmo acontecendo em relação ao ano de 2002 conforme se pode comprovar no mesmo documento da Direcção de Finanças.
31. Ora, o Meritíssimo Juiz a quo não considerou tais documentos, no entanto, consideram as Recorrentes, sempre com todo o respeito por opinião diversa, que o Digno Tribunal deveria ter apreciado tais elementos de prova e assim ter dado como assente que tanto os descansos semanais como os feriados teriam sido pagos devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene a Recorrente a pagar ao Recorrido a compensação a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n° 2 do artigo 564º do CPC.
32. Quanto à comparticipação nos custos de alojamento a sentença recorrida baseou a condenação da Recorrente neste ponto determinando que: " Cremos que, àfalta de qualquer outra justificação que se mostra indevido o desconto de forma automática da quantia de HK$750,00 por cada mês. atenta, desde logo, a obrigação assumida de disponibilizar aquando da contratação de alojamento gratuito (cfr. facto provado 26 e 28, pelo que terá de devolver a quantia de MOP$20.250,00 (e não MOP$20.500,00como por lapso é referido na decisão cuja rectificação desde já se requer) a título de devolução da "comparticipação no alojamento" (1ª Ré : MOP$750.00 x 27 meses)." e MOP$49.875,00 (2ª
Ré: MOP$750,00 x 66 meses) a título de devolução de "comparticipação de alojamento". Ora, não está alegado pelo Autor, ora Recorrido, que foi a Recorrente quem garantiu o alojamento gratuito em Macau nem tal resultou do depoimento da testemunha pois dos autos se permite concluir pelo pedido alegado que existe uma outra entidade responsável pelo recrutamento, ou seja uma agência de recrutamento, já que no ponto B ficou provado que o Autor foi recrutado pela sociedade E, o qual não pode ser olvidado pelo Digno Tribunal a quo, entidade que nada tem a ver com as Recorrentes. E estes factos, não estão também suficientemente alegados para permitir uma condenação pelo Tribunal.
33. Por outro lado, não violaram as Recorrentes o preceituado no artigo 9° do Despacho 12/GM/88 nem tão pouco a alínea a) e b) do artigo 9° do Decreto-lei 24/89/M porquanto não resultou dos autos que as Recorrentes não tenham fornecido alojamento ao Autor, nem que tivesse obrigado o Autor a adquirir ou utilizar quaisquer bens ou serviços por si fornecido, pois o que se apurou foi que as Rés procederam a uma dedução do salário do Autor a título de comparticipação nos custos de alojamento, não decorrendo da Lei que a entidade patronal esteja obrigada a arcar com as despesas de água, luz, gás, limpeza e manutenção dos alojamentos que fornece. E que a dedução no salário do Autor era operada de forma automática e independentemente de o trabalhador (leia-se Autor) residir ou não na habitação que lhe era pela Ré e/ou agência de emprego ... mas afínal, neste caso concreto, o Autor deixou de residir em tal habitação que tinha sido fornecidas pelas Recorrentes? Tal questão fícou sem resposta. Sendo obrigação da entidade patronal garantir alojamento - mas já não proceder ao pagamento das despesas com água, luz, gás, limpeza e manutenção dos alojamentos que fornece - e não se tendo provado em concreto se o Autor residiu fora do alojamento que lhe foi fornecido pela Ré e que mesmo assim estas continuaram a descontar a aludida quantia, o Tribunal a qllO não poderia senão absolver as Recorrentes do pedido.
34. Pelo que também aqui não poderá proceder o pedido do Recorrido, verificando-se assim uma errada aplicação do Direito e erro no julgamento da matéria de facto por parte do Tribunal a quo na condenação da recorrente nas quantias aqui peticionadas, violando assim o princípio do dispositivo consagrado no art. 5° do CPC e bem assim o disposto nos artigos 17° e 19° do DL 24/89/M, devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene as Recorrentes a pagarem ao Recorrido a compensação a título de comparticipação dos custos de alojamento que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n° 2 do artigo 564° do CPC.
35. No que diz respeito à reclamação das compensações reclamadas pela prestação de trabalho em regime de turno e trabalho extraordinário à semelhança do ocorrido com o subsídio de alimentação o Recorrente limitou-se a invocar factos genéricos, não alegando especifícadamente quais os factos que permitam concluir que tenha direito a pedir qualquer tipo de compensação a esse titulo, nem a própria testemunha, já que apresenta um testemunho genérico e indirecto sem conhecimento real e concreto da situação do recorrido pois nem o Recorrido nem a testemunha especifica datas, dias de trabalho efectivamente prestado, quando é que tais turnos coincidiam e quais os dias, e se ficou provado que o Recorrido dava faltas ao serviço (ainda que justificadas) ou pedia dispensas, como pode o Tribunal determinar com certeza quais os dias em que o Autor estava de turno?Ou ainda se eram ou não despendidas horas extraordinárias?
Na verdade, não é possível ao Tribunal determinar quais as horas extraordinárias que o trabalhador efectuava. Motivo pelo qual também aqui o Tribunal andou mal ao condenar as Recorrentes, em violação do art. 5° do CPC e do art. 10° do DL 24/89/M.
36. Mas mais se saliente um facto importante que o Tribunal deveria ter tido também em consideração, já que se reporta à relação laboral, in totum, que são as férias anuais gozadas pelo Autor, pois o Tribunal para o cômputo de todas as compensações devidas pelos créditos reclamados pelo Recorrido tem que ter em conta todos os dias de trabalho bem como todos os dias de férias, feriados e descansos gozados para efectivamente proceder ao cálculo das mesmas. Ora, não tendo sido alegado pelo Recorrido mas tendo sido dito pela testemunha que os guardas Nepaleses tinham direito a 24 dias de férias anuais,e não se sabendo quando, em cada ano, o Autor, ora Recorrido, gozou as férias anuais, porque a testemunha não logrou concretizar em audiência, pergunta-se mais uma vez como pode o Tribunal a qua, estabelecer com toda a certeza os dias para cômputo das compensações relativas aos feridos obrigatórios e descansos semanais, subsídio de efectividade, subsídio de alimentação e trabalho extraordinário nos turnos?
37. Face a esta falta de previsão por parte do Digno Tribunal no apuramento das compensações a atribuir ao Recorrido entendem as Recorrentes, sempre com todo o respeito, que padece a douta decisão dos vícios de erro de julgamento da matéria de facto e erro na aplicação do direito, devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condenem as Recorrentes a pagar ao Recorrido a compensação a título de trabalho extraordinário que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n" 2 do artigo 564° do CPC.
38. Quanto bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas entendeu o Tribunal a quo que tendo em conta o ponto 3.3 do Contrato de prestação de Serviços 5/98 teria o Autor direito a perceber as bonificações ou remunerações adicionais incluindo gorjetas pagas aos operários residentes a liquidar em execução de sentença. Com interesse para apreciação desta questão, pode ler-se na decisão recorrida que, "Entre 01/07/1997 e 21/07/2003 a 1ª Ré nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas que pagou a todos os demais trabalhadores residentes, incluindo guardas de segurança." (sublinhado e destacado nossos), mas com o devido respeito entende a Recorrente que o Tribunal a quo interpretou mal a aludida cláusula no que ao pagamento das gorjetas diz respeito.
