Proc. nº 246/2016
Recurso Contencioso
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 14 de Junho de 2018
Descritores: Procedimento disciplinar
Prescrição
Meios de prova permitidos em direito
Imagens de videovigilância
Prova proibida
Guardas prisionais
Direcção dos Serviços Prisionais/Estabelecimento Prisional
Reincidência
Sucessão de infracções
Princípio da separação de poderes
Medida concreta da pena
SUMÁRIO:
1 – Desde que determinada tempestivamente, e por quem detenha competência para o fazer, a instauração do procedimento importa a suspensão do prazo prescricional (nº4, do art. 289º, do ETAPM). E esta suspensão, segundo alguma jurisprudência, perdura até ao trânsito em julgado da decisão judicial que recair sobre o recurso contencioso interposto da sanção.
2 – Por outro lado, segundo o nº3, do art. 289º citado, a prática de qualquer acto instrutório com efectiva incidência na marcha do processo, como é, por exemplo, a audição do arguido, funciona como causa de interrupção do prazo prescricional, a partir de cuja verificação se inicia nova contagem por inteiro do prazo da prescrição.
3 – O órgão administrativo competente deve procurar averiguar os factos cujo conhecimento seja conveniente para a justa e rápida decisão do procedimento, recorrendo a todos os meios de prova admitidos em direito em cada caso (art. 86º, nº1, do CPA).
4 – Ao abrigo dos arts. 2º, 14º e 18º da Lei nº 2/2012, as imagens recolhidas pelo sistema de videovigilância, só podem utilizadas pelas Forças e Serviços de Segurança da RAEM, por um lado, e por outro, apenas têm valor probatório em processo penal e contravencional, não já em processos disciplinares.
5 – Fora desse contexto, a utilização de imagens para outros fins, nomeadamente disciplinares, já não terá que obedecer a esse diploma, designadamente quanto aos limites temporais nele definidos, mas sim à Lei nº 8/2005, que estabelece o Regime Jurídico do Tratamento e Protecção de Dados.
6 – Se a infracção for cometida dentro do período de um ano após o cumprimento de pena imposta em virtude idêntica infracção, estaremos perante a agravante de reincidência.
7 – Se a infracção for cometida depois de decorrido o período de um ano após o dia em que tiver terminado o cumprimento de pena por infracção da mesma natureza, então estar-se-á perante a agravante de sucessão (nº4, 1ª parte).
8 – De sucessão se falará, ainda, «quando as infracções forem de natureza diferente» (nº4, “fine”) se entre o cumprimento da anterior e o cometimento se verificar um período inferior a um ano.
9 – O dever de assiduidade é diferente do dever de pontualidade.
10 – Se a entidade competente considerou a agravante de sucessão, que no caso não podia existir, o acto punitivo tem que ser anulado, de forma a que possa eventualmente a pena ser refeita se, entretanto, não se verificar qualquer outra causa que a tanto obste.
11 – No domínio das penas concretas em matéria disciplinar, não pode o Tribunal substituir-se ao órgão sancionador, sob pena de ingerência no seu exclusivo campo de poderes e, portanto, sem quebra de violação do princípio da separação e independência de poderes, visto que o tribunal não pode fazer administração activa.
12 – O princípio da separação de poderes é justificado nestes casos por se estar no âmbito de uma tarefa da Administração incluída na chamada discricionariedade administrativa, e só cede ante um clamoroso e grosseiro erro que denote uma clamorosa injustiça e manifesta desproporção entre a falta cometida e a sanção infligida.
Proc. nº 246/2016
Acordam no Tribunal de Segunda Instância d RAEM
I - Relatório
A, do sexo feminino, guarda, 4.º escalão, de nomeação definitiva da carreira do corpo de guardas prisionais, em funções na Divisão de Segurança e Vigilância do EPM, da Direcção dos Serviços Correccionais (anterior Divisão de Segurança e Vigilância, do Departamento de Assuntos Prisionais do EPM), residente em Macau, na Rua da XX n.º XX, Edifício XX, XXº andar XX, melhor identificada nos autos supra referenciados, ----
Recorre contenciosamente ----
Do despacho do Secretário para a Segurança n.º 8/SS/2016, de 5/2/2016, que, no âmbito de um procedimento disciplinar, lhe aplicou à a pena de suspensão de 90 dias.
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Na petição inicial, a recorrente formulou as seguintes conclusões:
«1. O acto administrativo ora recorrido – que aplicou à recorrente a pena de suspensão de 90 dias, foi praticado pelo Secretário para a Segurança no uso das competências conferidas pelo n.º1 da Ordem Executiva n.º 111/2014 e pelo art.º 322.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, aprovado pelo D.L n.º 87/89/M, através do Despacho do Secretário para a Segurança n.º 8/SS/2016 por si proferido em 5/2/2016. O presente recurso contencioso foi interposto por causa do acto administrativo recorrido padecer dos vícios seguintes: Prescrição do procedimento disciplinar; Provas obtidas não correspondem à disposição legal; Falta de fundamentação; Erro nos pressupostos de direito e exercício irrazoável do poder discricionário.
2. Nos termos do art.º 289.º (prescrição do procedimento disciplinar) do D.L n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública):
“1. O procedimento disciplinar prescreve passados 3 anos sobre a data em que a falta houver sido cometida.
Se o facto qualificado de infracção disciplinar for também considerado infracção penal e os prazos de prescrição do procedimento criminal forem superiores a 3 anos, aplicar-se-ão ao procedimento disciplinar os prazos estabelecidos na lei penal.
Se antes do decurso do prazo prescricional referido no n.º 1 for praticado relativamente à infracção qualquer acto instrutório com efectiva incidência na marcha do processo, a prescrição conta-se desde o dia em que tiver sido praticado o último acto.
Suspendem o prazo prescricional a instauração dos processos de sindicância e de averiguações e ainda a instauração dos processos de inquérito e disciplinar, mesmo que não tenham sido dirigidos contra o funcionário ou agente a quem a prescrição aproveite, mas nos quais venham a apurar-se faltas de que seja responsável.”
3. Quanto à prescrição do procedimento disciplinar, o ilustre Dr. Manuel Leal-Henriques fez anotação ao art.º 289.º, n.ºs 3 e 4 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, cita-se aqui a respectiva parte mais importante:
“Na verdade, seria de todo absurdo que se conferisse à instauração do expediente disciplinar o mérito de, só por si, suspender o prazo prescricional para todo o sempre, pois que, a ser assim, significava que se estava a pôr nas mãos da Administração um instrumento perverso e altamente lesivo dos direitos dos infractores – aqui o direito de beneficiar da prescrição do procedimento -, permitindo que esse procedimento nunca prescrevesse, bastando para tal que a mesma Administração pusesse em marcha um qualquer processo contra o trabalhador em causa.
