--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ---------
--- Data: 08/11/2017 -------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo ---------------------------------------------------------------------------
Processo nº 882/2017
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)
Relatório
1. A (A), arguido com os restantes sinais dos autos, vem recorrer da decisão em 13.07.2017 pelo Mmo Juiz do T.J.B. proferida e que lhe revogou a suspensão da execução da pena única de 5 meses de prisão que lhe tinha sido decretada por decisão de 14.11.2014.
E, tanto quanto se colhe da sua motivação e conclusões de recurso – que, como sabido é, delimitam o âmbito deste – entende, em síntese, que verificados não estão os pressupostos legais para a decisão proferida e agora objecto da presente lide recursória; (cfr., fls. 578 a 580 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Em Resposta, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 582 a 585-v).
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Admitido o recurso com efeito e modo de subida adequadamente fixados, e remetidos os autos a este T.S.I., foram os mesmos a vista do Ministério Público.
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Emitiu o Exmo. Representante do Ministério Público douto Parecer sustentando a rejeição do recurso.
Eis o seu teor:
“O recorrente, A, impugna a decisão de 13/07/2017, que revogou a suspensão da execução da pena única de 5 meses de prisão que lhe fora aplicada no âmbito do processo CR3-14-0029-PCC.
Não lhe imputa qualquer vício específico, nem aponta normas violadas, o que leva o Ministério Público em primeira instância, na sua resposta, a suscitar, desde logo, a questão da rejeição do recurso, por este se mostrar desconforme às exigências processuais, padecendo de falta substancial de fundamentos.
Em bom rigor, a motivação do recurso apresenta um enunciado de razões que, em tese, militam a favor da suspensão da execução das penas de prisão aplicáveis a toxicodependentes, por via do consumo de drogas, parecendo esquecer que a suspensão já foi oportunamente decretada e que o que ora está em causa é a revogação dessa suspensão. Nessa medida, é algo difícil vislumbrar na peça a enunciação dos fundamentos do recurso, ou seja, os reais motivos de discordância com a decisão. E constituindo esta enunciação dos fundamentos o cerne da alegação de recurso, como resulta do artigo 402.°, n.° 1, do Código de Processo Penal, a sua falta acarreta a falta de motivação, com a consequência da rejeição prevista no artigo 410.° do Código de Processo Penal, o que levaria à rejeição do recurso.
Se porventura se entender que, apesar de tudo, a peça alegatória pode ser encarada como motivação substancial do recurso, e que lhe subjaz matéria de direito, traduzida numa incorrecta interpretação e aplicação da norma do artigo 54.°, n.° 1, alínea a), do Código Penal, então haverá que considerar manifestamente improcedente o recurso.
O que, no fundo, o recorrente deixa transparecer da sua alegação de recurso, é que pretende ver protelado indefinidamente o plano de acompanhamento e a suspensão da execução da pena.
Só que o recorrente não tem contribuído para viabilizar e tornar eficaz o plano de acompanhamento, vindo a reincidir no consumo de drogas, e recusando a hipótese de internamento para tratamento mais eficaz. E tudo isto acontece, não obstante as diversas advertências formais de que já foi alvo por parte do tribunal, que tentou repetidamente levar o recorrente ao cumprimento do regime de prova mediante acompanhamento do Departamento de Reinserção Social, para assim evitar a execução da pena de prisão. Indiferente às sensibilizações da Reinserção Social e às advertências do tribunal, o recorrente não congregou esforços e vontade para se libertar do consumo de droga e cumprir as condições da suspensão. Mais do que isso, o recorrente sempre encontrou razões, algumas de cariz perfeitamente pueril, para se autojustificar e, no fundo, continuar a trilhar a senda do consumo de droga. Ora são os medicamentos chineses, ora é a medicação de um médico particular, ora são os comprimidos da mulher, que ele, sem querer, engole num ápice, ora são os amigos que lhe colocam droga nos cigarros…
Não podendo obviamente ter-se por justificado o comportamento de alheamento e falta de colaboração que o recorrente livremente decidiu adoptar, e tendo o tribunal alertado anteriormente, por diversas vezes, o recorrente para o incumprimento em que ele estava a incorrer, o que, a certa altura, até justificou a prorrogação do período de suspensão, não se vê razão plausível para protelar ad aeternum a suspensão, quando é seguro que o recorrente se tem furtado reiterada e injustificadamente ao cumprimento das condições que lhe foram impostas para a suspensão. Dizer agora que tudo poderá ser diferente para o futuro, além de não passar de mera carta de intenções, não apaga a infracção repetida a que o recorrente votou as condições a que ficou subordinada a suspensão.
Não se detecta qualquer erro na decisão impugnada, que encontra pleno respaldo no artigo 54.°, n.° 1, alínea a), do Código Penal, apresentando-se manifestamente improcedentes os argumentos em que vem sustentada a revogação da decisão recorrida.
Em qualquer dos casos, impõe-se a rejeição do recurso, indo nesse sentido o meu parecer”; (cfr., fls. 626 a 627).
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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.
Fundamentação
2. Como se deixou relatado, vem o arguido dos autos recorrer da decisão proferida pelo Mmo Juiz do T.J.B. que lhe revogou a suspensão da execução da pena única de 5 meses de prisão que lhe tinha sido imposta por decisão de 14.11.2014.
