Processo nº 799/2016
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 11 de Janeiro de 2018
Descritores:
- Revisão de sentença
- Divórcio
- Regulação do poder paternal
SUMÁRIO:
I. Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.
II. Quanto aos requisitos relativos à competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, o tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do nº1, do artigo 1200º, negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.
Proc. nº 799/2016
Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM
I – Relatório
B (B), divorciada, de nacionalidade chinesa, residente em Macau, na Rua do ...... nº ..., THE ...... GARDEN, Bloco ..., ...º andar “...”, instaurou a presente acção com processo especial de revisão e confirmação de decisão proferida por tribunal ou árbitro do exterior de macau, ao abrigo do disposto no artº 1199º e seguintes do Código de Processo Civil, contra -----
C (C), divorciado, de nacionalidade chinesa, residente na China, 中國福建省石獅市......路...-... 號.
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O requerido foi citado mas não contestou.
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O digno Magistrado do MP não se opôs ao deferimento do pedido.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da matéria, nacionalidade e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1- A autora e o ré casaram em 27 de Novembro de 2009, em Macau (doc. nº.1, junto com a p.i.).
2 - Por sentença proferida pelo Tribunal Popular da cidade de Shishi, da Província de Fujian (福建省石獅市人民法院) a 20 de Abril de 2012, foi decretada, por divórcio, a dissolução do casamento entre autora e réu (doc. nº 2 junto com a p.i.).
3- A referida decisão determinou ainda que a dissolução do casamento só seria efectiva se, decorrido o prazo de 30 dias contados a partir da data da notificação, não fosse apresentada, naquele tribunal, qualquer instância que pudesse impedir que a dissolução se tornasse definitiva (doc. nº 2 cit.)
4- Não se tendo verificado esta última hipótese, a sentença transitou e passou a ser definitiva e plenamente eficaz a partir de 15 de Maio de 2012, transitando (doc. nº 3 junto com a p.i.).
5- Desse matrimónio nasceu um filho D D.
6. O exercício do poder paternal relativo ao filho referida no artigo anterior foi confiado ao pai, requerido, conforme a referida sentença ( doc. nº 2).
7- A sentença revidenda apresenta o seguinte teor:
Tribunal Popular da Cidade de Shishi da Província de Fujian
SENTENÇA CIVIL
N.º XXXX da série Shi Min Chu Zi (2011)
Autora, B (B), do sexo feminino, nascida a ... de Novembro de 19..., da etnia Han, residente da RAEM, residente na Cidade de Shishi, ......巷...號, titular do BIR do Interior da China n.º 350581198911...... e do BIR de Macau n.º 14XXXXX(X).
Mandatários judiciais, F (F) e G (G), advogados do Escritório de Advogados ...... de Fujian.
Réu, C (C), do sexo masculino, nascido a ... de Agosto de 19..., da etnia Han, residente na Cidade de Shishi, ......路...-..., titular do BIR do Interior da China n.º 350581198708.......
Mandatários judiciais, H (H) e I (I), advogados do Escritório de Advogados ...... de Fujian.
Tendo admitido a acção de divórcio litigioso entre a autora B e o réu C, este Tribunal formou juízo colectivo nos termos da lei e realizou audiência à porta aberta. A autora B e o seu mandatário judicial F, o réu C e os seus mandatários judiciais H e I compareceram à audiência. O presente caso já foi concluído.
