Processo nº 689/2017
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 01 de Fevereiro de 2018
ASSUNTO:
- Marca
- Capacidade distintiva
SUMÁRIO:
- A marca é um sinal distintivo de produtos e serviços de uma empresa dos de outras empresas, daí que o seu registo exige a capacidade distintiva.
- Coexistem na RAEM as marcas de “XXX” e “XXXe Plaza”, ambos em chinês “XXX”, registadas a favor da ora Recorrida e da ora Recorrente, respectivamente.
- Aquelas duas palavras chinesas não são de uso exclusivo da ora Recorrida, pois a ora Recorrente, na qualidade de titular das marcas registadas e XXX假日酒店, também tem o direito de usá-las.
- Nesta medida, não se pode, simplesmente com base no uso daquelas duas palavras chinesas, concluir pela existência da imitação ou reprodução das marcas registadas a favor da ora Recorrida por parte da ora Recorrente.
O Relator
Ho Wai Neng
Processo n.º 689/2017
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 01 de Fevereiro de 2018
Recorrente: YYY Hotels, Inc.
Recorrida: XXX Melbourne Limited
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I – Relatório
Por sentença de 21/03/2017, julgou-se procedente o recurso judicial de marca interposto pela Recorrida XXX Melbourne Limited.
Dessa decisão vem recorrer a Recorrente YYY Hotels, Inc., alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
I. Vem o presente recurso interposto da decisão proferida pelo douto Tribunal de Primeira Instância que determinou a revogação do despacho proferido pela Direcção dos Serviços de Economia, de 10 de Janeiro de 2011, publicado na Série II, do Boletim Oficial de Macau, de 02 de Fevereiro de 2011, através do qual a autoridade administrativa concede à ora Recorrente o registo da marca N/4......, que consiste em XXX國, para a classe 43;
II. Entendeu o douto Tribunal a quo que a marca N/4...... reproduz ou imita a marca n.º N/1......-N/1......, para as classes de produto/serviço 39, 41 e 42, e que consiste em "澳門XXX", a marca n.º N/2......-N/2......, para as classes de produto/serviço 35, 39, 41 e 43, e que consiste em "XXX貴賓會" e a marca n.º N/1...-N/1...-N/1..., para as classes de produto/serviços 39, 41 e 42, e que consiste em “XXX”;
III. A marca N/4...... trata-se de uma marca nominativa que consiste em: XXX國 e é romanizada como "XXX KOUK" e destina-se a assinalar serviços da classe 43;
IV. A Recorrida é da opinião que não existe qualquer risco de confusão entre as quatro marcas em confronto nem entre a marca registanda e qualquer outra marca de que a aqui Recorrida XXX Melbourne seja titular;
V. Antes do registo das marcas "澳門XXX" e "XXX貴賓會", a ora Recorrente já era, e ainda é, titular em Macau de marcas compostas pela expressão "XXXE" e "XXX", nomeadamente da Marca P/1...... « HOLIDAY INN XXXE PLAZA» e Marca P/1......, «XXX假日酒店» (XXX KA IAT CHAO TIM), ambas na classe 42 e pedidas no ano de 1990, para os seguintes serviços: "Serviços de alojamento, hotel, bar, restaurante, banquetes, motel, discotecas e serviços de reserva de hotel e de aprovisionamento." e muito antes, entre 12/12/1997 e 12/12/2007, a ora Recorrente foi titular em Macau da marca P/1......, que consistia em «XXXE PLAZA» para designar serviços da classe 42;
VI. A expressão "XXX" quando utilizada numa marca que pretenda assinalar serviços da classe 43 não é propriedade exclusiva da Recorrente, por se tratar de uma expressão comum de uso corrente e que por isso não é apropriável em exclusivo por ninguém;
VII. A marca da ora Recorrente é um todo incindível, onde o elemento divergente - 國 - confere eficácia distintiva à marca recorrida, impedindo que o elemento comum - XXX - leve o consumidor médio não especialmente atento nem especialmente distraído, tome uma marca pela outra ou que, mesmo que distinga os sinais em confronto possa associá-los e, assim, ligar também os serviços marcados por aqueles sinais;
VIII. O consumidor médio relativamente ao tipo de serviços em causa, não é um consumidor que passa apressadamente por um corredor de supermercado e adquire um produto inadvertidamente, confundindo-o com outro ou associando-o ao mesmo empresário, sendo que a natureza dos serviços em causa implica um consumidor mais atento;
IX. Não existe possibilidade de imitação da marca da Recorrente por não haver possibilidade de indução em erro do consumidor, em virtude de confusão ou associação uma vez que aos consumidores deste tipo de serviço, com as características medianas de inteligência, zelo e compreensão, razoavelmente informado dificilmente confundiria as marcas em apreço.
