Processo nº 344/2017-I Data: 30.01.2018
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “tráfico de estupefacientes”.
Atenuação (e/ou dispensa) da pena.
Art. 66° do C.P.M..
Art. 18° da Lei n.° 17/2009.
SUMÁRIO
1. A figura da atenuação especial da pena surgiu em nome de valores irrenunciáveis de justiça, adequação e proporcionalidade, como necessidade de dotar o sistema de uma verdadeira válvula de segurança que permita, em hipóteses especiais, quando existam circunstâncias que diminuam de forma acentuada as exigências de punição do facto, deixando aparecer uma imagem global especialmente atenuada, relativamente ao complexo «normal» de casos que o legislador terá tido ante os olhos quando fixou os limites da moldura penal respectiva, a possibilidade, se não mesmo a necessidade, de especial determinação da pena, conducente à substituição da moldura penal prevista para o facto, por outra menos severa.
A atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, – e não para situações “normais”, “vulgares” ou “comuns”, para as quais lá estarão as molduras normais – ou seja, quando a conduta em causa se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo.
2. Para efeito de atenuação especial da pena prevista no art.º 18.º da Lei n.º 17/2009, só tem relevância o auxílio concreto na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura de outros responsáveis do tráfico de drogas, especialmente no caso de grupos, organizações ou associações, ou seja, tais provas devem ser tão relevantes capazes de identificar ou permitir a captura de responsáveis de tráfico de drogas com certa estrutura de organização, com possibilidade do seu desmantelamento.
O relator,
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José Maria Dias Azedo
Processo nº 344/2017-I
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. Por acórdão de 11.05.2017 tirado nos presentes Autos de Recurso Penal decidiu-se negar provimento aos recursos pelos (1°, 2° e 3°) arguidos A, B e C trazidos a este T.S.I., confirmando-se a “decisão da matéria de facto” proferida pelo T.J.B., a sua “qualificação jurídico-penal” e as “penas” aplicadas aos referidos arguidos; (cfr., fls. 822 a 831 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Em sede do recurso do assim deliberado, proferiu o Vdo T.U.I. o douto Acórdão de 29.11.2017, onde – na parte que agora interessa – se decidiu que este T.S.I. incorreu em omissão de pronúncia sobre a pretensão de “atenuação especial” ou “dispensa de pena” do (2°) arguido B; (cfr., fls. 1015 a 1042).
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Devolvidos os autos a este T.S.I., sem mais demoras se passa a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão “provados” os factos seguintes:
“- Os 4 suspeitos “Michael”, “Mohan”, “Meche” e “Edy Bros” são membros dum grupo internacional que se dedica ao tráfico transfronteiriço de drogas que, servindo Macau de um entreposto, transportam drogas duns países do Sudeste da Ásia ou do Médio Oriente para Hong Kong ou para o Interior da China.
- No 1º semestre de 2016, para obter interesse pecuniário, o 1º arguido A comprometeu-se perante o suspeito “Mohan” a levar drogas do exterior para Macau e entregá-las ao indivíduo indicado pelo suspeito “Mohan”.
- No 1º semestre de 2016, para obter interesse pecuniário, os 2º e 3º arguidos B e C comprometeram-se perante o suspeito “Meche” a receber drogas do indivíduo indicado por este, e transportá-las para Hong Kong.
- Em 21 de Fevereiro de 2016, conforme a ordem do suspeito “Mohan”, o 1º arguido foi de avião da Malásia para Dubai (vide a fls. 184 dos autos).
- Em 29 de Fevereiro de 2016, de manhã, o 1º arguido recebeu de um indivíduo de identidade desconhecida indicado pelo suspeito “Mohan” dois sacos plásticos de cor vermelha, branca e azul, com letras imprimidas “DUBAI DUTY FREE”, nos quais havia uns objectos de cor branca leitosa, empacotados em forma de ovo de ganso, e recebeu uma quantia no valor de USD$700,00, da qual um montante de USD$300,00 consistiu no 1º pagamento da remuneração do 1º arguido pelo tráfico de drogas e o restante montante de USD$400,00 era para entregar ao indivíduo que receberia as drogas em Macau como despesas para actividade de tráfico de drogas. O suspeito “Mohan” disse ainda ao 1º arguido que este receberia uma outra remuneração no valor de USD$2.500,00 logo que ele conseguisse transportar as drogas para Macau e entregá-las ao indivíduo indicado.
