Processo nº 871/2017
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 14 de Dezembro de 2017
Recorrentes: A (Autor)
B, SA (1ª Ré)
C, SA (2ª Ré)
Recorridos: Os mesmos
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - RELATÓRIO
Por despacho de 21/02/2017, deferiu-se o requerimento apresentado pelo Autor A com vista à correcção de diversos erros de cálculo ou de escrita relativos aos valores pagos pelas Rés B, SA e C, SA ao Autor a título de salário de base mensal e de salário normal diário reclamados a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, trabalho em dia feriado, compensação por alojamento, trabalho prestado para além do período normal diário e 30 minutos de trabalho prestados para além do período normal diário.
Dessa decisão vêm recorrer as Rés, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
I. Vem o presente recurso interposto do despacho proferido a fls. 179 dos autos, nos termos do qual "Admite-se a correcção requerida pelo Autor aos pedidos formulados na sua petição inicial convertendo-se os valores inicialmente apresentados em patacas pelos agora concretizados em Hong Kong dólares, o que se faz em coerência com os documentos juntos aos autos e por força do princípio da economia processual, pois se assim se não fizesse previsivelmente teríamos o Juízo Laboral inundado de outras tantas acções, somente por força deste lapso, que assim se admite que seja reparado. Aliás não é por acaso que na base instrutória a dedução automática dos custos de alojamento feita pela Rés aos Autor está referida em HK dólares."
II. O despacho recorrido carece de fundamento legal, não podendo acolher-se o entendimento que, por via do princípio da economia processual e por forma a evitar que o Juízo laboral seja inundado de outras tantas acções, seja admitida a correcção dos pedidos formulados pelo Autor, simplesmente porque não há nada a corrigir e estamos perante verdadeiras alterações dos pedidos fora das situações legalmente previstas;
III. O princípio da economia processual mais não é que um princípio de simplificação do processo, segundo o qual o processo deve obter o maior resultado com o mínimo de esforço, mas sempre nos limites da legalidade e da Justiça imparcial, não sendo de se admitir o recurso ao princípio da economia processual como fundamento de atropelo à lei;
IV. O Autor fundamentava o seu pedido de correcção do pedido no preceituado no artigo 244º do Código Civil e no artigo 217º do CPC, os quais, flagrantemente não têm aplicação ao caso conforme acaba por deixar escapar o despacho recorrido sobre os quais não se debruça;
V. Do que vem declarado pelo Recorrido no seu requerimento não resulta que se trate de um erro de escrita ou de cálculo, nem dos seus articulados anteriores, mormente da petição inicial, se descortina esse erro, pois o Recorrido sempre foi muito claro em alegar e calcular todas as parcelas do seu pedido em Patacas, e nunca em momento algum se refere a Dólares de Hong Kong;
VI. É pacífico que, a existir um lapso manifesto, tal erro só pode ser ratificado se for ostensivo, evidente e devido a lapso manifesto, sendo necessário que ao ler-se o texto se veja de imediato o erro e que se entenda o que o interessado pretendia dizer;
VII. Aquilo que o Recorrido pretendeu e acabou por ser deferido pelo Tribunal a quo foi alterar o seu pedido, o que, conforme resulta do citado artigo 217º nº 2 do CPC só e admitido na Réplica, sendo certo que alteração não é o mesmo que ampliação;
VIII. Mas ainda que se tratasse de um requerimento de ampliação do pedido, o que legalmente é permitido até ao encerramento da discussão em primeira instância (art. 217º, nº 2 do CPC), a pretensão do Recorrido carece de qualquer fundamento legal porquanto não se trata de "desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo", nem o Recorrido o fundamentou;
IX. Se o Recorrido pretendia alegar que auferia a quantia mensal de HK7.500.00 (em vez de o receber em patacas) e deduzir os seus pedidos com base nessa quantia, poderia e deveria tê-lo feito ab initio na sua petição inicial, não podendo admitir-se que o faça agora lançando mão de expedientes processuais a despeito de erros de escrita que, como se viu, não existem, isto quando, ao longo do seu articulado o Autor sempre foi formulando os seus pedidos em patacas os quais também concretiza, a final, em patacas;
X. Atento o principio da preclusão, o Recorrido não pode vir desdizer aquilo que disse e sobre o qual as partes já tiveram oportunidade de se pronunciar, colocando o processo e as restantes partes na contingência das suas variações;
XI. Se o Autor não alegou que auferia o salário em dólares de Hong Kong - e essa alegação não decorre do - e não deduziu os seus pedidos com base nesse mesmo salário, ser imputado, não sendo admissível que lhe seja permitido fazê-lo agora, em momento inoportuno, lançando-se mão ao princípio da economia processual, como veio a fazer a decisão recorrida;
XII. No essencial, não se poderá sobrevalorizar o princípio da economia processual em detrimento de outros princípios que enformam o processo, designadamente desvalorizando-se os princípios da estabilidade da instância e da preclusão;
XIII. Motivo pelo qual, sempre com mui devido respeito, entende a Recorrente que o despacho recorrido que enferma do vício de erro na aplicação do Direito por violação, designadamente, do artigo 6º, 217º do CPC, artigo 244º do Código Civil, devendo o mesmo ser revogado e substituído por outro que decrete o indeferimento do requerimento apresentado pelo Autor, ora Recorrido.
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Por sentença de 29/05/2017, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a 1ª Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$106,861.25.00 e a 2ª Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$136,785.00, acrescida de juros moratórios à taxa legal.
Dessa decisão vêm recorrer o Autor e as Rés, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
Do Autor:
1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual foi julgada parcialmente improcedente ao ora Recorrente as quantias pelo mesmo reclamadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e feriados obrigatórios;
2. Salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de Direito quanto à concreta forma de cálculo devida pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e feriado obrigatórios e, nesta medida, se mostra em violação ao disposto nos artigos 17.º, 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, razão pela qual deve a mesma ser julgada nula e substituída por outra que atenda à totalidade dos pedidos reclamados pelo Autor na sua Petição Inicial;
Em concreto,
3. Ao condenar a 1ª Ré a pagar ao Autor apenas uma quantia em singelo pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal não gozado, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, na medida em que de acordo com o referido preceito se deve entender que o mesmo trabalho deve antes ser remunerado em dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, acrescido de um outro dia de descanso compensatório, tal qual tem vindo a ser seguido pelo Tribunal de Segunda Instância;
Acresce que,
4. Contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal a quo, não parece correcto concluir que pela prestação de trabalho nos dias de feriados obrigatórios se deva proceder ao desconto do valor do salário em singelo já pago;
5. Pelo contrário, salvo melhor opinião, a fórmula correcta de remunerar o trabalho prestado em dia de feriado obrigatório nos termos do disposto no artigo 20.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril – ainda que a determinar em sede de liquidação de execução de Sentença – será conceder ao Autor, ora Recorrente, um "acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito" – o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal – conforme tem vindo a ser entendido pelo Tribunal de Segunda Instância;
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As Rés responderam à motivação do recurso do Autor, nos termos constantes a fls. 289 a 295, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Das Rés:
1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção procedente e condenou as Rés, ora Recorrentes, no pagamento de uma indemnização ao Autor A no valor de MOP106,821.25 pela Ré B, sendo MOP16,680.00 a título de subsídio de alimentação, MOP11,000.00 a título de subsídio de efectividade, MOP21,887.50 a título de descansos semanais, MOP21,887.50 a título de não gozo dos dias de descanso compensatório, MOP21,243.75 a título de comparticipação no alojamento descontadas, MOP14,162.50 pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho em cada ciclo de 21 dias de trabalho e no valor de MOP136,785.00 pela Ré C, sendo MOP31,360.00 a título de subsídio de alimentação, MOP25,600.00 a título de subsídio de efectividade, MOP49,440.00 a título de comparticipação no alojamento descontadas, MOP30,385.00 pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho em cada ciclo de 21 dias de trabalho, acrescidas de juros moratórios à taxa legal a contar do trânsito em julgado da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório; Mais condenando as Rés, ora Recorrentes, a pagar ao Autor o montante correspondente ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatórios e a 1ª Ré B às bonificações ou remunerações adicionais incluindo gorjetas pagas ao operários residentes, a liquidar em execução de sentença.
