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Processo nº 594/2017
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 12 de Outubro de 2017

ASSUNTO:
- Reclamação da retenção do recurso
- Competência do tribunal a quo

SUMÁRIO:
- Uma vez recebida a reclamação da retenção do recurso, o juiz a quo tem de decidir manter ou alterar a forma de subida do recurso inicialmente fixada.
- Assim, tem de apreciar, inevitavelmente, a tempestividade da reclamação apresentada, sob pena de fazer actos processuais inúteis, o que é expressamente proibida nos termos do artº 87º do CPCM, para o que é naturalmente competente.
O Relator
Ho Wai Neng







Processo nº 594/2017
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 12 de Outubro de 2017
Recorrente: A S.A.
Objecto do Recurso:Despacho que não admitiu a reclamação contra a retenção do recurso

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por despacho de 13/02/2017, decidiu-se não admitiu a reclamação contra a retenção do recurso.
Dessa decisão vem recorrer o Recorrente A S.A., alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
I. Vem o presente recurso interposto do despacho proferido nos presentes autos, de fls. 12, que não admitiu a reclamação a fls. (...), com o fundamento de que a mesma foi apresentada extemporaneamente;
II. Atento o disposto na parte final do n.º 5 do artigo 596.° do CPC de Macau, se o Tribunal a quo mantiver o despacho reclamado, deve o respectivo apenso (da reclamação) ser remetido ao tribunal superior para julgamento, no âmbito do qual caberá ao respectivo presidente, em exclusivo, conhecer da tempestividade da reclamação (entre outros), ao abrigo do n.º 1 do artigo 597.° do CPC de Macau;
III. Ao Tribunal a quo está vedada a pronúncia sobre a tempestividade da reclamação ou acerca da validade intrínseca dos argumentos que o reclamante expõe, cabendo-lhe apenas, ponderando os argumentos apresentados pelo reclamante, reparar a decisão anteriormente tomada e mandar seguir o recurso - caso as razões apresentadas sejam decisivas no sentido de fazerem alterar o entendimento antes projectado no despacho reclamado - ou sustentar a decisão;
IV. A intromissão do julgador a quo nos poderes reservados ao presidente do Tribunal ad quem constitui uma imperfeição processual que o nosso ordenamento não consente, constituindo uma violação ao disposto no n.º 5 do artigo 596.° e no n.º 1 do artigo 597.°, ambos do CPC de Macau;
V. Ad cautelam, os despachos de admissão dos recursos e fixação do respectivo regime de subida diferida não retêm, nem implicam, per se, a retenção do recurso, porquanto, sendo aquele regime susceptível de impugnação apenas nas alegações recursórias - nos termos do n.º 4 do artigo 594.° do CPC de Macau -, está ainda sujeito a um outro despacho pelo tribunal a quo, de sustentação ou reparação, nos termos do artigo 617.° do CPC de Macau, que, importando a manutenção do fixado regime de subida ou a sua alteração, poderá levar, agora sim, à sua retenção;
VI. A reclamação para o presidente do Tribunal ad quem pode apenas ter por objecto a não admissão do recurso, proferida em cumprimento do n.º 1 do artigo 594.° do CPC de Macau, ou a sua retenção, proferida no âmbito do artigo 617.° do mesmo Código;
VII. Tendo sido proferido despacho a fls. 418, de sustentação da decisão recorrida e manutenção do já fixado regime de subida, será precisamente esta a única decisão que poderá ser objecto de reclamação para o Tribunal ad quem;
VIII. Tendo o Recorrente sido notificado de tal despacho por carta expedida em 16 de Janeiro de 2017, o prazo para dele reclamar terminava em 6 de Fevereiro de 2017 (Segunda-feira), atento o disposto no n.º 1 do artigo 596.° do CPC de Macau e ao abrigo do n.º 2 do artigo 201.° e do n.º 1 do artigo 94.° do mesmo Código, em conjugação com o artigo 12.° da Lei de Bases da Organização Judiciária, com o que a reclamação apresentada em 3 de Fevereiro de 2017 é tempestiva.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos
1. Por despacho de fls. 326, proferido nos autos principais da acção executiva, foi decidida pelo Tribunal a quo a suspensão da venda do imóvel hipotecado e penhorado, objecto de garantia real constituída a favor do Recorrente (Exequente).