39. Ora, resulta claramente da supra transcrita cláusula que os trabalhadores não residentes teriam direito às bonificações ou remunerações adicionais PAGAS pela Recorrente aos operários residentes, havendo assim que distinguir o que sejam as gratificações pagas pela entidade patronal do que sejam as gratificações pagas por terceiros, cumprindo não confundir o que seja o seu pagamento e a sua distribuição. As gratificações pagas pela entidade patronal, têm carácter de recompensa, visando premiar e incentivar o trabalhador face ao seu bom desempenho. No caso ficou por comprovar (e até mesmo por alegar) quais foram as bonificações ou remunerações adicionais que a Recorrente pagou aos trabalhadores residentes. Mas uma coisa é certa... nessas bonificações ou remunerações adicionais não será de incluir as gorjetas porque não são as mesmas pagas pela aqui 1ª Ré, ora Recorrente, mas sim pelos seus Clientes.
40. Não tinha a Recorrente nenhum dever de pagar ao Autor nenhuma gorjeta, tal como não existia esse dever para com nenhum dos seus trabalhadores residentes.Ao contrário do que o Autor pretendeu transparecer e veio a ser erradamente admitido pelo Tribunal, as gorjetas não correspondem a uma prestação do empregador mas sim de um terceiro e como tal não estão abrangidas pela sobredita cláusula. Cumpre aliás salientar que a nova lei das relações de trabalho (Lei 7/2008) enquadra as gorjetas no conceito de "remuneração variável" (cfr. artigo 2° alínea 5) e não como remuneração de base o que reforça o argumento que a sua distribuição não constitui uma verdadeira obrigação para a entidade patronal e mais se saliente que em audiência a testemunha quanto a este ponto se baseou apenas no contrato de prestação de serviços e não naquilo que se passava na Companhia.Por isso, nunca poderia o Tribunal ter condenado a Recorrente ao pagamento das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas, por falta de preenchimento do requisito para tal, pelo que não poderá a Recorrente senão ser absolvida do sobredito pedido.
41. Face a todo o acima exposto se concluiu também que a decisão em crise padece do vício de falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do Recorrido, isto porque a decisão em crise mantém na íntegra as conclusões incoerentes feitas na petição inicial, mantendo por responder a questões/vícios que a seguir se enumeram: (i) ter o Autor trabalhado todos os dias da semana, embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da 1ª Ré; (ii) Quantos foram esses dias de faltas justificadas e quando foram gozados os 24 dias de férias anuais? (iii) Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o autor concede na nota 1 ao art. 22° da petição inicial? Que factos suportam esta conclusão?
42. Com todo o devido respeito, as incoerências e violação do ónus de alegação por parte do recorrido só poderia, em nossa modesta opinião, ser resolvida pelo Tribunal de Primeira Instância de uma de duas formas: Ou dava a oportunidade ao Autor para aperfeiçoar a petição inicial, apresentando nova peça consistente e coerente que permitissem uma decisão clara e esclarecida: ou dava por provado apenas e tão só os factos que se encontram efectivamente provados e suficientemente alegados. O que o Tribunal a quo não podia fazer foi o que fez, ou seja, factualizar as conclusões do Autor (não suportadas em factos) e os factos incoerentes e contraditórios que se mantêm na íntegra. Esta decisão, por essa razão, padece também de vício de falta de fundamentação decorrente do ónus da violação do ónus de alegação por parte do Recorrido, sendo, por isso, nula.
Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, em conformidade,
deverá ser declarada nula a sentença recorrida nos termos nos termos do disposto no artigo 571º, n.º 1 al. b), ex vi do artigo 43° do CPT, com as demais consequências legais.
Sem prescindir, e caso assim não se entenda, deverá ser revogada a sentença recorrida nos termos supra explanados, com as demais consequências da lei,
Termos em que farão V. Exas. a costumada JUSTIÇA!
4. A este recurso responde o trabalhador:
1. Contrariamente ao alegado pelas Recorrentes, não se vislumbra da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento um qualquer erro ou vício quanto à decisão da matéria de facto posta em crise;
2. Pelo contrário, o Tribunal a quo apreciou e conheceu com detalhe o fundo da causa, enquadrando devidamente os factos no Direito aplicável e em conformidade com a prova produzida, tendo formado a sua convicção ao abrigo dos seus poderes de livre apreciação e mediante uma análise séria, crítica e descomprometida das provas carreadas e/ou produzidas em sede de audiência de julgamento e com desenvolvida especificação das razões e dos fundamentos convincentes da mesma convicção e sem que exista nos autos um qualquer outro meio de prova de igualou de superior valor que possa pôr em causa a sua credibilidade, certeza ou justeza, razão pela qual deve a douta Decisão manter-se (sem prejuízo do alegado pelo ora Recorrido em sede das suas Alegações de Recurso);
3. Ademais, a leitura das passagens da gravação transcritas pelas Recorrentes bem como a audição completa e continua do teor das declarações prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento - apenas confirma que a testemunha inquirida revelou seriedade e não comprometimento, bem como um conhecimento directo dos factos sobre os quais foi chamada a depor;
Em concreto,
4. Contrariamente ao alegado pelas Recorrentes em caso algum se pode concluir que quer a matéria vertida nos pontos G e H da Matéria Assente, como os quesitos 1.º a 19.º (leia-se, TODOS OS QUESITOS) da Base Instrutória terão sido incorrectamente julgados pelo Tribunal;
5. É, no mínimo, "atrevimento" virem as Recorrentes alegar que desconhecem o regime de turnos dos seus funcionários por "não mais disporem de dados para determinarem da efectificação de tais turnos" ... fazendo com que se possa concluir que seriam os próprios trabalhadores (croupiers, guardas de segurança, cozinheiros, etc.,) quem procedia eles próprios à marcação dos seus horários de trabalho, pondo em risco a necessária laboração contínua e permanente das Recorrentes ...