2. As ora Recorrentes vêm impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, nomeadamente a matéria fáctica vertida nos pontos G e H da Matéria Assente e ainda nos quesitos 1° a 17° e 19° da Base Instrutória, porquanto da prova produzida em sede de julgamento nunca poderiam os referidos quesitos terem sido provados, porquanto da prova produzida em sede de julgamento nunca poderiam os referidos quesitos terem sido provados, já que a matéria fáctica foi, salvo devido respeito, incorrectamente julgada pelo Douto Tribunal a quo e também no plano do Direito aplicável ao caso concreto, a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento, estando em crer que a decisão assim proferida pelo douto Tribunal de Primeira Instância padece dos vícios de erro de julgamento e erro na aplicação do direito e nulidade por falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do Autor ora, Recorrido.
3. Assim, foi a seguinte a factualidade tida por assente e provada:
Entre 18 de Outubro de 1996 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (B), prestando funções de "guarda de segurança", enquanto trabalhador não residente. (cfr. doc. 2) (A); O Autor foi recrutado pela Sociedade X - Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, aprovado pelo Despacho n.º 687/IMO/SAEF/96, de 25/03/96 (Cfr. doc. 3 e 4). (B); Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da 1.ª Ré (B) para a 2.ª Ré (C), com efeitos a partir de 21/07/2003 (Cfr. Doc. 5). (C); Entre 22/07/2003 e 19/11/2008 o Autor esteve ao serviço da 2.ª Ré (C), prestando funções de "guarda de segurança", enquanto trabalhador não residente. (D); Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pelas Rés. (E); Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de HKD$7,500.00, a título de salário de base mensal (F); Durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (G); Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré (B) num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas par dia: Turno A: (das 08h às 16h), Turno B: (das 16h às 00h), Turno C: (das 00Oh às 08h) (H); Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de "(...) $20,00 patacas diárias por pessoa, a titulo de subsídio de alimentação". (1.°); Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (2.°); Entre 22/07/2003 e 19/11/2008, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (3.°); Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.° 2/96, que "(...) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.ª outorgante (leia-se, a Rés) paga aos operários residentes no Território". (4.°); Entre 18/10/1996 e 21/0712003, a 1ª Ré (B) nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas. (5.°); Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.° 2/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) "(...) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço". (6.°); Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (7.º); Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (8.°); Entre 22/07/2003 e 19/11/2008, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (9.°); Entre 18/10/1996 e 31/12/2002, a 1.ª Ré (B) nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (10.°); A 1.ª Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (11.º); A 1.ª Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (12.°); A 1.ª Ré (B) nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório. (13.°); Entre 18/10/1996 e 21/07/2003 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 1.ª Ré. (14.°); A 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (15.°); Entre 22/07/2003 e 19/11/2008 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 2.ª Ré. (16.°); A 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia adicional (leia-se, qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (17.°); Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD750,00.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de "comparticipação nos custos de alojamento". (18.°); As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (19.°); Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau.
4. Ora, pela sua relevância no presente recurso não pode deixar de se transcrever os fundamentos aduzidos pelo douto Tribunal na resposta à matéria de facto: «Concretamente, atendemos ao depoimento prestado pela testemunha apresentada pelo Autor, com a razão de ciência que melhor resulta da acta da audiência, que revelou conhecimento directo dos factos sobre que depôs, num depoimento que se revelou sóbrio e não comprometido, tendo explicado que não era política da Ré permitir o gozo de descansos semanais (não sendo tal trabalho sido pago além de um dia normal); explicou ainda, a este propósito, que nunca foi dado qualquer dia de descanso compensatório. Explicou ainda a testemunha que não foi pago qualquer subsídio de efectividade ou qualquer compensação pela prestação de trabalho em dias de feriado obrigatório; quanto a estes últimos, a resposta restritiva decorre da circunstância de a testemunha ter explicado que o Autor (à sua semelhança) gozava 24 dias de férias anuais, não tendo, no entanto, conseguido concretizar exactamente o período em que tal sucedia.».
5. Mais ficou estabelecido na sentença recorrida que: «Explicou ainda a testemunha que nunca foram pagas quaisquer quantias a título de subsídio de alimentação, gorjetas ou outras remunerações além do salário. Mais explicou a testemunha que a Ré não forneciam refeições mas tão só um local - que não era assim uma cantina - onde os trabalhadores podiam tomar a refeição que traziam de casa; a este propósito ainda esclareceu que ainda no Nepal foi garantido aos trabalhadores que a alimentação seria fornecida gratuitamente pela entidade patronal. A testemunha inquirida afirmou ainda que, a título de alojamento, era cobrava a quantia mensal de 750 HK, mesmo que os trabalhadores optassem por residir fora das residências fornecidas pelas Rés. Mais relatou ainda a testemunha, de forma detalhada, como se processavam os turnos de trabalho e a sua rotatividade, precisamente nos termos que ficaram provados.
Cumpre ainda referir que nenhuma prova de sentido contrário foi produzida, quer testemunhal, quer documental, que permitisse pôr em causa o depoimento prestado em audiência pela testemunha, nomeadamente, nenhum registo que comprove ter o autor alguma vez faltado ao serviço ou que lhe tivesse sido paga qualquer quantia, e a que titulo, além do que resulta provado (...).».
6. Entendeu o Digno Tribunal a quo em levar para a Especificação a matéria vertida nos quesitos G e H, tacto que as ora Recorrentes reclamaram por entenderem que face à impugnação feita em Contestação e ao facto de não disporem dados para determinarem da efectivação de tais turnos e, atento o estipulado no art.º 13°, nº 2 da Lei 7/2008 das Relações de Trabalho, a Lei apenas obriga o empregador a manter e conservar os registos dos trabalhadores durante a vigência da relação de trabalho e por um período de três anos após a sua cessação.
7. No caso concreto a cessação da relação de trabalho ocorreu há mais de 7 anos e por isso as Rés não mais tinham em seu poder elementos que lhe permitissem confirmar tal facto. Pelo que, desta forma as Recorrentes não concordam e rejeitam também tal decisão a qual também impugnam, considerando que a matéria vertida nos factos G e H deve fazer parte da Base Instrutória e nunca da Matéria Assente, tendo a douta sentença recorrida violado a aplicação da lei e o disposto no art.º 13°, 3 da Lei 7/2008, pelo que deverá a sentença proferida ser revogada e substituída por outra que declare a passagem da matéria vertida nos pontos G e H dos Factos Assentes para a Base Instrutória com as demais consequências legais.
8. Mas caso assim não seja entendido, da prova produzida em sede de julgamento a resposta a todos os quesitos acima descritos, i.e., 1° a 17° e 19° da Base Instrutória e a fundamentação supra transcrita teriam necessariamente de ser diferentes, pelo que estamos perante um claro erro de julgamento e como no presente caso foi deferida a documentação das declarações prestadas na audiência de julgamento, existindo por isso suporte de gravação, o que permitirá ao douto Tribunal de Segunda Instância melhor avaliar, e decidir, sobre o ora invocado erro na apreciação da prova, aqui expressamente se requerendo a reapreciação da matéria de facto, nos termos admitidos no art.º 629° do CPC, aplicável ex-vi art. 1 ° do CPT.
9. As Recorrentes, ao invocarem no presente recurso o erro na apreciação da prova, que, na sua óptica, inquina a decisão proferida pelo douto Tribunal a quo, não pretende apresentar apenas uma simples discordância relativamente à interpretação dos factos feita por aquele douto Tribunal, tendo bem presente o dispositivo do art.º 558° do CPC, e a natureza insindicável da livre convicção relativamente à apreciação da prova efectuada pelo Tribunal recorrido, e estando bem ciente da jurisprudência afirmada nos Tribunais Superiores da RAEM sendo que é entendimento das Recorrentes que tal erro de julgamento se verifica na situação dos autos, e que o vício apontado à decisão recorrida resulta dos próprios elementos constantes dos autos, que por si só são contraditórios, ou do recurso às regras da experiência comum.
10. Nos presentes autos foi ouvida apenas uma única testemunha, X, cujo testemunho se encontra gravado na Passagem gravada em 21.02.2017, CD 1 Tradutor 1 Excerto 1 - 10.00.45 do minuto 09:10 ao minuto 11:31, do minuto 19:44 ao 21:18, do minuto 21:54 ao 28:57; Passagem gravada em 21.02.2017, CD 1 Tradutor 1 Excerto 2 - 10.31.09 do minuto 00:33 ao minuto 05:12.
