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Processo n.º 519/2017
(Recurso em matéria cível)

Data: 19 de Abril de 2018

ASSUNTOS:

- Acidente simultaneamente de trabalho e de viação
- Natureza da acção proposta contra a seguradora do acidente de viação pela seguradora de acidente de trabalho, depois de esta pagar a respectiva indemnização ao sinistrado
- Juros vencidos

SUMÁRIO:

I – O acidente simultaneamente de viação e de trabalho obedece, em matéria de indemnização reparatória, ao regime previsto no artigo 58º do DL nº 40/95/M, de 1 Agosto.
II – Tratando-se de uma acção de regresso, a causa de pedir há-de ser sempre o sinistro e o pagamento, feito pela seguradora, das indemnizações dos danos emergentes do acidente, já que do sinistro emerge a obrigação de reparação dos danos, do pagamento dessa reparação pela seguradora, o direito de regresso é pelo facto de a seguradora ter pago quantias pelas quais era apenas solidariamente responsável (ou não era de todo responsável) que lhe é conferido o direito de regresso.
III - Na acção dos autos, em bom rigor, a causa directa de que emerge o direito da acção não deriva do facto ilícito (embora indirectamente sim), mas sim do cumprimento da obrigação pela seguradora do acidente de trabalho, que, por força da lei, sub-roga nos direitos do sinistrado, e que vem por esta via a pedir responsabilidade junto do autor do acidente de viação que, por seu turno, transferiu a sua responsabilidade para a seguradora, ao nível dos juros vencidos, logo não é aplicável directamente a doutrina fixada pelo TUI no processo 69/2010, que assenta na seguinte base:
- Indemnização emergente de factos ilícitos;
- Valor indemnizatório líquido, fixado por via judicial.
IV - Perante uma acção de regresso, a Ré não impugnou o valor reclamado pela Autora, no fundo esta aceita o valor indicado pela parte contrária, mas a Recorrente/Ré contesta o momento do início da contagem dos juros, defendendo que estes só começam a vencer-se a partir da prolação da sentença, enquanto a Recorrida pede que os juros se vençam a partir da citação. Neste termos, a solução mais justa é a partir da interpelação é que começam a vencer-se os juros (pode ser feita a interpelação antes de propositura da competente acção, ou no momento da citação).

V – Como a Recorrida/Autora pede que os juros só comecem a vencer-se a partir de citação e não num momento antes, o Tribunal atende (e só deve atender) ao pedido nestes termos formulado.

O Relator,

________________
Fong Man Chong

Processo n.º 519/2017
(Recurso em matéria cível)
Data : 19/Abril/2018

Recorrente : A保險(香港)有限公司- (被告)
(A Insurance (Hong Kong) Limited) – (Ré)

Recorrida : B保險有限公司 –(原告)
       (B Insurance Company Limited) – (Autora)