A autora B alegou que, a autora e o réu conheciam via internet no fim do ano 2008, realizaram cerimónia de casamento conforme os usos locais no dia 15 de Outubro de 2009 do calendário lunar e procederam ao registo de casamento em Macau no dia 27 de Dezembro do mesmo ano. Em 29 de Março de 2010 deram à luz um filho em Macau que se chama D (D). Como os dois não se conheciam bem antes de casamento, a autora não tinha muitas experiências sociais e insistiu em casar-se com o réu sem consentimento dos pais. Após o casamento, pela divergência de caracteres e assuntos frívolos, os mesmos disputaram muitas vezes até o réu agrediu a autora por várias vezes depois do nascimento do filho. A autora tem que residir na casa dos pais. Até ao momento, a autora estava a trabalhar em Macau e vivia separadamente com o réu por uns meses. Dado que os mesmos conviviam por curto tempo e os conceitos de vida e de valor são completamente divergentes, a base matrimonial é fraca e eles não podem estabelecer sentimento conjugal após o casamento. A autora e os seus familiares visitaram o filho legítimo por várias vezes na casa do réu, mas sendo recusadas injustificadamente todas as visitas pelo réu e seus pais. Neste momento, o filho legítimo ainda se encontra na fase de amamentação, o acto do réu afecta gravemente ao crescimento saudável do filho legítimo, a autora pediu ao réu, por várias vezes, que lhe foi entregue o filho legítimo para custódia, mas o réu recusou-a injustificadamente. O acto do réu já mostrou que não há possibilidade de se pôr bem. A autora já intentou acção de divórcio junto do Tribunal em 22 de Novembro de 2010. Tendo apreciado, o Tribunal não decretou o divórcio. Até hoje, a autora e o réu têm vivido separadamente e não procederam à comunicação quanto ao relacionamento conjugal, o que mostra que o sentimento conjugal já ficou plenamente rompido, sem possibilidade de recuperação. Sendo assim, pediu a julgar que: 1. É decreto o divórcio entre a autora e o réu; 2. O filho legítimo, D, ficou a cargo da autora, cabendo ao réu suportar os alimentos e as despesas de educação do filho legítimo até à sua maioridade (no valor de RMB$2000/mês); 3. O réu deve restituir o património antenupcial da autora, ora veículo de marca Audi, de matrícula G5...... (no valor de cerca de RMB$400.000); 4. O réu deve restituir o dote à autora (5 pulseiras de ouro, 13 colares de ouro, 13 anéis de ouro e 14 correntes de pulsos); 5. Custas pelo réu.
O réu C alegou que, o contestante aceitou o divórcio. E aceitou o entendimento da autora de que o sentimento conjugal ficou rompido devido à divergência de conceitos de valor e de vida dos mesmos, mas ele achou que tem base conjugal com a autora. No início do casamento, o relacionamento familiar é bom e nunca ele agrediu a autora. A autora vivia sempre em Macau e insistia na sua maneira de ser, e levava os seus bens da casa para fora, a relação conjugal daí começou a ficar pior. O contestante não aceitou que o filho legítimo fica a cargo da autora, ele pediu a custódia do filho tendo em conta o crescimento saudável deste e não exigiu à autora nenhuns alimentos. Actualmente, o filho legítimo tem dois anos de idade, após o abandono da casa da autora, o filho ficava à custódia do contestante. A autora não tem residência fixa, nem rendimento estável, não podendo dar cuidados ao filho. As condições e a capacidade de custódia da autora não são tão boas do que as do contestante e a mudança do ambiente de vida não é favorável ao crescimento saudável do filho. O contestante aceitou a restituição do veículo Audi em estado actual à autora, mas o valor real é determinado em função da situação do próprio veículo e do mercado. O pedido de restituição de objectos de ouro da autora não tem fundamento de direito e de facto, uma vez que apenas o veículo era utilizado pelo contestante após o casamento, enquanto outros objectos eram aguardados pela autora, sendo improcedente o pedido de restituição dos objectos de ouro da autora.
Tendo apurado, a autora e o réu celebraram casamento na Conservatória do Registo Civil da RAEM em 27 de Novembro de 2009 e deram à luz um filho em Macau em 29 de Março de 2010 que se chama D. A autora comprou um veículo de marca Audi A6 na Companhia de Veículos ...... da Cidade de Shishi em 9 de Outubro de 2009. Os dois começaram a viver separadamente desde Agosto de 2010 até hoje. A autora intentou acção de divórcio junto do presente Tribunal em 22 de Novembro de 2010, este Tribunal proferiu sentença civil n.º XXXX da série de Shi Min Chu Zi (2010), não decretando divórcio, sentença essa transitou em julgado em 11 de Abril de 2011. Em 21 de Outubro de 2011, a autora intentou novamente acção de divórcio ao Tribunal.
Os referidos factos são dados por provados e confirmados pelo Tribunal com base nas alegações da autora e do réu, nos certificados de identidade dos dois, no certificado de inscrição de casamento, no certificado de identidade do filho legítimo, no acordo de compra de veículo, no recibo de compra de veículo, na sentença civil n.º XXXX da série Shi Min Chu Zi (2010) e no certificado de vigência.
Os pontos controvertidos entre a autora e o réu no presente caso são: 1. A quem deve ser concedida a custódia do filho legítimo D; 2. Se o réu deve restituir ou não o património antenupcial da autora e quanto valor; 3. Se o réu deve suportar ou não os alimentos do filho D e quanto valor.
