Processo nº 20/2017-A
Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância
I – Relatório
Sociedade de Desenvolvimento e Fomento Predial B, Limitada, devidamente identificada nos autos, veio, ao abrigo do disposto nos artºs 120º e s.s., requerer a suspensão da eficácia do despacho, datado de 08NOV2016, do Senhor Chefe do Executivo que declarou a caducidade de concessão, por arrendamento, do terreno com a área de 5288m², situado na ilha de Coloane, na zona industrial de Seac Pai Van, designado por lote SJ, destinado à construção de um edifício industrial.
Inconformada com o despacho veio interpor recurso contencioso de anulação e na pendência dele, formulou o presente pedido de suspensão da eficácia mediante o requerimento a fls. 2 a 6v dos presentes autos, concluindo e pedindo:
1. 本聲請所涉及的行政行為是行政長官於2016年11月8日作出的批示,其宣告位於路環島石排灣工業區,稱為「SJ」地段的批地失效。
2. 行政長官所作的宣告批給失效批示並不僅確認批地的租賃期而過,同時亦有附隨後果,即聲請人須將批地歸還予澳門特別行政區,並將土地騰空,這改變了聲請人過去存在的事實及法律狀況。
3. 因此,行政長官所作的宣告批給失效批示屬於具有部份積極內容的消極行為,可根據《行政訴訟法典》第120條b項作為效力中止的標的。
4. 如不中止執行被訴行為,聲請人則須耗費龐大的金錢移除批地內的工程車輛和建築物料,租用地方放置相關物品及聘請人員拆除批地內之建築物。
5. 由於「SJ」地段的批給被宣告失效,聲請人已經到了破產的邊緣,聲請人公司銀行帳戶內的資金不足以支付上述開支,倘被訴行為不被中止效力,聲請人將不得不面臨破產的命運。
6. 上述的開支對聲請人造成難以彌補的損害。
7. 縱使執行被訴行為是為了保護某些公共利益,例如增加土地供應,但在訴訟待決期間不執行被訴行為亦體現了法律交易的安定性及維持法律關係的穩定等公共利益。
8. 在本個案中,並沒有跡象顯示中止被訴行為之效力會嚴重侵害該行為在具體情況下所謀求之公共利益。
9. 最後,在本程序中亦不存在明顯及強烈跡象顯示主案中的司法上訴是違法提起的。
10. 總括而言,《行政訴訟法典》第121條所描述的效力中止的要件全部符合, 法官閣下應命令中止行政長官於2016年11月8日作出有關宣告「SJ」地段批給失效的批示之效力。
綜上所述,和依賴 法官閣下的高見,祈請 閣下裁定本聲請理由成立,並命令中止行政長官於2016年11月8日作出宣告「SJ」地段批給失效的批示之效力。
Citada a entidade requerida, veio contestar pugnando pelo indeferimento do pedido.
O Dignº Magistrado do Ministério Público emitiu o seu douto parecer, no qual opinou no sentido de indeferimento da requerida suspensão.
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo é o próprio e inexistem nulidades.
Os sujeitos processuais gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade.
Para além da questão prévia de susceptibilidade de suspensão do acto administrativo em causa, inexistem excepções ou outras questões prévias que obstam ao conhecimento do mérito do presente recurso.
Passemos então a debruçar-nos sobre esta única questão prévia.
A propósito da suspensão de eficácia de actos administrativos, o CPAC diz no seu artº 120º que:
A eficácia de actos administrativos pode ser suspensa quando os actos:
a) Tenham conteúdo positivo;
b) Tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.
Assim, é de averiguar se o acto em causa tem conteúdo meramente negativo, pois a ser assim, o acto em causa não se mostra logo susceptível de ser objecto do pedido de suspensão de eficácia.
Portanto, temos de nos debruçar sobre esta questão primeiro.
Tradicionalmente falando, a suspensão de eficácia tem uma função conservatória ou cautelar, admitida no âmbito dos processos do contencioso administrativo, que visa obter provisoriamente a paralisação dos efeitos ou da execução de um acto administrativo.
Assim, o acto administrativo cuja suspensão se requer tem de ter, por natureza, conteúdo positivo, pois de outro modo, a ser decretada a suspensão, em nada alteraria a realidade preexistente, deixando o requerente precisamente na mesma situação em que se encontra.
In casu, trata-se de um despacho que declarou a caducidade da concessão de um terreno.
A propósito da natureza do acto num caso congénere, este TSI chegou a pronunciar-se, no Acórdão tirado em 07ABR2016, no processo nº 1074/2015-A, nos termos seguintes:
……
2 – Da natureza do acto
É sabido que só é suspensível a eficácia de actos de conteúdo positivo ou, quando de conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva.
Verdade que, normalmente, um acto de não renovação ou que declara a caducidade se limita a uma mera constatação de facto, a uma mera enunciação de uma realidade previamente prevista, a uma simples expressão do reconhecimento de uma situação já verificada: o decurso do tempo (ou verificação duma condição resolutiva). Nesse sentido, habitualmente, o acto que declara a caducidade é acto negativo, porque não inovador1, porque não introduz alteração no “status” do interessado.
