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Tribunal Judicial de Base da Região Administrativa Especial de Macau
3.º Juízo Cível
Acção Ordinária n.º CV3-15-0103-CAO



S E N T E N Ç A
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I) RELATÓRIO
   A (甲), titular do bilhete do RPC nºXXXXXXXXXXXXXXXXXX, residente na [地址(1)], vem intentar a presente

   ACÇÃO ORDINÁRIA contra

   “B” Entretenimento Sociedade Unipessoal Limitada (乙娛樂一人有限公司) , registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º XXXXX(SO), com sede em Macau, na [Endereço (2)]; e
   “C” Resorts (Macau) S.A. (丙渡假村(澳門)股份有限公司) , registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º XXXXX(SO), com sede em Macau, na [Endereço (3)], Hotel “C”.
   
   com os fundamentos apresentados constantes da p.i., de fls. 2 a 6.
   Concluiu pedindo que seja julgada procedente por provada, e em consequência:
   a) 第一被告及第二被告須以連帶責任的方式向原告返還價值港幣陸佰萬元正的現金籌碼或等值的現金款項;
   b) 第一被告及第二被告須以連帶責任的方式向原告支付自2015年9月22日起,截至全數清還所有債務之日並以法定利率9.75%計算的利; 及
   c) 各被告須支付所有因本訴訟而產生的訴訟費用及律師代理費.
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   Os Réus contestaram, respectivamente, com os fundamentos constantes de fls. 73 a 76 e 55 a 71 dos autos, ambas impugnaram os factos articulados pelo Autor, tendo a 1ª Ré excepcionado que o depósito alegado pelo Autor foi feito e aceite pela sua funcionária D sem para qual foi autorizada pela 1ª Ré nem com o seu conhecimento, negando ter qualquer responsabilidade pela devolução dessa quantia entregue, e, a 2ª Ré refutou que o depósito das fichas alegados elo Autor não faz parte da actividade típica de promoção de jogo, não se entendendo que deverá, como concessionária, assumir, solidariamente, a responsabilidade da 1ª Ré.
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   Saneados os autos no saneador, e em seguida, foram seleccionados factos considerados assentes e os factos que se integram na base instrutória.
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Realiza-se a audiência de discussão e julgamento por Tribunal Colectivo de acordo com o formalismo legal.
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   O Tribunal é competente em razão da matéria, da hierarquia e internacionalmente e o processo é próprio.
   As partes gozam de personalidade e capacidade jurídicas e são legítimas.
   Não existem excepções, nulidades ou outras questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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II) FACTOS
   Dos autos resulta assente a seguinte factualidade com interesse para a decisão da causa:
   Da Matéria de Facto Assente:
- 2006年6月24日,第二被告丙渡假村(澳門)股份有限公司以承批人身份與澳門特別行政區簽訂了一份關於澳門特別行政區娛樂場幸運博彩或其他方式的博彩經營批給合同(參見2002年第27期特區公報),並成為了娛樂場幸運博彩的承批公司(以下簡稱“承批公司”)。(alínea A) dos factos assentes)
- 其後,經第二被告許可及同意下,第一被告成為了第二被告旗下丙娛樂場中的娛樂場幸運博彩中介人(以下簡稱“博彩中介人”)。 (alínea B) dos factos assentes)
- 而第一被告為從事其博彩中介業務,經第二被告批准及同意下,於丙娛樂場開設了一名為“乙貴賓會”的貴賓廳/賭廳。(alínea C) dos factos assentes)
- 經第二被告許可及同意下,第一被告在“乙貴賓會”內設置了獨立帳房以免費供其會員兌換、寄存及提取籌碼,以及為會員提供各種的便利。(alínea D) dos factos assentes)
- 由2014年9月至2015年3月期間,第一被告僅有單一股東及行政管理機關成員戊(E)先生。(alínea E) dos factos assentes)
   
   Da Base Instrutória:
- Em Junho de 2015, o Autor entregou a Sra. D, uma quantia de HK$6.000.000,00 em fichas vivas para depositar na “sala VIP “B”” operada pela 1ª Ré, no casino “C”. (resposta ao quesito 2º da base instrutória)