X. Os serviços prestados pela Recorrida em Macau sob a marca XXX ou XXX são todos eles prestado no complexo City of Dreams e como talos consumidores atentos sabem perfeitamente onde ir quando quiserem usufruir dos mesmos;
XI. A Recorrida XXX Melbourne, ao ter escolhido para identificar os seus serviços uma marca composta por um sinal - XXX - o qual já era anteriormente utilizado por outros empresários para assinalar as mais variadas espécies de serviços ou produtos, sabia à partida que estaria sujeita a uma protecção fraca da sua marca;
XII. A palavra "XXX" constitui por si só um sinal distintivo fraco, uma vez que sugere um objecto comum - "XXX" em português, "XXX" em inglês e quando inserida numa marca para assinalar os serviços desta natureza, pretende sugerir uma característica do serviço, i.e. que os hóspedes se sentirão como reis ou pertencentes a uma família real e/ou que o estabelecimento da titular da marca é como um "palácio";
XIII. Daí a expressão "XXX" ou figura de uma coroa, símbolos de excelência e qualidade, terem vindo a tornar-se comuns em muitos estabelecimentos, nomeadamente de hotelaria e restauração, dando-se como exemplo em Macau o "Hotel Emperor", que no topo do seu edifício tem uma enorme coroa, entre tantos outros;
XIV. É pois flagrante que a componente nominativa das marcas da Recorrida é constituída por um sinal que a doutrina e jurisprudência designam comummente como "marca sugestiva ou expressiva";
XV. Não se pode exigir agora que seja guardada uma maior distância em relação aos sinais usados pela Recorrida XXX Melbourne do que aquela que ela própria observou relativamente a sinais pré-existentes de outras empresas que operam na RAEM, pois que tal situação configura uma clara violação do princípio geral da igualdade, pois se a curta distância entre a marca registada e a marca registanda é inaceitável, então também seria inaceitável a curta distância daquela às marcas antecedentes;
XVI. A expressão XXX não assumiu especial notoriedade em Macau quando associada com os serviços prestados pela Recorrida sob as marcas compostas por tal vocábulo ou pela expressão correspondente em inglês;
XVII. Com efeito,o Hotel Casino ZZZ deixou já ser conhecido do público por XXX Macau, o que se deveu ao facto de a Recorrida espontaneamente ter escolhido abandonar a utilização de tal marca no referido espaço e o Hotel XXX Towers, inaugurado em 2009 e explorado pela Recorrida não deve a sua visibilidade a nenhuma das marcas que o douto Tribunal a quo considera ser objecto de imitação, mas sim ao facto de se integrar no complexo CITY OF DREAMS;
XVIII. A imprensa internacional se tem debruçado maioritariamente sobre o complexo CITY OF DREAMS e não, concretamente, sobre o Hotel XXX Towers;
XIX. Quanto às demais marcas que a Recorrente é titular, nomeadamente e "澳門XXX" e "XXX貴賓會", não gozam de qualquer visibilidade que as possa classificar como marcas notórias ou de prestígio;
XX. Por outro lado, a notoriedade das marcas constituídas pela expressão XXX e titulada pela Recorrida não tem paralelo com a notoriedade, em Macau e a nível internacional, que a marca XXXE PLAZA de que a ora Recorrente é titular em quase todo o Mundo;
XXI. A marca da ora Recorrente XXXE PLAZA, é certamente mais conhecida do grande público, e certamente dos operadores hoteleiros, como uma marca de referência da hotelaria mundial;