*
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

    I - RELATÓRIO
A Insurance (Hong Kong) Limited (A保險(香港)有限公司), Recorrente nos presente autos (Ré na primeiro instância) devidamente identificada nos autos, notificada da sentença do TJB (P.º n.º CV3-12-0093-CAO), datada de 28/10/2016 (fls. 257 a 263), foi condenada nos seguintes termos:
- Condenar-se a Ré A Insurance (Hong Kong) Limited no pagamento do montante de MOP$1.002.439 (um milhão e dois mil e quatrocentos e trinta e nove patacas) à Autora B Insurance Co. Limited, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, a contar da data de citação até integral e efectivo pagamento.
Contra esta decisão veio em 14/1/2016 (fls. 273) a Recorrente/Ré recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 278 a 282, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. O presente recurso vem interposto da sentença que condenou a recorrente a pagar à autora a quantia de MOP$999,390.00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, a contar desde a data da citação até integral e efectivo pagamento.
2. O recurso incide tão-só sobre a condenação no pagamento de juros sobre o montante devido, contados desde a data de citação, pois estes apenas deveriam começar a vencer após a prolação da decisão judicial que fixa o montante indemnizatório.
3. A presente acção foi instaurada com base num direito de sub-rogação conferido ope legis, ex vi do artigo 58.° do Decreto-Lei n.º 40/95/M.
4. Nos termos da lei, após o pagamento efectuado no âmbito de processo especial aberto por virtude da existência de um acidente de trabalho, em caso de acidente simultaneamente de viação e de trabalho, a seguradora laboral sub-roga-se nos direitos da vítima contra a seguradora do veículo causador do acidente de viação, na medida em que haja satisfeito as prestações devidas nos termos da lei laboral.
5. Para-fazer valer os direitos da vítima contra a seguradora de viação, a seguradora laboral por norma intentará uma acção de responsabilidade civil contra a seguradora de viação, para que se possa apurar a responsabilidade subjectiva ou objectiva desta, decorrente do acidente que envolveu o seu segurado.
6. Todos os pressupostos da responsabilidade civil terão de ser comprovados para que surja qualquer obrigação na esfera da seguradora de viação.
7. Não se pode confundir o direito de sub-rogação da autora nos presentes autos com um direito de regresso, em que a seguradora laboral apenas teria de comprovar o pagamento efectuado à vítima, para que nascesse na sua esfera jurídica o direito de reaver o mesmo montante da seguradora de viação.
8. Na acção de responsabilidade civil intentada em sub-rogação dos direitos da vítima, procurar-se-á apurar se a seguradora de viação tem de assumir ou não qualquer responsabilidade, por assumir os riscos do segurado.
9. É importante esta distinção porquanto o único montante que se encontrava líquido antes da interposição da acção era não aquele que a recorrente deveria pagar mas apenas o montante em que a autora se havia sub-rogado, ainda que a final a recorrente tenha sido condenada a "ressarci-la na mesma medida.
10. Tendo em conta o exposto, e por se tratar verdadeiramente de uma acção de responsabilidade civil, e não de uma acção de regresso, só devem ser contabilizados juros a partir da prolação da decisão judicial que fixa o respectivo montante.
11. Conforme dispõe o artigo 794.°, n.º 4 do Código Civil, se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto o crédito não se tomar líquido. Antes da fixação do montante indemnizatório, não pode entrar a recorrente em mora pelo simples facto de a autora, ora recorrida, já saber qual o montante exacto em que se sub-roga.
12. Entendimento idêntico foi perfilhado pelo Tribunal de Última Instância no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência proferido no Processo n.º 69/2010, em que ficou assente que "[a] indemnização pecuniária por facto ilícito, por danos patrimoniais ou não patrimoniais, vence juros de mora a partir da data da decisão judicial que fixa o respectivo montante, nos termos dos artigos 560.°, n.º 5, 794.°, n.º 4 e 795.°, n.ºs 1 e 2 do Código Civil, seja sentença de 1.ª Instância ou de tribunal de recurso ou decisão na acção executiva que liquide a obrigação."
13. A decisão recorrida colide frontalmente com a jurisprudência fixada pelo Venerando Tribunal de Última Instância, não podendo restar dúvidas de que nestes autos se fixou uma indemnização pecuniária por facto ilícito, por danos patrimoniais ou não patrimoniais, devida porque a recorrente assumiu os riscos decorrentes da utilização do veículo detido pelo seu segurado.
14. A tese que consubstancia o presente recurso, de resto, é também pacífica neste Venerando Tribunal, de que se salientam como exemplos os Acórdãos proferidos no âmbito dos processos n.ºs 631/2010 e 263/2011.
15. Os danos a ter em conta no apuramento do montante indemnizatório são os sofridos pela malograda vítima e não os sofridos pela seguradora laboral, que apenas substitui (parcialmente) a vítima (ou os seus herdeiros) na formulação do pedido contra a ora recorrente.
16. A douta sentença recorrida, nestes termos, violou o disposto nos artigos 560.°, 794.° e 795.° do Código Civil e, ainda, a jurisprudência fixada pelo Tribunal de Última Instância no Processo n.º 69/2010.
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B Insurance Company Limited (B保險有限公司), Recorrida nos presente autos (Autora na primeira instância), apresentou as contra-alegações constantes de fls. 287 a 291, tendo formulado as seguintes conclusões :
1. O acórdão recorrido não enferma de qualquer erro ou vício ao condenar a ora recorrente no pagamento de juros desde a data da sua citação relativamente ao montante de MOP$999.390,00.
2. De facto, este montante sempre esteve fixo e determinado.
3. E, de acordo com o disposto no artigo 794º n.º 1 do Código Civil, o devedor fica constituído em mora após ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, o que foi o caso após a recorrente ter sido citada nos presentes autos.
4. Na obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora tal como dispõe o n° 1 do artigo 795º do Código Civil.
5. Não tem razão a recorrente ao querer aplicar ao caso vertente a jurisprudência obrigatória do acórdão n.º 69/2010 pois o referido acórdão só teria aplicação nos presentes autos caso se tratasse de uma obrigação liquida e não de uma quantia já certa e liquida.
* * *
Colhidos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
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    II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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    III - FACTOS
    Com pertinência, têm-se por assentes os factos seguintes conforme o que consta da sentença ora recorrida:
A. Em 12 de Abril de 2011, pelas 8 horas da manhã, ocorreu uma acidente no terreno onde estavam a ser feitas as obras de construção do casino XXXX, na Taipa. (alínea A) dos factos assentes)