- A Sra. D assinou como sendo a 1ª Ré em nome da “sala VIP “B”” e emitiu a favor do Autor um talão de depósito de fichas, dele constando o carimbo usado pela 1ª Ré para confirmação. (resposta ao quesito 3º da base instrutória)
- Em Setembro de 2015, o Autor e seu amigo dirigiram-se à “sala VIP “B”” para pedir o levantamento das fichas vivas ali depositadas, mas o seu pagamento foi recusado pela 1ª Ré. (resposta ao quesito 4º da base instrutória)
- 原告及其受託人/受權人亦多次前往“乙貴賓會”要求提取寄存之籌碼,但都同樣被相關職員拒絕。(resposta ao quesito 5º da base instrutória)
- A 2ª Ré, sendo Sociedade Concessionária, permite a aceitação do depósito de fichas de jogos no casino “C”, (“sala VIP “B””) por parte dos membros desta. (resposta ao quesito 6 da base instrutória)
- D desempenhava o cargo de supervisora geral da “sala VIP “B”” da 1ª Ré, sendo responsável pelo trabalho de estabelecer contactos, atender clientes e efectuar o supervisionamento sobre o funcionamento da tesouraria, conferir e verificar os livros da contabilidade, bem como exercer a coordenação e executar tarefas relacionadas com o funcionamento diário da “sala VIP “B””. (resposta ao quesito 7º da base instrutória)
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III) FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
   Cumpre analisar os factos e aplicar o direito.
   Com a presente acção, pretendeu o Autor que seja indemnizado pelas Rés do montante de HKD$6.000.000,00, com os respectivos juros moratórios, alegando que era membro da sala VIP “B” explorado pela 1ª Ré, tendo depositado as fichas vivas no valor de HKD$6.000.000,00 até Junho de 2015, tendo esta emitido um talão de depósito com assinatura da sua funcionária e carimbo daquela sala VIP. No dia 21 de Setembro de 2015, o Autor pretendeu levantar as fichas vivias depositadas mas foi recusado pela 1ª Ré, entendendo o Autor que 1ª Ré, na qualidade de depositário, tem a obrigação da restituição dessa quantia e tem também a 2ª Ré a obrigação solidária pela restituição, por ser esta concessionária de jogo e nessa qualidade, ter acordado com a 1ª Ré para que esta prestasse actividade de promoção de jogo no seu casino, tendo a 2ª Ré a obrigação de fiscalizar a actividade da 1ª Ré, assumindo igualmente responsabilidade de indemnizar aos terceiros os danos causados pelos actos da 1ª Ré, ao abrigo do disposto do art° 29° e 31° do Regulamento Administrativo n°6/2002.
   Contestando a 1ª Ré que as fichas vivas alegadas pelo Autor não foram recebidas ou depositadas na tesouraria da sua sala VIP explorada por ela e que o talão de depósito foi emitida pela ex-funcionária D sem autorização e conhecimento dela, no abuso das funções desempenhas na 1ª Ré, entendendo que não tem a obrigação de pagar ou restituir qualquer quantia ao Autor.
   Enquanto a 2ª Ré pugnou que as fichas vivas com o valor de HK$6.000.000,00 reclamado pelo Autor foi investimento feito pelo mesmo junto da 1ª Ré com vista a obter remuneração oferecida por esta, a qual terá recorrido a fundos do público para financiar a concessão de crédito a clientes para jogo, actividade essa que não constituirá actividade normalmente desenvolvida pelo promotor de jogo no casino, sendo assim, negócio jurídico celebrado entre o Autor e a 1ª Ré, não está sujeito ao controlo das normas regulamentares do ramo da indústria para jogo, pelo que não deverá responsabilizar na restituição da quantia ao Autor.
   
   Acto praticado pela funcionária da 1ª Ré- Abuso de poderes
   O Autor alegou que depositou as fichas vivas no valor de HKD6.000.000,00 na sala VIP “B”, tendo este emitido um talão de depósito.