XXII. A ser aceite o entendimento do douto Tribunal a quo, tal entendimento implicaria a invalidade das marcas da Recorrida, face às marcas anteriormente registadas pela Recorrente e outras sociedades constituídas pelas expressões XXXE e XXX;
XXIII. Mas ainda que assim não se entendesse, o que por mera hipótese e dever de patrocínio se concebe, e se considerasse que a marca XXX da Recorrida é dotada de alguma notoriedade, especialmente (e apenas) se considerada conjuntamente com a marca CITY OF DREAMS, ainda assim haveria que considerar que é precisamente essa notoriedade/prestígio que obsta à confusão dos serviços por ela assinalados com os da marca da Recorrente, não existindo, portanto reprodução ou imitação de marca;
XXIV. O objectivo da Recorrente é prosseguir a sua actividade comercial utilizando uma marca para distinguir os seus produtos, não pretendendo, muito pelo contrário, que sejam confundidos ou associados com os comercializados pela Recorrida e não fazer concorrência desleal ou que esta é possível independentemente da sua intenção;
XXV. A marca registanda não é passível de ser confundida com a marca da Recorrente nem é idónea a criar algum tipo de confusão ou risco de associação no espírito dos consumidores;
XXVI. Face ao supra exposto, não se encontram reunidos os pressupostos para o conceito jurídico de imitação nem de concorrência desleal, previstos na alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º e na alínea b) do n.º 1 ou alínea b) do n.º 2 do artigo 214.º do RJPI, e nem para a recusa da marca registanda nos termos previstos naqueles preceitos legais, devendo revogar-se a sentença recorrida mantendo-se, consequentemente o douto despacho da Direcção dos Serviços de Economia.
*
A Recorrida respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 584 a 612 dos autos, cujo teores aqui se dão por integralmente reproduzidos, pugnando pela improcedência do recurso.
*
Foram colhidos os vistos legais.
*
II – Factos
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
1. Em 05 de Março de 2010 a YYY, parte contrária, apresentou o pedido de registo de marca com o número N/4......, para a classe 43, tendo a Direcção dos Serviços de Economia promovido, nos termos do artigo 210.° do RJPI, a publicação do respectivo pedido no Boletim Oficial da RAEM (“B.O.”), II Série, de 21 de Abril de 2010.
2. O registo da Marca da Recorrida veio a ser concedido por despacho da DSE de 10 de Janeiro de 2011, subsequentemente publicado no B.O., II Série, de 02 de Fevereiro de 2011.
3. A Marca Registanda é uma marca nominativa que consiste em:
4. A Marca Registanda pode gráfica e foneticamente traduzir-se para inglês como “XXX Country” e é romanizada como “XXX KOUK”.
5. A Recorrente é titular, entre outras, das seguintes marcas:
N/1...... a N/1...... 澳門XXX Classe: 39, 41 e 42.
6. N/2...... a N/2...... Classes:35, 39, 41e 43
7. N1..., N/1..., N/1... Classes:39, 41 e 42
8. N/2..... a N/2..... Classes:16, 17, 20, 21, 22, 24, 25, 26, 28, 29, 30, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 40, 42, 44 e 45.
9. N1... e N1... Classes:39 e 41
10. N/2...... a N/2...... Classes:16, 17, 18, 20, 21, 22, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 40, 42, 44 e 45.
11. N/1...... e 1...... Classes: 39 e 41.
12. N/1...... e N/1...... Classes:39 e 41.
13. N/2...... a N/2...... Classes:16, 17, 18, 20, 21, 22, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 40, 42, 44 e 45.