Daqui se há-de partir, pois, para a ideia de que, nada se fazendo no processo após a sua instauração, isto é, se nenhuma investigação for levada a cabo, é óbvio que a Administração não poderá fazer-se valer de uma suspensão do prazo prescricional, já que em nada contribuiu para a merecer.
Nestes termos, se o processo disciplinar ficar reduzido à mera instauração, esta não suspende naturalmente o dito prazo, que continuará assim a correr como se nada tivesse acontecido.
Se, porém, instaurado o procedimento, a Administração se mostra pouco diligente, isto é, se se limita a diligências esporádicas e sem continuidade ou meramente dilatórias, sem qualquer conteúdo útil no sentido do apuramento dos factos e da responsabilidade dos seus autores, haverá obviamente que chamar de novo aquele regime do n.º3 do art.º 289.º
Então de duas uma: ou as diligências levadas a cabo constituem acto instrutório com efectiva incidência na marcha do processo, - e aí apesar da intermitência das diligências, parece-me dever considerar-se que o prazo prescricional só volta a correr a partir do último acto, a menos que entre cada uma delas medeie tempo tal, que, por si só ou conjugado com tempo já decorrido, seja suficiente para conduzir à prescrição do procedimento; ou não constituem acto desse tipo – e nesse caso é manifesto que a Administração não pode usufruir do favor que lhe concede o apontado n.º3, nem tão pouco do benefício da suspensão do prazo prescricional previsto no n.º4, já que estamos perante um processo vazio, em que existe uma mera instauração sem consequências jurídicas no campo prescricional, uma vez que não se cumpriu a exigência da parte final do n.º4 do preceito (apuramento de faltas de que o arguido seja responsável).1
4. In casu ocorreram no dia 20/6/2010 os actos e factos que à recorrente foram imputados por terem violado os deveres disciplinares, mas o processo disciplinar em causa foi instaurado em 8/9/2011, 10 meses depois de recepção da carta de denúncia contra a recorrente em 27/4/2011, e em 14/9/2011, foi iniciada a instrução do caso.
5. Só até ao dia 26/5/2015, 3 anos e 8 meses mais tarde, a recorrente recebeu a notificação da acusação. Após ter apresentado contestação escrita, a recorrente foi ouvida pela instrutora de processo disciplinar sobre as declarações por si alegadas na contestação escrita.
6. Em 18/1/2016, a recorrente recebeu o acto administrativo ora recorrido, praticado no dia 5/2/2016 pela entidade recorrida, que determinou aplicar-lhe a pena de suspensão de 90 dias, através do Despacho do Secretário para a Segurança n.º8/SS/2016.
7. Nos termos dos art.ºs 60.º e 61.º do Código do Procedimento Administrativo, os órgãos administrativos devem providenciar pelo rápido e eficaz andamento do procedimento, quer recusando e evitando tudo o que for impertinente ou dilatório, quer ordenando e promovendo tudo o que for necessário ao seguimento do procedimento e à justa e oportuna decisão, também são obrigados a observar os prazos previstos na lei para a prática dos actos.
8. Uma vez que já estava prescrito o procedimento disciplinar em causa, o acto administrativo recorrido ainda tomou decisão sancionatória contra a recorrente, e isto, evidentemente, violou o disposto nos art.ºs 289.º, n.ºs 1, 3 e 4 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública, e 60.º e 61.º do Código do Procedimento Administrativo, devendo, nos termos do art.º 124.º Código do Procedimento Administrativo e do art.º 21.º, n.º1 do Código do Processo Administrativo Contencioso, ser anulado o acto administrativo recorrido.
9. Nos termos dos pontos 6º a 12º e 14º a 16º da Acusação, bem como o meio de prova constante de fls. 11 da Acusação, deu-se por provado que a recorrente praticou os actos e factos de violação dos deveres disciplinares, baseados nas videocassetes e fotografias do sistema de videovigilância instalado pelo então EPM, actual Direcção dos Serviços Correccionais. (vd. Doc. 6)
10. A Lei n.º 2/2012 (Regime Jurídico da Videovigilância em Espaços Públicos) dispõe no seu art.º 2.º, n.º1 que:
“A utilização de sistemas de videovigilância destina-se exclusivamente a assegurar a segurança e ordem públicas, nomeadamente prevenir a prática de crimes, e a auxiliar a investigação criminal.” E dispõe no art.º 4.º da mesma lei que: “A utilização de sistemas de videovigilância obedece aos seguintes princípios gerais: 1) Princípio da legalidade, segundo o qual a recolha e tratamento das imagens e sons captados pelo sistema de videovigilância devem ser efectuados dentro dos limites fixados na presente lei, na Lei n.º 8/2005 e na demais legislação aplicável; 2) Princípio da exclusividade, segundo o qual a videovigilância só é admissível para os fins previstos na presente lei; 3) Princípio da proporcionalidade, segundo o qual o recurso à videovigilância pressupõe a ponderação entre as exigências da manutenção da segurança e ordem públicas, nomeadamente a prevenção da prática de crimes, e a protecção do direito à reserva da intimidade da vida privada e de outros direitos fundamentais.” E dispõe no art.º 5º que “Só é permitida a utilização de sistemas de videovigilância para os seguintes fins: 1) Protecção de edifícios públicos e instalações de interesse público, mesmo quando a sua exploração esteja concessionada a entidades privadas; 2) Protecção de edifícios classificados como património histórico ou cultural; 3) Protecção da segurança de pessoas e bens, públicos ou privados, e a prevenção da prática de crimes em locais onde exista um risco razoável para a sua ocorrência, nomeadamente: (1) Em locais de detenção ou de cumprimento de medidas privativas de liberdade; (2) Nos postos fronteiriços e quaisquer locais de contacto com o exterior da RAEM; (3) Nas instalações portuárias e aeroportuárias, e nos serviços de transporte público, ferroviário e rodoviário; 4) Prevenção e segurança rodoviária de pessoas e bens; 5) Protecção de caminhos de acesso e de evacuação dos locais referidos nas alíneas 1) a 3).” E dispõe no art.º 6.º quanto ao limites à videovigilância que: “1. A recolha e tratamento de imagens e sons devem limitar-se ao estritamente necessário às finalidades a que se destinam nos termos da lei. 2. As forças e serviços de segurança devem adoptar as providências necessárias à eliminação dos registos e dos dados pessoais deles constantes que se revelem excessivos ou desnecessários para a prossecução dos fins legalmente previstos. 3. As forças e serviços de segurança têm direito a aceder, desde que estes sejam indispensáveis a fins de investigação em processo penal, aos dados relativos a veículos constantes dos sistemas de informação assentes no uso de identificadores ou outros meios técnicos de identificação para efeitos de controlo de acesso a determinados locais. E dispõe no art.º 14.º quanto ao valor probatório: “As imagens e sons recolhidos nos termos da presente lei podem constituir meios de prova em processo penal ou contravencional nas diferentes fases processuais. E dispõe no art.º 16.º que “o registo das infracções às leis e regulamentos do trânsito rodoviário captado pelo sistema de videovigilância tem o valor probatório do auto de notícia de infracção directamente constatada por agente de autoridade.”