   Defendeu a 1ª Ré que ela só é vinculada pelos documentos assinados pelo titular do órgão de administração, E, a D não tem o poder de praticar o acto jurídico em representação da 1ª Ré nem o poder de receber do cliente dinheiro ou fichas vivas e que a D terá subtraído o livro de registo de depósito das fichas de jogo da 1ª Ré e emitido ao Autor o talão da prova do depósito.
   Conforme os factos tidos por assentes, está comprovado que o Autor entregou a D, na “Sala VIP “B”” da 1ª Ré uma quantia de HKD$6.000.000,00 em fichas vivas.
   Para determinar se houve depósito das fichas vivas alegadas pelo Autor na “sala VIP “B”” da 1ª Ré, urge saber se a D estava a agir em nome da 1ª Ré ou aparentemente em nome da 1ª Ré em abuso dos poderes a ela atribuídos tem repercussão jurídica sobre a 1ª Ré.
   Para já, consigna-se que as matérias excepcionais alegadas pela 1ª Ré relativa aos factos de não ser função da D a praticar acto jurídico em representação da 1ª Ré ou o recebimento de qualquer valor de depósito ou fichas vivas do cliente da sala VIP, assim como a D subtraiu os livros de registo de depósito de fichas de jogo da 1ª Ré e passou ao Autor o talão de depósito de fichas em discussão não ficaram provados. (resposta aos quesitos 7° e 8°)
   Sem qualquer suporte fáctico, fica, logo, excluída a hipótese de D ter actuado, ao receber e aceitar o depósito das fichas do cliente da sala VIP, nesse caso concreto do Autor, fora das funções a ela incumbidas pela 1ª Ré nem se permite concluir que ela agiu sem conhecimento, consentimento, autorização da 1ª Ré.
   
   Efeito do acto praticado pela D em relação à 1ª Ré
   O Autor sustentou, nas alegações, que a D era gerente da sala VIP “B”, pelo que a 1ª Ré é responsável pelo acto praticado por aquela.
   Nos termos do art°64° do Código Comercial, “É gerente aquele que, sob qualquer designação, consoante os usos comerciais, é proposto pelo empresário comercial para o exercício da empresa.”
A D não tinha o título da gerente. Mas a designação não é essencial para determinar se ela é considerada como gerente ou não da sala VIP, o que releva se é o trabalho a que foi incumbido, isto é, se ela foi proposta para o exercício da sala VIP.
   Fazia parte das funções da D o supervisionamento sobre o funcionamento da tesouraria e a coordenação do funcionamento diário da sala VIP, sendo ela responsável pelo trabalho de estabelecer contactos, atender clientes e conferir e verificar os livros da contabilidade.
   Da factualidade apurada parece que a D desempenhava um cargo relevante no funcionamento da sala VIP “B”, particularmente na área da tesouraria, mas dúvidas ainda subsistem se ela era apenas a responsável de facto do funcionamento da sala VIP, ficando sujeito às instruções do administrador da 1ª Ré no que tocante ao funcionamento da empresa ou tinha ela mesmo poderes mais amplos no exercício da empresa, pelo que não se achamos que ela poderá ser considerada como gerente da 1ª Ré.
   
   Não obstante, é facto inegável que a D era empregada da 1ª Ré e que lhe incumbiu para o supervisionamento da tesouraria.
   A quantia que o Autor reclama foi recebida pela D no âmbito das tarefas incumbidas pela 1ª Ré.
   Ainda que se não tenha incluído na matéria de factos, dos autos resulta que a 1ª Ré é uma sociedade unipessoal, que tem por objecto a promoção de jogo, facto que se retira da certidão do registo comercial constante de fls. 10 a 17.
   Em termos gerais, as pessoas colectivas respondem civilmente pelos actos ou omissões dos titulares dos seus órgãos e dos seus agentes, procuradores ou mandatários nos mesmos termos em que os comitentes respondem pelos actos ou omissões dos seus comissários. (art°152° do C.C.)
   Dispõe-se o art°493° do C.C.:
   “1. Aquele que encarrega outrem de qualquer comissão responde, independentemente de culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar.