11. E do mesmo se extrai que o depoimento da única testemunha ouvida em julgamento é genérico sem que tivesse a testemunha conseguido concretizar se em relação ao Autor as coisas se passavam como se haviam passando em relação a si mesma, já que em relação ao Autor a instancias do Meritíssimo Juiz e perguntado à testemunha se alguma vez tinha trabalhado com o Autor declarou que: "Ele, foi, portanto, ele veio a Macau em 96, ele foi, fez parte do primeiro grupo, ele era supervisor, e era o duty supervisor (...) Eu estive cá em 99, quando eu cá vim, o autor já cá estava, já estava a trabalhar naquele casino, não éramos do mesmo grupo, ele era supervisor do grupo B, e eu trabalhava no grupo C (11:10), e tínhamos turnos diferentes, mas no mesmo casino, e em 2003 ou 2004, uma vez que o Infante Marina, portanto, foi aberto, então ele e outros colegas foram transferidos para esse casino (11:31)" (Cfr. Passagem gravada em 21.02.2017, CD 1 Tradutor 1 Excerto 1 - 10.00.45). Ora, face a esta resposta, como pode o Tribunal a quo dar com precisão como provados os factos vertidos nos quesitos que dizem respeito aos pedidos relativos aos descansos semanais, aos feriados obrigatórios, ao subsídio de alimentação e de efectividade, às horas extraordinárias relativamente aos turnos e relativamente ao pagamento de gorjetas?
12. Aquilo que revelou é que pouco sabe sobre o Autor, e aquilo que sabe é relativamente a si próprio pois mais parece um verdadeiro depoimento de parte, sobre si mesmo, não tendo um conhecimento directo sobre o que se passava com o Autor, ora Recorrido, o que revela a parcialidade do seu depoimento, sendo que a aludida testemunha foi Autor numa acção em tudo semelhante àquela em que veio depor, o que tende a revelar a parcialidade do seu depoimento e face às afirmações acima transcritas nunca poderia o Tribunal a quo ter dado como provado que o Autor não recebeu os subsídios a que alega ter direito, ou que nunca faltou sem conhecimento e autorização das Rés, ou que aquele nunca gozou dias de descanso semanal ou feridos obrigatórios ou se, a cada 21 dias, trabalhava 16 horas em cada período de 24!
13. Parece pois insuficiente admitir que a procedência do pedido do Autor seja feita com base num único depoimento genérico e indirecto, isto quando às Rés, ora Recorrentes, se tomou impossível contradizer documentalmente o depoimento da testemunha porquanto a presente demanda só se iniciou volvidos mais de 7 anos sobre o termo da relação laboral, não estando as mesmas portanto obrigadas a manter nos seus arquivos a documentação atinente a todos os seus trabalhadores, pelo que também aqui pecou o Digno Tribunal a quo quando deu como provados tais factos.
14. Quanto às gorjetas também aqui o Tribunal a quo pecou ao dar como provado os quesitos 4º e 5º da Base Instrutória, pois foi a seguinte a pergunta que foi colocada em audiência foi "(...) Olhe, e gorjetas, alguma vez a B entregou gorjetas aos senhores?" (CD 1 tradutor 1, Excerto 1, 10.00.45, minuto 23:24) e a resposta foi que: "Não, nós nunca gozamos, nós nem tínhamos conhecimento." (CD 1 tradutor 1, Excerto 1 minutos 23:38). Vindo o Digno Tribunal a dar como provado que "Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, a 1ª Ré (B) nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas." (5.°), sem que alguma vez em audiência tenha sido questionado à testemunha se os trabalhadores residentes, incluindo guardas de segurança tinham recebido gorjetas, já que aquilo que decorre do contrato de prestação de serviços é que : "(...) este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª Outorgante paga aos operários residentes no Território." (Sublinhado nosso).
15. Ora, se tal facto não foi sequer perguntado à testemunha nem esta sobre o mesmo se pronunciou, e se a eventual atribuição de gorjetas aos guardas Nepaleses dependia da atribuição de gorjetas aos guardas residentes da B como é que o Tribunal teve provas suficientes para apurar se foram pagas gorjetas aos trabalhadores residentes no território para assim dar a matéria vertida no quesito 5° como provada? A verdade, é que não se obteve prova suficiente para dar como provado tal facto e tal quesito, pelo que, e é com todo o respeito que o afirmamos, também aqui falhou o Digno Tribunal a quo, devendo e a resposta ao mesmo quesito ser diversa da que foi dada, devendo tal quesito ser dado como não provado, pelo que após reapreciação da prova efectuada em juízo por parte desse Venerando Tribunal da Segunda Instância deverá ser proferido douto Acórdão que julgue procedente o invocado vício de erro de julgamento ao dar por provados os quesitos 1° a 17° e 19° da Douta Base Instrutória, os quais serão de dar por não provados e ser proferido douto Acórdão que julgue procedente o invocado vício de erro de julgamento ao dar por provados todos os quesitos da Douta Base Instrutória, os quais serão de dar por não provados.
16. Mas ainda que improceda o recurso na parte respeitante à impugnação da decisão que dirimiu a matéria de facto, urge ainda questionar se o Autor teria direito a receber todos os créditos que reclama nos termos em que a sentença ora posta em crise os concedeu e a resposta só pode ser em sentido negativo, isto porque quanto ao subsídio de alimentação e ao subsídio de efectividade o Tribunal a quo condenou as ora Recorrentes a pagarem ao Autor compensações a título de subsídio de alimentação e a título de subsídio de efectividade tendo dado o douto Tribunal a quo como provado os supra transcritos quesitos 1° a 3° e 6° a 9° da Base Instrutória fundamentando a condenação da seguinte forma: «A pretensão do Autor assenta no regime legal de contratação de trabalhadores não residentes regulado no Despacho nº 12/GM/88 de 01 de Fevereiro, cujas condições mínimas de contratação estarão, segundo defende, incorporadas no contrato de prestação de serviços que a Ré celebrou tal como exigido pela alínea c) do nº 9 desse diploma legal e na qualificação jurídica deste contrato como sendo a favor de terceiro.
(...)
Relativamente à questão jurídica fundamental, ao enquadramento da relação estabelecida entre as partes outorgantes dos mencionados contratos de prestação de serviços e à sua repercussão na esfera jurídica do Autor, o Tribunal de Segunda Instância já firmou jurisprudência unânime no sentido de que estamos na presença de um contrato a favor e terceiro que tem como beneficiário o Autor, citando-se como exemplo, o mais recebente Acórdão datado de 25.07.2013, cujo sumário parcial aqui nos permitimos reproduzir:
(…)
Assim sendo, sem necessidade de outras considerações, como parte beneficiária do contrato de prestação de serviços dado como assente, o Autor tem direito a prevalecer-se do clausulado mínimo nele constante.
(...)
Quanto ao subsídio de alimentação resulta provado em 9) que era devido ao Autor o pagamento de 20 patacas diárias a tal título: Resulta ainda provado que entre 09 de Abril de 2001 (...) e 21 de Julho de 2003 a 1ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (cf. Facto 10) pelo que tem o Autor a receber a tal título a quantia de MOP16.680,00 (834 dias x MOP20);
- Resulta ainda provado que entre 22 de Julho de 2003 e 19 de Novembro de 2008 a 2ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (cf. Facto 11) pelo que tem o Autor a receber a tal titulo a quantia de MOP31.360,00 (1568 dias x MOP20).».
17. Fundamentando ainda que "Quanto ao subsídio de efectividade resulta este previsto no Contrato de Prestação de Serviços nº 2/96 (cf. facto 14) e não foi pago pela 1ª Ré ao Autor (cf. facto 16), sendo que 09 de Abril de 2001 (...) e 21 de Julho de 2003 o Autor não deu qualquer falta ao serviço sem conhecimento e autorização prévia da Ré (cf. Facto 15) pelo que lhe é devida a quantia de MOP100x4 dias x 27.5 meses, isto é, MOP11.000,00;
- Resulta ainda provado que não foi pago pela 2ª Ré ao Autor (cf. Facto 17) sendo que entre 22 de Julho de 2003 e 19 de Novembro de 2008 o Autor não deu qualquer falta ao serviço, sem conhecimento e autorização prévia da Ré (cf. facto 15), pelo que lhe é devida a quantia de MOP100 x 4 dias x 64 meses, isto é, MOP25.600,00.»
18. Numa situação como à dos autos em que à data da contratação do Autor estava em vigor o Despacho n.º 12/GM/88, de 1 de Fevereiro - o qual regia a contratação de trabalhadores não residentes - o Venerando Tribunal de Segunda Instância pronunciou-se do seguinte modo: «Tendo sido celebrado um contrato de prestação de serviços entre a Ré e a Sociedade [...] Lda., em que se estipula, entre outros, o mínimo das condições remuneratórias a favor dos trabalhadores que venham a ser recrutados por essa sociedade e afectados ao serviço da Ré, estamos em face de um contrato a favor de terceiro, pois se trata de um contrato em que a Ré (empregadora do Autor e promitente da prestação) garante perante a Sociedade [...] Lda. (promissória) o mínimo das condições remuneratórias a favor dos trabalhadores estranhos ao contrato (beneficiários). ».