11. Nos termos do art.º 5 (qualidade dos dados) da Lei n.º8/2005 (Lei da Protecção de Dados Pessoais): “1. Os dados pessoais devem ser: 1) Tratados de forma lícita e com respeito pelo princípio da boa fé e dos princípios gerais enunciados no artigo 2.º; 2) Recolhidos para finalidades determinadas, explícitas e legítimas e directamente relacionadas com o exercício da actividade do responsável pelo tratamento, não podendo ser posteriormente tratados de forma incompatível com essas finalidades; 3) Adequados, pertinentes e não excessivos relativamente às finalidades para que são recolhidos e posteriormente tratados; 4) Exactos e, se necessário, actualizados, devendo ser tomadas as medidas adequadas para assegurar que sejam apagados ou rectificados os dados inexactos ou incompletos, tendo em conta as finalidades para que foram recolhidos ou para que são tratados posteriormente;5) Conservados de forma a permitir a identificação dos seus titulares apenas durante o período necessário para a prossecução das finalidades da recolha ou do tratamento posterior. 2. Mediante requerimento do responsável pelo tratamento, e caso haja interesse legítimo, a autoridade pública pode autorizar a conservação de dados para fins históricos, estatísticos ou científicos por período superior ao referido na alínea 5) do número anterior. e nos termos do art.º 6.º (condições de legitimidade do tratamento de dados) que: “O tratamento de dados pessoais só pode ser efectuado se o seu titular tiver dado de forma inequívoca o seu consentimento ou se o tratamento for necessário para: 1) Execução de contrato ou contratos em que o titular dos dados seja parte ou de diligências prévias à formação do contrato ou declaração da vontade negocial efectuadas a seu pedido; 2) Cumprimento de obrigação legal a que o responsável pelo tratamento esteja sujeito; 3) Protecção de interesses vitais do titular dos dados, se este estiver física ou legalmente incapaz de dar o seu consentimento; 4) Execução de uma missão de interesse público ou no exercício de poderes de autoridade pública em que esteja investido o responsável pelo tratamento ou um terceiro a quem os dados sejam comunicados; 5) Prossecução de interesses legítimos do responsável pelo tratamento ou de terceiro a quem os dados sejam comunicados, desde que não devam prevalecer os interesses ou os direitos, liberdades e garantias do titular dos dados.”
12. De acordo com as disposições acima indicadas, evidentemente, a instalação de sistemas de videovigilância no local de ocorrência dos factos destina-se exclusivamente a assegurar a segurança e ordem públicas, nomeadamente prevenir a prática de crimes, e a auxiliar a investigação criminal, mas não ao uso outro tal como a servir de meios de prova contra os funcionários públicos em processo disciplinar que não tem nada a ver com crime ou processo criminal; por outro lado, nos termos do art.º 6.º da Lei n.º8/2005, o tratamento de dados pessoais só pode ser efectuado se o seu titular tiver dado de forma inequívoca o seu “consentimento”.
13. Se o legislador considerasse que as imagens resultantes do sistema de videovigilância pudessem ser utilizadas em procedimento disciplinar, colocaria tal representação na finalidade e âmbito da Lei n.º2/2002 (Regime Jurídico da Videovigilância em Espaços Públicos).
14. Sendo o governante e sujeito do exercício dos poderes públicos, a Administração Pública pode praticar apenas os actos que a lei lhe permite e atribui poderes para praticar, ou seja os actos secundum legem. Por outra palavra, todos os actos praticados pela Administração Pública sem autorização ou poderes atribuídos por lei são actos praeter legem, ou actos praticados com violação da lei, isto é, actos contra legem, sendo ambos considerados actos ilegais. (vd. Acórdão do TUI n.º100/2014)
15. Nos termos do art.º 21.º, n.ºs 1 e 2, conjugados com o art.º 6.º, n.º2, todos da Lei n.º2/2012 (Regime Jurídico da Videovigilância em Espaços Públicos), os dados recolhidos pelo sistema de videovigilância são conservados apenas pelo prazo de 60 dias e deve ser eliminados oportunamente. Contudo, os factos e actos de violação dos deveres disciplinares que à recorrente eram imputados ocorreram no dia 20/6/2010, tendo os respectivos dados sido extraídos como prova contra a recorrente, depois de recebimento da carta de denúncia contra a recorrente em 27/4/2011, ou seja 10 meses após a ocorrência dos factos, mas, evidentemente, a conservação de tais dados por parte da respectiva autoridade já excede o prazo previsto na supracitada deposição legal, pelo que, de nenhuma maneira, os ditos dados contra a lei não podem servir de prova no processo disciplinar.
16. O douto acórdão do Tribunal de Última Instância proferido no processo de recurso n.º19/2014 tomou a seguinte decisão: “Anulam o acórdão recorrido, por omissão de pronúncia quanto à ponderação se a utilização das câmaras mencionadas nas alegações facultativas viola os princípios jurídicos alegados pelo recorrente, bem como se constitui prova ilegal a utilização dos dados resultantes da alegada perseguição/seguimento que foi ordenado ao Recorrente diariamente e durante mais de um mês, com vista à prova da sua assiduidade;(…)” (sublinhado nosso)
17. Pelo que, pela violação dos art.ºs 2.º, n.º1, 4.º, 5.º e 6.º da Lei n.º2/2012 (Regime Jurídico da Videovigilância em Espaços Públicos) e dos art.ºs 5.º e 6º n.º8/2005 (Lei da Protecção de Dados Pessoais), nos termos do art.º 124.º do Código do Procedimento Administrativo e do art.º 21.º, n.º1, al. d) do Código do Processo Administrativo Contencioso, deve ser anulado o acto administrativo recorrido que aplicou à recorrente pena de suspensão, por ter adoptado a prova contra lei.