   2. A responsabilidade do comitente só existe se o facto danoso for praticado pelo comissário, ainda que intencionalmente ou contra as instruções daquele, no exercício da função que lhe foi confiada.”
   A comissão pressupõe uma relação de dependência entre o comitente e o comissário, que autorize aquele a dar ordens ou instruções a este, pois só essa possibilidade de direcção é capaz de justificar a responsabilidade do primeiro pelos actos do segundo.
   No caso em apreço, a 1ª Ré foi autorizada pela 2ª Ré para exercer actividade de promoção de jogo junto do casino explorado por esta e permitida pela mesma a instalação da sala VIP “B” no casino “C”, tendo aquela instalado tesouraria para prestar o serviço de depósito e levantamento das fichas de jogo junto dos seus membros.
   O depósito e levantamento das fichas de jogo é uma prática habitual da sala VIP. A D era empregada recrutada pela 1ª Ré, que lhe encarregou pelo funcionamento da referida sala VIP.
   Assim, a aceitação do depósito das fichas e jogo e a passagem de talão de depósito pela D na sala VIP fazia parte das funções ordinárias a ela incumbidas pela 1ª Ré.
   A Autor entregou à D na sala VIP “B” a quantia de HKD$6.000.000,00, esta passou-lhe um talão de depósito de fichas em nome da sala VIP “B”, nele constante ainda o carimbo usado pela 1ª Ré para confirmação. Não temos dúvidas que a D, sendo funcionária da 1ª Ré e no exercício das funções a ela incumbidas, estava a agir em nome da 1ª Ré.
   Todo o comportamento da D criou a aparência de que ela recebeu as fichas do Autora em nome e representação da 1ª Ré.
“A sociedade é uma abstracção. Apenas a confiança que os particulares tenham na sua consistência e na funcionalidade das normas que a rodeiam permite a operacionalidade do sistema.” (Menezes Cordeiro, in Manuel de direito das Sociedades I, 2004, pg. 185)
Vigoram no direito civil os princípios de tutela da aparência e da confiança, segundo os quais quem incute, pela sua actividade e comportamento nas relações jurídicas, expectativas de confiabilidade e segurança, deve arcar com as consequências da frustração desses valores.
Portanto, a 1ª Ré, como qualquer outra sociedade, carece de elemento pessoal, agentes, auxiliares ou colaboradores, para a prática dos actos materiais, tendo aquela tirado proveito dessa situação, não pode exonerar-se da sua responsabilidade pelo acto praticado pelo seu pessoal, ainda que este tivesse actuado contra a sua instrução.
Tendo o Autor confiado na D, que se apresentou na qualidade de supervisor geral da sala VIP, entregou-lhe as fichas vivas para o efeito de depósito e recebeu da mão dela o talão de depósito com o carimbo da 1ª Ré, como se fosse a própria 1ª Ré actuasse, a confiança essa criada pela própria 1ª Ré merece da tutela.
Ademais, diz-se o art°789° do C.C., que “O devedor é responsável perante o credor pelos actos dos seus representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados pelo próprio devedor.”
No caso em apreço, a D, na qualidade da funcionária da 1ª Ré aceitou as fichas vivas do Autor, o acto praticado pela D produz efeito em relação à 1ª Ré, como se fosse praticado por ela própria.
Nestes termos, a relação jurídica foi estabelecida entre o Autor e 1ª Ré e não entre o Autor e D, pois esta actuou como seu auxiliar ou representante, a 1ª Ré é responsável pelo acto praticado pela sua funcionária D.
Dispõe-se o art°1111° do C.C., “Depósito é o contrato pelo qual uma das partes entrega à outra uma coisa, móvel ou imóvel, para que o guarde, e a restitua quando for exigida.”
Pelo que, entre o Autor e a 1ª Ré existe um contrato de depósito, em que sobre o depositário recaia a obrigação de restituir a coisa entregue.
Assim, tem a 1ª Ré a obrigação de restituir o valor em HKD$6.000.000,00 ao Autor.