14. N/1...... e N/1...... Classes:39 e 41
15. N/1...... e N/1...... Classes:39 e 41
16. N/2...... e N/2...... Classes:35, 39, 41 e 43
17. N/2...... e N/2...... Classes:35, 39, 41 e 43
18. N/2...... Classes:41
19. N/2...... classes: 41
20. Os pedidos relativos às marcas澳門XXX foram apresentados em 05 de Setembro de 2005 e os respectivos despachos de concessão foram publicados no B.O. de 02 de Abril de 2008;
21. Os pedidos relativos às marcas XXX貴賓會foram apresentados em 08 de Maio de 2007 e os respectivos despachos de concessão foram publicados no B.O. de 02 de Abril de 2008;
22. Os pedidos relativos às marcas XXX foram apresentados em 07 de Fevereiro de 1996 e 10 de Julho de 2007 e os respectivos despachos de concessão foram publicados no B.O. de 07 de Agosto de 1996 e 02 de Abril de 2008;
23. Os pedidos relativos às marcas XXX Towers foram apresentados em 07 de Fevereiro de 1996, 01 de Julho de 2007 e 11 de Julho de 2005 e os respectivos despachos de concessão foram publicados no B.O. de 07 de Agosto de 1996, 02 de Abril de 2008 e 07 de Dezembro de 2005;
24. Os pedidos relativos às marcas XXX Macau foram apresentados em 11 de Julho de 2005 e os respectivos despachos de concessão foram publicados no B.O. de 07 de Dezembro de 2005 e 02 de Abril de 2008;
25. Os pedidos relativos às marcas XXX Casino foram apresentados em 11 de Julho de 2005 e os respectivos despachos de concessão foram publicados no B.O. de 02 de Julho de 2008;
26. Os pedidos relativos às marcas XXX VIP Club foram apresentados em 08 de Maio de 2007 e os respectivos despachos de concessão foram publicados no B.O. de 02 de Abril de 2008;
27. Os pedidos relativos às marcas N/2...... a N/2...... foram apresentados em 17 de Abril de 2007 e os respectivos despachos de concessão foram publicados no B.O. de 02 de Abril de 2008; e
28. Os pedidos relativos às marcas N/2...... e N/2...... foram apresentados em 02 de Junho de 2006 e os respectivos despachos de concessão foram publicados no B.O. de 02 de Abril de 2008.
29. O pedido de registo da Marca da Recorrida foi formulado para a classe 43, em particular para “serviços de hotéis, serviços de estalagens, providenciar alojamento; serviços de alojamento temporário; serviços de reservas para hotéis e para outros alojamentos; informação e planeamento de férias relacionados com alojamento; serviços de bar; serviços de clubes nocturnos e salas de “cocktail”; serviços de café, serviços de restaurante e “snack-bar”; serviços de “catering” para providenciar alimentação e bebidas; providenciar instalações para conferências, reuniões e exposições; serviços de “check-in” e “check-out” em hotéis; serviços de informação electrónica relacionados com hotéis; serviços de consultadoria e aconselhamento relacionados com os serviços acima mencionados”.
30. A Recorrente é titular das seguintes:
31. N/1...... (澳門XXX), registada para a classe 42 (da versão da Classificação de Nice em vigor à data do respectivo pedido), nomeadamente para “hotéis, reservas de hotéis, serviços de hotelaria, aluguer de alojamentos temporários, reservas de acomodações e serviço de acomodações; provisão de comidas e bebidas; serviços de salas de cocktails; bares; cafés; snack-bar; restaurantes de sirva-se a si próprio e serviços de restaurantes; serviços de fornecimento de refeições; serviços de hospitalidade; provisão de instalações para exposições; serviços de lavagem e passar a ferro de roupas e porteiro (…)”;
32. N/2...... (XXX貴賓會), registada para a classe 43, em particular para “serviços para fornecer comida, bebida e refeições, catering, preparação de comida, bebida, refeições e refrescos, banquetes e serviços de banquetes, bares e serviços de bares, bistrot e serviços de bistrot, restaurantes e serviços de restaurantes, cafés e serviços de cafés, cafetaria e serviços de cafetaria, cantina e serviços de cantina, snack-bar e serviços de snack-bar, serviços de bares de vinho e bare de vinho, serviços de take away, catering e serviços de catering; preparação de comida, bebida, refeições e de catering para recepções de casamento, serviços de comida rápida, procura e preparo de locais para recepção do casamento, cocktail em recepções e serviços de cocktail em recepções, coffee shop e serviços de coffee shop, cozinha e serviços de cozinha, confecção de comida e serviços de confecção de comida, promoção de infra-estruturas para conferências, exibições e convenções, espaços de restauração, serviços de informação, apoio, assistência, consultadoria e serviços consultivos relacionados”;
