--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------------
--- Data: 02/03/2018 ---------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. José Maria Dias Azedo -----------------------------------------------------------------
Processo nº 140/2018
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)
Relatório
1. B (B), com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Coloane (E.P.C.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no art. 56° do C.P.M.; (cfr., fls. 183 a 191 que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).
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Em resposta, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 193 a 194-v).
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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Na Motivação (cfr. fls.183 a 191 dos autos), o recorrente solicitou a revogação do douto despacho recorrido e a concessão da liberdade condicional, assacando-lhe a violação das disposições na alínea a) do n.°2 e no n.°1 do art.400° do CPP, bem corno no n.°1 do art.56° do Código Penal.
Antes de mais, subscrevemos inteiramente as criteriosas explanações do ilustre Colega na douta Resposta (vide. fls.193 a 194v dos autos).
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No dia de hoje, constitui jurisprudência firme que a concessão da liberdade condicional depende do preenchimento cumulativo de todos os pressupostos, quer formais quer substanciais, consignados no art.56° do CPM, bastando a não verificação de qualquer um para se negar o pedido da liberdade condicional (a título exemplificativo, Acórdão do TSI no Processo n.°195/2003).
Importa recordar que a liberdade condicional não é uma medida de clemência ou de recompensa por mera boa conduta prisional, e serve na política do C.P.M. um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o recluso possa equilibradamente recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão. (Acórdão do TSI no Processo n.°50/2002)
Daí decorre que se, não obstante um comportamento prisional adequado, pelo passado do recluso e perspectivas de reintegração se não se formula um juízo de prognose favorável a uma regeneração e se teme pelas razões de prevenção geral. (Acórdão do TSI no Processo n.°225/2010)
Ainda se inculca reiteradamente que cada situação deve ser observada em concreto e caso a caso, num circunstancialismo de modo, tempo e lugar próprios, analisando de forma crítica a personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo se vai reinserir na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo ainda constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social. (Acs. do TSI nos Processos n.°225/2010 e n.°404/2011)
Envolvendo conceitos indeterminados de prognose, as alíneas a) e b) do n.°1 do art.56° dotam aos julgadores certa margem de livre apreciação na interpretação e na valorização, pelo que a convicção de não verificação dos pressupostos subjectivos só poderia ser neutralizado se houvesse um exemplar e excelente evolução activa da personalidade do recluso durante a execução da prisão, e não um mero comportamento passivo cumprido das regras básicas de conduta prisional. (Acórdão do TSI no Processo n.°9/2002)
No caso sub judice, quanto à prevenção especial, a MMa Juiz a quo aponta prudentemente: 服刑人多次觸犯不同程度的販毒罪,均屬較為嚴重犯罪,案情顯示服刑人參與販毒活動,提供毒品予他人,服刑人是故意作案,禍及他人及社會,情節屬嚴重。此外,服刑人在被發現犯罪後,仍選擇一而再再而三地繼續犯罪,最後在多宗案件內被判刑,可見其守法意識相當薄弱。
E chegou a concluir que «鑒於刑罰的目的為一方面對犯罪行為作出阻嚇作用、預防犯罪;另一方面對犯人本身進行教育,將其改變成一個對社會負責任的人;直至目前為止,就本具體個案而言,本法庭考慮囚犯在獄中的行為表現、監獄部門、檢察院的意見,以及囚犯的人格,無法顯示一旦囚犯獲釋,其會誠實做人,不再犯罪;同時,考慮到嫌犯所涉及的犯罪性質對社會以及澳門本身的形象帶負面影響,因此,認為對囚犯施以的刑罰仍未達致刑罰一般預防的目的,本法庭認為在此情況下提早釋放囚犯將不利於維護法律秩序及社會安寧。»
Sendo assim, na esteira das persuasivas jurisprudências supra citadas, aderimos à cristal preocupação da MMa Juiz a quo, no sentido de que o recorrente ainda não preenche, por ora, os pressupostos consagrados no n.°1 do art.56° do CPM. Com efeito, como bem observou o MM° Juiz a quo, existe ainda a séria dúvida de que ele tenha já adquirido a estável capacidade de conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem ir cometer crime; e prevê-se razoavelmente que a colocação dele em liberdade nesta altura não é compatível com a paz social.