B. O acima referido acidente ocorreu em virtude de o condutor do veículo pesado de mercadorias de matrícula MM-##-##, não ter tomado a precaução de travar o veículo, após ter efectuado a descarga das mercadorias que transportava, originando que este deslizasse e viesse a esmagar a infleiz vitima C contra a barra metálica de um outro veículo pesado de mercadorias que se encontrava estacionado no local. (alínea B) dos factos assentes)
C. O acidente causou fracturas das costelas e o esmagamento do externo da vitima e do coração, provocando-lhe a sua morte. (alínea C) dos factos assentes)
D. À data da ocorrência deste acidente a XXXX Casino S.A., tinha contratado com a ora A. um seguro para cobrir os danos resultantes dos acidentes de trabalho dos seus empregados. (alínea D) dos factos assentes)
E. À data da ocorrência do acidente o falecido C era empregado de XXXX Casino S.A. e trabalhava no local referido em A). (alínea E) dos factos assentes)
F. No âmbito deste seguro, a ora A. pagou já à mulher da vitima, D, o montante de MOP$737,100.00, ao filho da vitima, E, MOP$245,700.00, a título da indemnização prevista no art.º 50º do Decreto-Lei n.º40/95/M. (alínea F) dos factos assentes)
G. A A. pagou ainda à companhia “YYYY Construction Engineering Development (Macau) Co. Ltd.” As despesas de funeral no montante de MOP$16,590.00 e as custas devidas a Tribunal referentes ao Processo Especial do Trabalho que correu termos sob o n.º CV2-11-0082-LAE pelo 2º Juízo Civel do Tribunal Judicial de Base no montante de MOP$3,049.00. (alínea G) dos factos assentes)
H. ZZZZ集團(澳門)有限公司(Sociedade de Construção e Engenharia-Grupo de Construção de ZZ-ZZ (Macau), Limitada)是澳門氹仔路氹城XXXX渡假娛樂發展項目的工程承攬人。(alínea H) dos factos assentes)
I. 該公司於澳門商業及動產登記局的法人商業企業主登記編號為#####(SO),公司資本額為澳門幣玖拾玖萬圓 (MOP$990,000.00),法人住所位於澳門......(......路)...至...號......商業大廈...樓,主要業務為建築業、工程項目及樓宇室內裝修。(alínea I) dos factos assentes).
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    IV - FUNDAMENTAÇÃO
Tal como a Recorrente/Ré afirmou na peça das alegações, o recurso incide tão-só sobre a condenação no pagamento de juros sobre o montante devido, contados desde a data de citação, pois, na óptica da Recorrente/Ré, os juros apenas deveriam começar a vencer após a prolação da decisão judicial que fixa o montante indemnizatório.
Quid Juris?
Como este recurso visa reapreciar por este Tribunal ad quem uma questão já decidida pelo Tribunal de 1ª Instância, importa ver o que o Tribunal a quo disse a propósito do ponto controvertido:
“ (…) Antes de Vem a Autora mover a presente acção, pretendendo que a Ré seja condenada a pagar a indemnização no montante de MOP$499.072,267 acrescido de respectivos juros.
Fundamentando a Autora que ocorreu um acidente de viação na Avenida do Dr. Rodrigo Rodrigues em que foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiro matrícula MO-##-## conduzido por F e o motociclo MC-##-## conduzido por G, que estava a seguir para o seu local de trabalho, alegando ainda que o condutor do veículo ligeiro é responsável exclusiva por esse acidente de viação por ter conduzido com alta velocidade, tendo embatido no motociclo que seguia à sua frente pelo G, o qual foi projectado para o chão, tendo sofrido diverso ferimentos. A Autora assumiu ao pagamento da quantia global de MOP$108.504,20 ao condutor do motociclo, por se tratar de um acidente de trabalho, no âmbito do processo n° CV2-11-0044-LAE. Vem exigindo a Autora a condenação da 1ª Ré no pagamento dessa quantia na sub-rogação nos direitos do condutor do motociclo.
Na contestação, defendeu a 1ª Ré que no momento do acidente, o condutor do motociclo não estava no local de acidente, bem como já tinha pago ao G o montante de MOP$295.973,86, no qual inclui a perda salaria relativa a 378 dias de incapacidade de trabalho, as despesas médicas, medicamentosas ou hospitalares, a incapacidade permanente parcial fixada de 18%, e os danos não patrimoniais.
***
Preceitua-se o n°1 do art°58° do D.L. n°40/95/M de 1 de Agosto, que “Quando o acidente for, simultaneamente, de viação e de trabalho, a reparação é efectuada pela seguradora para quem foi transferida a responsabilidade pelo acidente de trabalho, nos termos deste diploma, ficando esta sub-rogada nos direitos do sinistrado em relação à seguradora do veículo causador do acidente de viação.”
Sobre a razão de ser desse normativo, disse o acórdão do S.T.J. de 09/03/2010, in www.dgsi.pt, que “Quando ocorre um acidente simultaneamente de viação e de trabalho, não pode olvidar-se que a responsabilidade primeira é daquele a quem o acidente puder ser imputado, a título de culpa ou de risco. O dever de indemnizar os prejuízos decorrentes de um acidente recai, primacialmente, sobre o lesante que lhe deu causa. Alguém que adiante a indemnização está a cumprir uma obrigação alheia, a obrigação do lesante.”
No caso, não se parece haver dúvida que o acidente ora discutido nos autos é um acidente de trabalho, como vem provado que no momento de acidente, o condutor do motociclo estava a seguir para o local de trabalho, o qual era, na altura, trabalhador da 2ª Ré, bem como perante o facto de a Autora ter intervindo nos autos de acidente de trabalho que se correm sob o processo n° CV1-10-0075-LAE, no âmbito do qual transaccionou com o condutor do motociclo e pagou o montante ora reclamado.
Não se acolhe a interpretação restrita da 1ª Ré de que constitui acidente de trabalho quando o acidente ocorreu na ida para o local de acidente, se for utilizado o meio de transporte fornecido pelo empregador. (circunstância prevista no ponto 5 do art°3° do D.L. 40/95/M, de 14 de Agosto.
Ao estatuir o conceito do acidente de trabalho no preceito supra referido, o legislador pretende regular os requisitos mínimos cuja verificação se encaixa no âmbito de acidente de trabalho, com a finalidade de dar tutela mínima aos trabalhadores. Mas não quer dizer que os empregadores não podem dar mais tutela aos trabalhadores.
Na verdade, conforme o disposto do art°13° da portaria n°236/95/M, de 14 de Agosto, o legislador permite expressamente o empregador incluir no seguro a cobertura dos acidentes que possam ocorrer durante o trajecto para o local de trabalho ou no regresso deste, com a aplicação da sobretaxa mínima de 0.4%. Previsão essa harmoniza-se com o princípio de mais favoráveis, princípio fundamental do direito laboral.
Com efeito, ficou provado que segundo o apólice de seguro celebrado a Autora e a 2ª Ré, empregador do sinistrado, foi estendido para cobrir qualquer acidente de trânsito sofrido pelos empregados durante a sua deslocação usual para e do seu local de emprego, dentro de um razoável período de tempo de deslocação, mesmo quando o transporte utilizado, se o houver, não for fornecido pela Segurada. Desde que a Segurada informe a Seguradora com todos os pormenores logo que possível, mas dentro dos oito dias após a data do acidente.
Portanto, o acidente de viação foi ocorrido nas circunstâncias clausuladas no contrato de seguro celebrado pelo empregador, é de entender que esse é simultaneamente acidente de trabalho.
Por outro lado, está assente que a Autora já reparou os danos sofridos pelo condutor do motociclo no valor global de MOP$108.504,20, por lhe ter sido transferida a responsabilidade pelo acidente de trabalho pela 2ª Ré.