2. Não se conformando com tal despacho, o Recorrente interpôs dele recurso, o qual viria a ser admitido pelo despacho de 14/11/2016 (fls. 80 dos autos), com subida deferida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
3. Notificado de tal despacho por carta expedida em 17/11/2016 e com este não se conformando na parte em que fixou o regime de subida diferida e nos próprios autos, o Recorrente veio impugnar nas suas alegações recursórias e como questão prévia, o fixado regime de subida.
4. Por despacho de 12/01/2017 (fls. 98 dos autos), notificado ao Recorrente por carta expedida em 16 de Janeiro de 2017 (Segunda-feira), o Tribunal a quo esclareceu ao Recorrente que a motivação do recurso não era a sede própria para impugnar a retenção do recurso, mas sim através da reclamação nos termos do artigo 595.º n.º 1 do CPC e no prazo de 10 dias.
5. Em consequência, o ora Recorrente apresentou, em 03 de Fevereiro de 2017, reclamação para o Presidente do Tribunal de Segunda Instância contra a retenção do recurso.
6. Autuada por apenso e concluso o respectivo processo ao Mmº. Juiz titular, foi proferido o despacho de fls. 12, pelo qual se decidiu não admitir a reclamação, por ser intempestiva.
7. Inconformado com tal decisão, o Recorrente dela interpôs o presente recurso.
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III - Fundamentação
Entende o Recorrente que o juiz a quo não tem competência para apreciar a tempestividade da reclamação contra a retenção do recurso, tal competência pertence ao Presidente deste TSI para o caso concreto.
Quid iuris?
O CPC não tem norma expressa quanto à questão suscitada.
Num primeiro momento, parece que tal competência caiba à pessoa quem tem o poder jurisdicional para apreciar a reclamação, que é justamente o Sr. Presidente deste TSI para o caso.
No entanto, melhor analisando a tramitação processual da reclamação, a resposta deixa de ser tão linear.
Repare-se, uma vez recebida a reclamação, o juiz a quo tem de decidir manter ou alterar a forma de subida do recurso inicialmente fixada.
Para o efeito, tem de apreciar, inevitavelmente, a tempestividade da reclamação apresentada, sob pena de fazer actos processuais inúteis, o que é expressamente proibida nos termos do artº 87º do CPCM.
Pois, se uma reclamação for apresentada fora do prazo, o juiz a quo deixa de ter necessidade de decidir manter ou alterar a forma de subida do recurso inicialmente fixada, bem como não ter necessidade de praticar os actos processuais posteriores dessa decisão.
Face ao exposto, se conclui que também compete ao juiz a quo apreciar a tempestividade da reclamação apresentada.
Em relação ao mérito da decisão, defende o Recorrente que o juiz a quo só determinou a retenção do recurso com o despacho datado de 12/01/2017 (fls. 98 dos autos).
Adiantamos desde já que não lhe assiste razão.
O juiz a quo, através o despacho de 14/11/2016, ao admitir o recurso e fixar o seu regime de subida como deferida, já está a reter o recurso.
Pergunta-se, se o recurso não foi retido, porquê razão o Recorrente fez a impugnação da retenção na sua motivação do recurso?
Como se vê, a retenção do recurso foi feita no momento da admissão do recurso e não no momento do despacho de 12/01/2017.
Tal despacho limita-se a esclarecer ao Recorrente que o meio adequado para impugnar a retenção do recurso é através do mecanismo plasmado nos termos do artigo 595.º do CPCM.
Uma vez que o despacho que determinou a retenção do recurso foi notificado ao Recorrente por carta expedida de 17/11/2016 e a reclamação contra a retenção só se apresentou em 06/02/2017, não resta qualquer margem de dúvida em afirmar que a mesma é intempestiva.
Face ao expendido, o recurso não deixa de se julgar como improvido.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento do presente recurso, mantendo o despacho recorrido.
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Custas do recurso pelo Recorrente.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 12 de Outubro de 2017.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong




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