Juros de mora
Para além da quantia depositada, peticiona o Autor ainda os juros moratórios contados a partir de 21/09/2015.
Não consta dos factos assentes qualquer prazo estipulado pelas partes para a restituição da quantia depositada, pelo que a 1ª Ré tem o dever de a restituir quando for exigido.
Nos termos do art°793° do C.C., “1. A simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor 2. O devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido.”
Preceitua-se o n°1 do art°794° do C.C., “O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.
2. Há, porém, mora do devedor, independentemente de interpelação:
a) Se a obrigação tiver prazo certo;
b) Se a obrigação provier de facto ilícito; ou
c) Se o próprio devedor impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste caso, na data em que normalmente o teria sido.”
“A mora é o atraso culposo no cumprimento da obrigação. O devedor incorre em mora, quando, por causa que lhe seja imputável, não realiza a prestação no tempo devido, continuando a prestação a ser ainda possível.” (Antunes Varelas, in Das Obrigações em geral, Vol. II. ,pag. 112)
Para que haja mora, carece de reclamação por parte do credor do cumprimento das obrigações, excepto dos casos dispensados por lei. A interpelação extrajudicial pode ser feita por qualquer via.
De acordo com o disposto do n°1 e 2 do art°795° do C.C. e a ordem executiva n°29/2006 de 6 de Julho, por se tratar de obrigação pecuniária, a indemnização corresponde ao juros à taxa de 9.75% a contar do dia da constituição em mora.
No caso sub judice, ficou apurada que, em Setembro de 2015, o Autor solicitou ao levantamento das fichas depositadas na sala VIP “B”, mas foi recusado pela 1ª Ré. Posteriormente, o Autor foi, várias vezes, a respectiva sala VIP, exigindo à restituição das fichas vivas, também foi recusado.
Daí se resulta que já houve reclamação, por várias vezes, do cumprimento da obrigação por parte do credor, a Ré encontrou-se em mora desde a primeira interpelação ocorrida em Setembro de 2015.
Porém, não foi apurado o dia exacto do mês de Setembro em que o Autor fez a interpelação, os juros de mora não podem ser contados a partir de 15 de Setembro como pretendeu o Autor.
Na incerteza do dia em qua ocorreu a interpelação, facto que cabe ao Autor o ónus de provar, assim, apenas podemos ter como interpelado o último dia de Setembro de 2015, a partir do qual se conta os juros de mora.

Responsabilidade da 2ª Ré
Entende o Autora que a 2ª Ré tem igualmente a responsabilidade de lhe indemnizar o montante reclamado quer por esta não ter cumprido o dever de fiscalização imposto pela alínea 5) do art°30° do Regulamento Administrativo n°6/2002, quer por ter de assumir solidariamente a obrigação com a 1ª Ré ao abrigo do art°29° do mesmo diploma.

Estatui-se o art°29° do R.A. n°6/2002 “As concessionárias são responsáveis solidariamente com os promotores de jogo pela actividade desenvolvida nos casinos pelos promotores de jogo e administradores e colaboradores destes, bem como pelo cumprimento, por parte dos mesmos, das normais legais e regulamentares aplicáveis.”
Argumenta a 2ª Ré que as concessionárias não são responsáveis solidariamente com os promotores de jogo por qualquer obrigação assumidas por estes, sem distinção de ela ter ou não conexão com a actividade de promoção de jogo. O âmbito de aplicação dessa norma deverá restringir-se à actividade tipicamente desenvolvidas pelos promotores de jogo no casino e não a todos aos actos praticados pelos mesmos.
Importa determinar qual será a boa interpretação do normativo em crise.
Dispõe-se o art°8°, n° 1do C.C., “A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”
Da letra da lei, refere-se apenas “pela actividade desenvolvida nos casinos pelos promotores de jogo e administradores…..”, não havendo qualquer limitação do âmbito da actividade explorada pelo promotor de jogo.
Aliás, conforme o disposto do art°1 do referido regulamento administrativo, este tem por âmbito a regulamentação das condições do acesso ao exercício da actividade de promoção de jogos de fortuna ou azar em casino, isto é, a qualificações dos promotores de jogo e, as obrigações a assumir pelos promotores de jogo.
