--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------
--- Data: 12/02/2018 --------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo -----------------------------------------------------------------------------
Processo nº 86/2018
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)
Relatório
1. A, com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Coloane (E.P.C.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no art. 56° do C.P.M.; (cfr., fls. 349 a 355 que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).
*
Em resposta, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 357 a 359-v).
*
Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Na Motivação (cfr. fls.344 a 355 do, autos), o recorrente pediu a revogação do despacho recorrido e a concessão da liberdade condicional, assacando-lhe o vício de violação do preceito nos arts.56° e 40° do CPM, por entender que ele reunir todos os pressupostos.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações da ilustre Colega na Resposta (vide. fls.357 a 359 verso dos autos).
*
No dia de hoje, constitui jurisprudência firme que a concessão da liberdade condicional depende do preenchimento cumulativo de todos os pressupostos, quer formais quer substanciais, consignados no art.56° do CPM, bastando a não verificação de qualquer um para se negar o pedido da liberdade condicional (a título exemplificativo, Acórdão do TSI no Processo n.°195/2003).
Importa recordar que a liberdade condicional não é uma medida de clemência ou de recompensa por mera boa conduta prisional, e serve na política do C.P.M. um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o recluso possa equilibradamente recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão. (Acórdão do TSI no Processo n.°50/2002)
Daí decorre que se, não obstante um comportamento prisional adequado, pelo passado do recluso e perspectivas de reintegração se não se formula um juízo de prognose favorável a uma regeneração e se teme pelas razões de prevenção geral. (Acórdão do TSI no Processo n.°225/2010)
Ainda se inculca reiteradamente que cada situação deve ser observada em concreto e caso a caso, num circunstancialismo de modo, tempo e lugar próprios, analisando de forma crítica a personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo se vai reinserir na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo ainda constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social. (Acs. do TSI nos Processos n.°225/2010 e n.°404/2011)
Envolvendo conceitos indeterminados de prognose, as alíneas a) e b) do n.°1 do art.56° dotam aos julgadores certa margem de livre apreciação na interpretação e na valorização, pelo que a convicção de não verificação dos pressupostos subjectivos só poderia ser neutralizado se houvesse uma exemplar e excelente evolução activa da personalidade do recluso durante a execução da prisão, e não um mero comportamento passivo cumpridor das regras básicas de conduta prisional. (Acórdão do TSI no Processo n.°9/2002)
No caso sub judise, importa realçar que o recorrente cometeu duas infracções às regras prisionais e, na declaração prestada em 01/12/2017 no JIC (vide fls.322 a 323 dos autos), manifestou desonestidade quanto ao motivo de não participar na formação. Tudo isto leva-nos a sufragar tranquilamente a prudente conclusão da MMa Juiz a quo que apontou:
就實質要件,在特別預防方面,囚犯曾於2011年5月25日及2014年2月7日兩度違反獄規因而2015年4月21日受罰,此後沒有再違規紀錄,故獄方對囚犯服刑行為的總評價維持於“良”的級別。服刑期間,囚犯曾於2011年至2013年參與小學回歸課程的數學班及葡文班,另其自2013年4月起參與獄中水電工房職業培訓,但至2015年4月因違規而被取消有關職訓,有關服刑情況與審理其前兩次假釋時無異,亦即囚犯已逾兩年半時間沒有申請參與任何學習課及職訓活動。另外,對於仍欠之訴訟費用,囚犯入獄至今已有七年,即使期間曾經參與職訓工作,惟其亦沒有主動作出分毫支付。事實上,儘管囚犯近年來已沒有再次違反獄規之紀錄,但須知恪守獄規只是囚犯在監獄這個小社會中所需做到的最基本要求,且綜觀囚犯多年的服刑表現,尤其是囚犯近兩年多以來有欠積極的服刑情況來看,當中可供本法庭考量之屬有利其獲得假釋的持續正面因素實在有限。
另尚要指出的是,法庭在審理假釋申請時尤需著重關注的是囚犯多年來的人格改造進展情況,而經本法庭於是日聽取囚犯親身所作之聲明後,尤其是其時至今日對於服刑期間兩度違規事件之取態,本法庭對於囚犯的人格是否已朝正面積極的方向作出重造仍存重大疑問,因此,現階段對於囚犯是否已確切從被判處的徒刑刑罰中汲取教訓及真正悔悟並無把握,且以囚犯之情況來看,對於其在現時倘獲假釋後能否循規蹈矩安份生活且不再犯罪方面,本法庭仍存保留。
縱觀囚犯在獄中之表現,考慮到其所實施的販毒罪之嚴重性、過往生活與人格方面的演變情況,本法庭認為目前囚犯仍未具備適應誠實生活的能力及意志,因此對其一旦提早獲釋能以負責任的態度在社會安份地生活並不再犯罪方面沒有充足信心。所以,囚犯的情況不符合澳門《刑法典》第56條第1款a項所規定的給予假釋的實質條件。
……
考慮到澳門社會的現實情況,提早釋放囚犯將引起相當程度的社會負面效果,妨礙公眾對被觸犯的法律條文之效力所持有的期望,故基於有需要對有關犯罪作一般預防的考慮,本法庭認為,提前釋放囚犯將有礙法律秩序的權威及社會的安寧,因此,不符合澳門《刑法典》第56條第1款b項所規定的給予假釋此一必備實質要件。
Assim, não obstante se militarem umas circunstâncias favoráveis ao recorrente, mas, na esteira das persuasivas jurisprudências supra citadas, aderimos, sem reserva, à cristal preocupação da MMa Juiz a quo, no sentido de ele ainda não preencher, por ora, os pressupostos consagrados no n.°1 do art.56° do CPM.