1. Acerca da questão a quem deve ser concedida a custódia do filho legítimo D
Pediu fortemente a autora a custódia do filho. Durante o período de nascimento e quatro ou cinco meses depois, o filho ficava quase totalmente à custódia da autora, após o abandono da casa, a autora tinha visitado por várias vezes o filho de Macau para Shiqi e também feito telefonema, mas tem sido impedido intencionalmente pelo réu, causando a separação entre a autora e o seu filho por longo tempo. A autora exigiu por várias vezes ao réu a entrega do filho, mas o réu recusou-a injustificadamente. O réu inventou o fundamento de que a sua residência comum está situada em Jinjiang e invocou, assim, a excepção da incompetência do vosso Tribunal e do Tribunal Popular de Nível Médio de Quanzhou, daí gerou exaustão judicial da autora e desperdício grave dos recursos judiciais. Neste momento, em vez de o réu estar a criar, por si próprio, o filho, era a mãe do réu quem está a cuidá-lo, a mãe do réu não consegue seguir os novos conceitos quanto à educação, o que levou o filho a não ter mínima capacidade pessoal. O acto do réu prejudicou gravemente o crescimento saudável do filho, além disso, o ambiente de habitação do réu é muito complicado, não sendo um bom ambiente de vida para o filho. O filho acabou por ter completado dois anos de idade, ainda é menino e está carecido de amor da mãe, assim, a criação do filho sob a autora é mais favorável à saúde física e mental do filho. E o filho D é residente permanente de Macau, as condições de vida, o ambiente de habitação e as regalias sociais em Macau são melhores do que os no Interior da China. A autora tem emprego estável e residência fixa em Macau, podendo fornecer um bom ambiente de habitação ao seu filho, a mãe da autora também pode ajudá-la a cuidar do filho, tendo em conta a vida e a educação futuras do filho, pediu ao Tribunal que a custódia do filho seja concedida à autora.
Invocou o réu que, tendo em conta o crescimento saudável do filho, o réu pediu a guarda e custódia do filho e não precisa de nenhuns alimentos da autora. Não se pode julgar apenas em função de sentimento de uma parte para com o filho, mas também se deve considerar a capacidade e as condições de custódia das partes. O réu tem residência fixa e emprego estável, podendo fornecer ao filho um bom ambiente de habitação e melhores condições de vida, enquanto a autora não pode provar que ela tem emprego e rendimento estável em Macau. O filho, desde nascimento até agora, tem ficado à guarda e custódia efectiva do réu, a mudança súbita do ambiente de habitação não é favorável ao crescimento do filho. O réu participou nas obras beneficentes e tem boa idoneidade moral, e os pais do réu têm boas condições físicas e exploravam pequenos negócios, e manifestaram, por escrito, estarem dispostos a tomar conta do filho do réu. A lei não prevê que os residentes de Macau têm que viver em Macau, a não viver em Macau não prejudica a qualidade de residente do filho, nem priva os direitos deste. Macau é um local onde o sector de jogos é desenvolvido, o Interior da China, por sua vez, tem regime social distinto do de Macau, as crianças de Hong Kong, Macau e Taiwan frequentam nas escolas de Shishi, com direitos iguais de educação e de seguro social às crianças locais de Shishi. Portanto, em comparação com a capacidade e as condições de custódia das partes, o réu apresenta a melhor situação do que a da autora, portanto, o filho deve ficar à custódia do réu.
Este Tribunal entende que nos termos do art.º 36.º n.º 2 da Lei do Casamento da RPC, depois do divórcio, tanto o pai como a mãe têm o direito e o dever de criar e educar os filhos. E nos termos do n.º 3, em princípio, depois do divórcio a mãe deve ter a custódia do bebé em amamentação. Se surgir um conflito entre ambas as partes sobre a custódia do seu filho que tiver sido desmamado e não alcançarem um acordo, o Tribunal Popular deve fazer um julgamento de acordo com os direitos e interesses da criança e com as condições actuais dos pais. O filho do réu, D, já passou o período de amamentação, em princípio, a custódia do filho deve ser determinada por acordo das partes, mas a autora e o réu não chegaram ao acordo quanto à custódia do filho. Ao abrigo das “Algumas Sugestões Quanto à Questão de Custódia de Filho na Acção de Divórcio Apreciada pelo Tribunal Popular” do Tribunal Supremo Popular, ao apreciar a questão de custódia de filho na acção de divórcio, o Tribunal Popular deve seguir a Lei do Casamento da RPC e as respectivas disposições legais, ter em conta os interesses e direitos legítimos do filho e saúde física e moral do filho e combinar com a capacidade e condições de custódia dos pais. Nos termos do art.º 3.º destas “Sugestões”, para o filho menor com mais de 2 anos de idade, quando o pais e a mãe ambos pediram a conviver com ele, podem dar prioridade a quem tem uma das seguintes circunstâncias: …… (2) o filho tem vivido com esta parte por longo tempo e a mudança do ambiente de vida é manifestamente desfavorável ao crescimento saudável do filho ……” In casu, a autora e o réu, ambos não conseguiram provar que a capacidade e as condições de custódia de uma parte são manifestamente melhores do que as de outra parte, o filho D já completou dois anos de idade e tem vivido com o pai após o nascimento e actualmente está a ficar à custódia do réu, a mudança do ambiente de vida não é favorável ao crescimento saudável deste, portanto, devem conceder prioritariamente a custódia do filho ao pai. Assim, este Tribunal julga improcedente o pedido da autora que solicitou a custódia do filho D.