Porém, para que haja lugar a sub-rogação pela Autora nos direitos do sinistrado, ainda tem que saber se o condutor do veículo ligeiro, segurado pela 1ª Ré, é responsável pela reparação dos danos.
No que diz respeito à causa do acidente, também não se suscita maior dúvida. No caso vertente, provado está que em 04 de Dezembro de 2009, o condutor do veículo matrícula MO-##-##, circulava na faixa direita da Avenida do Dr. Rodrigo Rodrigues, na direcção do Túnel da Guia para a Avenida da Amizade. Quando, chegado ao cruzamento entre a Avenida Dr. Rodrigo Rodrigues e a Estrada o Reservatório, não conseguia reduzir a velocidade atempadamente, tendo embatido no motociclo com a matrícula MC-##-##, que seguia à sua frente. Em consequência do embate o condutor do motociclo foi projectado para o chão, tendo sofrido fracturas do topo do rádio lateral, escafóide cárpico, lunar, triangular e contundentes nos tecidos moles da parte do joelho esquerdo.
Dispõe-se o n°1 do art°30° da Lei do Trânsito Rodoviário que “O condutor deve regular a velocidade de modo a que, atendendo às características e estado da vida e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias especiais, possa, em condições de segurança, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente e evitar qualquer outas circunstâncias especiais, possa, em condições de segurança, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente e evitar qualquer obstáculo que lhe surja em condições normalmente previsíveis.”
Tendo em conta o preceito acima prescrito e perante o quadro fáctico acima descrito, é evidente que o condutor do veículo violou essa regra estradal ao não conseguir reduzir atempadamente a velocidade, embatendo, por isso, no motociclo que seguia à sua frente, incumbe sempre ao condutor a modelar a velocidade do seu veículo, atendendo às quaisquer circunstâncias a ocorrer na via.
Portanto, é de concluir que o acidente foi causado por essa conduta grosseira do condutor do veículo ligeiro, sem contribuição para ele o condutor do motociclo, daí que é exclusiva a responsabilidade do veículo ligeiro MO-##-## pelos danos causados ao sinistrado, condutor do motociclo.
Aliás, no âmbito do processo criminal CR2-10-0175-PCC em que foi discutido o acidente de viação, a 1ª Ré chegou a transacção com o G, condutor do motociclo, assumindo a responsabilidade de pagamento de indemnização, o que ilustra que, na perspectiva da 1ª Ré, houve culpa na produção do acidente o condutor do veículo ligeiro, segurado por ela própria.
Assim, no presente caso, vislumbram-se preenchidos os requisitos da sub-rogação prevista na norma acima prescrita, por um lado, assente está a total culpa do condutor do veículo ligeiro MO-##-## no acidente de viação, por ter violado o disposto do art°30° da Lei de Trânsito Rodoviário e, por outro lado, provado o pagamento pela companhia seguradora ora Autora das indemnizações resultantes de acidente de trabalho a favor da sinistrada no montante total de MOP$108.504,20.
***
Alega a 1ª Ré que já pagou ao G, condutor do motociclo, a indemnização no montante de MOP$295.973,86, parece pretender essa Ré justificar que, com pagamento total do montante indemnizatório ao próprio ofendido, já não tem responsabilidade de satisfazer o crédito reclamado da Autora, proveniente da sub-rogação nos direitos do sinistrado.
Vejamos.
Conforme os factos assentes e os documentos de fls. 60 e 62, o montante pago pela Autora ao G refere-se à soma das seguintes parcelas: MOP$65.419,20, a título de indemnização por incapacidade temporária absoluta para o trabalho (ITA), correspondente a 378 dias; MOP$28.415,00, a título de indemnização por despesas na compra de medicamentos; MOP$11.070,00, a título de indemnização por despesas com consulta médica; e MOP$3.600,00, a título de indemnização por despesas com internamento hospitalar.
Enquanto a 1ª Ré pagou ao mesmo G, o montante de MOP$295.973,86, em que se inclui a perda salarial relativa a 378 dias para se curar, as despesas médicas, medicamentosas ou hospitalares, a incapacidade permanente parcial fixada de 18%, e os danos não patrimoniais.
Da simples comparação desses factos, depara-se, facilmente, que, pelo menos, em relação à indemnização da perda salarial e das despesas médicas, a 1ª Ré pagou, efectivamente, o montante indemnizatório a esse título ao G.
Mas, será, por isso, que a 1ª Ré deixa de se responsabilizar com a Autora? A resolução da questão consiste em saber a quem deverá a 1ª Ré prestar a obrigação.
Sobre essa questão, prevê-se o n° do referido art°58° do D.L. “No caso de haver responsabilidade da seguradora do veículo causador do acidente de viação, pode esta notificar a seguradora do acidente de trabalho para que exerça o direito previsto no número anterior, no prazo de sessenta dias, ficando com a faculdade de liquidar directamente ao sinistrado a indemnização devida, uma vez decorrido aquele prazo.”
De acordo com o preceito acima referido, a seguradora do veículo causador do acidente de viação tem a faculdade de liquidar directamente ao sinistrado, se a seguradora do acidente de trabalho não exercer o direito de sub-rogação no prazo de 60 dias depois de ser notificada para o efeito.
Muito embora não se tratar dum dever para a seguradora do acidente da viação a notificação prévia da seguradora de acidente de trabalho, por o legislador ter usado o termo “pode” e não “deve”, mas afigura-se que, perante um caso em que seja simultaneamente acidente de trabalho e de viação, e, face ao disposto normativo, a seguradora de acidente de viação, antes de efectuar o pagamento ao sinistrado, deverá ter a cautela de notificar a seguradora do acidente de trabalho, com vista a evitar a situação como o caso, ambas as seguradoras efectuaram o pagamento da indemnização proveniente do mesmo facto ao sinistrado, pois sabe bem que seja muito provável a seguradora de acidente de trabalho ter indemnizado ao sinistrado perante a imposição da lei.
Seguindo esse raciocínio, por maioria da razão, se a seguradora do acidente de viação já foi notificada a pretensão do exercício do direito de sub-rogação pela seguradora do acidente de trabalho, não deve aquela pagar, a totalidade do montante indemnizatório, directamente, ao sinistrado.
No caso vertente, a factualidade provada há de conduzir que a 1ª Ré não devia pagar a totalidade do montante indemnizatória fixada no processo criminal ao sinistrado, justamente por antes da prolação do acórdão referido, a Autora já tinha comunicado à 1ª Ré a sub-rogação dos direitos e interpelado o pagamento.
Pois, dos factos assentes consta que a 1ª Ré tinha sido interpelada pela Autora para o pagamento do montante de despendido, e de acordo com o teor dos documentos de fls. 64 a 66, demonstra que a Autora comunicou, em 15/03/201, 15/04/2011 e 03/08/2011, à 1ª Ré o exercício do direito de sub-rogação nos direitos do sinistrado G por o ter indemnizado no âmbito de responsabilidade de acidente de trabalho, enquanto o acórdão de condenação foi proferido em 28/10/2011 e o pagamento pela 1ª Ré ao G só ocorreu em 03/11/2011
Ou seja, pelo menos, menos anos antes do acórdão condenatório e do pagamento efectuado pela 1ª Ré ao G, aquela já tomou conhecimento do direito de sub-rogação da Autora, apesar disso, em vez de pagar à Autora, procedeu ao pagamento directo ao sinistrado G.
Por outro banda, independentemente do disposto do art°58° do Decreto-lei acima transcrito, no caso de sub-rogação, o sub-rogado adquire, na medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este competiam, de acordo com o art°587° do C.C..