18. Ao tomar a decisão que aplicou à recorrente a pena de suspensão de 90 dias, a entidade recorrida indica que: (…) De acordo com o auto de declaração da arguida (constante de fls 174 a 178, 208 a 211, 212 a 215 dos autos, respectivamente), a arguida tinha perfeito conhecimento de que os supracitados actos são irregulares, que violam a lei e as instruções de serviço, por outro lado, como pessoal do corpo de guardas prisionais sénior com mais de dez anos e tal do tempo de serviço, deve ter um perfeito conhecimento sobre as atribuições e deveres de guarda prisional, tendo, contudo, ainda agido deliberadamente ao praticar os supracitadas actos, pelo que, evidentemente a arguida não cumpriu os seus deveres por não ter observado as atribuições e deveres de guarda prisional e ter negligenciado a importância do seu trabalho e desprezado os seus deveres no exercício das funções, pelo que tem um grau de culpa bastante elevado. Após considerado as circunstâncias atenuantes previstas no art.º 282.º, al. a) e f), bem como as circunstâncias agravantes previstos no art.º 283.º, n.º1, al. g) e h), n.º4 e 5 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, todos aplicáveis à arguida, nos termos do art.º 316.º, n.ºs 1, 2 e 4, bem como os art.ºs 7.º, 12.º, n.º1 do D.L n.º60/94/M, e o art.º 303.º, n.º2, al. a) do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, no uso das competências conferidas pelo art.º 1 da Ordem Executiva n.º111/2014 e o art.º 322.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, determinou aplicar à arguida A a pena de suspensão de 90 dias.”
19. A Lei n.º87/89/M (Regime dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau) dispõe no seu art.º 314.º, n.ºs 2 e 3 quanto à pena de suspensão, mas o acto administrativo recorrido não indica nem fundamenta qual a situação dos casos acima enumerados que preencha o acto da recorrente, em que seja aplicável a pena de suspensão.
20. O D.L n.º60/94/M (Aprova o Regime Disciplinar do Corpo de Guardas Prisionais de Macau) dispõe expressamente no seu art.º 12.º, n.º2 quanto à aplicação da pena de suspensão, e nos termos do art.º 21.º (regime disciplinar), n.º1 da Lei n.º7/2006 (Estatuto do Pessoal da Carreira do Corpo de Guardas Prisionais): “O pessoal do CGP está sujeito ao regime disciplinar próprio em vigor, sem prejuízo da aplicação subsidiária do regime disciplinar geral.”
21. É de crer que todos os juristas sabem bem que, em comparação com o D.L n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau), o D.L n.º60/94/M (Aprova o Regime Disciplinar do Corpo de Guardas Prisionais de Macau) é uma lei especial que é aplicável prevalentemente em relação à lei ordinária (enquanto a última só é aplicável subsidiariamente.
22. Nos termos do art.º 114.º, n.º1, al. a) do Código do Procedimento Administrativo, devem ser fundamentados os actos administrativos de sanções.
23. Pelo que, por ter violado o art.º 114.º, n.º1, al. a) e do art.º 115.º, n.ºs 1 e 2 do Código do Procedimento Administrativo, deve o acto administrativo recorrido ser anulado ao abrigo do art.º 124.º do Código do Procedimento Administrativo, por falta de fundamentação.
24. Segundo constam dos pontos 7º, 9º, 10º, 11º e 12º da Acusação, a recorrente, no dia de ocorrência dos factos, ausentou-se do posto de trabalho por cinco vezes sem pedir a sua autorização ou informá-lo a qualquer forma, junto de qualquer um dos seus superiores hierárquicos, violando o dever de assiduidade, previsto no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. g) e 9 do D.L.n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau) e os actos podem ser punidos com pena de multa ao abrigo do art.º 11.º, n.2, al. f) do D.L n.º60/94/M. (vd. Doc.6)
25. Segundo constam dos pontos 6º, 8º, 10º, 11º e 14º da Acusação, a recorrente, no dia de ocorrência dos factos, não manteve, por cinco vezes, as portas fechadas e trancadas do piso onde a vigilância ficou a seu cargo violando os deveres de zelo e de obediência, previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c), n.º4 e 5 do D.L.n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau) e os actos podem ser punidos com pena de multa ao abrigo do art.º 11.º, n.2, al. a) e b) do D.L n.º60/94/M. (vd. Doc.6)
26. Segundo consta do ponto 15º da Acusação, a recorrente, no dia de ocorrência dos factos, ao entrar na zona prisional feminina para exercer funções, não passou pelo pórtico detector de metais nem abriu a “bolsa de cinta para serviço” para ser examinada, violando os deveres de zelo e de obediência previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c), n.ºs 4 e 5 do D.L.n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau) e pode ser punida com pena de multa, ao abrigo do art.º 11.º, n.2, al. a) e b) do D.L n.º60/94/M. (vd. Doc.6)
27. Segundo constam do ponto 16º da Acusação, a recorrente, no dia de ocorrência dos factos, durante o exercício das funções, não levou consigo a “bolsa de cinta para serviço” como um dos artigos de equipamento conforme as Instruções de Serviço, violando os deveres de zelo e de obediência previstos no art.º 279.º, n.º 1 e 2, al. b) e c), n.º4 e 5 do D.L.n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau) e pode ser punida com pena de multa, ao abrigo do art.º 11.º, n.2, al. a) e b) do D.L n.º60/94/M. (vd. Doc.6)
28. Contudo, a entidade recorrida apenas se baseou em que não pode aplicar-se ao mesmo funcionário mais de uma pena disciplinar por cada infracção conforme se prevê no art.º 316.º, n.º4 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, sintetizando todas as infracções praticadas pela recorrente e ponderando as circunstâncias agravantes e o grau de culpa sem ter em consideração outros fundamentos jurídicos, determinou aplicar à recorrente a pane de suspensão de 90 dias.
29. Nos termos do art.º 316.º, n.ºs 2 a 4 do D.L n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau): “2. Ponderado o especial valor das circunstâncias atenuantes ou agravantes que se provem no processo, poderá ser especialmente atenuada ou agravada a pena, aplicando-se pena de escalão mais baixo ou de escalão superior do que ao caso caberia. 3. Havendo reincidência, a pena a aplicar, quando igual ou superior a multa, será obrigatoriamente agravada para a de escalão imediatamente superior. 4. Não pode aplicar-se ao mesmo funcionário ou agente mais de uma pena disciplinar por cada infracção ou pelas infracções apreciadas em mais de um processo quando apensados nos termos do artigo 296.º.”