Alega – em suma – que verificados não estavam os pressupostos legais para tal decisão.
Porém, e como já se deixou adiantado, evidente é que nenhuma razão lhe assiste, muito não sendo necessário consignar.
Vejamos.
Nos termos do art. 54° do C.P.M.:
“1. A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no decurso dela, o condenado
a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano individual de readaptação social, ou
b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.
2. A revogação determina o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença, sem que o condenado possa exigir a restituição de prestações que haja efectuado”; (sub. nosso).
E, nesta conformidade, atento o preceituado no art. 54°, n.° 1, al. a), e constatando-se que o ora recorrente violou de forma grosseira e repetidamente os deveres que lhe tinham sido impostos como condição da suspensão da pena que lhe foi revogada, fazendo descaso absoluto das (várias) advertências que lhe foram feitas e (várias) oportunidades que lhe foram concedidas, outra solução não se mostra possível.
De facto, o ora recorrente, após a condenação na pena única de 5 meses de prisão suspensa na sua execução no âmbito dos presentes autos, infringiu, repetida e grosseiramente, os deveres que lhe tinham sido impostos no âmbito do programa de ressocialização e desintoxicação que lhe foi decretado como condição de suspensão da execução da pena fixada nestes autos, apresentando, por 4 vezes, “resultado positivo” em exames de urina para despistagem de consumo de estupefacientes, o que levou mesmo à prorrogação do período de suspensão por mais um ano, continuando, não obstante isto, com uma postura de total alheamento aos seus deveres, (mesmo após tal prorrogação), dando lugar a decisão ora recorrida.
Não se nega, (e assim temos entendido) que se devem evitar penas de prisão de curta duração, (cfr., v.g., o recente Ac. deste T.S.I. de 01.11.2017, Porc. n.° 948/2017), que a revogação da suspensão da execução da pena não é automática, não funcionando “ope legis”, e que o legislador pretende “salvar”, até ao limite, a pena de substituição da suspensão da pena, surgindo a sua revogação como “última ratio”; (no mesmo sentido, cfr., o Ac. da Rel. de Coimbra de 13.09.2017, Proc. n.° 254/15).
Como decidiu o T.R. de Guimarães:
“I) As razões que estão na base do instituto da suspensão da execução da pena radicam, essencialmente, no objectivo de afastamento das penas de prisão efectiva de curta duração e da prossecução da ressocialização em liberdade.
II) Por isso, se conclui sempre que, desde que seja aconselhável à luz de exigências de socialização, a pena de substituição só não deverá ser aplicada se a opção pela execução efectiva de prisão se revelar indispensável para garantir a tutela do ordenamento jurídico ou para responder a exigências mínimas de estabilização das expectativas comunitárias”; (cfr., Ac. de 11.05.2015, Proc. n.° 2234/13).
Todavia, face à repetida postura do ora recorrente em violar, grosseiramente, os deveres impostos como condição para a suspensão da execução da pena, impõe-se dizer que outra solução não se nos apresenta como possível, pois que revelado está que as “finalidades que estavam na base da dita suspensão da pena (agora revogada) não puderam ser alcançadas”.
Como ensinava Jescheck: “o tribunal deve dispor-se a correr um risco aceitável, porém se houver sérias dúvidas sobre a capacidade do réu para aproveitar a oportunidade ressocializadora que se lhe oferece, deve resolver-se negativamente a questão do prognóstico”; (in, “Tratado de Derecho Penal”– Parte General – Granada 1993, pág. 760, e, no mesmo sentido, o Ac. da Rel. de Lisboa de 05.05.2015, Proc. n.° 242/13, e, mais recentemente, da Rel. de Coimbra de 27.09.2017, Proc. n.° 147/15, onde se consignou que “Na formulação deste juízo [de prognose] o tribunal deve correr um risco prudente pois a prognose é uma previsão, uma conjectura, e não uma certeza. Quando existam dúvidas sérias e fundadas sobre a capacidade do agente para entender a oportunidade de ressocialização que a suspensão significa, a prognose deve ser negativa e a suspensão negada”, in “www.dgsi.pt”).
Por sua vez, perante a (repetida) insistência na prática de ilícitos criminais por parte de um arguido, revelando, claramente, não ser merecedor de um “juízo de prognose favorável”, outra solução não existe que não seja uma “medida detentiva”, sob pena de manifestação de falência do sistema penal para a protecção de bens jurídicos e autêntico “convite” à reincidência; (neste sentido, cfr., v.g., o Ac. da Rel. de Guimarães, de 13.04.2015, Proc. n.° 1/12).
Dest’arte, e constatando-se que com a sua “conduta”, invalidou, o ora recorrente, de forma definitiva e totalmente, a prognose favorável que suportou a aplicação da pena de prisão suspensa na sua execução, ou seja, a expectativa de, através da suspensão da pena se manter afastado da delinquência, (cfr., o Ac. Rel de Coimbra de 28.06.2017, Proc. n.° 508/13), e, assim, apresentando-se-nos o recurso “manifestamente improcedente”, há que decidir em conformidade com o estatuído no art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M..
Decisão
3. Nos termos e fundamentos expostos, decide-se rejeitar o recurso.
Pagará o arguido 3 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.
Registe e notifique.
Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 08 de Novembro de 2017
José Maria Dias Azedo
Proc. 882/2017 Pág. 2
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