De acordo com o disposto do art°577°, n°1, conjugado como o art°589°, ambos do C.C., a sub-rogação produz efeitos em relação ao devedor desde que lhe seja notificada, ainda que extrajudicialmente, ou desde que ele a aceite.
Como se refere acima, a 1ª Ré foi notificada pela Autora da sub-rogação e da pretensão do exercício do direito, a sub-rogação já lhe produz efeito muito antes da realização do pagamento ao sinistrado G.
Portanto, o pagamento pela 1ª Ré ao G a totalidade do montante indemnizatório não produz efeito em relação à Autora nem é oponível a ela, a 1ª Ré continua estar vinculada a satisfazer o crédito sub-rogado à Autora pelo sinistrado.
Nesse caso, a 1ª Ré, tomada conhecimento do pagamento da indemnização pela Autora ao G por responsabilidade do acidente de trabalho, ignorando esse facto, efectuou a indemnização a quem já deixa de ser seu devedor, pelo menos, na parte concernente aos montantes liquidados pela Autora, essa prestação nunca poderá ter o efeito de fazer extinguir a sua obrigação, pois, o cumprimento só ocorre se a obrigação for prestada a quem é devida.
“Quem paga mal, paga duas vezes”. Por isso, mantem-se a 1ª Ré a obrigação de satisfazer o direito do crédito da Autora, assistindo à Autora o direito de exigir a 1ª Ré pelo pagamento do montante indemnizatório que tinha satisfeito ao G.
Pelo exposto, o pedido da Autora é de proceder, devendo a 1ª Ré ser condenada no pagamento dessa quantia peticionada.
*
Juros de mora
Vem pedir ainda a Autora a condenação da 1ª Ré no pagamento de juros de mora vencidos e vincendos.
Uma vez provada a falta de cumprimento da prestação pela 1ª Ré a que ficou adstrita, torna-se responsável pelo prejuízo que causou à Autora, nos termos do artigo 787º do Código Civil de Macau.
No caso de simples mora, “constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor”, e “o devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido” (artigo 793º do Código Civil de Macau).
Ao abrigo do disposto nº 1 do artigo 794º, do Código Civil, o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir ou quando tiver verificado alguma das situações previstas no nº 2 do mesmo artigo, a saber, se a obrigação tiver certo prazo, se provier de facto ilícito ou se o próprio devedor impedir a interpelação.
Na obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora (artigo 795°, n° 1 do Código).
Os juros devidos são os juros legais, salvo se antes da mora for devido um juro mais elevado ou as partes houverem estipulado um juro moratório diferente do legal (artigo 795º, nº 2).
Defende a 1ª Ré que a mora só se constitui no dia de sentença, sendo a obrigação exigível quando é fixado na sentença. Sem razão. Nos autos, o crédito reclamado pela Autora é líquido e não ilíquido, contudo, não é objecto de discussão o quantum indemnizatório que a 1ª Ré deve pagar mas apenas se deve pagar.
Assim, provado está que a Ré foi interpelada, extra-judicialmente, para proceder ao pagamento da quantia reclamada pela Autora, até à presente data, nenhum pagamento foi efectuado pelo mesmo, pelo que, são devidos juros de mora à taxa legal de 9,75% ao ano, sobre a quantia em dívida, a ser contabilizados a partir da data dessa interpelação até efectivo e integral pagamento.
Entretanto, como a Autora só pediu os juros legais desde a citação, face às limitações previstas no art°564°, n°1 do C.P.P., o Tribunal só condena a 1ª Ré o pagamento dos juros legais a partir da data de citação.”
Nos termos já acima referidos, só esta última parte da sentença, relacionada com os juros, é que merece nossa reflexão.
Pergunta-se, no caso sub judice, os juros vencem-se a partir da citação da Ré/Recorrente? Ou a partir da data de prolação da sentença na primeira instância?
Começando pela análise da argumentação da Recorrete/Ré que teceu as seguintes considerações:
“(…)
3. A presente acção foi instaurada com base num direito de sub-rogação conferido ope legis, ex vi do artigo 58.° do Decreto-Lei n.º 40/95/M.
4. Nos termos da lei, após o pagamento efectuado no âmbito de processo especial aberto por virtude da existência de um acidente de trabalho, em caso de acidente simultaneamente de viação e de trabalho, a seguradora laboral sub-roga-se nos direitos da vítima contra a seguradora do veículo causador do acidente de viação, na medida em que haja satisfeito as prestações devidas nos termos da lei laboral.
5. Para-fazer valer os direitos da vítima contra a seguradora de viação, a seguradora laboral por norma intentará uma acção de responsabilidade civil contra a seguradora de viação, para que se possa apurar a responsabilidade subjectiva ou objectiva desta, decorrente do acidente que envolveu o seu segurado.
6. Todos os pressupostos da responsabilidade civil terão de ser comprovados para que surja qualquer obrigação na esfera da seguradora de viação.
7. Não se pode confundir o direito de sub-rogação da autora nos presentes autos com um direito de regresso, em que a seguradora laboral apenas teria de comprovar o pagamento efectuado à vítima, para que nascesse na sua esfera jurídica o direito de reaver o mesmo montante da seguradora de viação.
8. Na acção de responsabilidade civil intentada em sub-rogação dos direitos da vítima, procurar-se-á apurar se a seguradora de viação tem de assumir ou não qualquer responsabilidade, por assumir os riscos do segurado.
9. É importante esta distinção porquanto o único montante que se encontrava líquido antes da interposição da acção era não aquele que a recorrente deveria pagar mas apenas o montante em que a autora se havia sub-rogado, ainda que a final a recorrente tenha sido condenada a "ressarci-la na mesma medida.
10. Tendo em conta o exposto, e por se tratar verdadeiramente de uma acção de responsabilidade civil, e não de uma acção de regresso, só devem ser contabilizados juros a partir da prolação da decisão judicial que fixa o respectivo montante.”
No entendimento da Recorrente/Ré, esta acção é uma acção de responsabilidade civil como outras normais e não propriamente dita uma acção de regresso!
Terá razão este argumento?
Vejamos de imediato.
A questão em discussão tem a ver com o artigo 58º do DL nº 40/95/M, de 14 de Agosto, que tem o seguinte teor:
Artigo 58.º
(Acidentes de viação e de trabalho)
1. Quando o acidente for, simultaneamente, de viação e de trabalho, a reparação é efectuada pela seguradora para quem foi transferida a responsabilidade pelo acidente de trabalho, nos termos deste diploma, ficando esta sub-rogada nos direitos do sinistrado em relação à seguradora do veículo causador do acidente de viação.
2. No caso de haver responsabilidade da seguradora do veículo causador do acidente de viação, pode esta notificar a seguradora do acidente de trabalho para que exerça o direito previsto no número anterior, no prazo de sessenta dias, ficando com a faculdade de liquidar directamente ao sinistrado a indemnização devida, uma vez decorrido aquele prazo.
3. Na acção judicial contra a seguradora do veículo causador do acidente de viação devem intervir o sinistrado, o empregador e a seguradora do acidente de trabalho, sendo estes, para o efeito, oficiosamente citados pelo tribunal competente.
4. O sinistrado que, injustificadamente, prejudicar o exercício do direito de sub-rogação referido no n.º 1 responde perante a seguradora do acidente de trabalho pelo acréscimo de despesas decorrentes desse comportamento.
5. Na falta de seguro, o disposto nos números anteriores para a seguradora do acidente de trabalho e para a seguradora do acidente de viação aplica-se, respectivamente, à entidade patronal do sinistrado e à entidade responsável pelo acidente de viação.