2. Acerca de questão se o réu deve restituir ou não os bens pessoais antenupciais da autora e quanto valor
Referiu a autora que, antes de casamento, a autora comprou um veículo de marca Audi de matrícula MinC...., assim é bem pessoal antenupcial o veículo. Após a compra, o veículo era utilizado pelo réu e seus familiares até hoje. Nos termos da lei, o réu deve restituí-lo. Além disso, a autora tem ainda 5 pulseiras de ouro, 13 colares de ouro, 13 anéis de ouro e 14 correntes de pulsos como dote que se encontram na posse do réu, tais bens também pertenciam aos bens pessoais antenupciais da autora, devendo ser restituídos pelo réu à autora.
Segundo o réu, ele aceitou a restituição imediata do veículo de Audi em estado actual logo depois da dissolução da relação matrimonial das partes, mas cujo valor real é determinado em função da situação própria do veículo e do mercado. Não é possível restituir o valor de veículo de RMB$400.000 como a autora pediu, já que o veículo tem consumo natural após o casamento. A autora não pode provar que tinha entregado os objectos de ouro ao réu, a dote da autora já foi completamente levada pela autora em Agosto de 2011, por isso, o pedido de restituição de objectos de ouro não é procedente por falta de facto e de direito.
Este Tribunal entende que a autora e o réu ambos concordaram em divórcio, o veículo de marca Audi A6 foi comprado pela autora antes de casamento, sendo bem antenupcial da autora e não podendo ser transformado em bem comum conjugal em virtude da relação matrimonial, e o réu também concordou em restituí-lo em estado actual imediatamente logo depois de dissolução da relação matrimonial; mas a desvalorização do veículo é causado pelo uso normal na constância da relação matrimonial da autora e do réu, pelo que julga procedente o pedido da autora no sentido de restituição do veículo de marca Audi A6 com situação actual, a título de bem pessoal antenupcial. Adiantou a autora que tem 5 pulseiras de ouro, 13 colares de ouro, 13 anéis de ouro e 14 correntes de pulsos como dote que se encontram na posse do réu e este deve restituir estes bens pessoais antenupciais à autora, mas a autora não conseguiu provar o seu pedido, pelo que este Tribunal julga improcedente o pedido da autora no sentido de restituição de 5 pulseiras de ouro, 13 colares de ouro, 13 anéis de ouro e 14 correntes de pulsos como dote.
3. Acerca de questão se o réu deve suportar ou não os alimentos do filho D e quanto valor
Segundo a autora, o réu deve suportar os alimentos e as despesas de educação do filho até à maioridade deste, no valor de RMB$2000 mensalmente.
O réu, por sua vez, pediu a custódia do filho e não precisa de nenhuns alimentos da autora.
Este Tribunal entende que, uma vez que o Tribunal julga improcedente o pedido da autora que solicitou a custódia do filho D, e o réu pediu a custódia e não precisa de nenhuns alimentos da autora, por isso este Tribunal julga improcedente o pedido da autora que exigiu ao réu o pagamento de alimentos do filho até à sua maioridade no valor de RMB$2000 mensalmente.