30. Nos termos do art.º 283.º, n.3 do mesmo decreto-lei, a reincidência dá-se quando a infracção é cometida antes de decorrido 1 ano sobre o dia em que tiver findado o cumprimento da pena imposta por virtude de idêntica infracção.
31. Já que se deu por provada a prática pela recorrente dos supracitados actos e factos de infracções disciplinares e só se pode aplicar a pena de multa, deve, feita a acumulação das infracções, aplicar-se a pena mesma ou mais leve, ou pena mais gravosa quando ocorra a situação de reincidência prevista no art.º 283.º, al. f) do mesmo decreto-lei e no n.º3 do mesmo artigo, mas nos autos não existe a situação de reincidência.
32. Indica também o acto administrativo recorrido que a recorrente possui as circunstâncias atenuantes previstas no art.º 282.º, als. a), b) e f) do D.L n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau), bem como as circunstâncias agravantes previstas no art.º 283.º, al. g) e h) do mesmo decreto-lei.
33. Mas a recorrente não acha que ela possua a circunstância agravante de sucessão prevista no art.º 283.º, al. g) do 87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau), segundo o ponto 43 do Relatório, a infracção praticada pela recorrente na última vez foi em 31/5/2005 quando chegou atrasada para exercer funções, e pelo que constituiu a sucessão. (vd. Doc.4)
34. Nos termos do art.º 283.º, n.º4 do 87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau): “A sucessão dá-se quando a infracção for cometida depois de decorrido 1 ano sobre o dia em que tiver findado o cumprimento da pena imposta por virtude de infracção idêntica ou diferente.” Mas já decorreu um ano contado desde o dia em que tinha findado o cumprimento da pena imposta por ter cometido infracção disciplinar da última vez, até ao dia em que tinha cometido as supracitadas infracções disciplinares desta vez, pele que não exista a situação de sucessão.
35. Indica o Dr. Manuel, no seu livro «Manual de Direito Disciplinar», do Centro de Formação Jurídica e Judiciária, edição 2005, fls. 147 que: “Dá-se a sucessão quando haja: -Repetição das faltas disciplinares;- Intervalo de tempo superior a 1 ano entre o cometimento da última e a data de cumprimento da medida aplicada à primeira, tratando-se de infracções idênticas; -Intervalo de tempo inferior a 1 ano no caso de infracções de diferente natureza.”
36. Pelo que a recorrente não tem duas circunstâncias agravantes, quando muito só tem circunstância de acumulação de uma infracção. (art.º 283.º, n.º1, al.) h) do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública).
37. Nos termos do regime de anulabilidade previsto no art.º 124.º do Código do Procedimento Administrativo e no art.º 21.º, n.º1, al. d) do Código do Processo Administrativo Contencioso, deve o acto administrativo recorrido ser anulado por ter incorrido no vício de erro nos pressupostos de direito.
38. Indica o Dr. José Eduardo Figueiredo Dias, no seu livro «Manual de Formação de Direito Administrativo de Macau», do Centro de Formação Jurídica e Judiciária, edição 2010, fls. 91 que “não há dúvida de que estamos perante a concessão de poderes discricionários quando a norma jurídico-administrativa tiver uma natureza facultativa, isto, quando o elemento de ligação for um “pode”, caso em que estamos perante normas autorizativas, ou quando a estatuição compreender medidas em alternativa (A, B ou C).
39. Nos termos do art.º 317.º, n.º1 do D.L n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública) que: “1. As penas disciplinares previstas nas als. A) a c) do n.º 1 do artigo 300.º podem ser suspensas, quando, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao facto punível e às circunstâncias deste, se concluir que a censura do facto e a ameaça de pena bastarão para satisfazer as necessidades de prevenção e reprovação da infracção.” E nos termos do art.º 300.º, n.º1, al. a) a c) do mesmo decreto-lei: “1. As penas aplicáveis aos funcionários e agentes pelas infracções disciplinares que cometerem, são: a) Repreensão escrita; b) Multa; c) Suspensão.”
40. Na realidade, no presente processo, os actos e factos de infracções disciplinares imputados à recorrente foram praticados no mesmo dia e no mesmo turno (período de prestação de serviço), bem como segundo consta da Acusação, tais circunstâncias não são graves. (vd. Doc.6)
41. Segundo o relatório admitido pela entidade recorrida, nele também foi tomado em consideração o facto de a recorrente ter prestado serviço no corpo de guardas prisionais com mais de dez anos e tal, deve tal circunstância ser considerada favorável, tendo, contudo, no relatório sido considerada como circunstância desfavorável. (vd. Doc. 4, fls. 15)
42. Bem como os actos e factos das infracções disciplinares praticados pela recorrente não causaram prejuízo efectivo, pelo contrário tais infracções disciplinares só causaram influência ligeira devendo ser consideradas como circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. h) do D.L n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública).
43. Segundo constam do ponto 44 e 45 da Contestação, em 2001 e 2005, respectivamente, à recorrente foi atribuído o “louvor” de natureza de grupo, tendo, contudo, tais louvores sido considerados no relatório como elogio tributado aos participantes nas respectivas actividades e elogio de espírito do desporto ou do grupo manifestado pelos participantes nas actividades, mas não têm uma ligação directa com as funções exercidas pela recorrente, bem como tais elogios são de natureza de grupo mas não de natureza individual, pelo que o respectivo louvor não pertence às situações previstas no art.º 17.º (Recompensas) da Lei n.º7/2006 (Estatuto do Pessoal da Carreira do Corpo de Guardas Prisionais) nem reúne qualquer uma das situações atenuantes previstas no art.º 282.º do D.L n.º87/89/M (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública). (vd. Doc.4, fls.14)
44. O art.º 17.º da Lei n.º7/2006 (Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública) não regula que os louvores devam ser de natureza individual ou de grupo, ou seja a disposição legal não exclui expressamente a natureza de grupo, basta no exercício das suas funções, se distinga por exemplar comportamento e actos de especial mérito ou bravura; além disso, o “louvor” é atribuído ao agente desde que a participação em actividade pertença ao âmbito das suas funções e se distingue por exemplar comportamento, tratando-se de circunstância favorável que se pode tomar em consideração. Segundo relevado em casos números, embora pertença à natureza de grupo, o louvor também é um dos factores favoráveis a considerar na promoção do pessoal militarizado. (vd. 167.º, n.º1, al. b) (2) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau)
45. O D.L n.º60/94/M dispõe no seu art.º 12.º as situações da pena de suspensão, mas após analisado todo o processo disciplinar, em particular, o acto administrativo de punição ora recorrido, o relatório final do processo disciplinar e a acusação, não foi verificado o cometimento pela recorrente dos supracitados actos aplicáveis à pena de suspensão.