33. N/1... (XXX), registada para a classe 42 (da versão da Classificação de Nice em vigor à data do respectivo pedido), em particular para “Serviços de acolhimento e alojamento, fornecimento de alimentos e bebidas, incluindo catering, cafés e restaurantes”;
34. N/2...... (XXX VIP Club), registada para a classe 43, em particular para “serviços para fornecer comida, bebida e refeições, catering, preparação de comida, bebida, refeições e refrescos, banquetes e serviços de banquetes, bares e serviços de bares, bistrot e serviços de bistrot, restaurantes e serviços de restaurantes, cafés e serviços de cafés, cafetaria e serviços de cafetaria, cantina e serviços de cantina, snack-bar e serviços de snack-bar, serviços de bares de vinho e bares de vinho, serviços de take away, catering e serviços de catering; preparação de comida, bebida, refeições e de catering para recepções de casamento, serviços de comida rápida, procura e preparo de locais para recepção do casamento, cocktail em recepções e serviços de cocktail em recepções, coffee shop e serviços de coffee shop, cozinha e serviços de cozinha, confecção de comida e serviços de confecção de comida, promoção de infra-estruturas para conferências, exibições e convenções, espaços de restauração, serviços de informação, apoio, assistência, consultadoria e serviços consultivos relacionados com o antecedente”; e
35. N/2...... (XXX Global Resorts), registada para a classe 43, em particular para “serviços para fornecer comida, bebida e refeições, “catering”, preparação de comida, bebida, refeições e refrescos, banquetes e serviços de banquetes, bares e serviços de bares, “bistrot” e serviços de “bistrot”, restaurantes e serviços de restaurantes, cafés e serviços de cafés, cafetaria e serviços de cafetaria, cantina e serviços de cantina, snack-bar e serviços de snack-bar, serviços de bares de vinho e bares de vinho, serviços de take away, catering e serviços de catering; preparação de comida, bebida, refeições e de catering para recepções de casamento, serviços de comida rápida, procura e preparo de locais para recepção do casamento, cocktail em recepções e serviços de cocktail em recepções, “coffee shop” e serviços de “coffee shop”, cozinha e serviços de cozinha, confecção de comida e serviços de confecção de comida, serviços de alojamento temporário, de hotel, incluindo serviços de reservas de alojamento; promoção de infra-estruturas para conferências, exibições e convenções, espaços de restauração, serviços de informação, apoio, assistência, consultadoria e serviços consultivos relacionados com o antecedente”.
36. Relativamente à comparação entre marcas em língua chinesa, a Marca da Recorrida (XXX国) reproduz a parte essencial das marcas澳門XXX e XXX貴賓會. Com efeito, os caracteres XXX, que significam em português “XXX” (ou, literalmente, “chapéu do imperador”) e, em inglês “XXX”, são comuns às três marcas, diferindo estas apenas nos seus elementos descritivos, respectivamente, 国(“Country”),澳門 (“Macau”) e 貴賓會(“VIP Club”).
37. A parte contrária é titular da marca XXXE PLAZA, também é titular de marca “XXX假日酒店” “金XXX俱樂部”.
*
III - Fundamentação
O Sr. Relator apresentou o projecto do acórdão no sentido de negar provimento ao recurso, confirmando desde modo a sentença recorrida.
No entanto, ficou vencido na votação, pelo que passa o 1º Adjunto a lavrar o presente aresto nos termos do nº 3 do artº 631º do CPCM.
A questão fundamental do presente recurso jurisdicional consiste em saber se a marca registanda (“XXX国”) (XXX KUOK) é ou não uma marca que imita, ou reproduz, ainda parcialmente, as marcas da Recorrida (recorrente na primeira instância).