Face ao exposto, este Tribunal entende que a autora B e o réu C contraíram casamento junto do órgão de registo de casamento competente, estabelecendo relação matrimonial legal. As partes viviam separadamente desde Agosto de 2011 até hoje, a autora pediu divórcio junto do presente Tribunal pela primeira vez, tendo sido rejeitado o pedido pelo Tribunal, depois intentou acção de divórcio novamente junto do presente Tribunal, o sentimento conjugal já ficou rompido e o réu também aceitou o divórcio. Nos termos da Lei do Casamento da RPC, o sentimento conjugal já foi rompido e a conciliação falhou, devem decretar divórcio. Este Tribunal decreta divórcio por ser fundado com facto e direito o pedido da autora. Este Tribunal não julga procedente o pedido da autora no sentido de solicitar a custódia do filho, uma vez que conviver com o réu corresponde ao princípio de “favorecer à saúde física e moral do filho e assegurar os interesses e direitos legítimos do filho”. Este Tribunal julga procedente o pedido da autora no sentido de restituição do seu veículo Audi A6, uma vez que se trata de bem antenupcial da autora. Este Tribunal julga improcedente o pedido da autora no sentido de restituição da sua dote de 5 pulseiras de ouro, 13 colares de ouro, 13 anéis de ouro e 14 correntes de pulsos por falta de provas. Este Tribunal julga improcedente o pedido da autora no sentido de exigiu ao réu o pagamento de alimentos até à maioridade do filho no valor de RMB$2000 mensalmente. Sendo assim, nos termos dos art.ºs 18.º, 21.º, 32.º e 36.º da Lei do Casamento da RPC, do art.º 19.º da “Interpretação das Algumas Questões sobre a Lei do Casamento da RPC” do Tribunal Supremo Popular, do art.º 3.º das “Algumas Sugestões Acerca da Questão de Custódia do Filho na Acção de Divórcio Apreciada pelo Tribunal Popular” do Tribunal Supremo Popular, do art.º 64.º da Lei do Processo Civil da RPC, dos art.ºs 2.º e 76.º das “Algumas Disposições acerca de Provas do Processo Civil”, este Tribunal decide:
1. Decretar divórcio entre a autora B e o réu C;
2. A custódia do filho D fica a cargo do réu C;
3. O réu C é obrigado a restituir o bem antenupcial, ora carro de marca Audi A6 em estado actual à autora B (n.º de identificação do carro: LFV4A24F193......) no prazo de 10 dias a contar da data de trânsito em julgado da presente sentença.
4. Indeferir outros pedidos da autora B.
As custas de admissão, no valor de RMB$1345 (no qual, RMB$100 pela improcedência do pedido de incompetência do Tribunal invocado pelo réu), ficam a cargo do réu C.
Caso não se conformar com a presente sentença, a autora B e o réu C podem interpor petição de recurso junto do presente Tribunal no prazo de 30 dias e 15 dias respectivamente a contar da notificação da presente sentença e apresentar tantas cópias quanto o número de pessoa da contraparte, recorrendo para o Tribunal Popular de Nível Médio da Cidade de Quanzhou da Província de Fujian.
O Juiz presidente
J (J)
O Juiz
K (K)
O Juiz substituto
L (L)
Aos 20 de Abril de 2012
O Escrivão de Direito
M (M)
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IV – O Direito
1. Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida; 342/2009 28/34
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública. 2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”
Neste tipo de processos não se conhece do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, uma vez que o Tribunal se limita a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento, nem da questão de facto, nem de direito.
Vejamos então os requisitos previstos no artigo 1200º do CPC.
Ora, os documentos constantes dos autos reportam e certificam a situação de divórcio entre requerente e requerido, que foi decretada por decisão proferida pelo tribunal competente da República Popular da China.
Revelam, além da autenticidade, a inteligibilidade da decisão que decidiu sobre o exercício do poder paternal do filho comum de ambos.
Por outro lado, a decisão em apreço não conduz a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública (cfr. art. 20º e 273º do C.C.). Com efeito, também o direito substantivo de Macau prevê o divórcio e a regulação do exercício do poder paternal.
Assim, cremos estarem reunidos os requisitos de verificação oficiosa do art. 1200º, n.1, als. a) e f), do CPC.
Além destes, não se detecta que os restantes (alíneas b) a e)) constituam aqui qualquer obstáculo ao objectivo a que tendem os autos. Na verdade, o trânsito da decisão já ocorreu em 15/05/2012. A decisão foi proferida por entidade competente e não versa sobre matéria exclusiva da competência dos tribunais de Macau, face ao que consta do art. 20º do Cód. Proc. Civil.
Também não se vê que tivesse havido violação das regras de litispendência e caso julgado ou que tivessem sido violadas as regras da citação no âmbito daquele processo ou que não tivessem sido observados os princípios do contraditório ou da igualdade das partes.
Posto isto, tudo se conjuga para a procedência do pedido (cfr. art. 1204º do CPC).
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V - Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder a revisão e confirmar a sentença de divórcio proferida pelo Tribunal Popular da Cidade de Shishi da Província de Fujian, que decretou a dissolução do casamento de requerente e requerido e confiou a este o exercício do poder paternal do filho comum, de nome D, nos precisos termos acima transcritos.
Custas pela requerente.
T.S.I., 11 de Janeiro de 2018
(Relator) José Cândido de Pinho
(Primeiro Juiz-Adjunto) Tong Hio Fong
(Segundo Juiz-Adjunto) Lai Kin Hong
799/2016 16