46. O D.L n.º60/94/M dispõe no seu art.º 10.º todas as situações quanto à pena de repreensão escrita e dispõe no seu art.º 11.º todas as situações quanto à aplicação da pena de multa.
47. Os factos que à recorrente eram imputados, quando muito, só reúnem o disposto no art.º 10.º (repreensão escrita) ou no art.º 2.º, al. a), b) e f) aplicação da pena de multa, ambos do D.L n.º60/94/M.
48. Mesmo que haja acumulação das infracções, também não pode violar a disposição sobre a suspensão como punição grave prevista e aplicável nos termos do art.º 12.º, traduzindo-se isso em “nullum crimen, nulla poena sine lege”. (nos termos do art.º 1.º do Código Penal – Princípio da legalidade, aplicável por remissão do art.º 277.º do D.L n.º87/89/M e do art.º 1.º do D.L n.º60/94/M)
49. Além disso, o D.L. n.º87/89/M dispõe no seu art.º 317.º que “as penas disciplinares previstas nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 300.º podem ser suspensas, quando, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao facto punível e às circunstâncias deste, se concluir que a censura do facto e a ameaça de pena bastarão para satisfazer as necessidades de prevenção e reprovação da infracção.”
50. Pelo que, face aos actos praticados pela recorrente no mesmo dia e no mesmo período de prestação de serviço que só se revelam em vídeo, evidentemente, o acto administrativo recorrido de ter aplicado à recorrente a pena de suspensão pertence ao erro no exercício do poder discricionário ou, ao exercício do poder discricionário de forma irrazoável absoluta, nos termos do art.º 21.º, n.º1, al. d) do Código do Processo Administrativo Contencioso, dos art.ºs 124.º, 3º e 5.º do Código do Procedimento Administrativo, deve ser anulado.».
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Contestou a entidade recorrida, pugnando pela improcedência do recurso em termos que aqui damos por reproduzidos.
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Apenas a recorrente apresentou alegações, reiterando no essencial a posição vertida na sua petição inicial.
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O digno Magistrado do MP emitiu o seguinte parecer:
«Objecto do presente recurso contencioso é o despacho de 5 de Fevereiro de 2016, da autoria do Exm.º Secretário para a Segurança, que aplicou à recorrente A, guarda prisional, a pena disciplinar de 90 dias de suspensão.
A recorrente acha que o acto padece dos seguintes vícios: violação de lei por prescrição do procedimento disciplinar; violação de lei por utilização de provas ilegais; falta de fundamentação; erro nos pressupostos de direito; e exercício desrazoável do poder discricionário.
A entidade recorrida, por seu turno, refuta que o acto padeça de tais vícios, afirmando a sua legalidade e pronunciando-se pela improcedência do recurso contencioso.
Vejamos, começando pela questão da prescrição.
Diz a recorrente que houve violação do artigo 289.º, n.ºs 1, 3 e 4, do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, ao não se considerar prescrito o procedimento disciplinar. Na sua tese, teriam decorrido mais de três anos desde a instauração do processo disciplinar até à dedução da acusação e nesse lapso de tempo não teria sido praticado qualquer acto instrutório com efectiva incidência na marcha do processo.
Não tem razão.
Os factos infraccionais que originaram o procedimento tiveram lugar em 20 de Junho de 2010, tendo sido instaurado o procedimento em 8 de Setembro de 2011, e tendo-se iniciado a respectiva instrução no dia 14 do mesmo mês e ano. E é certo que a acusação apenas foi deduzida e notificada em 26 de Maio de 2015. Todavia, nesse entretanto, foram efectuadas diligências instrutórias relevantes, com efectiva repercussão na marcha do processo. Tenha-se presente, para não ir mais longe, os autos de audição da arguida em 27 de Março de 2013 e 7 de Agosto de 2013, que substanciam diligências de avultado interesse para a dilucidação dos factos, ou seja, para a investigação e sequente destino do processo, como o teor e a riqueza de pormenor de tais declarações evidenciam.
Não decorreu, pois, à luz de qualquer das normas do apontado artigo 289.º, o prazo de 3 anos susceptível de acarretar a prescrição do procedimento disciplinar.
Improcede, assim, o primeiro dos vícios imputados ao acto.
Diz também a recorrente que foi punida com base na utilização de provas ilegais, nomeadamente videocassetes e fotogramas do sistema de vigilância, o que afronta normas e princípios das Leis 2/2012 e 8/2005.
Sem prejuízo de quanto a entidade recorrida alega nesta matéria - e sendo certo que não divisamos que, no caso presente, se indicie ter ocorrido qualquer operação de tratamento de dados -, importa não perder de vista que os tribunais de Macau já se pronunciaram sobre questão idêntica, tendo concluído pela licitude da utilização, em processo disciplinar, de imagens captadas por câmaras de vídeo instaladas em serviços públicos - cf. acórdão do Tribunal de Segunda Instância, de 25.02.2016, in Recurso Contencioso 268/2009. Como então se ponderou, tais imagens não constituem prova ilegal porquanto o equipamento é instalado visando finalidades de controlo e segurança, e não com qualquer objectivo específico de intromissão nos passos da vida de funcionários. Também em Portugal, onde o regime de videovigilância desfruta de um quadro normativo similar, se tem entendido que tais imagens podem ser utilizadas como meio de prova em processo disciplinar. Ainda em recente acórdão de 26 de Junho de 2017, no recurso de apelação RP201706266909/16.2T8PRT.P1, o Tribunal da Relação do Porto considerou lícito e admissível tal meio de prova, como se pode ver da seguinte passagem do respectivo sumário: É de aceitar as imagens captadas por sistema de videovigilância como meio de prova em processo disciplinar e na subsequente acção judicial em que se discuta a aplicação de sanção disciplinar, mormente o despedimento, desde que sejam observados os pressupostos que decorrem da legislação sobre a protecção de dados e concomitantemente se conclua que a finalidade da sua colocação não foi exclusivamente a de controlar o desempenho profissional do trabalhador. Num quadro circunstancial assim apurado, o trabalhador não merece - nem a lei lhe confere - maior protecção do que aquela que é conferida aos demais cidadãos e, logo, o meio de prova é lícito e admissível.
Improcede também este vício de violação de lei.
Seguidamente, a recorrente sustenta que o acto padece de falta de fundamentação.