6. Depois, quanto à demais matéria de facto, as Recorrentes mais não fazem do que apresentar a sua directa - mas infundada - discordância quanto à sua apreciação, mas sem que nada de concreto adiantem quanto às razões para tais discordância(s), refugiando-se em argumentos de ordem geral e por vezes descontextualizados em puro desrespeito pelo Princípio da livre apreciação da prova;
7. Ademais, não obstante as Recorrentes transcreverem (grande parte) do depoimento prestado pela testemunha ouvida em juízo, fazem-no sem especificar a propósito de cada um dos concretos factos por si postos em crise e, bem assim, sem indicar em que medida se impunha uma resposta diferente da que foi dada pelo tribunal a quo tendo em conta o concreto conteúdo do testemunho prestado, de onde se retira que as Recorrentes não deram integral cumprimento ao “especial ónus de alegação” imposto pelo art. 599.° do CPC - e que em caso algum se pode ter por satisfeito com a mera reprodução/transcrição do testemunho prestado em juízo - razão pela qual deve ser rejeitado o Recurso nesta parte;
Sem prescindir,
8. Salvo melhor entendimento, não parece correcto concluir que resulta da matéria de facto provada que: o Autor deu faltas ao serviço e que pediu dias de dispensa com autorização da Ré, porquanto o que resulta da mesma matéria de facto provada foi que: "Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés" e que "nenhum registo que comprove ter o autor alguma vez faltado ao serviço", o que acredita ser manifestamente distinto ... ;
9. Ou melhor, em caso algum se poderá aceitar que o facto de ter resultado provado que durante todo o período da relação de trabalho o Autor nunca deu qualquer falta injustificada nem qualquer falta sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré possa, por si só, igualmente fazer com se conclua resultar da matéria de facto provada que: o Autor deu faltas ao serviço e que pediu dias de dispensa com autorização da Réu ;
10. A ser assim - ressalvado o devido respeito por diferente entendimento - as Recorrentes procuram alegar matéria nova que extravasa os limites formais da matéria controvertida - razão pela qual está precludida a possibilidade da sua apreciação;
Mas ainda que assim não se entenda,
11. Contrariamente ao alegado, o Contrato de Prestação de Serviço apenas estipula o mínimo das condições remunerat6rias a favor dos trabalhadores que venham a ser recrutados ao seu abrigo, sendo que nada impede que sejam fixadas outras desde que mais favoráveis;
12. De onde, o facto de as Recorrentes terem pago ao Autor, a título de salário diário, uma quantia que se mostra superior ao mínimo diário constante do Contrato de Prestação de Serviços, em caso algum faz com que as mesmas deixem de estar obrigadas a pagar as demais quantias (remuneratórias ou não) que igualmente se obrigaram a pagar relativamente a cada uma das "vertentes contratuais" (leia-se, contrato de prestação de serviços e contrato individual de trabalho) e, em concreto, devidas ao Recorrido a título de subsídio de alimentação, subsídio de efectividade e outras bonificações ou remunerações adicionais;
Sem prescindir,
13. Salvo melhor opinião, a afirmação em sede de Alegações de Recurso de que a atribuição ao Recorrido do subsídio de alimentação constante do Contrato de Prestação de Serviço só é devido quando o trabalhador presta serviço efectivo, consubstancia matéria de excepção que há muito deveria ter sido alegada pelas Rés, maxime em sede de Contestação, pelo que não o tendo feito em momento próprio, precludido se mostra o direito de o fazer agora ...
14. Certo é que, a respeito da atribuição (ou não) do subsídio de alimentação ao Autor, ora Recorrido, as Recorrentes limitaram-se na sua Contestação a afirmar que: o mesmo foi sempre pago aos seus trabalhadores; que as Rés sempre forneceram refeições diárias aos Autores e a todos os seus colegas, e que todos os casinos dispunham de uma cantina, o que resultou tudo NAO PROVADO;
Acresce que,
15. A mera junção pela 1ª Recorrente (em sede de audiência de discussão e julgamento) de uma declaração de rendimentos do Recorrido referente aos anos de 2001 e 2002, apenas e tão-só comprova que a mesma terá declarado tais valores junto da Direcção dos Serviços de Finanças da RAEM para efeitos de pagamento de imposto profissional, mas já não demonstra - por si só - que as referidas quantias (e a que concreto título) tenham sido efectivamente recebidas pelo Recorrido ... ;
16. Seja como for - e a ser verdade que o Autor terá recebido por parte da 1ª Recorrente as quantias pela mesma declaradas para efeitos de pagamento de imposto profissional - tal só deixa ver que o Autor não terá dado faltas ao serviço (pelo menos, faltas injustificadas e não remuneradas) porquanto, de outro modo, não mais teria auferido o seu salário por inteiro ... contrariamente ao que a 1ª Recorrente se esforça por concluir ... ;
17. Certo é que, apenas a 1ª Recorrente - e não o ora Recorrido - está em condições de explicar que montantes salariais foram (e a que título) pagos ao Autor ao longo da relação de trabalho, e os documentos juntos em audiência nada elucidam a tal respeito, conforme bem concluiu o Tribunal a quo;
18. Depois, em matéria de subsídio de efectividade, o que tem vindo a ser concluído pelo Tribunal de Segunda Instância é que: “(…) as faltas justificadas não são consideradas como fundamento de exclusão do subsídio em apreço” (Cfr. o Ac. do TSI, Processo n.º 308/2014, de 24/06/2014), razão pela qual o mesmo é devido e ainda que se aceite que o Autor “deu faltas ao serviço e que pediu dias de dispensa com autorização da Ré”, razão pela qual deve improceder todo o alegado pelas Recorrentes a tal respeito;
19. Quanto trabalho prestado em dia de descanso semanal e dia de descanso compensatório, a 1ª Recorrente limita-se a manifestar a sua discordância de ordem geral e sem que avance um único elemento documental que se mostre capaz de abalar a convicção do Tribunal a quo, razão pela qual deve também aqui improceder o Recurso apresentado;
20. Não obstante, parece ter escapado à 1ª Recorrente que tanto aquando da formulação do pedido pelo Autor como da condenação pelo Tribunal a quo, foi tido em conta os 24 dias de férias anuais em que se ausentava para o Nepal, razão pela qual deve igualmente improceder o alegado a este respeito;
21. Quanto à comparticipação nos custos de alojamento, está o Recorrido em crer que as questões agora suscitadas pelas Recorrentes há muito o deviam ter sido feitas, por forma a poderem ter sido objecto de apreciação por parte do Tribunal a quo, razão pela qual precludido se encontra o direito das Recorrentes, não podendo as mesmas vir agora a ser levadas em conta, porquanto está vedada a sua apreciação pelo Tribunal de Recurso;
22. Não obstante, as Recorrentes olvidam por completo que resulta da matéria PROVADA que a quantia de HK$750,00 era cobrada "mesmo que os trabalhadores optassem por residir fora das residências fornecidas pela Ré", razão pela qual se torna completamente irrelevante as dúvidas ou pertinências que as Recorrentes tão-só agora pretendem suscitar;
23. Quanto ao trabalho por turnos e trabalho extraordinário, as Recorrentes limitamse a tecer comentários de ordem geral, sem que apresentem um único argumento convincente da sua razão;
24. A respeito das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas, as Recorrentes mais não fazem do que procurar "tapar com uma peneira" a interpretação que reiteradamente tem vindo a ser seguida pelo Tribunal de Segunda Instância a respeito da natureza jurídica das gorjetas e, bem assim, da obrigatoriedade do seu pagamento aos ex-trabalhadores da 1ª Recorrente;
Por último,
25. Não deixará certamente de constituir uma discussão jurídica interessante a questão de saber se à luz da Nova Lei das Relações de Trabalho - na qual as gorjetas surgem enquadradas no conceito de "remuneração variável" - tendo as mesmas (gorjetas) sido contratualmente fixadas as mesmas serão ou não devidas por constituírem uma "verdadeira obrigação para a entidade patronal" ;
26. Porém, porquanto o Recorrido acredita tratar-se de uma pertinência jurídica que ultrapassa seguramente o âmbito da concreta legislação a aplicar nos presentes autos, a sua concreta discussão terá de aguardar para outras e quiçá melhores oportunidades ...
Termos em que devem ser aceites as presentes Alegações de Reposta e julgado improcedente o Recurso apresentado pelas Recorrentes, assim se fazendo a costumada Justiça.