Olhamos para a marca registanda, o que sobressai desde logo à vista são as duas palavras chinesas “XXX”.
As marcas registadas a favor da ora Recorrida têm as mesmas palavras.
Não temos qualquer dúvida de que aquelas duas palavras constituem parte essencial tanto da marca registanda como das marcas já registadas da ora Recorrida.
Será que a coincidência deste elemento essencial é suficiente para concluir pela existência da imitação ou reprodução da marca já registada?
Este TSI tem decidido no sentido afirmativo (cfr. Ac. de 12/01/2012, Proc. nº 539/2010).
No entanto, cada caso é um caso, pois o elemento essencial nem sempre é válido para todos os casos.
Como é sabido, coexistem na RAEM as marcas de “XXX” e “XXXe Plaza”, ambos em chinês “XXX”, registadas a favor da ora Recorrida e da ora Recorrente, respectivamente.
Como se vê, aquelas duas palavras chinesas não são de uso exclusivo da ora Recorrida, pois a ora Recorrente, na qualidade de titular das marcas registadas e XXX假日酒店, também tem o direito de usá-las.
Nesta medida, não se pode, simplesmente com base no uso daquelas duas palavras chinesas, concluir pela existência da imitação ou reprodução das marcas registadas a favor da ora Recorrida por parte da ora Recorrente.
No mesmo sentido, veja-se os Acs. deste Tribunal, de 14/05/2015 e de 23/06/2016, proferidos nos Procs. nº 239/2015 e 860/2015, respectivamente.
Temos assim de analisar os restantes elementos que compõem a marca registanda.
Além dos dois caracteres chineses “XXX”, a marca registanda apresenta mais uma palavra chinesa “国”.
Esta palavra chinesa não tem qualquer coincidência ou semelhança, quer fonética, quer gráfica, quer nominativa, quer ideológica, com os demais elementos componentes das marcas registadas da ora Recorrida.
Ora, não podendo a partir do simples uso das palavras “XXX” para afirmar a existência da situação de imitação ou reprodução e não tendo os restantes elementos componentes da marca registanda qualquer coincidência ou semelhança com os das marcas registadas da ora Recorrida, o recurso não deixará de se julgar procedente.
Tudo visto, resta decidir.
*
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conceder provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando a sentença recorrida e confirmando a decisão da DSE que concedeu o registo da marca em referência.
*
Custas pela Recorrida em ambas as instâncias.
Notifique e registe.
*
RAEM, aos 01 de Fevereiro de 2018.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Fong Man Chong
(com declaração de voto vencido)
(Processo n.º 689/2017)
Declaração de voto
Elaborei o projecto de acórdão no sentido da confirmação da sentença proferida pelo Mmo Juiz do tribunal de primeira instância (TBJ).
Com todo o respeito pela opinião contrária, não acompanho a elaborada posição que ora fez vencimento, por razões a seguir indicadas:
1) À luz do disposto no artigo 215° do RJPI, há reprodução ou imitação de uma marca quando se verificam, cumulativamente, os seguintes requisitos:
a) - A marca registada tem prioridade;
b) – As marcas em causa são ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins; e
c) - A semelhança verifica-se quando ela é susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão, que compreende um risco de associação, de forma tal que o consumidor não consiga distingui-las senão depois de exame atento ou confronto.
2) - A imitação ou a confundibilidade pressupõem, um confronto, de modo a que se possa concluir, ou não, sobre se os produtos que as marcas assinalam são idênticos ou afins, ou despertam, pela semelhança dos seus elementos, a possibilidade de associação a outros produtos ou marcas já existentes no mercado. Esse confronto não demanda, da parte do consumidor, especiais qualidades de perspicácia, subtileza ou atenção, já que, no frenético universo do consumo, o padrão é o consumidor médio, razoavelmente informado, mas não particularmente atento às especificidades próprias das marcas.
3) - Daí que a imitação deva ser apreciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca, e não pelas diferenças que poderiam oferecer os diversos pormenores considerados isolados e separadamente.
