Processo n.º 1029/2017 Data do acórdão: 2018-3-1
(Autos em recurso penal)
Assuntos:
– erro notório na apreciação da prova
– art.o 400.o, n.o 2, alínea c), do Código de Processo Penal
– atenuação especial da pena
– art.o 66.o, n.o 1, do Código Penal
S U M Á R I O
1. A decisão condenatória penal ora recorrida não padece do vício de erro notório na apreciação da prova aludido no art.o 400.o, n.o 2, alínea c), do Código de Processo Penal, quando não se vislumbra qualquer violação, por parte do tribunal a quo, de alguma norma jurídica sobre o valor legal das provas, de alguma regra da experiência da vida humana quotidiana, ou ainda de quaisquer leges artis, na tarefa de julgamento da matéria de facto.
2. Não se pode atenuar especialmente a pena, quando há que aplicar a pena na sua moldura penal normal, consideradas as circunstâncias concretas da sua prática pelo arguido recorrente (cfr. o critério material previsto no n.o 1 do art.o 66.o do Código Penal para activação, ou não, do mecanismo de atenuação especial da pena).
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 1029/2017
(Autos de recurso penal)
Recorrente (arguido): A (A)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com a sentença proferida a fls. 300 a 307v do Processo Comum Singular n.° CR4-17-0013-PCS do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base que o condenou como autor material de um crime tentado de coacção, p. e p. pelo art.o 148.o, n.os 1 e 2, do Código Penal (CP), em quatro meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano e seis meses, veio o arguido A, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), imputando a essa decisão condenatória o vício de “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada” (por entender ele, na sua essência, que com base nas declarações da ofendida era difícil dar por provada a matéria de facto descrita como provada na sentença recorrida, para além de que do conteúdo das conversações mantidas entre ele e a ofendida em aplicação de comunicação em telemóvel não resultava que a ofendida sentisse medo ou se encontrasse coagida, pelo que não se poderia dar por provada a execução dos actos, por parte do próprio recorrente, de ameaça contra a ofendida, não bastando, assim, a matéria de facto ali descrita por provada para sustentar o dolo dele na prática do crime por que vinha condenado), para pedir a sua absolvição do crime tentado de coacção, sem deixar de pedir, subsidiariamente, como um delinquente primário, a atenuação especial da sua pena, a aplicação da multa em detrimento da pena de prisão, ou, fosse como fosse, a redução da pena (cfr. com mais detalhes, a motivação do recurso apresentada a fls. 316 a 319 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso, respondeu o Ministério Público (a fls. 321 a 327v) no sentido de manutenção do julgado.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 336 a 337v), pugnando também pela improcedência do recurso.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se que a sentença recorrida se encontra proferida a fls. 300 a 307v dos autos, cuja fundamentação fáctica (incluindo a probatória) e jurídica se dá por aqui integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
É de notar, de antemão, que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Começou o recorrente por assacar à decisão condenatória recorrida o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, como tal nominado no art.o 400.o, n.o 2, alínea a), do Código de Processo Penal (CPP).
Contudo, a argumentação concretamente tecida por ele para sustentar a verificação desse vício não tem a ver com esse vício, mas sim está no foro do vício de erro notório na apreciação da prova aludido na alínea c) do n.o 2 do mesmo art.o 400.o.
Pois bem, vista a fundamentação probatória exposta pelo Tribunal a quo na sentença recorrida, é patente que esse Tribunal não errou notoriamente na apreciação da prova, ao dar por provados os factos já descritos como provados no texto da sentença proferida. É que, de facto, não se vislumbra qualquer violação, por parte desse Tribunal a quo, de alguma norma jurídica sobre o valor legal das provas, de alguma regra da experiência da vida humana quotidiana, ou ainda de quaisquer leges artis vigentes na tarefa de julgamento da matéria de facto. Antes pelo contrário, é perfeitamente razoável, lógico e congruente o raciocínio do Tribunal sentenciador na formação da sua livre convicção sobre os factos, sob aval do art.o 114.o do CPP. Não pode, pois, vir o recorrente fazer impor o seu ponto de vista pessoal sobre o julgamento dos factos.
E sobre a problemática da medida da pena: desde já, não se pode atenuar especialmente a pena, porquanto há que aplicar a pena do cirme de coacção tentada na sua moldura penal normal, consideradas as circunstâncias concretas da sua prática pelo arguido recorrente (já minuciosamente descritas na fundamentação fáctica da sentença recorrida, da qual ressalta que se trata de um caso que tem a ver com a ameaça de divulgação de fotografias e videogramas de foro sexual) (cfr. o critério material previsto no n.o 1 do art.o 66.o do CP para activação, ou não, do mecanismo de atenuação especial da pena); também não se pode optar por pena de multa em detrimento da de prisão em sede do art.o 64.o do CP, por se considerar que a multa não consiga realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição na vertente de prevenção geral deste tipo de conduta delituosa; e no respeitante à também rogada redução da pena nos termos gerais: vista a moldura da pena de prisão do crime de coacção tentada, e atentos os padrões da medida da pena nomeadamente plasmados nos art.os 40.º, n.os 1 e 2, e 65.º, n.os 1 e 2, do CP, a pena de prisão já achada no aresto recorrido para este crime à luz de todos os ingredientes fácticos aí apurados já não admite mais redução.
Em suma, é de manter o julgado, por estar já cabalmente verificado o tipo-de-ilícito (objectivo e subjectivo) do crime de coacção tentada.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pelo arguido, com quatro UC de taxa de justiça.
O presente acórdão é irrecorrível nos termos do art.o 390.o, n.o 1, alínea f), do Código de Processo Penal.
Comunique a presente decisão ao Senhor Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública.
Macau, Primeiro de Março de 2018.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
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