Parte I – 1ª questão: Natureza da acção.
Comparando a redacção do nº 1 com a do nº 5 do artigo citado, parece-nos que as acções intentadas ao abrigo do citado artigo não têm (ou podem não ter) sempre a mesma natureza. Ressaltam-nos desde já 2 hipóteses:
1) – A 1ª é a em que há seguro, então a norma aplicável é o nº 1 do artigo 58º do DL citado, que é também o caso sub judice;
2) – A 2ª é aquela em que não há seguro, circunstância em que é a entidade patronal que substitui a posição do sinistrado e o responsável do acidente de viação que substitui a posição da seguradora do veículo causador do acidente de viação, se o veículo acidentado também não tem seguro, caso contrário seria a seguradora a intervir.
Nesta óptica, consoante situações diferentes, as causas de pedir são diferentes também.
Pois, se se trata de uma acção de regresso, a causa de pedir há-de ser sempre o sinistro e o pagamento, feito pela seguradora, das indemnizações dos danos emergentes do acidente, já que do sinistro emerge a obrigação de reparação dos danos, do pagamento dessa reparação pela seguradora, o direito de regresso e é pelo facto de a seguradora ter pago quantias pelas quais era apenas solidariamente responsável (ou não era de todo responsável) que lhe é conferido o direito de regresso.