19. Retirando-se daqui que o contrato de prestação de serviços funciona como uma garantia do mínimo das condições remuneratórias a cumprir por parte da entidade promitente ou empregadora, sendo portanto de analisar se aquando do início da relação laboral os trabalhadores ficaram individualmente prejudicados face ao resultado que teriam se a entidade empregadora cumprisse apenas com aqueles mínimos das condições remuneratórias mas a verdade é que se as Recorrentes se tivessem limitado a cumprir com os mínimos a que se obrigaram, o Autor teria auferido um salário idêntico ao nível médio dos salários praticados para desempenho equivalente, num mínimo de 100.00 patacas diárias, acrescida de 20,00 patacas diárias por pessoa a título de subsídio de alimentação, ou seja, MOP3,600.00 mensais, ao qual poderia acrescer um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço e caso se considere que o Autor, ora Recorrido auferia HK$7.500,00, ou seja, mais do dobro dos aludidos montantes, ficam assim devidamente cumpridas e verificadas as condições remuneratórias mínimas previstas no contrato de prestação de serviços, donde nunca poderiam proceder os pedidos formulados pelo Autor, ora Recorrido, a titulo de subsídio de alimentação e de efectividade.
20. Mas ainda que assim não se entenda sempre se diga que, o pedido formulado a título de subsídio de alimentação não poderia proceder, isto porque o Tribunal a quo entendeu que o Autor teria direito a receber MOP20 por 834 dias de trabalho que mediaram entre o dia 09 de Abril de 2001 (atenta a prescrição dos créditos reclamados pelo Autor) e 21 de Julho de 2003 e 1568 dias que mediaram entre 22 de Julho de 2003 e 19 de Novembro de 2008, mas a verdade é que não se comprovou que entre 09 de Abril de 2001 e 19 de Novembro de 2008 o Autor tenha trabalhado 2402 dias, mas antes aquilo que se provou foi que durante o período em que o Autor prestou trabalho nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés resultando assim assumido pelo Autor que teve períodos de "dispensa ao trabalho remunerados e/ ou não remunerados e autorizados pela Rés".
21. Perguntando-se então quantos dias o Autor faltou ao trabalho com conhecimento e autorização da Rés? É que a parca matéria fáctica alegada pelo Autor não pode conduzir, sem mais, à procedência do pedido. Isto porque resultou apurado que o Autor teve férias, que deu faltas ao serviço e que pediu dias de dispensa com autorização das Rés mas não se comprova, nem tão pouco foi alegado, quais são esses dias e se não foram alegados esses dias, e sendo os subsídios de alimentação e de efectividade atribuídos em função da efectiva prestação de trabalho, como poderá o Tribunal determinar quais os dias em que o Autor trabalhou e quais efectivamente os dias em que o Autor tem direito a tais subsídios? Parece-nos pois que não estaria o Tribunal a quo em condições de determinar quais os dias relativos aos quais o Autor tem direito ao subsídio de alimentação pois conforme tem vindo a ser entendimento unânime da doutrina e jurisprudência, este subsidio trata-se de um acréscimo salarial que pressupõe necessariamente a prestação efectiva de trabalho por parte do seu beneficiário tendo tal argumento vindo a ser defendido por esse Venerando Tribunal em diversos arestos dos quais se destaca o proferido em 13.04.2014 no processo 414/2012.
22. Ora de acordo com esta decisão para que houvesse condenação das Rés, ora Recorrentes, no pagamento desta compensação, deveria o Autor ter alegado e provado quantos foram os dias de trabalho efectivamente por si prestados, o que não sucedeu estando, aliás, a decisão em contradição com a factualidade provada (Cfr. resposta aos quesitos 1°, 2°, 3°, 6°, 7°, 8° e 9°, pelo que, salvo devido respeito por melhor opinião, não tendo sido alegados nem provados os factos essenciais de que depende a atribuição do mencionado subsídio de alimentação, ou seja, a prestação efectiva de trabalho, não poderia o douto Tribunal ter condenado as Recorrentes nos termos em o que fez, padecendo assim a douta sentença nesta parte do vício de erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito, devendo consequentemente ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do pagamento de compensação a título de subsidio de alimentação.
23. Quanto ao subsídio de efectividade veio a apurar-se que o mesmo fazia parte do contrato de prestação de serviços 2/96 e ainda que o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés, sucede que por definição e conforme resulta do aludido contrato de prestação de serviços, o subsídio de efectividade visa premiar a efectiva prestação do trabalho e o Contrato de Prestação de Serviços é claro ao prever que o subsidio de efectividade pressupunha que "[…] no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço." (Sombreado nosso), sendo irrelevante que o trabalhador tenha faltado por motivo justificado ou mesmo sob autorização prévia, sendo que nos presentes autos não foi feita qualquer prova relativamente à assiduidade do Autor, não se tendo apurado quantos dias de trabalho efectivo e\e prestou e nem quantas vezes faltou ao serviço, antes pelo contrário, resulta dos autos e da matéria de facto provada que o Autor deu faltas ao serviço, ainda que com conhecimento e autorização prévia por parte das Rés, não tendo porém sido tais faltas quantificadas, nem se determinando quando foram dadas e neste pressuposto se questiona como foi possível ao Tribunal a quo fixar os dias que fixou para cálculo das compensações se não sabe quantos foram os dias de faltas justificadas? E mais uma vez deixou a decisão recorrida escapar que o próprio Autor alega não ter trabalhado todos os dias.
24. Ou seja, é insuficiente a matéria de facto apurada nos presentes autos que permita ao Tribunal a quo sustentara condenação das Recorrentes a pagar ao Recorrido qualquer montante a título de subsídio de efectividade, devendo assim ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene as Recorrentes a pagarem ao Recorrido a compensação a título de subsídio de efectividade e de subsídio de alimentação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no nº 2 do artigo 564° do CPC.
25. Quanto à compensação do trabalho prestado em dia de descanso semanal e feriados obrigatórios com relevo para a apreciação de tais pedidos deu o Tribunal a quo por provado o constante nos quesitos 10° a 17° da Base Instrutória e, tendo resultado que o recorrido teve faltas ainda que justificadas, como pode o Tribunal entender decidir o número de dias devidos e não gozados pelo Recorridos a que se faz alusão a fls. 210 a 211 da sentença? Isto porque estando provadas as dispensas ao trabalho ainda que remuneradas e, tendo sido dito pela testemunha que o Autor gozava 24 dias de férias anuais, tal como referido pelo Meritíssimo Juiz a quo no relatório da resposta à matéria de facto, sem que a testemunha conseguisse determinar em que dias o Autor gozou tais dias de férias anuais, nunca poderia o Tribunal ter condenado a Recorrente B ao pagamento da quantia de MOP21.887,50 + MOP21.887,50 (descansos compensatórios) sem que se provasse o número de dias concretos que o Autor deixou de gozar o seu descanso semanal.
26. Verificou-se assim uma errada aplicação do Direito e erro no julgamento da matéria de facto por parte do Tribunal a quo na condenação da recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e em quantia indefinida quanto aos feriados obrigatórios, já que o mesmo raciocínio se aplica a este pedido de crédito, em violação do princípio do dispositivo consagrado no art. 5° do CPC e bem assim o disposto nos artigos 17° e 19° do DL 24/89/M devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene as Recorrentes a pagar ao Recorrido a compensação a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal que se venha a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no nº 2 do artigo 564° do CPC.
27. No que diz respeito à reclamação das compensações reclamadas pela prestação de trabalho em regime de turno e trabalho extraordinário à semelhança do ocorrido com o subsídio de alimentação o Recorrido limitou-se a invocar factos genéricos, não alegando especificadamente quais os factos que permitam concluir que tenha direito a pedir qualquer tipo de compensação a esse titulo, nem a própria testemunha, sendo o testemunho genérico e indirecto sem conhecimento real e concreto da situação do recorrido, tornando-se impossível apurar quais as horas que o Recorrido teria trabalhado a mais ou a menos, dada a falta de alegação do Autor, ora Recorrido, e da falta de prova em julgamento, pois nem o Recorrido nem a testemunha especifica datas, dias de trabalho efectivamente prestado, quando é que tais turnos coincidiam e quais os dias. E tendo ficado provado que o Recorrido dava faltas ao serviço (ainda que justificadas) ou pedia dispensas, como pode o Tribunal determinar com certeza quais os dias em que o Autor estava de turno? Ou ainda se eram ou não despendidas horas extraordinárias?