5. Foram colhidos os vistos legais.
II – FACTOS
Vêm provados os factos seguintes:
1) Entre 1 de Julho de 1997 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (B), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (Cfr. doc.1). (A)
2) O Autor foi recrutado pela Sociedade E – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, aprovado pelo Despacho n.º 01124/IMO/SEF/2000, de 26/06/2000 (Cfr. doc. 2 e 3). (B)
3) Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da 1.ª Ré (B) para a 2.ª Ré (C), com efeitos a partir de 21/07/2003 (Cfr. Doc. 4). (C)
4) Entre 22/07/2003 a 31/01/2009, o Autor esteve ao serviço da 2.ª Ré (C), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (D)
5) Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pelas Rés. (E)
6) Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de Mop$7,500.00, a título de salário de base mensal. (F)
7) Durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (G)
8) Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré (B) num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia:
Turno A: (das 08h às 16h)
Turno B: (das 16h às 00h)
Turno C: (das 00h às 08h) (H)
9) Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (1.º)
10) Entre 01/07/1997 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (2.º)
11) Entre 22/07/2003 e 31/01/2009, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (3.º)
12) Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, que “(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, as Rés) paga aos operários residentes no Território”. (4.º)
13) Entre 01/07/1997 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas. (5.º)
14) Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (6.º)
15) Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (7.º)
16) Entre 01/07/1997 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (8.º)
17) Entre 22/07/2003 e 31/01/2009, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (9.º)
18) Entre 01/07/1997 e 31/12/2002, a 1.ª Ré (B) nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (10.º)
19) A 1.ª Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (11.º)
20) A 1.ª Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (12.º)
21) A 1.ª Ré (B) nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório. (13.º)
22) Entre 01/07/1997 e 21/07/2003 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 1.ª Ré. (14.º)
23) A 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (15.º)
24) Entre 22/07/2003 e 31/12/2008 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 2.ª Ré. (16.º)
25) A 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia adicional (leia-se, qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (17.º)
26) Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD750,00.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (18.º)
27) Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (18.º -A)
28) A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela 1.ª Ré. (18.º -B)
29) As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (19.º)
III – FUNDAMENTOS
Vêm interpostos dois recursos: um recurso (A) interposto pelas empregadoras; outro recurso (B) interposto pelo trabalhador.
Recurso A
1. Do erro no julgamento da matéria de facto.
As Rés põem em causa a especificação da matéria de facto relativa ao trabalho de turnos, dizendo que impugnaram essa matéria na contestação, pelo que devia ter sido levada à BI, para além de que nos termos da lei (art. 13º, n.º 2 da Lei n.º 7/2008) só seriam obrigadas a guardar a documentação relativa à organização e distribuição do trabalho por um período de 3 anos.
Não obstante esta alegação, trata-se de um facto que as Rés não podem desconhecer, relativo à organização do serviço, consabidamente organizado por turnos, pelo que face ao disposto no n.º 3 do art. 410º, a declaração por si feita e nos termos em que o foi, equivale a confissão.
Trata-se, todavia, de matéria que não deixa de ser confirmada pelo depoimento da testemunha, para além de que não se afigura essencial, na medida em que não está em causa o pagamento do número de horas em horário normal, ainda que por turnos, mas sim a determinação e apuramento desses mesmos turnos, como adiante se verá.
Vêm ainda as rés pôr em causa o julgamento efectuado com base apenas num trabalhador que diz ter feito um depoimento titubeante, contraditório e parcial.
Não cremos, da leitura desse depoimento, que assim seja, havendo que integrar as limitações sócio-culturais do depoente, também ele servidor nos mesmos termos do autor nos presentes autos, e, portanto, bem conhecedor da realidade, não havendo razões para crer que estivesse a mentir.
Também nós trazemos aqui o que a este propósito já escrevemos, em termos que se nos afiguram encaixar bem na situação presente:
«Mas importa colocarmo-nos na particular posição da testemunha, também ele trabalhador, naturalmente condicionado, se não fragilizado, ao depor num ambiente que lhe é estranho, sobre uma relação laboral que ele próprio vivenciou em termos próximos àqueles em que depôs, numa acção movida contra a ex-entidade patronal.
Há que contextualizar aquele depoimento e tentar abarcar tudo aquilo que os monossílabos, se não os silêncios, encerram.
Terá sido essa sensibilidade que o Mmo Juiz na sua imediação não deixou de ter em relação àquele depoimento, formalmente curto, mas substancialmente fazendo perceber toda a realidade que importaria abarcar.
Realça-se essa imediação a atenção evidenciada pelo Mmo Juiz que a cada passo intervém, insta, pergunta e busca esclarecimentos (…)
A testemunha mostrou conhecer a matéria sobre a qual foi questionado, visto durante largos anos ter igualmente exercido funções de guarda de segurança para a Ré/Recorrente nas mesmas condições que o autor e as demais centenas de trabalhadores (…).
As suspeições avançadas pela recorrente não se confirmam e as ligações existentes não são de molde a afectar a credibilidade da testemunha, (…)
Na linha do que já noutro passo se avançou e sem querer inverter as regras do ónus da prova importa registar que também por seu lado a ré, ora recorrente, nada fez para infirmar o que se perguntava, ou sequer se dignou a juntar documentação relativa a tais matérias, ou sequer apresentou uma qualquer outra testemunha que pudesse vir a infirmar o afirmado pela parte e sustentado pela testemunha ouvida, sendo que lhe cabia, ao nível da impugnação ter tomado posição marcada, definida, especificada sobre uma questão que também ela não podia ignorar (…).»1
Há que integrar o depoimento numa experiência por si vivenciada, havendo que interpretar “cum grano salis” as suas palavras, no sentido de que eventual posição que pareça ser de favor ou desfavor em relação às partes no processo, mais não é do que o retrato de quem teve as mesmas razões de queixa.
A não se validar um depoimento desta natureza seria anular a possibilidade de conferir os depoimentos das vítimas em teatros em que por vezes são estas as únicas testemunhas.
Aliás, a este propósito, não se deixa aqui de referir o entendimento que vem sendo sustentado neste Tribunal de Segunda Instância, a propósito da reapreciação da matéria de facto em matéria cível:2
“Ora, é certo que o princípio da livre apreciação da prova (art. 558º, do CPC) não surge na lei processual como um dogma que confere total liberdade ao julgador, uma vez que o tribunal não pode alhear-se de critérios específicos que o obrigam a caminhar em direcção determinada, de que é exemplo a inversão do ónus de prova em certos casos, a prova legal por confissão, por documentos autênticos, por presunção legal, etc. Mas, por outro lado, também é certo que a convicção do julgador é o farol de uma luz que vem de dentro, do íntimo do homem que aprecia as acções e omissões do outro. Portanto, se a prova só é “livre” até certo ponto, a partir do momento em que o julgador respeita esse espaço de liberdade sem ultrapassar os limites processuais imanentes, a sindicância ao trabalho do julgador, no tocante à matéria de facto, só nos casos e moldes restritos dos arts. 599º e 629º do CPC pode ser feita (Ac. do TSI, de 18/07/2013, Proc. nº 50/2013).
Por isso se diz que, geralmente, o princípio da imediação e da livre apreciação das provas impossibilita o Tribunal de recurso de censurar a relevância e credibilidade que o Tribunal recorrido atribuiu ao depoimento de testemunhas a cuja inquirição procedeu (Ac. TSI, de 19/10/2006, Proc. nº 439/2006).”
Razão, ainda aqui, por que, face aos dados adquiridos no caso concreto, se decide não pôr em causa o julgamento efectuado.
Assim, sem mais, improcede todo o alegado pela recorrente a respeito da decisão sobre a matéria de facto.
2. Do subsídio de alimentação
Somos a reiterar o que já anteriormente decidimos sobre esta matéria.
O contrato de prestação de serviços com a empresa de importação de mão-de-obra vai balizar os montantes dos subsídios que devem ser pagos pelos empregadores e esse valor não tem que ser imputado à conta dos valores auferidos globalmente.