4) – Como escreve o Dr. Coutinho de Abreu:
“(...) O risco de confusão deve ser entendido em sentido lato, de modo a abarcar tanto o risco de confusão em sentido estrito ou próprio como o risco de associação.
Verifica-se o primeiro quando os consumidores podem ser induzidos a tomar uma marca por outra e, consequentemente, um produto por outro (os consumidores crêem erroneamente tratar-se da mesma marca e do mesmo produto).
Verifica-se o segundo quando os consumidores, distinguindo embora os sinais, ligam um ao outro e, em consequência, um produto ao outro (crêem erroneamente tratar-se de marcas e produtos imputáveis a sujeitos com relações de coligação ou licença, ou tratar-se de marcas comunicando análogas qualidades dos produtos)” (in “Boletim da Faculdade de Direito”, Vol. LXXIII, 1997, pág. 145, em estudo sobre as "Marcas (Noções, Espécies, Funções, Princípios Constituintes).
O Prof. Ferrer Correia ensinava:
“(...) A imitação de uma marca por outra existirá, obviamente, quando postas em confronto, elas se confundam. Mas existirá ainda, convém sublinhá-lo, quando, tendo-se em vista apenas a marca a constituir, se deva concluir que é susceptível de ser tomada por outra de que se· tenha conhecimento. Este processo de aferição da novidade é o que melhor tutela o interesse que a lei visa proteger - o interesse em que se não confundam, através da marca, mercadorias idênticas ou afins pertencentes a empresários diferentes”.
"(...) o consumidor quando compra determinado produto marcado com um sinal semelhante a outro que já conhecia, não tem à vista (em regra) as duas marcas, para fazer delas um exame comparativo. Compra o produto por se ter convencido de que a marca que o assinala é aquela que retinha na memória" (in Lições de Direito Comercial, Vol. I, pág. 329).
Neste sentido, em termo de direito comparado, atente-se ainda no seguinte aresto do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 17.04.2008 (www.dgsi.pt, Processo n.º 08A375), que concluiu em sentido consonante:
"Pode dizer-se que uma certa marca é imitação de outra adoptada para o mesmo produto ou para produto semelhante quando, postas em confronto, elas se confundem, mas também quando, tendo-se à vista apenas uma delas, se deve concluir que ela é susceptível de ser tomada, pelo consumidor médio, por outra de que ele tenha conhecimento.
A imitação não implica necessariamente uma cópia, ou seja, igualdade total, podendo ser parcial e pressupondo então a existência simultânea de elementos diferentes e de elementos comuns. O que importa é verificar se, neste caso, os elementos diferentes possibilitam que a marca possua, no seu conjunto, capacidade ou eficácia distintiva, pois, não acontecendo tal, isto é, sendo a semelhança com a outra tão grande que possa determinar a confusão entre as duas, deve considerar-se verificada a existência de imitação".
5) – Ora, é de realçar que a marca registanda XXX國 (XXX KOUK / XXX COUNTRY) é apenas uma marca nominativa, isto é, para além do nome, não há sequer outro desenho ou gráfico que permita fazer a sua caracterização.
Para apurar se existe ou não risco de confusão e/ou de associação entre as marcas em crise, atente-se em particular nas marcas XXX貴賓會 e 澳門XXX (XXX Kuai Pan Wui / XXX VIP Club e Ou Mun XXX / XXX Macau) e o que resulta do seu confronto com a marca registanda XXX國 (XXX KOUK / XXX COUNTRY), os caracteres XXX, que significam "XXX", são comuns às três marcas, diferindo estas apenas nos seus elementos descritivos, respectivamente, XYZ軒 ("XYZ Hall"), 澳門 ("Macau") e 貴賓會 ("VIP Club").
6) - O elemento 國 não é suficiente para conferir capacidade distintiva adicional à expressão XXX que é, de facto, o núcleo essencial das marcas em crise e, em geral, das Marcas XXX, assim, a marca registanda não só é confundível por conter o núcleo das marcas XXX (XXX) como em virtude de o caracter sobrante evocar uma indicação geográfica (國), passível de ser manifestamente confundido ou associado às marcas da Recorrida e à marca 澳門XXX (XXX Macau) em particular.