28. Na verdade, não é possível ao Tribunal determinar quais as horas extraordinárias que o trabalhador efectuava em cada dia, em cada semana, mês e ano. Motivo pelo qual também aqui o Tribunal andou mal ao condenar as Recorrentes, em violação do art. 5° do CPC e do art. 10° do DL 24/89/M. E não se sabendo quando, em cada ano, o Autor, ora Recorrido faltou ao serviço e gozou as férias anuais, porque a testemunha não logrou concretizar em audiência, pergunta-se mais uma vez como pode o Tribunal a quo estabelecer com toda a certeza os dias para cômputo das compensações relativas aos descansos semanais, subsídio de efectividade, subsídio de alimentação e trabalho extraordinário nos turnos? Face a esta falta de previsão por parte do Digno Tribunal no apuramento das compensações a atribuir ao Recorrido entendem as Recorrentes, sempre com todo o respeito, que padece a douta decisão dos vícios de erro de julgamento da matéria de facto e erro na aplicação do direito. Devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado ou, caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condenem as Recorrentes a pagar ao Recorrido a compensação a título de trabalho extraordinário que se venha a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no nº 2 do art.º 564º do CPC.
29. Entendeu o Tribunal a quo que resulta do Contrato de Prestação de Serviços 2/96 que teria o Autor direito a perceber as bonificações ou remunerações adicionais incluindo gorjetas pagas aos operários residentes a liquidar em execução de sentença. Com interesse para apreciação desta questão, pode ler-se na decisão recorrida que, "Resulta do ponto 3.3 do Contrato de Prestação de Serviços nº 2/96 que "(...) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor) este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª Outorgante (leia-se a Rés) paga aos operários residentes no Território" (sublinhado e destacado nossos).
30. Com o devido respeito entende a Recorrente B que o Tribunal a quo interpretou mal a aludida cláusula no que ao pagamento das gorjetas diz respeito. Resulta claramente da supra transcrita cláusula que os trabalhadores não residentes teriam direito às bonificações ou remunerações adicionais PAGAS pela Recorrente aos operários residentes. As gratificações pagas pela entidade patronal, têm carácter de recompensa, visando premiar e incentivar o trabalhador face ao seu bom desempenho. No caso ficou por comprovar e até mesmo por alegar quais foram as bonificações ou remunerações adicionais que a Recorrente B pagou aos trabalhadores residentes. Sendo certo que nessas bonificações ou remunerações adicionais não será de incluir as gorjetas porque não são as mesmas pagas pela aqui 1ª Ré, ora Recorrente, mas sim pelos seus Clientes. Não tinha a Recorrente B nenhum dever de pagar ao Autor nenhuma gorjeta, tal como não existia esse dever para com nenhum dos seus trabalhadores residentes.
31. Ao contrário do que o Autor pretendeu transparecer e veio a ser erradamente admitido pelo Tribunal, as gorjetas não correspondem a uma prestação do empregador mas sim de um terceiro e como tal não estão abrangidas pela sobredita cláusula. Como aliás decorre da nova lei das relações de trabalho (Lei 7/2008) que enquadra as gorjetas no conceito de "remuneração variável" (cfr. art.º 2º alínea 5) e não como remuneração de base o que reforça o argumento que a sua distribuição não constitui uma verdadeira obrigação para a entidade patronal e por isso nunca poderia o Tribunal ter condenado a Recorrente B ao pagamento das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas, por falta de preenchimento do requisito para tal, pelo que não poderá a Recorrente B senão ser absolvida do sobredito pedido devendo então a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado.
32. Face a todo o acima exposto se concluiu também que a decisão em crise padece do vício de falta de fundamentação isto porque a decisão em crise mantém na íntegra as conclusões incoerentes feitas na petição inicial, mantendo por responder a questões/vícios que a seguir se enumeram: (i) ter o Autor trabalhado todos os dias da semana, embora reconheça ter faltado algumas vezes ainda que tenham sido faltas justificadas; a que dias se refere o Tribunal quando faz os cálculos da indemnização? (ii) Quantos foram esses dias de faltas justificadas e quando foram gozados os 24 dias de férias anuais? (iii) Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o autor concede na nota 3 ao art.º 38° e a "média de 76 dias "por cada ano civil de dias de faltas autorizadas ao Autor, tal como o Recorrido concede na nota 5 do artigo 42º da petição inicial? (vi) Mas que factos suportam esta conclusão? Questionando-se, face estes pressupostos, como foi possível ao Tribunal fixar os dias que fixou para cálculo das compensações a que condenou as rés a pagar ao Autor se não se sabe quantos foram os dias de faltas justificadas do Recorrido.
33. Com todo o devido respeito, as incoerências e violação do ónus de alegação por parte do Recorrido só poderia, em nossa modesta opinião, ser resolvida pelo Tribunal de Primeira Instância de uma de duas formas: ou dava a oportunidade ao Autor para aperfeiçoar a petição inicial, apresentando nova peça consistente e coerente que permitisse uma decisão clara e esclarecida; ou dava por provado apenas e tão só os factos que se encontram efectivamente provados e suficientemente alegados, os que, in casu, não são praticamente nenhuns, sendo que o que o Tribunal a quo não podia ter feito o que fez, ou seja, factualizar as conclusões do Autor não suportadas em factos nem por prova bastante em audiência e sustentar os factos incoerentes e contraditórios que se mantêm na íntegra pelo que esta decisão, por essa razão, padece também de vício de falta de fundamentação decorrente da violação do ónus de alegação por parte do Recorrido, sendo, por isso, nula.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
1. Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (B), prestando funções de "guarda de segurança", enquanto trabalhador não residente (cfr. doe. 2). (A)
2. O Autor foi recrutado pela Sociedade X - Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n. o 2/96, aprovado pelo Despacho n.º 687/IMO/SAEF/96, de 25/03/96 (Cfr. doc. 3 e 4). (B)
3. 3) Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da l.ª Ré (B) para a 2.ª Ré (C), com efeitos a partir de 21/07/2003 (Cfr. Doc. 5). (C)
4. Entre 22/07/2003 a 19/11/2008, o Autor esteve ao serviço da 2.ª Ré (C), prestando funções de "guarda de segurança", enquanto trabalhador não residente. (D)
5. Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pelas Rés. (E)
6. Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de HKD$7,500.00, a título de salário de base mensal. (F)
7. Durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (G)
8. Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré (B) num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia:
Turno A: (das 08h às 16h)
Turno B: (das 16h às 00h) Turno C: (das 00h às 08h) (H)
9. Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n." 2/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de "(...) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação". (1.º)
10. Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (2.°)
11. Entre 22/07/2003 e 19/11/2008, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (3.°)
12. Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, que "(...) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, a Rés) paga aos operários residentes no Território". (4.°)
13. Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas. (5.°)
14. Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) "(...) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço". (6.°)
15. Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (7.°)
16. Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (8.°)
17. Entre 22/07/2003 e 19/11/2008, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (9.°)
18. Entre 18/10/1996 e 31/12/2002, a 1.ª Ré (B) nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (10.°)
19. A 1.ª Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (11.°)
20. A 1.ª Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (12.°)
21. A 1.ª Ré (B) nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório. (13.°)
22. Entre 18/10/1996 e 21/07/2003 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 1.ª Ré. (14.°)
23. A 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (15.°)
24. Entre 22/07/2003 e 19/11/2008 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 2.ª Ré. (16.°)
25. A 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia adicional (leia-se, qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (17.°)
26. Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD750,00.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de "comparticipação nos custos de alojamento". (18.°)
27. As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (19.°)
28. Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A. Do recurso interlocutório:
Estabelece o artº 583º/1 do CPC que “salvo disposição em contrário, o recurso ordinário só é admissível nas causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre, desde que a decisão impugnada seja desfavorável à pretensão do recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal; em caso, porém, de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, atende-se somente ao valor da causa”.
Por outro lado, nos termos do disposto no artº 18º do LBOJM, em matéria cível e laboral, a alçada dos Tribunais de Primeira Instância é de MOP$50.000,00.
No caso em apreço, a decisão recorrida lhes não é desfavorável em valor superior à metade da alçada dos tribunais de primeira instância, pelo que não é de admitir o recurso interlocutório.
Custas pelas Rés com 2UC de taxa de justiça.
B. Do recurso final das Rés:
1. Da impugnação da decisão da matéria de facto:
1.1. Da matéria assente
Entendem as Rés que o Tribunal a quo não deveria ter dado como assente a matéria de facto constante das alíneas G) e H) dos Factos Assentes, visto que o desconhecimento que alegaram relativamente a essa matéria não pode ser tido por confissão, uma vez que não são obrigadas a conservarem os documentos alusivos ao Autor e à vida da sociedade.