Contudo, algumas declarações de caducidade acabam por representar alguma interferência na esfera dos seus destinatários, na medida em que alteram o seu “status quo ante” ou que “obrigam” a uma alteração material e jurídica da situação daqueles. Isso é aqui particularmente visível, em virtude de a execução do acto implicar a desocupação do terreno concedido de todos e quaisquer haveres, máquinas, utensílios e veículos que ali estivessem e que pertencessem à requerente. A desocupação corta cerce qualquer expectativa jurídica, mais ou menos fundada, de levar a cabo a actividade para a qual o terreno foi concessionado.
É por esta razão que o acto administrativo em causa apresenta, quanto a nós, uma imediata repercussão negativa na esfera da requerente, circunstância que, por caber no âmbito de previsão da alínea b), do art. 120º do CPAC, permite a formulação do pedido e obriga à apreciação dos requisitos de procedibilidade.
Subscrevemos a tese vertida nesse Acórdão.
Portanto o acto da cuja eficácia que a requerente pretende ver suspensa é integrável no elenco dos actos susceptíveis de suspensão.
Avancemos.
Sem vistos – artº 129º/2 do CPAC, cumpre apreciar e decidir as questões de fundo.
II – Fundamentação
De acordo com os elementos constantes dos autos e do processo instrutor, podem ser seleccionados os seguintes factos com relevância à decisão do presente pedido da suspensão de eficácia:
* Por despacho, datado de 08NOV2016, do Senhor Chefe do Executivo que declarou a caducidade de concessão, por arrendamento, do terreno com a área de 5288m², situado na ilha de Coloane, na zona industrial de Seac Pai Van, designado por lote SJ, destinado à construção de um edifício industrial;
* Inconformada com esse despacho do Chefe do Executivo, a concessionária Sociedade de Desenvolvimento e Fomento Predial B, Limitada, ora requerente, veio interpor recurso contencioso de anulação para este TSI, onde o recurso foi registado, autuado e distribuído sob o nº 20/2017; e
* Na pendência desse recurso contencioso de anulação, a requerente requereu a suspensão de eficácia desse despacho.
Então apreciemos a verificação ou não dos requisitos exigidos no artº 121º/1 do CPAC para o deferimento da requerida suspensão
Para o deferimento da tal providência, a lei exige a verificação cumulativa dos seguintes requisitos – artº121º/1-a), b) e c) do CPAC:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
Sendo de verificação cumulativa que é, a inverificação de qualquer deles implica logo o indeferimento da suspensão.
Comecemos então pelos requisitos exigidos nas alíneas b) e c), que nos se afiguram ser de fácil apreciação, tendo em conta a especificidade do caso, a matéria de facto assente, assim como os elementos constantes nos autos.
No que respeita ao requisito exigido na alínea b), não cremos que a não execução imediata, apenas num curto período de tempo correspondente ao tempo da pendência do recurso contencioso de anulação, do despacho cuja eficácia ora se requer, possa causar imediatamente lesão do interesse público de tal maneira grave que frustrará de todo em todo o fim concretamente prosseguido por este despacho, pois, pelo menos, de acordo com os elementos existentes quer nos presentes autos quer no Processo nº 20/2017, não temos presente a existência de um projecto concreto de reaproveitamento do terreno a ser implementado imediatamente com vista à prossecução de interesses públicos eminentes.
Em relação à inexistência dos fortes indícios da ilegalidade do recurso, podemos dizer que existem sim fortes indícios da legalidade do recurso, tendo em conta os vícios imputados ao acto ora suspendendo no recurso contencioso de anulação e a manifesta legitimidade da requerente para reagir contenciosamente contra o acto administrativo que representa a última palavra da Administração.
Então resta analisar a verificação ou não do requisito exigido na alínea a), ou seja, se a execução do acto causa previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso contencioso.
A lei exige que sejam de difícil reparação os prejuízos resultantes da execução imediata do acto suspendendo.
A dificuldade de reparação do prejuízo deve avaliar-se através de um juízo prognose relativo a danos prováveis, tendo em conta o dever de reconstrução da situação (hipotética) pela autoridade administrativa na sequência de uma eventual sentença de anulação – Vieira de Andrade, in A Justiça Administrativa, 2ª ed. pág. 168.
Com a exigência desse requisito consistente nos previsíveis prejuízos de difícil reparação, a mens legislatoris é para acautelar as situações em que, uma vez consumada a execução do acto administrativo, ocorre a dificuldade de reconstituição hipotética da situação anteriormente existente e ainda aquelas em que, para ressarcimento dos prejuízos causados pela execução imediata, se revele difícil fixar a indemnização, por serem de difícil avaliação económica exacta, mesmo no âmbito ou por via dos meios judiciais a que se referem os artºs 24º/1-b) e 116º do CPAC.