- Em 29 de Fevereiro de 2016, à tarde, o 1º arguido levou os dois sacos referidos que continham os objectos de cor branca leitosa e viajou de avião de Dubai para Banguecoque (vide a fls. 185 dos autos). Em seguida, o 1º arguido levou os dois sacos referidos que continham os objectos de cor branca leitosa e viajou de avião de Banguecoque para Macau.
- Em 29 de Fevereiro de 2016, à noite, conforme a ordem do suspeito “Meche”, os 2º e 3º arguidos entraram do Interior da China em Macau (vide as fls. 125 e 145v. dos autos), com o fim de receber as drogas do indivíduo indicado pelo referido grupo de tráfico de drogas e de as transportar para Hong Kong.
- Em 29 de Fevereiro de 2016, pelas 21H04, os 2º e 3º arguidos chegaram ao XXX Hotel Macau, tendo o 2º arguido feito o check-in com os seus dados de identidade no quarto n.º 607 (vide a fls. 86 dos autos), em que ficavam também hospedados os 2º e 3º arguidos.
- Em 1 de Março de 2016, pelas 5H19, conforme a ordem do suspeito “Meche”, os 2º e 3º arguidos saíram do quarto n.º 607 do XXX Hotel Macau (vide a fls. 57 dos autos) e foram ter com o indivíduo indicado pelo referido grupo de tráfico de drogas no Aeroporto Internacional de Macau para receber as drogas dele. Na altura, o suspeito “Meche” contou aos 2º e 3º arguidos as características da aparência do 1º arguido e o número de voo que este tomou.
- Em 1 de Março de 2016, pelas 6H07, os 2º e 3º arguidos chegaram ao Aeroporto Internacional de Macau, vagando no salão de imigração e esperando o indivíduo que o referido grupo de tráfico de drogas indicou para levar drogas para Macau.
- Em 1 de Março de 2016, pelas 6H28, o 1º arguido conseguiu entrar em Macau depois de fazer os trâmites de imigração, na altura, o 1º arguido ainda levava os dois sacos plásticos de cor vermelha, branca e azul, com letras imprimidas “DUBAI DUTY FREE”, nos quais se encontravam aqueles objectos de cor branca leitosa.
- A seguir, os 2º e 3º arguidos viram o 1º arguido no salão de imigração, confirmaram de acordo com as informações oferecidas pelo suspeito “Meche” que o 1º arguido era exactamente a pessoa que o referido grupo de tráfico de drogas ordenou para levar drogas para Macau, assim, o 3º arguido foi dizer ao 1º arguido que era a pessoa que o referido grupo de tráfico de drogas ordenou para receber as drogas em Macau e estava disposto a receber as drogas, quando o 2º arguido vigiava e tomava conta à distância (vide o auto de visionamento de videogravação constante das fls. 196 a 201 dos autos).
- Todavia, na altura o 1º arguido não conseguiu entrar em contacto por telefone com o suspeito “Mohan”, assim, não podia confirmar a identidade do 3º arguido, pelo que não entregou ao 3º arguido os dois sacos plásticos de cor vermelha, branca e azul, com letras imprimidas “DUBAI DUTY FREE”, nos quais se encontravam os objectos de cor branca leitosa. Por conseguinte, conforme a prévia ordem do suspeito “Mohan”, o 1º arguido foi ao XXX Hotel Macau.
- Não tendo recebido as drogas do 1º arguido, os 2º e 3º arguidos ligaram imediatamente para o suspeito “Meche” para informar o sucedido. O suspeito “Meche” ordenou ao 2º arguido que telefonasse ao outro suspeito “Edy Bros” para pedir nova instrução. Durante a conversa com o 2º arguido, o suspeito “Edy Bros” ordenou-lhe voltar imediatamente ao XXX Hotel Macau para esperar o 1º arguido e disse que o 1º arguido iria dar-lhes as drogas no XXX Hotel Macau.
- Deste modo, os 2º e 3º arguidos voltaram imediatamente ao XXX Hotel Macau, em 1 de Março de 2016, pelas 6H54, chegaram ao salão do Hotel para esperar o 1º arguido.
