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Processo n.º 979/2015 Data do acórdão: 2017-11-23 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– crime de reentrada ilegal
– julgamento na ausência da arguida
– interrogatório em inquérito
– revogação da suspensão da pena
– prática de novo crime
– art.º 54.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal
S U M Á R I O
1. No caso dos autos, a recorrente foi julgada em primeira instância na sua ausência, tal como tinha sido consentido por ela própria, pelo que ela já ficou representada para todos os efeitos possíveis pela sua defensora nessa audiência de julgamento (art.º 315.º, n.os 2 e 3, do Código de Processo Penal).
2. Atentos o facto de ter sido interrogada pelo Ministério Público na fase do inquérito e o acto de prestação do consentimento escrito para a audiência de julgamento poder ser realizada na sua ausência, é de concluir que ela já soube da existência do subjacente processo penal aberto nomeadamente pela conduta de reentrada ilegal, pelo que ao ter voltado a cometer este crime, mostrou ela que as exigências da prevenção especial do crime de reentrada ilegal já não poderem ser alcancadas, devendo, pois, ser revogada, sob a égide do art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal, a suspensão da execução da pena de prisão então imposta.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 979/2015
(Autos de recurso penal)
Arguida recorrente: B (B)





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformada com o despacho revogatório da suspensão, por três anos e seis meses, da execução da pena única de três anos de prisão imposta no acórdão de 22 de Maio de 2014 do subjacente Processo Comum Colectivo n.º CR1-13-0256-PCC do 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB), pela prática, em autoria material e na forma consumada, de dois crimes de falsificação de documento e de dois crimes de reentrada ilegal, veio a arguida B, aí já melhor identificada, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para pedir a revogação dessa decisão revogatória da pena suspensa, tendo alegado, para o efeito, e em síntese, o seguinte: apesar do seu consentimento escrito anteriormente prestado para que a audiência de julgamento nesse processo penal pudesse ser realizada na sua ausência, ela não chegou a receber a notificação daquele acórdão condenatório nem tomou conhecimento do acórdão, e só veio saber do mesmo aresto por causa do julgamento do Processo Sumário n.o CR3-15-0112-PSM pelo qual foi condenada em pena de prisão efectiva; e aquando do cumprimento dessa prisão, já passou a inteirar-se da gravidade das consequências da sua conduta, pelo que exibiu bom comportamento prisional, com arrependimento sincero; tendo ela vinte e tal anos de idade e precisando de cuidar do seu pai permanentemente doente, mereceria a prorrogação do período de suspensão da pena de prisão, pelo que violou o despacho recorrido o critério material exigido no n.o 1 do art.o 54.o do Código Penal (CP) para revogação da pena suspensa (cfr. com mais detalhes, o teor da motivação de recurso, apresentada a fls. 169 a 173 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu (a fls. 179 a 180v) a Digna Delegada do Procurador, no sentido de manifesta improcedência do recurso.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 209 a 210), pugnando pela manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame crítico e global dos autos, fluem os seguintes elementos fácticos e processuais, pertinentes à solução do recurso:
– por acórdão de 22 de Maio de 2014 (de fls. 108 a 112v) do subjacente Processo Comum Colectivo n.º CR1-13-0256-PCC do TJB, já transitado em julgado em 12 de Junho de 2014 (cfr. a nota de trânsito lavrada a fl. 118 do mesmo processo ora em causa), a ora recorrente ficou condenada pela prática, em autoria material e na forma consumada, de dois crimes de falsificação de documento e de dois crimes de reentrada ilegal, em três anos de prisão única, suspensa na execução por três anos e seis meses;
– nesse subjacente processo, a audiência de julgamento foi realizada na ausência da recorrente (a qual ficou representada pela sua Ex.ma Defensora Oficiosa – cfr. a acta da audiência de fl. 107 a 107v e a acta de leitura do acórdão de fl. 113), à luz do consentimento escrito prestado por ela nesse sentido na fase do inquérito, depois de interrogada pelo Ministério Público em 4 de Outubro de 2012 (cfr. o auto de inquirição de fls. 75 a 76 segundo o qual confessou ela os factos imputados, e o consentimento escrito de fl. 80);
– ulteriormente, por sentença proferida em 16 de Junho de 2015 (com texto disponibilizado a partir de 23 de Junho de 2015) do Processo Sumário n.º CR3-15-0112-PSM do TJB, transitada em julgado em 13 de Julho de 2015 (cfr. o teor da certidão dessa sentença junta em 17 de Julho de 2015 a fls. 126 a 129v dos presentes autos), a recorrente ficou condenada pela autoria material de um crime, consumado em 13 de Junho de 2015, de reentrada ilegal, na pena de quatro meses de prisão efectiva (cfr. o teor de fls. 45 e 139 dos presentes autos);
– em face da condenação penal nesse processo sumário, a M.ma Juíza titular dos subjacentes autos n.º CR1-13-0256-PCC ouviu a própria pessoa da recorrente (cfr. o teor da acta dessa diligência lavrada a fls. 146 e seguintes), na sequência do que acabou por decidir revogar, à luz do art.º 54.º, n.º 1, do CP, a suspensão da execução da pena de prisão inicialmente aplicada à mesma arguida (cfr. o teor do despacho revogatório da pena suspensa, constante de fls. 146v a 147).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, é de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, vê-se que a recorrente sindicou principalmente do mérito da decisão recorrida, revogatória da suspensão da pena de prisão.
No caso dos autos, a recorrente foi julgada no subjacente processo penal em primeira instância na sua ausência, tal como tinha sido consentido por escrito por ela própria, pelo que ela já ficou representada para todos os efeitos possíveis pela sua Ex.ma Defensora na audiência de julgamento em primeira instância (art.º 315.º, n.os 2 e 3, do Código de Processo Penal).
Dos elementos referidos na parte II do presente acórdão de recurso resulta que ela tinha ficado condenada nos subjacentes autos penais pela prática de dois crimes de falsificação de documento e de dois crimes de reentrada ilegal, e voltou a praticar, durante o período de suspensão da execução da pena de prisão, o crime de reentrada ilegal.
Alegou ela que desconheceu a decisão condenatória daqueles quatro crimes. Mas, este argumento não pode valer, porquanto atentos o facto de ter sido interrogada na fase do inquérito pelo Ministério Público e o acto de prestação, por ela, do consentimento escrito para a audiência de julgamento se poder realizar na sua ausência, é de concluir que ela já soube da existência do subjacente processo penal por aqueles quatro crimes, pelo que ao ter voltado a cometer o crime de reentrada ilegal, mostrou ela que as exigências da prevenção especial do crime de reentrada ilegal já não poderem ser alcancadas, devendo, pois, ser revogada, sob a égide do art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal, a suspensão da execução da pena de prisão então imposta.
Improcede, portanto, o recurso, sem mais indagação por prejudicada ou desnecessária.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas do recurso pela arguida, com duas UC de taxa de justiça e duas mil e quinhentas patacas de honorários a favor da sua Ex.ma Defensora Oficiosa.
Macau, 23 de Novembro de 2017.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)



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