E para convencer o Tribunal de que, segundo o decurso normal das coisas e pela experiência comum, os alegados prejuízos sejam a consequência adequada, típica, provável da execução imediata, é preciso que o requerente da suspensão de eficácia alegue e demonstre factos concretos e bem determinados em que assentam tais prejuízos.
Para sustentar a sua tese da verificação in casu desse requisito, a requerente alega, em síntese, que:
* Para levar a cabo o projecto de desenvolvimento do terreno, a requerente adquiriu veículos, materiais de construção e outros equipamentos, que se encontram colocados no terreno;
* Para o cumprimento do despacho de cuja eficácia ora se requer a suspensão, a requerente terá de deixar de ocupar o terreno, o que implica a realização de enormes despesas para a remoção dos objectos existentes no terreno e a tomada de arrendamento de um outro espaço para a colocação dos mesmos;
* Na hipótese de procedência do recurso contencioso de anulação, a requerente terá de suportar de novo despesas para o transporte dos mesmos materiais;
* Por efeito da declaração de caducidade da concessão, a requerente não pode recorrer a empréstimos bancários nem tem saldos suficientes nas suas contas bancárias para custear as despesas acima referidas;
* O que leva a requerente a ficar na beira da falência;
* Se a pretendida suspensão do acto não vier a ser decretada, a requerente já terá entrado na falência e terá sofrido prejuízos irreparáveis; e
* Nesta hipótese, a eventual procedência do recurso contencioso de anulação deixará de ter qualquer utilidade.
Ora, o prejuízo de difícil reparação alegado pela requerente é a hipotética falência, a ser causada pelo cumprimento dispendioso da obrigação de desocupação do terreno, consequente da declaração da caducidade da concessão.
Para o efeito, a requerente alegou uma série de factos, nomeadamente a existência no terreno de veículos e materiais por ela adquiridos para o aproveitamento do terreno, falta de capacidade económica para custear as despesas resultante da remoção de tais materiais do terreno e da recolocação dos mesmos num outro espaço.
Todavia, a requerente limitou-se a alegar vagamente estes factos e nada mais disse no sentido da demonstração da verificação desses factos.
Ora, tal como doutamente apontou o Ministério Público em sede de vista, citando a jurisprudência do Venerando Tribunal de Última Instância, ao requerente compete sempre o ónus de demonstrar, mediante prova verosímil e susceptível de objectiva apreciação, o preenchimento do requisito consagrado no artº 121º/1-a) do CPAC, por ai não se estabelecer a presunção do prejuízo de difícil reparação – neste sentido, cf. nomeadamente os Ac. do TUI nos processos nºs 799/2011 e 266/2012/A.
Por outro lado, o que a requerente alegou, de per si, senão em si contraditório, não é suficiente, para nos convencer de que o não diferimento da pretendida suspensão da eficácia conduzirá ao invocado estado de falência.
Ora, diz-se falência o estado de um comerciante de se encontrar impossibilitado de solver as suas dívidas comerciais.
A requerente vem alegar que, com a declaração da caducidade da concessão, fica logo impossibilitada de recorrer a empréstimos bancários para custear as despesas a realizar, em obediência ao acto de cuja eficácia ora se requer a suspensão, para a remoção dos materiais existentes no terreno e a sua recolocação noutro espaço.
Então de duas uma, ou remover e recolocar os materiais com os meios financeiros ainda disponíveis, ou por falta de meios próprios disponíveis e por impossibilidade de recorrer a empréstimos, cruzar os seus braços.
Qualquer quer seja a sua opção, a requerente não entrará no estado de falência, pois nenhum facto foi alegado pela requerente para nos convencer do eventual endividamento da requerente que poderá conduzir à invocada falência.
Portanto, nem sequer foi alegado factos suficientemente demonstrativos para se estabelecer o nexo de causalidade entre a não suspensão de eficácia do acto administrativo e a falência da requerente.
Pelo que não podemos senão julgar não verificado o requisito a que se refere o artº 121º/1-a) do CPAC e consequentemente indeferir a requerida suspensão da eficácia do acto em causa.
Tudo visto, resta decidir.
III – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam indeferir o pedido de suspensão da eficácia do despacho, datado de 08NVO2016, do Senhor Chefe do Executivo que que declarou a caducidade de concessão, por arrendamento, do terreno com a área de 5288m², situado na ilha de Coloane, na zona industrial de Seac Pai Van, designado por lote SJ, destinado à construção de um edifício industrial.
Custas a cargo da requerente, com taxa de justiça fixada em 6UC.
Registe e notifique.
RAEM, 01FEV2018
Relator
Lai Kin Hong
Primeiro Juiz-Adjunto
Fong Man Chong
Segundo Juiz-Adjunto
Ho Wai Neng
Mai Man Ieng
1 Lino Ribeiro e C. Pinho, Código de Procedimento Administrativo Anotado, Fundação Macau e SAFP, pág. 741).
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Susp.ef. 20/2017-A-10