- Em 1 de Março de 2016, pelas 7H38, o 1º arguido chegou ao XXX Hotel Macau, tendo feito o check-in com os seus dados de identidade no quarto n.º 612 (vide a fls. 177 dos autos), na altura, o 1º arguido viu que os 2º e 3º arguidos estavam no salão do Hotel.
- E depois, o 1º arguido levou para o quarto n.º 612 os dois sacos plásticos de cor vermelha, branca e azul, com letras imprimidas “DUBAI DUTY FREE”, nos quais se encontravam os objectos de cor branca leitosa; os 2º e 3º arguidos voltaram ao quarto n.º 607.
- No quarto n.º 612, o 1º arguido conseguiu contactar por telefone o suspeito “Mohan”, que lhe contou que os 2º e 3º arguidos eram as pessoas que o referido grupo de tráfico de drogas indicou para receber as drogas em Macau, e mandou o 1º arguido dirigir-se imediatamente ao salão do Hotel para lhes entregar os dois sacos plásticos de cor vermelha, branca e azul, com letras imprimidas “DUBAI DUTY FREE”, nos quais se encontravam os objectos de cor branca leitosa.
- Ao mesmo tempo, o suspeito “Edy Bros” telefonou ao 2º arguido e ordenou-lhe dirigir-se imediatamente ao salão do Hotel para receber do 1º arguido os referidos dois sacos plásticos de cor vermelha, branca e azul, com letras imprimidas “DUBAI DUTY FREE”, nos quais se encontravam os objectos de cor branca leitosa.
- Em 1 de Março de 2016, pelas 7H57, os 1º e 2º arguidos encontraram-se no salão do Hotel, tendo o 1º arguido entregue ao 2º arguido os dois sacos plásticos de cor vermelha, branca e azul, com letras imprimidas “DUBAI DUTY FREE”, nos quais se encontravam os objectos de cor branca leitosa, e uma quantia de USD$400,00 como despesas para actividade de tráfico de drogas. A seguir, o 2º arguido levou imediatamente os objectos ao quarto n.º 607 (vide o auto de visionamento de videogravação constante das fls. 56 a 59 dos autos).
- Em seguida, o 3º arguido saiu e comprou uma mala de viagem de cor cinzenta com o referido dinheiro para actividade de tráfico de drogas. Por conseguinte, no quarto n.º 607 os 2º e 3º arguidos empacotaram de novo com diferentes sacos plásticos os objectos de cor branca leitosa contidos nos dois sacos recebidos do 1º arguido e colocaram-nos na mala de viagem recém-comprada, com o objectivo de os transportar para Hong Kong.
- De facto, a PJ já tinha recebido a informação e sabia que 3 arguidos, sob a ordem dum grupo de tráfico de drogas, iriam exercer actividade de tráfico de drogas em Macau, pelo que, desde que os 3 arguidos entraram em Macau, começou a vigiá-los.
- Em 1 de Março de 2016, pelas 10H30, quando os 2º e 3º arguidos saíram do XXX Hotel Macau, os agentes da PJ seguiram-nos, depois de constatar os agentes da PJ os 2º e 3º arguidos fugiram separadamente, assim sendo, os agentes da PJ perseguiram-nos e conseguiram interceptá-los.
- Em seguida, os agentes da PJ interceptaram também o 1º arguido nas proximidades do XXX Hotel Macau.