Para tanto, e em suma, aduz que os argumentos arregimentados pelo acto não justificam a aplicação da pena de suspensão que lhe foi imposta.
Salvo melhor juízo, esta suposta deficiência, que vem assinalada ao acto, não integra vício de forma por falta de fundamentação.
Em matéria de fundamentação, o artigo 115.º do Código do Procedimento Administrativo prescreve que ela deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituem neste caso parte integrante do respectivo acto, equivalendo à sua falta a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
A partir deste inciso legal, a doutrina e a jurisprudência vêm apontando a relatividade do conceito e vincando que o que importa é que, perante o acto, um destinatário médio fique inteirado da motivação da decisão, das razões que levaram a Administração a decidir da forma como decidiu e não doutra. Consideram, por isso, que não vale como fundamentação a adopção de proposições ou juízos conclusivos desacompanhados da concretização factual em que assentam, porquanto dessa forma não se logra esclarecer a motivação do acto, desiderato essencial do dever de fundamentação.
No caso vertente, cremos que se mostra suficientemente cumprido aquele dever. Na verdade, os elementos fácticos e de direito arregimentados na fundamentação do acto - onde pontua a actuação protagonizada pela arguida, os deveres que tal actuação violou e os normativos que os prevêem, as demais circunstâncias a atender e a pena aplicada, estas últimas, circunstâncias e pena, igualmente sustentadas nas disposições de direito tidas por aplicáveis -, permitem a um destinatário normal apreender os motivos por que se decidiu no sentido adoptado e não noutro. Aliás, a destinatário do acto e recorrente compreendeu bem as razões da decisão administrativa, como se extrai dos articulados oferecidos neste recurso contencioso. Em bom rigor, as críticas que lhe dirige, a propósito da alegada insuficiência da fundamentação, não relevam da fundamentação como exigência de forma - que é o que ora está em causa -, mas sim do mérito ou do acerto substancial dos fundamentos, sendo esta uma questão diversa, porventura com acuidade para caracterização doutros vícios, mas despida de importância para o aspecto formal da fundamentação.
Soçobra também este vício.
Seguidamente, vem invocado erro nos pressupostos de direito.
Na caracterização deste vício, a recorrente argumenta, em essência, que lhe foi aplicada uma pena mais gravosa do que aquela que normalmente cabe às infracções tidas por provadas, o que sucedeu por via da ponderação do peso das circunstâncias agravantes. Só que - acrescenta - foi erradamente tida como verificada a circunstância “sucessão”.
Afigura-se assistir razão à recorrente, neste ponto. De facto, a decisão punitiva considerou haver uma relação de sucessão entre as infracções investigadas no questionado procedimento disciplinar, ocorridas em 20 de Junho de 2010, e a infracção ocorrida em 31 de Maio de 2005, sendo que, nesta, estava em causa a violação do dever de pontualidade. Pois bem, no caso de infracções de natureza diferente, como sucede entre as referidas infracções de 31 de Maio de 2005 e de 20 de Junho de 2010, a sucessão só opera quando, entre o cumprimento da pena imposta pela primeira e a prática da segunda, medeie um período de tempo inferior a um ano, tal como sustenta a recorrente, respaldada na doutrina de Leal-Henriques. É a conclusão que se impõe pela leitura conjugada das normas dos números 3 e 4 do artigo 283.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, posto que deva reconhecer-se que o texto do referido número 4 não prima pela clareza.
Na situação em análise, esse requisito temporal não ocorria, tendo, assim, sido valorada e ponderada, na determinação da pena, uma circunstância agravante inexistente.
Procede, por isso, o suscitado erro nos pressupostos de direito.
Finalmente, vem invocada a desrazoabilidade no exercício do poder discricionário.
A este propósito, cabe lembrar que a pena foi aplicada com base em determinados pressupostos, um dos quais, a nosso ver, não ocorre, como supra-referido. Daí que tenhamos considerado haver erro, o que, a ser confirmado pelo tribunal, irá implicar a anulação do acto.
Nesta perspectiva, fica prejudicada a apreciação da desrazoabilidade no exercício dos poderes discricionários. Com efeito, não vale a pena, por inútil, estar a discorrer sobre a existência de erro manifesto ou total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários relativamente a uma pena que foi fixada com base em erro num pressuposto de carácter vinculado.
Nestes termos, temos por prejudicado o conhecimento deste último vício.
Ante quanto se deixa dito, procede o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito, pelo que, em razão do disposto no artigo 124.º do Código do Procedimento Administrativo, vai o nosso parecer no sentido do anulação do acto, nessa medida se devendo dar provimento ao recurso.».
*
Cumpre decidir.
***
II – Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
***
III – Os Factos
De acordo com os elementos constantes dos autos e do processo administrativo apenso, damos por assente a seguinte factualidade:
1- A recorrente exerce funções no corpo da guarda prisional na Divisão de Segurança e Vigilância do Estabelecimento Prisional de Macau.
2- Com base em factos ocorridos no dia 20/06/2010, foi instaurado procedimento disciplinar contra a recorrente por despacho do Estabelecimento Prisional de Macau de 8/09/2011 (fls. 2 do p.a.).
3- A instrução do procedimento teve início em 14/09/2011 (fls. 23 do p.a.)
4- No dia 26/05/2015 foi proferida acusação contra a arguida, ora recorrente, com o seguinte teor:
«Governo da Região Administrativa Especial de Macau
Estabelecimento Prisional de Macau
Processo disciplinar n.º 00012-PDD
Arguida:
1. A, guarda, 4º escalão, da carreira do Corpo de Guardas Prisionais, exercício do cargo na Divisão de Segurança e Vigilância do EPM
2. B, guarda, 1º escalão, em regime de assalariamento, exercício do cargo na Divisão de Segurança e Vigilância do EPM
Nos termos dos art.ºs 21.º e 22.º da Lei n.º 7/2006, do art.º 1.º do D.L. n.º 60/94/M de 5 de Dezembro, e dos art.ºs 280.º n.º 2 e 332.º n.º 2 do ETAPM (adiante designado por “Estatuto”), aprovado pelo D.L. n.º 87/89/M de 21 de Dezembro e alterado pelas leis n.ºs 4/2010 e 14/2009 e pelo D.L. n. 62/98/M, deduziu
Acusação
Contra as arguidas A e B,
Dados de identificação das arguidas:
1.
A arguida A, nomeado, definitivamente, guarda, 4º escalão, da carreira do Corpo de Guardas Prisionais, exercício do cargo na Divisão de Segurança e Vigilância do EPM, cuja certidão de registo disciplinar consta-se de fls. 285 e 286 dos autos.