Caso seja uma acção sub-rogatória, então é o exercício por parte do credor de direitos de natureza patrimonial, que a lei confere ao devedor e dos quais resulte um aumento do activo ou uma diminuição do passivo (P. Lima e A. Varela, CC anotado, 2ª ed. 1º-646).
No caso dos autos, a acção em análise não nos parece ser de uma acção de responsabilidade civil, mas sim uma acção de regresso, pois este existe quando a lei estipula que o devedor, que cumpre a obrigação, pode exigir de terceiro a prestação que efectuou (cfr. BMJ, 278º-310). Mesmo que, por hipótese, se defenda que seja uma acção sub-rogatória, a acção em causa também não é uma acção de responsabilidade civil.
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A título de direito comparado, o STJ pronunciou:
“No sentido de que o direito da entidade patronal (ou da respectiva seguradora) do sinistrado em acidente simultaneamente de viação e de trabalho contra terceiro responsável pelo acidente (ou respectiva seguradora) para reembolso das quantias pagas é um direito de regresso, veja-se, v.g. os Acs. Do STJ de 24/04/01, in Proc. 1342/01-2ª Secção) (ac. de 24/06/2004, in CJSTJ, tomo II, pág. 112 e seguintes).”
O que impõe à conclusão da improcedência da argumentação da Recorrente/Ré nesta parte, quando esta defende que o caso dos autos é uma acção de responsabilidade civil como outras normais.
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Parte II – 2ª questão: Aplicabilidade da doutrina fixada pelo TUI no acórdão do processo nº 69/2010?
A doutrina fixada pelo acórdão citado tem o seguinte teor:
“ - A indemnização pecuniária por facto ilícito, por danos patrimoniais ou não patrimoniais, vence juros de mora a partir da data da decisão judicial que fixa o respectivo montante, nos termos dos artigos 560.º, n.º 5, 794.º, n.º 4 e 795.º, n. os 1 e 2 do Código Civil, seja sentença de 1.ª Instância ou de tribunal de recurso ou decisão na acção executiva que liquide a obrigação.”