- Os agentes da PJ levaram os 2º e 3º arguidos para o XXX Hotel Macau e efectuaram uma busca ao quarto n.º 607 em que eles ficavam hospedados, tendo encontrado no armário situado perto da porta os seguintes objectos (vide o auto de busca e de apreensão constante de fls. 71 dos autos):
Uma pequena mala de viagem de cor cinzenta, em que havia uma bolsa de ombro de cor castanha (marca: “TOP POWER”) e uma mini balança electrónica de cor prateada;
- Na referida bolsa de ombro de cor castanha havia um grande saco plástico de cor vermelha, branca e azul, com letras imprimidas “DUBAI DUTY FREE”, o qual continha 74 objectos em forma de ovo de ganso, empacotados com papel plástico transparente, com peso bruto de 1528,12g;
- No referido grande saco plástico de cor vermelha, branca e azul, com letras imprimidas “DUBAI DUTY FREE”, havia 4 sacos plásticos que continham objectos em forma de ovo de ganso, empacotados com papel plástico transparente, os detalhes vide o seguinte:
1. Um saco plástico de cor rosa, com letras imprimidas “D”, que continha 74 objectos em forma de ovo de ganso, empacotados com papel plástico transparente, com peso bruto de 1401,83g;
2. Um saco plástico de cor branca, com letras imprimidas “E”, que continha 67 objectos em forma de ovo de ganso, empacotados com papel plástico transparente, com peso bruto de 1037,34g;
3. Um saco plástico de cor rosa, com letras imprimidas “D”, que continha 82 objectos em forma de ovo de ganso, empacotados com papel plástico transparente, com peso bruto de 1791g;
4. Um saco plástico de cor branca, que continha 12 objectos em forma de ovo de ganso, empacotados com papel plástico transparente, com peso bruto de 247,4g;
- Após exame laboratorial, foi confirmado que os 74 objectos em forma de ovo de ganso, de cor branca leitosa, empacotados com papel plástico transparente, contidos no referido grande saco plástico de cor vermelha, branca e azul, com letras imprimidas “DUBAI DUTY FREE”, continham “Cocaína” controlada na Tabela I – B da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 1322,00g, e após análise quantitativa, verificou-se que a proporção de “Cocaína” era de 70,6%, com peso líquido de 933g; os 74 objectos em forma de ovo de ganso, de cor branca leitosa, empacotados com papel plástico transparente, contidos no referido saco plástico de cor rosa, com letras imprimidas “D”, continham “Cocaína” controlada na Tabela I – B da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 1248,53g, e após análise quantitativa, verificou-se substâncias de “Cocaína” de 72,2%, no peso líquido de 901g; os 67 objectos em forma de ovo de ganso, de cor branca leitosa, empacotados com papel plástico transparente, contidos no referido saco plástico de cor branca, com letras imprimidas “E”, continham “Cocaína” controlada na Tabela I – B da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 997,54g, e após análise quantitativa, verificou-se substâncias de “Cocaína” de 72,2%, no peso líquido de 720g; os 82 objectos em forma de ovo de ganso, de cor branca leitosa, empacotados com papel plástico transparente, contidos no referido saco plástico de cor rosa, com letras imprimidas “D”, continham “Cocaína” controlada na Tabela I – B da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 1636,14g, e após análise quantitativa, verificou-se substâncias de “Cocaína” de 72,1%, no peso líquido de 1180g; os 12 objectos em forma de ovo de ganso, de cor branca leitosa, empacotados com papel plástico transparente, contidos no referido saco plástico de cor branca, continham “Cocaína” controlada na Tabela I – B da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 219,93g, e após análise quantitativa, verificou-se substâncias de “Cocaína” de 72,0%, no peso líquido de 158g (vide o relatório de exame constante das fls. 350 a 357 e 393 a 399 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
- A referida mala de viagem de cor cinzenta e a bolsa de ombro foram instrumentos que os 2º e 3º arguidos utilizaram para transportar drogas; a referida mini balança electrónica foi instrumento que 2º e 3º arguidos utilizavam para empacotar drogas.
- Na PJ, os agentes efectuaram uma revista ao 1º arguido, tendo encontrado na sua posse os seguintes objectos (vide o auto de apreensão constante da fls. 175 dos autos:
* Um cartão-chave do quarto n.º 612 do XXX Hotel Macau;
* Uma folha de registo de hóspedes do XXX Hotel Macau (quarto n.º 612, do dia 1 de Março ao dia 2 de Março);
* 6 recibos de hospedagem no XXX HOTEL de Dubai;
* 8 bilhetes de embarque de avião em nome de A;
* 5 registo das informações de voo em nome de A;
* Um telemóvel;
* Numerário no valor de MOP$600,00.
- O referido telemóvel foi instrumento de comunicação que o 1º arguido utilizava para exercer actividade de tráfico de drogas; o referido valor em numerário foi dinheiro obtido pelo 1º arguido através de tráfico de drogas.