Os montantes valerão para cada um dos subsídios em si e não é porque o empregador paga mais a outros títulos que se justifica que deixe de satisfazer os valores individualizados e concretamente considerados.
Sobre a natureza deste subsídio tomámos já posição:
“Não se abalando a matéria dada como provada, de que o trabalhador durante todo o período da relação laboral, sem conhecimento e autorização prévia da Ré, nunca deu qualquer falta ao trabalho, reafirma-se a posição já anteriormente assumida neste TSI de que o subsídio de alimentação só é devido quando o trabalhador presta serviço3 e já não assim com o serviço de efectividade4.
O subsídio de alimentação ou de refeição depende da prestação efectiva de trabalho, fazendo todo o sentido que assim seja, tendo até em vista a sua natureza e os fins a que se propõe. Destinar-se-á a fazer face a um custo suplementar a suportar por quem trabalha e por quem tem de comer fora de casa ou com custos acrescidos por causa do trabalho.
É esta a Jurisprudência deste Tribunal, concretizada no acórdão n.º 376/2012, de 14/6.
Ora, foi fixado um subsídio de alimentação na pressuposição de que ele trabalhou todos os dias por que perdurou a relação laboral, mas não foi isso exactamente o que se comprovou.
Quando pedia ao patrão podia faltar.
Nesta conformidade, tem razão o recorrente e porque não se sabe quais os dias efectivos de trabalho, há que relegar o seu apuramento para execução de sentença.”5
Importa, porém, no caso “sub judice”, proceder ao apuramento do número exacto de dias efectivamente prestado nos termos que abaixo se dirão.
3. Subsídio de efectividade
Trata-se de um subsídio que carece de uma prestação de serviço regular e sem faltas, pois assim o diz o contrato, tal como vem provado. Com efeito, o trabalhador teria direito a um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tivesse dado qualquer falta.
Em relação a este subsídio, vista a sua natureza e fins - já não se manifestam as razões que levam a considerar que a sua atribuição esteja excluída numa situação de não assiduidade justificada ao trabalho. Se o patrão autoriza uma falta, seria forçado retirar ao trabalhador uma componente retributiva da sua prestação laboral, não devendo o trabalhador ser penalizado por uma falta em que obteve anuência para tal e pela qual o patrão também assumiu a sua responsabilidade.
Neste sentido vão também os recentes acórdãos do TSI, já acima citados, na linha da jurisprudência unitária deste tribunal.
É questão que, no entanto, não se coloca.
No caso presente não há qualquer alusão a faltas, antes se prova que o A. trabalhou ininterruptamente durante todo o tempo por que perdurou a relação laboral, com excepção dos períodos em que terá sido autorizado a ausentar-se, pelo que cremos que comprovado está o pressuposto relativo à assiduidade contemplada no subsídio de efectividade.
Pelo que não merece reparo o que vem decidido.
4. Compensação por não gozo dos dias de descanso semanal e compensatório
A questão relativa à fórmula de compensação pelo trabalho em dia de descanso semanal trata-se de matéria já sobejamente debatida, sendo pacífica a solução adoptada neste tribunal6, no sentido de que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser pago pelo dobro da retribuição normal, não se podendo ficcionar que o trabalhador já recebeu um dia de salário por integrado no seu salário mensal.
Não se pode dizer que o recorrente recebeu em singelo a retribuição pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, na medida em que o seu salário era mensal e se foi trabalhar não foi remunerado por isso. O montante do seu salário ao fim do mês contemplava todos os dias e pode até dizer-se que era pago também enquanto estava a descansar ou devia descansar. Forçando a nota, dir-se-á que era pago para não trabalhar. Se trabalhou, tem que ser compensado por isso e é aí que a lei estabelece o correspondente ao dobro do montante de um dia de trabalho, não se podendo abater um montante ficcionado e remuneratório do dia de descanso.
A não se entender desta forma teríamos que a remuneração de um dia de descanso não era minimamente compensatória de um esforço acrescido de quem trabalhe em dia de descanso semanal em relação àqueles que ficassem a descansar ao fim de uma semana de trabalho. Estes ganhariam, por ficarem a descansar, um dia de trabalho; os outros, por trabalharem nesse dia especial não ganhariam mais do que um dia de trabalho normal.
O pagamento de tal trabalho em dobro não traduz qualquer errada interpretação do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril.
Com efeito, a fórmula correcta para retribuir o trabalho prestado pelo recorrente em dia de descanso semanal é a seguinte: "2X o salário diário X o número de dias de prestação de trabalho em dia de descanso semanal, sem ter em consideração o dia de trabalho prestado", tal como concluído pelo Tribunal a quo.
O trabalhador pretende ser indemnizado pelos dias de descanso semanal que não gozou e não se pode considerar que já foi compensado por isso. Não, ele, enquanto pago ao mês, foi pago exactamente para não trabalhar, pelo que não se pode dizer que esse trabalho já foi pago em singelo. Não se podem confundir retribuições que assumem natureza diferente.
O artigo 17.° do Decreto-Lei n." 24/89/M de 03 de Abril dispõe, no seu n. ° 1, que todos os trabalhadores têm direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26º.
Por seu turno, o art. 26º estabelece:
“1. Para os trabalhadores que auferem um salário mensal, o respectivo montante inclui o valor dos salários dos períodos de descanso semanal e anual e dos feriados obrigatórios, não podendo sofrer qualquer dedução pelo facto de não prestação de trabalho nesses períodos.
2. O valor relativo aos períodos de descanso semanal considera-se igualmente incluído no salário dos trabalhadores calculado em função do resultado efectivamente produzido ou do período de trabalho efectivamente prestado, sendo-lhes, no entanto, devida uma compensação adicional imputável aos períodos de descanso anual e aos feriados obrigatórios.*
3. Para os trabalhadores que auferem simultaneamente um salário composto pelas modalidades referidas nos números anteriores, o valor relativo aos períodos de descanso semanal considera-se igualmente incluído na remuneração acordada, sem prejuízo do direito à compensação pelos períodos de descanso anual e pelos feriados obrigatórios, na parte que corresponda à remuneração variável.*
4. Para efeitos do disposto nos n.os 2 e 3, a compensação devida pelo período de descanso anual e pelos feriados obrigatórios será calculada a partir da média diária dos últimos três meses de trabalho efectivamente prestado, ou do período durante o qual a relação de trabalho tenha efectivamente permanecido, quando de duração inferior, incluindo-se na determinação da referida média, num e noutro caso, o trabalho extraordinário.”
5. Sobre o tema transcrevemos até, com a devida vénia, o que exarado ficou no acórdão deste TSI, n.º 780/2007, já acima referido:
“O mesmo é dizer que "o Autor tem direito de receber, por cada dia de descanso semanal não gozado, o dobro da retribuição normal, para além do singelo já recebido".
Na vigência do DL n. 24/89/M
Vale aqui o disposto no art. 17º, n.1, 4 e 6, al. a).
Assim:
N.1: Tem o trabalhador direito a gozar um dia de descanso semanal, sem perda da correspondente remuneração (“sem prejuízo da correspondente remuneração”).
N.4: Mas, se trabalhar nesse dia, fica com direito a gozar outro dia de descanso compensatório e, ainda,
N.6: Receberá em dobro da retribuição normal o serviço que prestar em dia de descanso semanal.
Ora, como o trabalhador trabalhou o dia de descanso semanal terá direito ao dobro do que receberia, mesmo sem trabalhar (n.6, al. a)).