Com efeito, como bem observou a MMa Juiz a quo, existe ainda a séria dúvida de que o recorrente tenha já adquirido a estável capacidade de conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem ir cometer crime; e prevê-se razoavelmente que a colocação dele em liberdade nesta altura não é compatível com a paz social.
Nesta linha de perspectiva, não podemos deixar de entender que não tem cabimento o pedido da recorrente, e não merece censura alguma o douto despacho em escrutínio, por este mostrar-se plenamente conforme com o disposto nos arts.56° e 40° do CPM.
(…)”; (cfr., fls. 366 a 367-v).
*
Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):
– por Acórdão do T.J.B. de 21.09.2011, foi, A, ora recorrente, condenado pela prática como co-autor e em concurso real de 1 crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”, 1 de “consumo ilícito de estupefacientes” e 1 outro de “detenção indevida de utensilagem”, na pena única de 7 anos e 6 meses de prisão;
– o mesmo recorrente, deu entrada no E.P.C. em 03.12.2010, e em 01.12.2015, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 01.06.2018;
– durante a sua reclusão foi 2 vezes disciplinarmente punido: em 28.02.2012 e em 21.04.2015;
– se lhe vier a ser concedida a liberdade condicional, tenciona voltar a viver com os seus pais em Hong Kong, de onde é natural.
Do direito
3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do art. 56° do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.
Porém, sem razão.
Vejamos.
— Preceitua o citado art. 56° do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:
“1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.
3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. n.° 1).
“In casu”, atenta a pena única que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 03.12.2010, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.
Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do n.° 1 do referido art. 56°.
Com efeito, importa ter em conta que a liberdade condicional não é uma “medida de clemência”, constituindo uma medida que faz parte do normal desenvolver da execução da pena de prisão, manifestando-se como uma forma de individualização da pena no fito de ressocialização, pois que serve um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, equilibradamente, recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão; (cfr., v.g., J. L. Morais Rocha e A. C. Sá Gomes in “Entre a Reclusão e a Liberdade – Estudos Penitenciários”, Vol. I, em concreto, “Algumas notas sobre o direito penitenciário”, IV cap., pág. 41 e segs.).
Na esteira do repetidamente decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 07.12.2017, Proc. n.° 1041/2017, de 14.12.2017, Proc. n.° 1069/2017 e de 25.01.2018, Proc. n.° 14/2018, podendo-se também sobre o tema ver o Ac. da Rel. de Coimbra de 24.01.2018, Proc. n.° 540/16).
Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.
Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?
Como se deixou adiantado, cremos que de sentido negativo terá de ser a resposta.
Com efeito, demonstram os autos que o ora recorrente, em período de reclusão, sofreu 2 punições disciplinares, (em 2012 e 2015), e que tendo já antes sofrido 2 outras condenações, (cfr., fls. 309 e segs.), incorreu, novamente, na prática dos ilícitos criminais dos presentes autos, não aproveitando as oportunidades concedidas e as solenes advertências que lhe foram feitas, insistindo em delinquir, revelando assim uma personalidade com tendência para a prática de ilícitos, com uma deficitária capacidade crítica relativamente aos crimes cometidos e às normas de convivência social.
Dest’arte, afigura-se-nos evidente que não existem indícios – minimamente – seguros de ter vontade séria e capacidade de vir a levar vida honesta uma vez posto em liberdade, (até porque não tem perspectivas de emprego), (totalmente) inviável sendo assim o necessário “juízo de prognose favorável”.
Por sua vez, sendo natural de Hong Kong, e aqui visitante, e tendo já sofrido 3 condenações proferidas pelos Tribunais de Macau, importa pois acautelar a sua repercussão na sociedade, o que equivale a dizer que não podem ser postergadas as exigências de tutela do ordenamento jurídico, (cfr., F. Dias in “Dto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 528 e segs.), havendo igualmente que salvaguardar a confiança e as expectativas da comunidade no que toca à validade das normas violadas através do “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada”; (cfr., F. Dias in “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 106).
Assim, em face das expostas considerações, e manifesto sendo que verificados não estão os pressupostos do art. 56°, n.° 1, al. a) e b) do C.P.M., há que decidir em conformidade.
Decisão
4. Em face do exposto, decide-se rejeitar o recurso.
Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 3 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.
Registe e notifique.
Nada vindo de novo, e após trânsito, devolvam-se os autos com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 12 de Fevereiro de 2018
Proc. 86/2018 Pág. 14
Proc. 86/2018 Pág. 13