- Na PJ, os agentes efectuaram uma revista ao 2º arguido, tendo encontrado na posse dele os seguintes objectos (vide o auto de apreensão constante da fls. 77 dos autos):
* Numerário no valor de USD$6.300,00;
* Numerário no valor de HKD$500,00;
* Uma folha de registo de hóspedes do XXX Hotel Macau, do que consta o nome do 2º arguido e o n.º 607 do quarto;
* Um cartão-chave do quarto n.º 607 do XXX Hotel Macau;
* 7 bilhetes de avisão electrónicos dos quais consta o nome do 2º arguido;
* 9 bilhetes de embarque de avião dos quais consta o nome do 2º arguido;
* Um recibo de hospedagem no “F” da Malásia do qual consta o nome do 2º arguido;
* Um recibo de West Union do qual consta “recebido por B”;
* Um livro de contas de cor azul e branca, ao qual se junta 4 papéis de conta;
* Um livro de contas de cor verde;
* 3 telemóveis;
- Os referidos valores em numerário foram dinheiro obtido pelo 2º arguido através de tráfico de drogas e dinheiro para despesas de actividade de tráfico de drogas; dos referidos dois livros de conta constam as despesas e rendimentos na actividade de tráfico de drogas pelo 2º arguido, bem como as informações das drogas recebidas; os referidos 3 telemóveis foram instrumento de comunicação que o 2º arguido utilizava na actividade de tráfico de drogas.
- Na PJ, os agentes efectuaram uma revista ao 3º arguido, tendo encontrado na sua posse os seguintes objectos (vide o auto de apreensão constante da fls. 138 dos autos):
* Numerário no valor de USD$1.345,00;
* Um bilhete de barco de Macau para Hong Kong no dia 1 de Março;
* 3 telemóveis;
- Os referidos valores em numerário foram dinheiro obtido pelo 3º arguido através de tráfico de drogas e dinheiro para despesas de actividade de tráfico de drogas; os referidos 3 telemóveis foram instrumento de comunicação que o 3º arguido utilizava na actividade de tráfico de drogas.
- Os 3 arguidos sabiam bem a natureza e as características das drogas referidas.
- Os 3 arguidos agiram livre, voluntaria e conscientemente ao praticar dolosamente a conduta referida.
- Sob a instrução do grupo de tráfico de drogas, sabendo que era proibido, o 1º arguido transportou do exterior para Macau as drogas controladas pela lei e entregou-as aos indivíduos indicados pelo grupo de tráfico de drogas, com o fim de facilitar a outrem transitar por Macau as drogas para o exterior.
- Sob a instrução do grupo de tráfico de drogas, sabendo que era proibido, os 2º e 3º arguidos receberam do indivíduo indicado pelo grupo de tráfico de drogas as drogas controladas pela lei e pretenderam transportá-las para o exterior.
- Os 3 arguidos sabiam que a sua conduta era proibida e punida pela lei.
- Conforme o CRC, os 3 arguidos são primários.
- O 1º arguido declarou que, é vendedor de automóvel, auferindo mensalmente uma quantia de MYR$18.000.000,00, tem a seu cargo a mãe, um irmão mais novo e uma irmã mais nova, tem como habilitação académica o 1º ano da escola secundária.
- O 2º arguido declarou que, é comerciante, auferindo mensalmente uma quantia de USD$1.000,00, tem a seu cargo o pai, a mulher e dois filhos, tem como habilitação académica o ensino superior.
- O 3º arguido declarou que, é comerciante, auferindo mensalmente uma quantia de USD$4.000,00 a USD$6.000,00, tem a seu cargo os pais, um filho, uma filha, uma irmã mais nova e dois irmãos mais novos, tem como habilitação académica o ensino secundário”; (cfr., fls. 1002 a 1013).
Do direito
3. Desde já, mostra-se de consignar que, perante a matéria de facto que se deixou transcrita, foram os (1°, 2° e 3°) arguidos A, B e C condenados como co-autores da prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.°1, da Lei n.° 17/2009, fixando-lhes o Colectivo do T.J.B. a pena de 9 anos e 6 meses de prisão para o (1°) arguido A, e a de 12 anos de prisão para os (2° e 3°) arguidos B e C; (cfr., o Ac. do T.J.B. de 24.02.2017, a fls. 635 a 650).
E, importando agora – tão só – decidir se em relação ao (2°) arguido B, adequada é uma “atenuação especial” ou “dispensa de pena”, a tanto se passa.
Vejamos.
Nos termos do art. 66° do C.P.M.:
“1. O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
2. Para efeitos do disposto no número anterior são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:
a) Ter o agente actuado sob influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência;
b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida;
c) Ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados;
d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta;
e) Ter o agente sido especialmente afectado pelas consequências do facto;
f) Ter o agente menos de 18 anos ao tempo do facto.