Na 1ª perspectiva acima avançada, se o empregador pagou o devido (pagou o dia de descanso), falta pagar o prestado. E como o prestado é pago em dobro, tem o empregador que pagar duas vezes a “retribuição normal” (o diploma não diz o que seja retribuição normal, mas entende-se que se refira ao valor remuneratório correspondente a cada dia de descanso, que por sua vez corresponde a um trinta avos do salário mensal).
Na 2ª perspectiva, se se entender que o empregador pagou um dia de salário pelo serviço prestado, continuam em falta:
- Um dia de salário (por conta do dobro fixado na lei), e ainda,
- O devido (o valor de cada dia de descanso, que não podia ser descontado, face ao art. 26º, n.1);
Portanto, a fórmula será sempre: AxBx2.”
De onde se conclui que, para além do pagamento do trabalho efectivamente prestado pelo recorrente em dia de descanso semanal, a recorrida não pagou ao seu trabalhador outro qualquer acréscimo salarial, em violação ao disposto no referido preceito legal, tal como decidido pelo Tribunal a quo.
O trabalhador deve assim ser compensado a esse título com o montante devido a título do dobro do salário e não só de apenas mais um montante em singelo, havendo ainda que ser pago do dia compensatório em que trabalhou, tal como também consignado na douta sentença proferida.
No entanto, a quantificação do montante estará dependente do concreto apuramento ou não de dias de descanso não gozados.
6. Da comparticipação nos custos do alojamento
Não tem razão a recorrente, pois face ao que foi acordado entre a empregadora e a sociedade prestadora de serviços E, esta comprometia-se um alojamento adequado e não faz sentido dizer que a subtracção de MOP 750,00 por mês era a título das despesas de água, electricidade, gaz e limpeza dos alojamentos, tal como resulta da cláusula 4.4 do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96 (fls 31 e segs).
Desde logo resulta que quem assume esse compromisso é a prestadora de serviços, não se percebendo a que título é a empregadora que reclama agora o pagamento desse serviço.
Como se assinala na douta sentença recorrida e já no Proc. 167/2017, prevê-se na al. a) do art. 9.º do DL n.º 24/89/M que é proibido ao empregador “obrigar o trabalhador a adquirir ou a utilizar serviços fornecidos pelo empregador ou por pessoa por ele indicada.”
Ora, prova-se que o empregador procedia de forma automática a um desconto de MOP 750,00 por mês no seu salário, a título de “comparticipação nos custos do alojamento”, independentemente de o trabalhador residir ou não na habitação que lhe era providenciada. (factos 27 e 28, II supra).
De qualquer modo, estas despesas parecem inerentes a um alojamento que não se concebe sem esses custos. Aqueles custos estão muito ligados ao concreto alojamento individual, não se compreendendo até que se possa estimar um valor certo de MOP 750,00, como a quantia correspondente aos gastos efectuados por cada um dos trabalhadores e por cada um dos alojamentos, quantia que há-de ser necessariamente variável.
O referido desconto afigura-se, pois, manifestamente ilegítimo por não ter base contratual, não ser permitido legalmente e por não vir comprovada essa despesa em benefício do A.
Continuamos ainda aqui com o entendimento vertido no douto acórdão prolatado no Processo 307/2017, para onde nos remetemos.
Estes descontos, indevidamente efectuados, tê-lo-ão sido independentemente dos períodos consentidos de ausência, pelo que o decidido não merece censura.
Improcede, pois, o recurso nesta parte.
7. Do trabalho por turnos e trabalho extraordinário
Pelas razões já acima expendidas e na impossibilidade de determinação dos dias de serviço efectivo – tendo em vista as ausências autorizadas, para além das férias gozadas -, a recorrente tem razão no que concerne à incerteza da liquidação, pelo que, na linha da jurisprudência acima citada, somos a considerar que importa apurar os dias em que se traduzirá a prestação devida.
8. Das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas
Defende a recorrente que não tinha que pagar ao autor quaisquer bonificações ou gorjetas ao autor, primeiro por não ter ficado provado quais foram as bonificações ou remunerações adicionais que pagou aos trabalhadores residentes, segundo porque as gorjetas não são pagas por si, mas pelos seus clientes, que devem ser tidos por terceiros.
A obrigação de pagamento desses suplementos prende-se com o estabelecido no ponto 3.3 do Contrato de Prestação de Serviços nº 5/96, segundo o qual o trabalhador, após 30 dias de prestação de serviço, teria direito, para além da remuneração normal, às bonificações adicionais, incluindo as gorjetas, que a 1ª ré paga aos operários residentes em Macau (facto 13).
Da matéria provada não resulta quais sejam as bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª ré tenha pago aos seus trabalhadores residentes, embora se tenha provado que a ré vinha pagando bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas.
Não só não resulta da matéria provada a sua definição material e quantificação, como nem sequer tal matéria vem alegada.
Estamos em crer que mais do que uma dificuldade no cômputo daquilo que é devido, o que poderia passar por uma operação de liquidação em execução de sentença, como determinou o Mmo Juiz, na essência, estará mesmo em causa a especificação de um pedido que nem sequer está definido na sua génese.
Será aceitável a parte pedir que o tribunal condene o patrão a pagar os suplementos que paga aos outros trabalhadores residentes, sem dizer em que é que esse pedido se traduz e se concretiza? Sem dizer a que suplementos se refere, qual a categoria dos beneficiados, a analogia de funções e qual o serviço dos beneficiários desses suplementos, partindo do facto comprovado de que a Ré pagou? Aceitar-se-ia que a parte trabalhadora pedisse ao tribunal que condenasse a pagar-lhe os salários em dívida pelo período por que perdurou a relação laboral sem os especificar?
A factualidade em que vai radicar o pedido mostra-se crucial.
Como salienta Alberto dos Reis, “… não pode ligar-se maior importância à formulação do pedido, do que à exposição dos fundamentos de facto. Que a menção das razões de direito ocupe lugar secundário, já o assinalámos; mas que a narração dos fundamentos de facto possa relegar-se para plano inferior ao da enunciação do pedido é proposição que temos por inexacta. O êxito da acção tanto depende da correcção do pedido, como da pertinência e suficiência dos fundamentos de facto; o advogado não tem que pôr maior cuidado na formulação do pedido, do que na apresentação do aspecto de facto da acção.”7
A insuficiência que se assinala, neste caso, perpassa até pelos dois vectores: narração e pedido. Não dizendo quais esses suplementos remuneratórios ou abonatórios, os termos e qualidade dos destinatários das bonificações ou remunerações adicionais que pagou a todos os trabalhadores residentes (art. 13 dos factos), está bem de ver que o pedido formulado fica necessariamente inquinado.
A questão que se equaciona estará essencialmente dependente da admissibilidade da formulação de pedidos genéricos, enquadrada no art. 392º do CPC.
Não se estando perante um caso de universalidade (al. a) do n.º1); não se estando perante um caso de impossibilidade de determinação, de modo definitivo, das consequências do facto ilícito, nem se configurando uma situação prevista no art. 563º do CC (al. b) do n.º1); nem estando a fixação do quantitativo dependente da prestação de contas ou de outro acto que deva ser praticado pelo réu – pelo menos nada se requer nesse sentido – (al. c) do n.º 1) parece não ser aceitável o pedido nos termos em que o foi na acção.