É fácil verificar-se que tal decisão assenta em 2 pontos importantes:
- Indemnização emergente de factos ilícitos;
- Valor indemnizatório líquido, fixado por via judicial.

Nestes termos, os juros vencem-se a partir da prolação da decisão que fixe a respectiva indemnização.
Ora, na presente acção, em bom rigor, a causa directa de que emerge o direito da acção não deriva do facto ilícito (embora indirectamente sim), mas sim do cumprimento da obrigação pela seguradora do acidente de trabalho, que, por força da lei, sub-roga nos direitos do sinistrado, e que vem por esta via a pedir responsabilidade junto do autor do acidente de viação que, por seu turno, transferiu a sua responsabilidade para a seguradora, logo não é aplicável directamente a doutrina fixada pelo TUI no processo acima indicado.

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Parte III: 3ª questão: a liquidez do valor da obrigação determina o momento do início do vencimento de juros, desde que o devedor seja interpelado (judicial ou extrajudicialmente)?
Nesta perspectiva de ver as coisas, ressaltam-nos desde logo 2 hipóteses:
(1) O devedor foi citado para contestar a acção e ele não impugnou o valor reclamado, que é o caso dos autos, o citado simplesmente limita-se a dizer que os juros só devem vencer-se a partir da decisão final, e não a partir da citação.
(2) A 2ª hipótese é aquela em que o devedor, ao contestar a respectiva acção, na sequência de ter sido citado, vem impugnar o valor, nomeadamente vem a dizer que o valor não estava correcto, ou invoca excepções peremptórias, por exemplo, prescrição do direito reclamado (ainda que parcialmente).
Note-se, neste tipo de situações (de acção sub-rogatória) e de exercício de direito de regresso, existem 4 momentos possíveis para contar os juros:
1) – O momento em que a seguradora efectuou o pagamento de indemnização ao sinistrado;
2) – O momento em que foi feita a citação da seguradora do acidente de viação para contestar a acção;
3) – O momento em que o Tribunal profere a decisão na acção de regresso proposta pela seguradora do acidente de trabalho contra o responsável do acidente de viação;
4) – O momento em que a decisão referida no nº 3 transitou em julgado.
Nas situações indicadas sob os nºs 2), 3) e 4), o valor reclamado pelo Autor poderá vir a ser alterado pela decisão final, então existem 2 sub-hipóteses:
(1) Perante uma acção de regresso, o Réu não impugnou o valor reclamado pelo Autor, no fundo este aceita o valor indicado pela parte contrária. Nesta hipótese, parece-nos que a solução mais justa é a partir da interpelação é que se começa a vencer-se os juros (pode ser feita a interpelação antes de propositura da competente acção, ou no momento da citação).
(2) Uma outra situação é a em que, mesmo que houvesse interpelação antes de propositura de acção, o devedor vem a impugnar o valor indemnizatório reclamado, invocando, por exemplo, parte dos créditos já está prescrita, ou a conta não está bem feita, ou a medida de fixação do valor indemnizatório não está certa… etc. Na sequência disso, o Tribunal vem alterar o valor, nestes termos, parece-nos mais justa a solução é a de que, só a partir da prolação da decisão é que se começa a vencer-se os juros.

Voltemos ao caso sub judice, importa reter as seguintes ideias:
1) - A Recorrente/Ré não chegou a impugnar o valor indemnizatório, já pago pela Recorrida/Autora;
2) – A Recorrida/Autora vem pedir que os juros só começam a vencer-se a partir de citação e não num momento antes, pelo que, o Tribunal atende ao pedido nestes termos formulado;
3) – Nestes termos, a doutrina fixada pelo TUI no processo nº69/2010 não se aplica directamente ao caso dos autos, por não se verificarem os pressupostos necessários;
4) – O Tribunal a quo não chegou a alterar o valor reclamado pela Recorrida/Autora, por os autos não fornecerem dados para esta finalidade.
Pelo que, os juros devem vencer-se a partir da citação, tal como pede a Recorrida/Autora, e assim, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 do CPC, é de manter a decisão recorrida.
Tudo visto, resta decidir

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    V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão da primeira instância.
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Custas pela Recorrente (Ré).
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Registe e Notifique.
                 RAEM, 19 de Abril de 2018.

(Relator) Fong Man Chong

(Primeiro Juiz-Adjunto) Ho Wai Neng

                  (Segundo Juiz-Adjunto) José Cândido de Pinho
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