Não lhes assiste razão, já que aquela matéria diz directamente respeito à relação jurídica estabelecida entre elas e o Autor. Portanto, sendo facto que também lhes é pessoal e de que não podem deixar de ter conhecimento, o simples modo de impugnar dizendo desconhecer genericamente tal factualidade equivale a confissão da mesma – cfr. artº 410°, nº 3, do CPC.
Nesta conformidade, o recurso não deixará de se julgar improvido nesta parte.
1.2. Da matéria julgado provado
Para as Rés, face à prova existente nos autos, o Tribunal a quo “nunca poderia ter dado por provados os quesitos 1º a 17º e 19º da base instrutória, os quais terão necessariamente de ser tidos por não provados”.
Não têm razão.
Como é sabido, segundo o princípio da livre apreciação das provas previsto n° 1 do artigo 558.° do CPC, “O tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”.
A justificar tal princípio e aquilo que permite a existência do mesmo, temos que o Tribunal a quo beneficia não só do seu prudente juízo e experiência, como da mais-valia de um contacto directo com a prova, nomeadamente, a prova testemunhal, o qual se traduz no princípio da imediação e da oralidade.
Sobre o princípio da imediação ensina o Ilustre Professor Anselmo de Castro (in Direito Processual Civil, I, 175), que “é consequencial dos princípios da verdade material e da livre apreciação da prova, na medida em que uma e outra necessariamente requerem a imediação, ou seja, o contacto directo do tribunal com os intervenientes no processo, a fim de assegurar ao julgador de modo mais perfeito o juízo sobre a veracidade ou falsidade de uma alegação”.
Já Eurico Lopes Cardoso escreve que “os depoimentos não são só palavras, nem o seu valor pode ser medido apenas pelo tom em que foram proferidas. Todos sabemos que a palavra é só um meio de exprimir o pensamento e que, por vezes, é um meio de ocultar. A mímica e todo o aspecto exterior do depoente influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe.” (in BMJ n.º 80, a fls. 220 e 221)
Por sua vez Alberto dos Reis dizia, que “Prova livre quer dizer prova apreciada pelo julgador seguindo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei. Daí até à afirmação de que o juiz pode decidir como lhe apetecer, passando arbitrariamente por cima das provas produzidas, vai uma distância infinita. (...) A interpretação correcta do texto é, portanto, esta: para resolver a questão posta em cada questão, para proferir decisão sobre cada facto, o tribunal aprecia livremente as provas produzidas, forma sua convicção como resultado de tal apreciação e exprime-a na resposta. Em face deste entendimento, é evidente que, se nenhuma prova se produziu sobre determinado facto, cumpre ao tribunal responder que não está provado, pouco importando que esse facto seja essencial para a procedência da acção” (in Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora IV, pago 570-571.)
É assim que “(...) nem mesmo as amarras processuais concernentes à prova são constritoras de um campo de acção que é característico de todo o acto de julgar o comportamento alheio: a livre convicção. A convicção do julgador é o farol de uma luz que vem de dentro, do íntimo do homem que aprecia as acções e omissões do outro. Nesse sentido, princípios como os da imediação, da aquisição processual (art. 436º do CPC), do ónus da prova (art. 335º do CC), da dúvida sobre a realidade de um facto (art. 437º do CPC), da plenitude da assistência dos juízes (art. 557º do CPC), da livre apreciação das provas (art. 558º do CPC), conferem lógica e legitimação à convicção. Isto é, se a prova só é "livre" até certo ponto, a partir do momento em que o julgador respeita esse espaço de liberdade sem ultrapassar os limites processuais imanentes, a sindicância ao seu trabalho no tocante à matéria de facto só nos casos restritos no âmbito do arts. 599º e 629º do CPC pode ser levada a cabo. Só assim se compreende a tarefa do julgador, que, se não pode soltar os demónios da prova livre na acepção estudada, também não pode hipotecar o santuário da sua consciência perante os dados que desfilam à sua frente. Trata-se de fazer um tratamento de dados segundo a sua experiência, o seu sentido de justiça, a sua sensatez, a sua ideia de lógica, etc. É por isso que dois cidadãos que vestem a beca, necessariamente diferentes no seu percurso de vida, perante o mesmo quadro de facto, podem alcançar diferentes convicções acerca do modo como se passaram as coisas. Não há muito afazer quanto a isso.” (Ac. do TSI de 20/09/2012, proferido no Processo n° 551/2012)
Deste modo, “A reapreciação da matéria de facto por parte desta Relação tem um campo muito restrito, limitado, tão só, aos casos em que ocorre flagrantemente uma desconformidade entre a prova produzida e a decisão tomada, nomeadamente quando não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação” (Ac. do STJ de 21/01/2003, in www.dgsi.pt)
Com efeito, “não se trata de um segundo julgamento até porque as circunstâncias não são as mesmas, nas respectivas instâncias, não bastando que não se concorde com a decisão dada, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de erro na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efectivamente, no caso, foram produzidos.(...).” (Ac. do RL de 10/08/2009, in www.dgsi.pt.)
Ou seja,
Uma coisa é não agradar às Rés o resultado da avaliação que se faz da prova, o que parece ser o caso, e outra bem diferente é detectarem-se no processo de formação da convicção do julgador erros claros de julgamento, incluindo eventuais violações de regras e princípios de direito probatório.
Ora,
Em face da prova efectivamente produzida e atentas as regras e entendimento acima enunciados, não assiste razão às Rés ao colocar em causa a apreciação e julgamento da matéria de facto realizada pelo Tribunal a quo.
Improcede portanto o recurso nesta parte.
2. Da nulidade da sentença por falta de fundamentação:
Entendem as Rés que a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação uma vez que não contém todos os factos necessários para a sua condenação dos créditos reclamados a título dos subsídios de alimentação e de efectividade, da compensação da prestação das horas extraordinárias, dos dias de descanso semanal, incluindo os respectivos dias de descano compensatório, e dos feriados obrigatórios não gozados, especialmente não tendo alegado e provado o nº de dias de trabalho efectivo e o nº de dias do descanso semanal e dos feriados obrigatórios não gozados.
Sobre a questão suscitada, a jurisprudência (Ac. de 29/06/2017, Proc. nº 326/2017) recente deste TSI é no sentido seguinte:
“…Invoca-se uma insuficiente fundamentação e afigura-se-nos que a Ré, ora recorrente, tem razão, na medida em que o Mmo Juiz se terá baseado num cômputo de dias que vêm alegados pelo A., não se alcançando em que bases se louvou para o seu cálculo.
A recorrente coloca bem a questão, ao imputar o vício à sentença proferida - independentemente do enquadramento jurídico efectuado – nos seguintes termos:
“(…) a decisão em crise padece do vício de falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do Recorrido já que mantém na íntegra as conclusões incoerentes feitas na petição inicial, mantendo por responder a questões/vícios tais como: (i) ter o Autor trabalhado todos os dias da semana, embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da 1ª Ré; (ii) Quantos foram esses dias de faltas justificadas e quando foram gozados os 24 dias de férias anuais? (iii) Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o autor concede na nota 1 ao art. 22° da petição inicial? Que factos suportam esta conclusão?”
De certa forma pode-se dizer que o Mmo Juiz terá efectuado o seu cálculo com base na alegação do A. que ressalva na nota ao art. 27º da p.i. de que o A. não trabalhou 30 dias por cada ano civil, após o desconto do tempo relativo à prescrição. Mas se se se baseia nesse pressuposto de facto, logo a douta sentença peca por não se saber em que bases assentou essa fixação da matéria de facto – presumida apenas a partir da fundamentação de direito na sentença proferida, já que essa factualidade não está concretizada no capítulo em que se dá por assente a matéria de facto -, sendo certo que se trata de matéria que foi impugnada pelo A. e é certo que o A. não trabalhou durante todo o período em que esteve ao serviço do A., de forma ininterrupta, pois foi autorizado a ausentar-se. Dir-se-á que que o período de ausência era de 30 dias por ano. Mas onde está a comprovação de que assim era e que assim era de facto? O A. alegou e formulou o pedido nessa base, mas comprovou-o?
Estamos em crer que essa incompleição não pode deixar de ser suprida, havendo que aditar, se necessário, o ou os quesitos necessários referentes à concretização dos dias de trabalho efectivo prestado e desconto dos 30 dias em cada ano, tal como alegado na nota ao artigo 27º da p.i.