Nesta conformidade, por falta de pedido certo e concreto, ao abrigo do disposto nos artigos 139º, n.º 1 e n.º 2, al. a) e 230º, n.º 1, al. b) do CPC, absolver-se-á a Ré da instância, por se tratar de um pressuposto processual inominado,8 o que impede a apreciação de mérito, não se sufragando aqui o entendimento que configura o caso como de improcedência do pedido.9
Esta insuficiência da petição mereceria, desde logo, um convite ao aperfeiçoamento, em tempo oportuno, a fim de evitar um desfecho do teor acima contemplado.10
9. Da nulidade da sentença por falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do recorrido
Por fim, a recorrente imputa à sentença a nulidade decorrente da falta de fundamentação em virtude de ter assentado nas incoerentes conclusões levadas à petição inicial pelo autor, no fundo, reconduzindo essa nulidade a uma falta de fundamentação de facto no que tange ao apuramento do número de dias de trabalho efectivo, visto que se comprova que o trabalhador faltou, ainda que autorizadamente, por alguns períodos.
Diga-se, desde já, que não é só o número de dias de trabalho efectivo e do número das ausências que estará em causa, mas ainda a determinação de quais os dias em que o trabalho foi prestado, pois que essa concretização se mostra essencial para determinadas rubricas, como é o caso da compensação pelos dias de feriados obrigatórios não gozados. Observa-se que, neste particular aspecto bem andou o Mmo Juiz ao relegar para execução de sentença essa liquidação por não se saber quais os feriados em que o A. terá trabalhado.
Temos presentes as diferentes soluções adoptadas nos Proc.ºs 167/2017 e 307/2017, dando conta de que aqueles processos não eram exactamente iguais, nomeadamente, não tendo o primeiro sido contestado.
A questão que ora se coloca vinha já sendo anunciada, quando, em passos vários, tivemos necessidade de dizer que a liquidação se faria em sede própria, perspectivando-se uma anulação de sentença com repetição do julgado na parte respectiva ou uma liquidação de execução de sentença.
Invoca-se uma insuficiente fundamentação e afigura-se-nos que a Ré, ora recorrente, tem razão, na medida em que o Mmo Juiz se terá baseado num cômputo de dias que vêm alegados pelo A., não se alcançando em que bases se louvou para o seu cálculo.
A recorrente coloca bem a questão, ao imputar o vício à sentença proferida - independentemente do enquadramento jurídico efectuado – nos seguintes termos:
“(…) a decisão em crise padece do vício de falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do Recorrido já que mantém na íntegra as conclusões incoerentes feitas na petição inicial, mantendo por responder a questões/vícios tais como: (i)ter o Autor trabalhado todos os dias da semana, embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da 1ª Ré; (ii)Quantos foram esses dias de faltas justificadas e quando foram gozados os 24 dias de férias anuais? (iii) Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o autor concede na nota 1 ao art. 22° da petição inicial? Que factos suportam esta conclusão?”
De certa forma pode-se dizer que o Mmo Juiz terá efectuado o seu cálculo com base na alegação do A. que ressalva na nota ao art. 44º da p. i. de que o A. não trabalhou 30 dias por cada ano civil, após o desconto do tempo relativo à prescrição. Mas se se se baseia nesse pressuposto de facto, logo a douta sentença peca por não se saber em que bases assentou essa fixação da matéria de facto – presumida apenas a partir da fundamentação de direito na sentença proferida, já que essa factualidade não está concretizada no capítulo em que se dá por assente a matéria de facto -, sendo certo que se trata de matéria que foi impugnada pelo A. e é certo que o A. não trabalhou durante todo o período em que esteve ao serviço da A., de forma ininterrupta, pois foi autorizado a ausentar-se. Dir-se-á que que o período de ausência era de 30 dias por ano. Mas onde está a comprovação de que assim era e que assim era de facto? O A. alegou e formulou o pedido nessa base, mas comprovou-o?
Estamos em crer que essa incompleição não pode deixar de ser suprida, havendo que aditar, se necessário, o ou os quesitos necessários referentes à concretização dos dias de trabalho efectivo prestado e desconto dos 30 dias em cada ano, tal como alegado na nota ao artigo 27º da p.i.
Embora se acolha a linha jurisprudencial mais permissiva, no sentido de que sempre que o tribunal verificar o dano ou a prestação devida, mas não tiver elementos para fixar o seu valor, quer se tenha pedido um montante determinado ou formulado um pedido genérico, lhe cumpre relegar a fixação do montante indemnizatório para liquidação em execução de sentença, ao abrigo do disposto no art. 564º/2 do CPC11 - mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade ao autor que tenha deduzido pedido líquido de provar o quantitativo devido, não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal, na medida em que a existência de danos já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor e só no caso de se não ter provado a existência de prestação devida é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto no posterior incidente de liquidação, estando subjacente a esta jurisprudência a ideia de que razões de justiça e de equidade impedem que se absolva a demandada uma vez demonstrada a sua obrigação -, a situação presente não consentirá essa via, na exacta medida em que houve já uma liquidação e o apuramento de uma base de cálculo, não se tendo o Mmo Juiz limitado a uma enunciação genérica de trabalho prestado não apurado.
Ainda que que não se enjeite essa possibilidade, numa recondução a um completamento de matéria de facto, estamos em crer que a presente solução aponta para uma necessidade de exigência e de rigor, desde logo, para as próprias partes - muitas nem sequer aqui permanecendo, porventura desinteressando-se dos seus direitos aquando da cessação dos contratos, visto até o tempo entretanto decorrido -, não podendo elas facilitar na concretização e prova das prestações que dizem estar em dívida. Quanto se diz não retira de forma nenhuma o reconhecimento à tutela dos direitos dos trabalhadores que tenham sido violados, apenas se pretendendo a sua cooperação e responsabilização na realização da Justiça.
Perante esta insuficiência, perante esta incompreensão sobre a forma como se atingiu aquele facto com que se jogou no cálculo efectuado, mais do que a falta a que alude o art. 571º, b) do CPC estaremos perante a situação prevista no art. 629º, n.º 4 do mesmo Código, o que implica a anulação da decisão proferida na parte relativa à concretização de quais e quantos os dias considerados no cálculo efectuado pelo Mmo Juiz, tendo em conta a necessidade de saber os dias concretos de trabalho e ausência para se poderem determinar as diferentes compensações. Ou seja, por exemplo, para efeitos de compensação de feriados obrigatórios, como está bem de ver, só há compensação se houve trabalho nesses dias. Mas independentemente dessa necessidade concretização, contemplada aliás, na decisão proferida, há uma outra quantificação que se tem de provar.
Compreende-se que possa não ser fácil, mas aí o A. tem o ónus de provar, não se podendo remeter para uma alegação conclusiva de que trabalhou todos os dias menos 30 por ano. Tem de provar que assim foi e esmerar-se na prova que produz. Admite-se que essa alegação seja pobre, mas não se deixa de considerar que ela ainda consubstancia um facto que se mostra essencial e como tal tem de ser comprovado, na certeza de que o tribunal não pode suprir de todo a insuficiência de alegação das partes.
Daqui decorre que, em todos os momentos em que ao longo da fundamentação expendida fazíamos alusão à necessidade de apurar o número de dias, se conclui que esse apuramento deve ser efectuado em sede de repetição do julgamento na parte pertinente e já não em sede de liquidação em execução de sentença, na medida em que se fica por perceber como se encontrou o número de dias de base do cálculo, descontados os dias de ausência, matéria que não foi levada à base instrutória, mas, ainda que incipientemente, foi alegada.