Entende-se por actividade de promoção de jogos de fortuna ou azar em casino a actividade que visa promover jogos de fortuna ou azar ou outros jogos em casino, junto de jogadores, através da atribuição de facilidades, nomeadamente de transporte, alojamento, alimentação e entretenimento, em contrapartida de um comissão ou outra remuneração paga por uma concessionária. (art°2 ° do RA)
Como é consabido, a actividade de promoção de jogo é componente essencial na ecologia de jogo de RAEM, a principal função dos promotores de jogo é angariar clientes para jogar nos casinos duma concessionária, sendo uma das condições do acesso ao exercício da actividade de promoção de jogo o registo junto de uma das concessionárias.
A exploração da actividade de promoção de jogo está condicionada com à autorização das concessionárias ou subconcessionárias. Razão pela qual as concessionárias têm que apresentar uma lista dos promotores de jogo que vai operar no seu casino ao D.I.C.J por cada ano. (art°23°, n°5 da Lei n°16/2001)
Porquê o nosso legislador impende sobre as concessionárias o dever de fiscalização da actividade de promotores de jogo e exige-lhes a responsabilizar solidariamente por actividade desenvolvida por estes no casino.
Parece ser pacífico que não existe entre os promotores de jogo e concessionárias uma relação de dependência, a actividade de promoção de jogo prestada pelos promotores de jogo não está sujeita às ordens ou instruções das concessionárias. A relação entre elas não é considerada como comitente e comissário.
Sendo certo que a actividade prestada pelos promotores de jogo é em benefício das concessionárias, pois todas as facilidades prestadas pelos promotores de jogo aos clientes/jogadores têm o único fim de estes jogarem no casino das concessionárias, a partir daí estas poderão obter lucros.
As concessionárias gozam do direito exclusivo de explorar os casinos, os seus proveitos principais provém dos jogadores que façam aposta de jogo e azar nos seus casinos. A procura dos jogadores a jogar no casino é relevante para que as concessionárias obtenham lucros da exploração de jogo.
O legislador não ignora o papel desempenhado pelos promotores de jogo na exploração de jogo de fortuna ou azar, assim, no momento da regulamentação do regime jurídico da exploração de jogos de fortuna ou azar em casino prevista pela Lei n° 16/2001, tem previsto a figura dos promotores de jogo no seu art°2, permitindo as concessionárias, em vez de angariar por si próprias os clientes para jogar, a serem colaborados por terceiros, por escolha sua. Os promotores de jogo são, sob essa perspectiva, colaboradores ou auxiliares das concessionárias. É justamente por essa relação especial entre as concessionárias e promotores de jogo, o legislador exige àquelas a responsabilidade solidária pelas actividades desenvolvidas no casino pelos dos promotores jogos.
Julgamos essa opção legislativa baseia-se na ideia semelhante da responsabilidade objectiva
As concessionárias beneficiam directamente das actividades promovidas pelos promotores de jogo, quanto mais sejam os jogadores, maior lucro possa obter. Tirando proveito das actividades de promoção de jogo, fará todo o sentido que arcar a concessionária a responsabilidade derivada da actividade desenvolvida pelos promotores e jogo.
No entanto, sendo o R.A. n° 6/2002 um diploma especificamente reger o acesso ao exercício, o licenciamento dos promotores de jogo e as obrigações dos promotores de jogo, cremos ser mais coerente e conforme com a finalidade do regulamento que a expressão “actividade desenvolvida no casino” a que se refere o art°29° não terá um sentido tão abrangente que abarca toda e qualquer actividade praticada pelos promotores de jogo.
Mas, não se acha certo o entendimento pugnado pela 2ª Ré que limita a responsabilidade das concessionárias às actividades típicas da promoção de jogo.