Embora se acolha a linha jurisprudencial mais permissiva, no sentido de que sempre que o tribunal verificar o dano ou a prestação devida, mas não tiver elementos para fixar o seu valor, quer se tenha pedido um montante determinado ou formulado um pedido genérico, lhe cumpre relegar a fixação do montante indemnizatório para liquidação em execução de sentença, ao abrigo do disposto no art. 564º/2 do CPC1 - mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade ao autor que tenha deduzido pedido líquido de provar o quantitativo devido, não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal, na medida em que a existência de danos já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor e só no caso de se não ter provado a existência de prestação devida é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto no posterior incidente de liquidação, estando subjacente a esta jurisprudência a ideia de que razões de justiça e de equidade impedem que se absolva a demandada uma vez demonstrada a sua obrigação -, a situação presente não consentirá essa via, na exacta medida em que houve já uma liquidação e o apuramento de uma base de cálculo, não se tendo o Mmo Juiz limitado a uma enunciação genérica de trabalho prestado não apurado.
Ainda que que não se enjeite essa possibilidade, numa recondução a um completamento de matéria de facto, estamos em crer que a presente solução aponta para uma necessidade de exigência e de rigor, desde logo, para as próprias partes - muitas nem sequer aqui permanecendo, porventura desinteressando-se dos seus direitos aquando da cessação dos contratos, visto até o tempo entretanto decorrido -, não podendo elas facilitar na concretização e prova das prestações que dizem estar em dívida. Quanto se diz não retira de forma nenhuma o reconhecimento à tutela dos direitos dos trabalhadores que tenham sido violados, apenas se pretendendo a sua cooperação e responsabilização na realização da Justiça.
Perante esta insuficiência, perante esta incompreensão sobre a forma como se atingiu aquele facto com que se jogou no cálculo efectuado, mais do que a falta a que alude o art. 571º, b) do CPC estaremos perante a situação prevista no art. 629º, n.º 4 do mesmo Código, o que implica a anulação da decisão proferida na parte relativa à concretização de quais e quantos os dias considerados no cálculo efectuado pelo Mmo Juiz, tendo em conta a necessidade de saber os dias concretos de trabalho e ausência para se poderem determinar as diferentes compensações. Ou seja, por exemplo, para efeitos de compensação de feriados obrigatórios, como está bem de ver, só há compensação se houve trabalho nesses dias. Mas independentemente dessa necessidade concretização, contemplada aliás, na decisão proferida, há uma outra quantificação que se tem de provar.
Compreende-se que possa não ser fácil, mas aí o A. tem o ónus de provar, não se podendo remeter para uma alegação conclusiva de que trabalhou todos os dias menos 30 por ano. Tem de provar que assim foi e esmerar-se na prova que produz. Admite-se que essa alegação seja pobre, mas não se deixa de considerar que ela ainda consubstancia um facto que se mostra essencial e como tal tem de ser comprovado, na certeza de que o tribunal não pode suprir de todo a insuficiência de alegação das partes.
Daqui decorre que, em todos os momentos em que ao longo da fundamentação expendida fazíamos alusão à necessidade de apurar o número de dias, se conclui que esse apuramento deve ser efectuado em sede de repetição do julgamento na parte pertinente e já não em sede de liquidação em execução de sentença, na medida em que se fica por perceber como se encontrou o número de dias de base do cálculo, descontados os dias de ausência, matéria que não foi levada à base instrutória, mas, ainda que incipientemente, foi alegada.”
Somos a reiterar o que já anteriormente decidimos sobre esta matéria.
3. Do subsídio de alimentação:
Sobre esta matéria, este TSI, no âmbito do Proc. nº 709/2017, já se pronunciou pela forma seguinte:
“O contrato de prestação de serviços com a empresa de importação de mão-de-obra vai balizar os montantes dos subsídios que devem ser pagos pelos empregadores e esse valor não tem que ser imputado à conta dos valores auferidos globalmente.
Os montantes valerão para cada um dos subsídios em si e não é porque o empregador paga mais a outros títulos que se justifica que deixe de satisfazer os valores individualizados e concretamente considerados”.
Quanto ao seu quantum, também já decidimos nos processos congéneres que este subsídio depende da prestação efectiva de trabalho, tendo em vista a sua natureza e os fins a que se propõe (ex.: Ac. de 14/06/2012, Proc. nº 376/2012).
Assim, no caso em apreço, importa proceder ao apuramento do número exacto de dias efectivamente prestado em conformidade com o decidido no ponto nº 2.
4. Do subsídio de efectividade:
No que respeita ao pedido do pagamento do subsídio de efectividade, prevê a cláusula 3.4 do Contrato de Prestação em referência que o trabalhador tem direito a um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço.
Ora, é já jurisprudência assente ao nível deste TSI de que a sua atribuição não está excluída numa situação de não assiduidade justificada ao trabalho.
Pois, “se o patrão autoriza uma falta seria forçado retirar ao trabalhador uma componente retributiva da sua prestação laboral, não devendo o trabalhador ser penalizado por uma falta em que obteve anuência para tal e pela qual o patrão também assumiu a sua responsabilidade.” (cfr. Ac. do TSI, de 25/07/2013, Proc. nº 322/2013).
Face ao expendido e tendo sido dado como provado que o Autor nunca, sem conhecimento e autorização prévia das Rés, deu qualquer falta ao trabalho, o recurso não deixa de se julgar não provido nesta parte.
5. Da compensação de descanso semanal e do dia compensatório:
Quanto à fórmula de compensação do descanso semanal, considerando que se trata de matéria mais do que analisada e decidida por este TSI2, vamo-nos remeter para a Jurisprudência quase uniforme deste Tribunal no sentido de que o trabalhador tem o direito de receber, por cada dia de descanso semanal não gozado, o dobro da remuneração correspondente, para além do salário-base já recebido, ou seja, o quantum compensatório é calculado pela fórmula seguinte: Nºs de dias não gozados X salário diário X 2.
Em relação aos feriados obrigatórios, a fórmula é a seguinte: Nºs de dias não gozados X salário diário X 3, para além do salário-base já recebido.
Para o dia de descanso compensatório, a fórmula é: Nºs de dias não gozados X salário diário X 1.
Porém, como já referimos anteriormente, há-de proceder ao apuramento do número exacto de dias efectivamente prestado em conformidade com o decidido no ponto nº 2 para determinar o quantum compensatório.
6. Dos turnos e horas extraordinárias:
Quanto à compensação da prestação das horas extraordinárias, o nº 1 do artº 10º do DL nº 24/89/M prevê que “Nenhum trabalhador deve normalmente prestar mais do que oito horas de trabalho por dia e quarenta e oito por semana, devendo o período normal de trabalho ser interrompido por um intervalo de duração não inferior a trinta minutos, de modo a que os trabalhadores não prestem mais de cinco horas de trabalho consecutivo”.
Ficou provado que o Autor prestou 16 horas de trabalho para além do seu período normal de trabalho (de 8 horas por dia e 48h por semana), em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo.
Assim, o Autor tem o direito de ser compensado pela prestação de trabalho nestas horas extraordinárias.
No entanto, a quantificação do montante dependerá do concreto apuramento do número de dias de trabalho efectivo em conformidade com o decidido no ponto nº 2.
7. Da bonificação extra e gorjetas:
No caso em apreço, o Autor formulou o pedido no sentido de que a 1ª Ré fosse condenada a pagar-lhe “o montante correspondente às bonificações ou remunerações adicionais incluindo gorjetas que a Ré pagou aos operários residentes, a determinar nos termos do artigo 392º, nº 1, alínea c) ou alínea b) a liquidar em execução da sentença, por força do disposto no artigo 564º, nº 2 do Código de Processo Civil, ex vi artº 1º do CPT”.
Estamos perante um pedido genérico cuja admissibilidade depende da verificação duma das condições previstas no artº 392º do CPC, a saber:
1. É permitido formular pedidos genéricos:
a) Quando o objecto mediato da acção seja uma universalidade;
b) Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 563.º do Código Civil;
c) Quando a fixação do quantitativo esteja dependente de prestação de contas ou de outro acto que deva ser praticado pelo réu.
2. Nos casos das alíneas a) e b) do número anterior o pedido pode concretizar-se em prestação determinada por meio do incidente de liquidação, quando para o efeito não caiba o processo de inventário; não sendo liquidado na acção declarativa, observa-se o disposto no n.º 2 do artigo 564.º
Já no âmbito do processo congénere nº 326/2017, este TSI, por acórdão de 29/06/2017, decidiu a sua inadmissibilidade nos seguintes termos:
“…Da matéria provada não resulta quais sejam as bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª ré tenha pago aos seus trabalhadores residentes, embora se tenha provado que a ré vinha pagando bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas.