De qualquer modo, importa ter presente que é generalizadamente consabido que em termos comparativos, as sanções penais da ordem jurídica da RAEM são mais benevolentes. Daí que Macau deve tentar todo o esforço para evitar a desastre de ser destino ou “paraíso” de delinquentes.
Nesta linha de perspectiva, não podemos deixar de entender que não tem cabimento o pedido da recorrente, e não merece censura alguma o douto despacho em escrutínio que não infringe as disposições na alínea a) do n.°2 e no n.°1 do art.400° do CPP, bem como no n.°1 do art.56° do Código Penal.
(…)”; (cfr., fls. 201 a 202-v).
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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):
– B, ora recorrente, deu entrada no E.P.C. em 04.01.2013, para cumprimento de uma pena única de 6 anos de prisão, resultado do cúmulo jurídico das penas que lhe foram aplicadas em 3 processos, pela prática de crimes de “produção e tráfico de menor gravidade” e “tráfico ilícito de estupefacientes”;
– em 02.01.2017, cumpriu dois terços de tais penas, expiando-as em 02.01.2019;
– em 19.02.2016 foi disciplinarmente punido;
– em caso de vir a ser libertado, irá viver com os seus pais, em Macau, de onde é natural.
Do direito
3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do art. 56° do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.
Cremos que manifesto é não se lhe pode reconhecer razão.
Vejamos.
— Preceitua o citado art. 56° do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:
“1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.
3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. n.° 1).
“In casu”, atenta a pena única que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 04.01.2013, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.
Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do n.° 1 do referido art. 56°.
Com efeito, importa ter em conta que a liberdade condicional não é uma “medida de clemência”, constituindo uma medida que faz parte do normal desenvolver da execução da pena de prisão, manifestando-se como uma forma de individualização da pena no fito de ressocialização, pois que serve um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, equilibradamente, recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão; (cfr., v.g., J. L. Morais Rocha e A. C. Sá Gomes in “Entre a Reclusão e a Liberdade – Estudos Penitenciários”, Vol. I, em concreto, “Algumas notas sobre o direito penitenciário”, IV cap., pág. 41 e segs.).
Na esteira do repetidamente decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 07.12.2017, Proc. n.° 1041/2017, de 14.12.2017, Proc. n.° 1069/2017 e de 25.01.2018, Proc. n.° 14/2018, podendo-se também sobre o tema ver o Ac. da Rel. de Coimbra de 24.01.2018, Proc. n.° 540/16).
Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.
Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?
Como se deixou adiantado, temos para nós que de sentido negativo terá de ser a resposta.
Com efeito, demonstram os autos que o ora recorrente, em período de reclusão, (e recentemente), sofreu 1 punição disciplinar.
Outrossim, verifica-se que foi condenado no âmbito de 3 processos, em todos eles respondendo por crimes de “tráfico ilícito de estupefacientes”, (ainda que em dois deles por “quantidade diminutas”; cfr., fls. 146 a 154), revelando, assim, uma personalidade com tendência para a prática de ilícitos, (avessa ao direito), a que importa acautelar.
Dest’arte, afigura-se-nos evidente que, não existem indícios – minimamente – seguros de ter “vontade séria” de vir a levar vida honesta uma vez posto em liberdade, (totalmente) inviável sendo assim o necessário “juízo de prognose favorável”.
Por sua vez, e não se olvidando o(s) tipo(s) de crime(s) pelo ora recorrente cometidos, importa também acautelar a sua repercussão na sociedade, o que equivale a dizer que não podem ser postergadas as exigências de tutela do ordenamento jurídico, (cfr., F. Dias in “Dto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 528 e segs.), havendo igualmente que salvaguardar a confiança e as expectativas da comunidade no que toca à validade da norma violada através do “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada”, impondo-se, também por isso, uma reafirmação social mais intensa da validade das normas jurídicas violadas; (cfr., F. Dias in “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 106 e o Ac. da Rel. do Porto de 10.01.2018, Proc. n.° 417/15).
Assim, em face das expostas considerações, e manifesto sendo que verificados não estão os pressupostos do art. 56°, n.° 1, al. a) e b) do C.P.M., há que decidir em conformidade.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, decide-se rejeitar o recurso.
Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 3 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.
Registe e notifique.
Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 02 de Março de 2018
José Maria Dias Azedo
Proc. 140/2018 Pág. 14
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