3. Só pode ser tomada em conta uma única vez a circunstância que, por si mesma ou em conjunto com outras, der lugar simultaneamente a uma atenuação especial da pena expressamente prevista na lei e à atenuação prevista neste artigo”.
E, em relação ao assim estatuído temos entendido que: “A atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, – e não para situações “normais”, “vulgares” ou “comuns”, para as quais lá estarão as molduras normais – ou seja, quando a conduta em causa se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 20.07.2017, Proc. n.° 600/2017, de 28.09.2017, Proc. n.° 812/2017 e de 16.11.2017, Proc. n.° 751/2017).
Tratando desta “matéria” tem-se entendido que a figura da atenuação especial da pena surgiu em nome de valores irrenunciáveis de justiça, adequação e proporcionalidade, como necessidade de dotar o sistema de uma verdadeira válvula de segurança que permita, em hipóteses especiais, quando existam circunstâncias que diminuam de forma acentuada as exigências de punição do facto, deixando aparecer uma imagem global especialmente atenuada, relativamente ao complexo «normal» de casos que o legislador terá tido ante os olhos quando fixou os limites da moldura penal respectiva, a possibilidade, se não mesmo a necessidade, de especial determinação da pena, conducente à substituição da moldura penal prevista para o facto, por outra menos severa.
Por sua vez, nos termos do art. 18° da Lei n.° 17/2009, (agora, alterada pela Lei n.° 10/2016):
“No caso de prática dos factos descritos nos artigos 7.º a 9.º e 11.º, se o agente abandonar voluntariamente a sua actividade, afastar ou fizer diminuir consideravelmente o perigo por ela causado ou se esforçar seriamente por consegui-lo, auxiliar concretamente na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura de outros responsáveis, especialmente no caso de grupos, de organizações ou de associações, pode a pena ser-lhe especialmente atenuada ou haver lugar à dispensa de pena”.
E, pronunciando-se sobre o assim prescrito, teve já o Vdo T.U.I. oportunidade de consignar que “Para efeito de atenuação especial da pena prevista no art.º 18.º da Lei n.º 17/2009, só tem relevância o auxílio concreto na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura de outros responsáveis do tráfico de drogas, especialmente no caso de grupos, organizações ou associações, ou seja, tais provas devem ser tão relevantes capazes de identificar ou permitir a captura de responsáveis de tráfico de drogas com certa estrutura de organização, com possibilidade do seu desmantelamento”; (cfr., v.g., o Ac. de 21.07.2010, Proc. n.° 34/2010 e, mais recentemente, de 30.07.2015, Proc. n.° 39/2015).
Aqui chegados, e motivos não tendo nós para não ter como correctas e adequadas as considerações que se deixaram consignadas quanto à matéria da “atenuação especial” e/ou “dispensa de pena”, cremos que sem esforço se mostra de concluir que, (no caso), inviável é uma decisão em tal sentido.
Com efeito, a “situação dos autos” – atenta a “factualidade dada como provada” e atrás retratada, notando-se que apenas esta releva, e não o que meramente alega o recorrente – de forma alguma se identifica como uma “situação excepcional” (ou “extraordinária”) para efeitos de uma possível aplicação do art. 66° do C.P.M., o mesmo sucedendo com o preceituado no (também) transcrito art. 18° da Lei n.° 17/2009, pois que nenhuma das suas “previsões” ou circunstâncias se apresentam verificadas, (ou melhor, dadas como “provadas”), não se vislumbrando assim qualquer possibilidade de uma “atenuação especial da pena” aplicada ao (2°) arguido B, o mesmo se mostrando de dizer, por motivos óbvios, em relação a uma (eventual) “dispensa de pena”.
Dito isto, resolvida que assim nos parece ter ficado a “questão” e nada mais se mostrando de acrescentar ao deliberado no nosso acórdão de 11.05.2017, resta decidir.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam julgar improcedente o recurso do (2°) arguido B no que toca à questão da “atenuação especial” ou “dispensa de pena”.
Pelo seu decaimento pagará o recorrente a taxa de justiça de 3 UCs.
Registe e notifique.
Macau, aos 30 de Janeiro de 2018
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 344/2017-I Pág. 24
Proc. 344/2017-I Pág. 1