Não só não resulta da matéria provada a sua definição material e quantificação, como nem sequer tal matéria vem alegada.
Estamos em crer que mais do que uma dificuldade no cômputo daquilo que é devido, o que poderia passar por uma operação de liquidação em execução de sentença, como determinou o Mmo Juiz, na essência, estará mesmo em causa a especificação de um pedido que nem sequer está definido na sua génese.
Será aceitável a parte pedir que o tribunal condene o patrão a pagar os suplementos que paga aos outros trabalhadores residentes, sem dizer em que é que esse pedido se traduz e se concretiza? Sem dizer a que suplementos se refere, qual a categoria dos beneficiados, a analogia de funções e qual o serviço dos beneficiários desses suplementos, partindo do facto comprovado de que a Ré pagou? Aceitar-se-ia que a parte trabalhadora pedisse ao tribunal que condenasse a pagar-lhe os salários em dívida pelo período por que perdurou a relação laboral sem os especificar?
A factualidade em que vai radicar o pedido mostra-se crucial.
Como salienta Alberto dos Reis, “… não pode ligar-se maior importância à formulação do pedido, do que à exposição dos fundamentos de facto. Que a menção das razões de direito ocupe lugar secundário, já o assinalámos; mas que a narração dos fundamentos de facto possa relegar-se para plano inferior ao da enunciação do pedido é proposição que temos por inexacta. O êxito da acção tanto depende da correcção do pedido, como da pertinência e suficiência dos fundamentos de facto; o advogado não tem que pôr maior cuidado na formulação do pedido, do que na apresentação do aspecto de facto da acção.”3
A insuficiência que se assinala, neste caso, perpassa até pelos dois vectores: narração e pedido. Não dizendo quais esses suplementos remuneratórios ou abonatórios, os termos e qualidade dos destinatários das bonificações ou remunerações adicionais que pagou a todos os trabalhadores residentes (art. 13 dos factos), está bem de ver que o pedido formulado fica necessariamente inquinado.
A questão que se equaciona estará essencialmente dependente da admissibilidade da formulação de pedidos genéricos, enquadrada no art. 392º do CPC.
Não se estando perante um caso de universalidade (al. a) do n.º1); não se estando perante um caso de impossibilidade de determinação, de modo definitivo, das consequências do facto ilícito, nem se configurando uma situação prevista no art. 563º do CC (al. b) do n.º1); nem estando a fixação do quantitativo dependente da prestação de contas ou de outro acto que deva ser praticado pelo réu – pelo menos nada se requer nesse sentido – (al. c) do n.º 1) parece não ser aceitável o pedido nos termos em que o foi na acção.
Nesta conformidade, por falta de pedido certo e concreto, ao abrigo do disposto nos artigos 139º, n.º 1 e n.º 2, al. a) e 230º, n.º 1, al. b) do CPC, absolver-se-á a Ré da instância, por se tratar de um pressuposto processual inominado,4 o que impede a apreciação de mérito, não se sufragando aqui o entendimento que configura o caso como de improcedência do pedido.5
Esta insuficiência da petição mereceria, desde logo, um convite ao aperfeiçoamento, em tempo oportuno, a fim de evitar um desfecho do teor acima contemplado.6”
É de manter a posição já assumida, pelo que o recurso não deixará de se julgar provido nesta parte.
C. Do recurso final do Autor:
O recurso não deixará de se julgar provido face à jurisprudência unânime deste TSI já citada anteriormente.
Assim, a fórmula para a compensação do descanso semanal é: dias não gozados X salário diário X 2, para além do salário-base já recebido.
Em relação aos feriados obrigatórios, a fórmula é a seguinte: Nºs de dias não gozados X salário diário X 3, para além do salário-base já recebido.
Porém, pelas razões já acima expendidas e na falta de determinação dos dias de serviço efectivo – tendo em vista as ausências autorizadas, para além das férias gozadas -, somos a considerar que importa apurar os dias de trabalho efectivo para determinar o quantum compensatório.
*
Tudo visto, resta decidir.
*
IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em:
1. não admitir o recurso interlocutório interposto pelas Rés.
2. conceder parcial provimento ao recurso final interposto pelas Rés, decidindo-se:
a) anular parcialmente o julgamento de facto de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios;
b) julgar procedente o recurso, revogando-se o decidido quanto ao pedido relativo a bonificações adicionais, incluindo gorjetas e, em consequência, absolver as Rés da instância nessa parte;
c) julgar não provido o recurso na parte restante, em consequência do que se mantém a sentença recorrida, nomeadamente na parte concernente à liquidação a que já procedeu quanto ao subsídio de efectividade e à comparticipação no alojamento.
3. conceder provimento ao recurso final do Autor e, em consequência, revogar a sentença na parte respectiva e condenar as Rés ao acatamento das fórmulas acima referidas, no tocante aos dias de trabalho prestado em dias de descanso semanal e aos feriados obrigatórios, quantum, em conformidade com o que vier a ser decidido após a repetição parcial do julgamento, nos termos acima definidos.
*
Vão as Rés ainda condenadas nos juros de mora nos termos definidos no Ac. do TUI, de 02/03/2011, Proc. nº 69/2010.
Custas pelas partes em função do decaimento.
Notifique e D.N..
*
RAEM, aos 14 de Dezembro de 2017.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong (com declaração de voto que se segue)
落敗聲明
針對合議庭裁判中關於周假日的補償問題,根據《勞資關係法律制度》(第24/89/M號法令)第17條第6款a項的規定,在每周休息日提供工作的工作者,雇主須向其支付平常報酬的雙倍,而所謂“報酬的雙倍”,應理解為本身日工資加上另一日的補償。另外,根據《勞資關係法律制度》第17條第4款的規定,如在每周休息日提供工作,工作者亦有權享受一天補假。
至於強制性假日的補償方面,根據《勞資關係法律制度》第19條第3款及20條第1款的規定,如在強制性假日提供工作,除了本身的日工資外,工作者亦有權收取不少於兩倍平常報酬的補充工資。
合議庭大多數意見認為工作者在周假日提供工作,除了本身的日工資外,還有權多收取兩天的工資補償,同時亦有權享受一天補假,換言之,如工作者在上述假日提供工作,變相有權收取“四工”。
合議庭大多數意見認為同時認為在強制性假日提供工作,除了本身的日工資外,還有權多收取三天的工資補償,換言之,如工作者在上述假日提供工作,變相有權收取“四工”。
通過以下例子相信比較容易理解:
按照合議庭大多數意見的理解,假設工作者的每月收入為9000元,如其在周假日提供工作而沒有享受補假,或者在強制性假日提供工作,除了每月的固定月薪外,工作者還可向雇主要求支付900元的補償(日計,300元x3)。
在充分尊重不同見解的情況下,本人認為根據法律規定,工作者在周假日提供工作而沒有享受補假或在強制性假日提供工作,僅有權收取“三工”(當中包含本身的日工資),而並非除了本身原有的工資外,可再收取“三工”,因為後者變相讓工作者收取“四工”。
引用上述例子,假設工作者的每月收入為9000元,如其在周假日提供工作,本人認為他有權多收取一天工資即300元及享受一天補假,但倘若雇主不讓他享受補假,則工作者有權在提供工作後多收取兩天工資即600元的補償,即是所謂的“三工”(本身日工資+一天工資補償+一天補假);如在強制性假日提供工作,本人認為工作者有權多收取不少於兩倍平常報酬的補充工資即600元,即是所謂的“三工” (本身日工資+兩天工資補償)。
有見及此,本人不同意合議庭裁判中對周假日及強制性假日工作所定出的賠償金,因此作出本落敗聲明。
唐曉峰
14.12.2017
1 Na linha de uma interpretação pioneira de Alberto dos Reis, CPC Anot, V, 71
2 Os Acs. do TSI, de 30/10/2014, Proc. nº 396/2014; de 23/10/2014, Proc. nº 338/2014; de 27/11/2014, Proc. nº 654/2014.
3 CPC Anot, II, Reim. 2005, 363
4 Ac. STJ, de 8/2/1994, CJ, Acs STJ 1994, 1º tomo, 95; Ac. do STJ, de 22/3/2007, Proc. n. 06S3961; Ac. RP, de 15/5/2006, Proc. n.º 0545375; Ac RC, de 30/1/2001, Proc. n.º 2183/2000. No mesmo sentido, Abrantes Geraldes, Temas da Ref…, Almedina, 1997, 155 e 156 e Viriato Lima, Manual de DPC, CFJJ, 2005, 145
5 Alberto dos Reis, Com., 3º vol., 186 e 187
6 Vd. autores e jurisprudência acima citada
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871/2017