Como se resulta do disposto do art°2 do R.A. n°6/2002, considera-se de promoção de jogos de fortuna ou azar, as actividades que visa promover jogos de fortuna ou azar ou outros jogos em casino, não havendo uma definição determinada quais são essas actividades, as actividades referidas nesse artigo é enumeração exemplificativo e não taxativa. Se o legislador não deu uma definição precisa das actividades típicas da promoção de jogo. Por consequência, quanto fala da actividade desenvolvida no casino pelos promotores de jogo no art°29°, não poderia pensar em restringir o seu âmbito às actividades típicas de promoção de jogo.
As actividades a que se refere o art°29°, como sendo actividades desenvolvidas no casino pelos promotores de jogo ou os seus auxiliares, tendo em conta que a função desempenhada pelos promotores de jogo na exploração de jogo, deverão ser entendidas actividades destinadas à promoção de jogo ou com conexão com a promoção de jogo.
Posto isso, é momento para analisar se a matéria apurada no presente caso concreto se enquadra nos pressupostos normativos acima referidos
Está provado que entre o Autor e a 1ª Ré foi estabelecida uma relação jurídica de depósito em que aquele entregou uma quantia de HK$6.000.000,00 em fichas vivas na sala VIP explorada pela 1ª Ré.
Sabemos que a promoção de jogo é, no fundo, através do fornecimento das facilidades, de transporte, alojamento, alimentação e entretenimento, com o fim de angariar os jogadores a jogar em casino.
Aliás, não é menos verdade que a 1ª Ré, como entidade autónoma, poderá praticar negócio jurídico com quem quer que seja. Nem se diga que todas as actividades praticadas por esta constituir actividade de promoção de jogo.
Quando o promotor fornecer transporte, alojamento, alimento aos jogadores, atraindo-os para virem jogar nos casinos das concessionárias, não temos dúvidas de que essas actividades fazem parte da promoção de jogo. Mas se o mesmo promotor, por outras finalidades, fornecer os mesmos serviços ao seu cliente, essas actividades já não poderão ser entendidas como de promoção de jogo.
Conforme os factos assentes, a 1ª Ré explorava uma tesouraria independente na sala VIP “B” para a prestação de serviços de troca, depósito e levantamento de fichas, aos seus membros, com a autorização da 2ª Ré.
A aceitação do depósito das fichas de jogo pelos clientes na tesouraria da sala VIP é uma das facilidades fornecidas pela sala VIP aos jogadores. Portanto, o depósito das fichas de jogo pelos jogadores na tesouraria da sala VIP é, actividade com forte conexão com a promoção de jogo. Senão, não iria a 2ª Ré como concessionária de jogo, permitir os promotores de jogo a prestar esse serviço aos jogadores no casino explorado por ela.
Não obstante, não é qualquer indivíduo, seja ou não jogador, que faz algum depósito na sala VIP dum casino torna-se automaticamente esse acto como actividade de promoção de jogo.
Para concluirmos que é actividade de promoção de jogo, é necessário indagar em que circunstâncias é que o agente proceder ao depósito.
In casu, cremo que não tem elementos fácticos para determinar se o depósito feito pelo Autor tem ou não conexão com a promoção de jogo. É verdade que não está provado que o depósito feito pelo Autor se tratava de investimento. Mas também não consta dos factos assentes quaisquer factos relativos às circunstâncias concretas em que foram depositadas pelo Autor de tais as fichas vivas, se o foi feito na sequência do jogo de fortuna ou azar ou outros jogos ou se o foi feito com intenção de jogar posteriormente ou se o foi para outra finalidade?
Com o mero facto de depósito das fichas vivas, sem demais circunstâncias, não é suficiente para afirmar que esse negócio jurídico celebrado entre a 1ª Ré e o Autor integra-se no âmbito da actividade de promoção de jogo.
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Também não se entende que, no caso, está em causa o cumprimento das normas legais ou regulamentares pelos promotores de jogos.
Pois, o depósito em causa é meramente contrato típico celebrado entre o Autor e a 1ª Ré, o que não se envolve normas relativas à regulamentação da promoção de jogo.
Nestes termos, não achamos que, ao caso em apreço, é aplicável o disposto do art°29° do R.A. n°6/2002, pelo que, não se poderá responsabilizar a 2ª Ré, em solidariedade, com a 1ª Ré pela restituição da quantia entregue por esta ao Autor.