7) - O critério passa pois por um juízo global acerca de vários aspectos comercialmente relevantes. Ora, comparados, sob a perspectiva dos referidos aspectos, os bens que a marca registanda N/4...... se destina a assinalar “Serviços de hotéis, serviços de estalagens, providenciar alojamento; serviços de alojamento temporário; serviços de reservas para hotéis e para outros alojamentos; informação e planeamento de férias relacionados com alojamento; serviços de bar; serviços de clubes nocturnos e salas de "cocktail"; serviços de café, serviços de restaurante e "snack-bar"; serviços de "catering" para providenciar alimentação e bebidas; providenciar instalações para conferências, reuniões e exposições; serviços de "check-in" e "check-out" em hotéis; serviços de informação electrónica relacionados com hotéis; serviços de consultadoria e aconselhamento relacionados com os serviços acima mencionados.”
Afigura-se que se trata de bens e serviços idênticos ou afins quanto à natureza, à composição, à finalidade, aos circuitos comerciais e canais de distribuição usados das marcas da recorrente designadamente N N/1...... a N/1......, N/2...... a N/2......, N/2..... a N/2....., N/2...... e N/2.......
8) - Ora, um consumidor médio ao reparar nessa marca, o que ressalta em primeira vista é a fonética de XXX国 (XXX KUOK), que é, senão idêntica à marca 澳門XXX ou XXX da recorrente, é também semelhante a ela. É que, a fonética KUOK ou a palavra 国, de per si, não reúne capacidade distintiva, nos termos do artigo 199.° n.° 1 b), uma vez que se refere pura e simplesmente à menção geográfica.
Por outro lado, a recorrente é titular da marca N/1...... a N/1......澳門XXX (XXX de Macau), que para além da expressão XXX, contém um elemento geográfico Macau 澳門.
Ora, como a marca registanda é para ser usada em Macau, a palavra国 (que significa país, lugar ou terreno) e a ser usada em Macau, pode, efectivamente, criar confusão com a marca registada澳門XXX da recorrente. Esse risco de confusão é alta e considerando a função protectora das marcas, não nos pode olvidar a existência desse risco.
Podemos citar como exemplo a palavra LISBOA. Hoje em dia, provavelmente em Macau, a palavra Lisboa não será apreendida por grande número de turistas como o nome de uma cidade ou uma capital, como se passaria há umas dezenas anos atrás, pois o sinal passa a ser apreendido com uma significação diferente da descritiva originária, mas desta vez distintiva.
9) - A jurisprudência local tem entendido que, para haver imitação, a marca deve ter semelhança gráfica, figurativa ou fonética com outra registada que induza em erro ou confusão o consumidor, não podendo este distinguir as duas senão depois de exame ou confronto, face àquilo que a marca representa no mercado: a função de garantia de qualidade não enganosa, visando associar um produto ou serviço a determinado produtor ou prestador de serviço e evitar no consumidor o erro e a confundibilidade de origem e proveniência. Ou seja, o que releva é a semelhança que resulte do conjunto de elementos das marcas em causa e não as dissemelhanças entre elementos de cada uma, vistos isoladamente ou em separado (Proc n° 226/2014 do TSJ).
10) - Uma vez verificados os respectivos pressupostos, reconhecendo o Tribunal (i) a antiguidade das marcas da Recorrida, (ii) a identidade ou afinidade dos produtos e serviços para os quais as marcas em confronto se referem, e (iii) a susceptibilidade de induzir o público em erro em virtude da semelhança entre as marcas em confronto, deve proceder-se à revogação do despacho da DSE que autorizou o registo da marca XXX國(XXX KUOK).
É este, com a devida vénia, nos aspectos essenciais, o sentido da minha declaração de voto vencido.
*
Macau, 1 de Fevereiro de 2018.
_________________
Fong Man Chong
689/2017 8