Recurso B
1. O objecto deste recurso passa por determinar qual a forma de apuramento da quantia devida ao trabalhador como compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e em dias de feriados obrigatórios.
2. Compensação por não gozo dos dias de descanso semanal
Sobre a fórmula devida, remetemo-nos para quanto acima dissemos em sede do recurso A.
A questão que se abre agora é também a da determinação do número de dias devido, pelo que só mediante o julgamento que vier a ser realizado, nos termos que adiante melhor se explicitarão, se comprovará ou não esse facto.
3. Também quanto à compensação dos dias não gozados em dias de feriado obrigatório não deixa de assistir razão ao recorrente.
No âmbito do revogado Decreto-Lei n.º 101/84/M de 25 de Agosto (art.ºs 20.º e 21.º), não havia qualquer indemnização pelo trabalho prestado em feriados obrigatórios.
O n.º 3 do seu art.º 20.º só previa o direito à retribuição pelo trabalho a prestar nos três dias de feriados obrigatórios aí designados (o Primeiro de Janeiro, o Primeiro de Maio e o Primeiro de Outubro) por parte dos trabalhadores permanentes e já não também nos restantes seis dias de feriados obrigatórios referidos no n.º 1 do mesmo art.º 20º.
Por outro lado, só havia atribuição da indemnização pelo trabalho prestado naqueles três dias de feriados obrigatórios “remunerados” (com acréscimo de salário nunca inferior a 50% do salário normal) na situação prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 21º e já não também na hipótese da alínea c), à qual se reconduz o caso do “croupier”. Na verdade, tendo em conta a actividade da empregadora no sector de casinos, não é difícil constatar que funcionamento da empresa é contínuo e permanente, situação prevista na alínea c) e não já na al. b) - acréscimo de trabalho não previsível -, só este trabalho sendo compensado.
No âmbito do Decreto-Lei n.º 24/89/M, diploma aqui aplicável, mas também ele já revogado, são seis os dias de feriados obrigatórios “remunerados” por ano, sendo certo que a Lei n.º 8/2000, de 8 de Maio, que mantém igualmente em dez dias os feriados obrigatórios, deixa intocados esses mesmos seis dias de feriados obrigatórios “remunerados”, quais sejam, o primeiro de Janeiro, os três dias do Ano Novo Chinês, o primeiro de Maio e o primeiro de Outubro.
E para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado pelo trabalhador em feriados obrigatórios “remunerados”, mas somente a partir de 3 de Abril de 1989, vista a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 24/89/M, a fórmula há de corresponder ao “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal”, para além naturalmente da retribuição a que tem direito, caso tenha que trabalhar nesses feriados, a despeito da regra da dispensa obrigatória de prestação de trabalho (art.ºs 20.º, n.º 1, e 19.º, n.ºs 2 e 3), o que equivale ao “triplo da retribuição normal”. 12
Esta retribuição pelo triplo da retribuição normal justifica-se pelo especial valor social e comunitário que se pretende imprimir à celebração de certas datas festivas; pela comparação com o regime compensatório nas situações de impedimento do gozo dos descansos anuais (artigo 24º), podendo fazer-se o paralelismo entre o não gozo de um núcleo reputado fundamental de feriados de gozo obrigatório e o impedimento do gozo das férias anuais, sendo sempre mais censurável a violação deste direito do que o não gozo voluntário do descanso anual.
Tal interpretação resulta da própria letra da lei ao falar num acréscimo salarial não inferior ao dobro da retribuição norma, o que pressupõe a contemplação da base a acrescer, usando o legislador uma terminologia diferente da usada para as situações de compensação pelo dobro - poder-se-ia dizer, neste passo, que também não usou a expressão triplo; só que não se trata aqui de uma situação de indemnização, mas sim de uma especial majoração do salário em função do trabalho prestado; para se dizer ainda que este parece ser o regime igualmente consagrado na Função Pública, onde se usa a mesma expressão de acréscimo de remuneração, correspondente ao coeficiente 2 para cada hora de trabalho (cfr. art. 197º do RJFPM).13
Seguimos, aliás, a posição dominante nesta Instância, sobre este assunto, desenvolvida particularmente no Proc. nº 780/2007, para onde também nos remetemos.
4. De todo o modo, tal como se decidiu, importa apurar o montante devido em função dos dias de trabalho efectivamente prestado, tanto mais que é o próprio A. que admite que faltou autorizadamente durante algum período, pelo que esse quantum não deverá deixar de ser apurado em sede própria, nos termos acima vistos e atinentes à repetição parcial do julgamento que se ordena.
Importa, pois, decidir em conformidade com tudo quanto acima exposto.
IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em:
1 - Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelas rés B e C, decidindo-se:
a) Anular parcialmente o julgamento de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios;
b) julgar procedente o recurso, revogando-se o decidido quanto ao pedido relativo a bonificações adicionais, incluindo gorjetas e, em consequência, absolver a Ré da instância nessa parte;
c) Julgar não provido o recurso na parte restante, em consequência do que se mantém a sentença recorrida, nomeadamente na parte concernente à liquidação a que já procedeu quanto ao subsídio de efectividade e à comparticipação no alojamento.
2 – Conceder provimento ao recurso do autor e, em consequência, revogar a sentença na parte respectiva e condenar as rés ao acatamento das fórmulas acima referidas, no tocante aos dias de trabalho prestado em dias de descanso semana e aos feriados obrigatórios, “quantum”, em conformidade com o que vier a ser decidido após a repetição parcial do julgamento, nos termos acima definidos.
Vão as rés ainda condenadas nos juros de mora nos termos definidos no Ac. do TUI, de 2/03/2011, Proc. nº 69/2010.
Custas pelas partes em função do decaimento.
Macau, 20 de Julho de 2017,
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 - Proc. 627/2013, deste TSI.
2 - Ac. do TSI, Proc. n.º 562/2013, de 8/5/2014
3 - Ac. 376/2012, 322/2013, 78/2012 e 414/2012
4 - Ac. 322/2013
5 - Ac. deste TSI, de 21/7/2016, Proc. 376/2016
6 - Cfr., entre muitos outros, acs. do TSI, no proc. n.º 780/2007, de 31 de Março de 2011; 422/2013, de 14/Nov/2013; 327/2005, de 15 de Julho de 2006; 678/2013, de 24 de Abril de 2014
7 - CPC Anot, II, Reim. 2005,363
8 - Ac. STJ, de 8/2/1994, CJ, Acs STJ 1994, 1º tomo, 95; Ac. do STJ, de 22/3/2007, Proc. n. 06S3961; Ac. RP, de 15/5/2006, Proc. n.º 0545375; Ac RC, de 30/1/2001, Proc. n.º 2183/2000. No mesmo sentido, Abrantes Geraldes, Temas da Ref…, Almedina, 1997, 155 e 156 e Viriato Lima, Manual de DPC, CFJJ, 2005, 145
9 - Alberto dos Reis, Com., 3º vol., 186 e 187
10 - Vd. autores e jurisprudência acima citada
11 - Na linha de uma interpretação pioneira de Alberto dos Reis, CPC Anot, V, 71
12 - Cfr- Ac. 297/2005, de 23/2/2006, entre outros, já acima citados
13 -Teixeira Garcia, ob. cit., Ca. V, 9.2
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407/2017 66/66