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Outro fundamento legal invocado pelo Autor para imputar a responsabilidade da 2ª Ré pela restituição da quantia reclamada alicerça-se no art°30°, n°5 do mesmo regulamento administrativo.
Esse preceito impõe as concessionárias a obrigação de fiscalização da actividade dos promotores de jogo, nomeadamente quanto ao cumprimento das suas obrigações legais, regulamentares e contratuais.
Diz o Autor que a 2ª Ré é concessionária do casino, permite a 1ª Ré a exercer actividade de promoção de jogo nos termos do qual essa Ré instalou a sala VIP “B” no seu casino. A 2ª Ré, na qualidade de concessionária, tem o dever de fiscalizar as actividades praticadas pelo promotor de jogo no casino, in casu, a actividade de depósito, no entanto, tem falhado a cumprir o seu dever, pela que deverá assumir a responsabilidade solidária com a 1ª Ré, ao abrigo do disposto nos termos do 5) do art° 30° do R.A. n°6/2002 de 1 de Abril.
De acordo com a análise acima exposta, crermos que o dever de fiscalização impendida sobre as concessionárias, ora 2ª Ré não é um dever geral, mas também o dever de cumprimento das obrigações conexas com a promoção de jogo.
Como não se entendemos que o depósito feito pelo Autor integra-se na actividade de promoção de jogo, deixa de ter qualquer razão de ser em responsabilizar a 2ª Ré, por omissão do dever de fiscalização decorrente desse normativo, o que está em causa é somente o incumprimento pela 1ª Ré do contrato de depósito estabelecido com o Autor
Assim, faleceu essa argumentação.
***
Nas suas alegações, argumenta ainda o Autor a ilegalidade do contrato de promoção de jogo celebrado entre as Rés com fundamento de que a 1ª Ré partilhou com a 2ª Ré o rendimento obtido nas mesas de jogo, o que constitui violação das disposições previstas nos art°17°, n°9 na Lei n°16/2001, respeitante à proibição da transferência ou cessão para terceiro a exploração do jogo de fortuna ou azar no casino.
Abstracto da questão de eventual nulidade do contrato de promoção de jogo e das suas repercussões na solução acima analisada. Nunca foi alegado pelo Autor menos provado algum facto relativamente aos contratos de promoção de jogo celebrado entre as duas Rés, sem qualquer elemento fáctico, nem temos suporte para analisar sobre a legalidade ou ilegalidade do referido contrato de promoção de jogo.
Logo, não tem qualquer virtualidade essa argumentação da Autora.
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Face ao acima exposto, julga-se improcedente o pedido em relação à 2ª Ré.
*
IV) DECISÃO
   Em face de todo o que fica exposto e justificado, o Tribunal julga parcialmente procedente a acção e, em consequência, decide:
   - Condenar a Ré “B” Entretenimento Sociedade Unipessoal Limitada pagar ao Autor A uma quantia de HKD$6,000,000.00 (seis milhões Hong Kong dólares), acrescido dos juros de mora, a taxa legal, contado a partir do 30 de Setembro de 2015, até ao integral e efectivo pagamento.
   - Absolver a Ré “C” Resorts (Macau) S.A. do pedido formulado pelo Autor.
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   Custas pelo Autor e 1ª Ré na parte do seu decaimento.
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   Registe e Notifique.
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   據上論結,本法庭裁定訴訟理由部份成立,裁決如下:
- 判處被告乙娛樂一人有限公司向原告甲支付HKD$6,000,000.00元(港幣陸佰萬圓),附加自2015年9月30日起以法定利率計算的遲延利息;
   - 裁定原告針對被告丙渡假村(澳門)股份有限公司提出的請求不能成立,並開釋此名被告。
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   訴訟費用由原告及第一被告按敗訴比例承擔。
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   依法作出通知及登錄本判決。
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Macau, aos 21 de Dezembro de 2017
Juiz-Presidente do Tribunal Colectivo do TJB
Cheong Un Mei
Acção Ordinária 21
CV3-15-0103-CAO