2.
A arguida, B, guarda, 1º escalão, em regime de assalariamento, exercício do cargo na Divisão de Segurança e Vigilância do EPM, cuja certidão de registo disciplinar consta-se de fls. 283 e 284 dos autos.
Factos Provados:
3.
A arguida A prestou serviços no dia 20 de Junho de 2010, das 13h00 às 20h00, no 2º andar da zona prisional feminina (vide fls. 6 dos autos).
4.
A arguida B (escala de serviço n.º K0XX) prestou serviços no dia 20 de Junho de 2010, das 13h00 às 20h00, no 1º andar da zona prisional feminina (R/C) (vide fls. 6 dos autos).
5.
Os superiores em serviço das arguidas A e B durante o referido período de serviços são chefe C, o guarda de plantão D e o chefe de piquete E.
6.
No dia 20 de Junho de 2010, das 13H09 às 13H12, a arguida A não fechou nem trancou, durante três minutos, a porta do 2º andar que dá acesso a outros pisos (vd. fotos 2 a 10, fls. 106 a 107 dos autos, e fotos 1.1 a 1.8, fls. 263 a 264 dos autos, extraídas da videocassete do EPM)
7.
No dia 20 de Junho de 2010, das 13H12 às 14H12, a arguida A saiu do seu posto de trabalho no 2º andar e entrou no 1º andar da zona prisional feminina e aí ficava (rés-do-chão), mas principalmente permanecia na sala de descanso; a arguida saiu e se ausentou do seu posto de trabalho durante uma hora (vd. fotos 12 a 24, fls. 108 a 110 dos autos, e fotos 1 a 18, fls. 190 a 193 dos autos, extraídas da videocassete do EMP)
8.
No dia 20 de Junho de 2010, das 14H12 às 14H19, a arguida A não fechou nem trancou, durante sete minutos, a porta do 2º andar que dá acesso a outros pisos (vd. fotos 29 a 36, fls. 111 a 112 dos autos, e fotos 2.1 a 2.5, fls. 265 dos autos, extraídas da videocassete do EPM)
9.
No dia 20 de Junho de 2010, das 16H04 às 16H17, a arguida A saiu do seu posto de trabalho no 2º andar e entrou no 1º andar da zona prisional feminina e aí permanecia (rés-do-chão); a arguida saiu e se ausentou do seu posto de trabalho durante treze minutos (vd. fotos 80 a 101, fls. 119 a 123 dos autos, extraídas da videocassete do EPM)
10.
No dia 20 de Junho de 2010, das 16H18 às 16H26, a arguida A não fechou nem trancou, durante oito minutos, a porta do 2º andar que dá acesso a outros pisos (vd. fotos 104 a 108, fls. 123 a 124 dos autos, e fotos 111 a 124, fls. 124 a 126 dos autos, bem como fotos 3.1 a 2.9, fls. 266 a 267 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção). Na altura, das 16H20 às 16H26, a arguida saiu do seu posto de trabalho no 2º andar, dirigindo-se ao 3º andar e aí permanecia; a arguida saiu e se ausentou do seu posto de trabalho durante seis minutos (vd. fotos 116, fls. 125 dos autos e 3.7 a 3.9, fls. 267 dos autos, extraídas da videocassete do EPM)
11.
No dia 20 de Junho de 2010, das 17H03 às 18H13, a arguida A não fechou nem trancou, durante uma hora e dez minutos, a porta do 2º andar que dá acesso a outros pisos (vd. fotos 131 a 215, fls. 128 a 142 dos autos, e fotos 4.1 a 4.28, fls. 270 a 274 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção). Na altura, das 17H23 às 17H25, a arguida saiu do seu posto de trabalho no 2º andar dirigindo-se ao 3º andar; a arguida saiu e se ausentou do seu posto de trabalho durante dois minutos e nessa altura, havia reclusa que passou pelo 2º andar deslocando-se do 1º andar ao 3º andar (vd. fotos 155 a 166, fls. 132 a 133 dos autos e fotos 4 a 9, fls. 254 a 255 dos autos, extraídas da videocassete do EPM)
12.
No dia 20 de Junho de 2010, das 18H32 às 19H16, a arguida A saiu do seu posto de trabalho no 2º andar e entrou no 1º andar (rés-do-chão) da zona prisional feminina e aí permanecia e chegou a sair da zona prisional feminina no período entre 18H39 e 18H59 e ao regressar à zona prisional feminina, entrou directamente na sala de descanso e depois, permanecia em vários locais do 1º andar da zona prisional feminina, só até 19H16 saiu da sala de descanso e regressou ao seu posto de trabalho no 2º andar; durante quarenta e quatro minutos a arguida saiu e se ausentou do seu posto de trabalho (vd. fotos 222 a 226, fls. 143 dos autos e fotos 1 a 11, fls. 249 a 251 dos autos, extraídas da videocassete do EPM)
13.
Durante o supracitado período de tempo dos quarenta e quatro minutos em que a arguida A saiu e se ausentou do seu posto de trabalho (entre 18H32 e 19H16), altura em que a mesma só foi substituída por outra guarda prisional no período entre 18H39 e 18H59 num total de 20 minutos, para além desse período não havia outra guarda prisional que a substituiu no seu posto de trabalho (vd. Doc. n.º0005-CI/SSV/2005, a fls. 70 dos autos e o verso do “mapa de transferência de trabalho”, fls. 74 dos autos)
14.
No dia 20 de Junho de 2010, das 19H51 às 20H12, a arguida A não fechou nem trancou, durante vinte e um minutos, a porta do 2º andar que dá acesso a outros pisos (vd. fotos 227 a 249, fls. 144 a 147 dos autos, e fotos 5.1 a 5.16, fls. 275 a 277 dos autos, extraídas da videocassete do EPM).
15.
No dia 20 de Junho de 2010, a arguida A, ao entrar na zona prisional feminina para ir exercer funções ao seu posto de trabalho no 2º andar do bloco, não passou pelo pórtico detector de metais nem abriu a “bolsa de cinta para serviço” para ser examinada pela arguida B que se responsabilizava pela verificação de segurança no 1º andar; na altura, a arguida B, por sua vez, também não exigiu à arguida A que voltasse para passar pelo pórtico detector de metais nem lhe exigiu que abrisse a “bolsa de cinta para serviço” para ser examinada (vd. fotos 7 a 13, fls. 84 a 89 dos autos e fotos a fls. 91 e fotos 217 a 219, fls. 142 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
16.
No dia 20 de Junho de 2010, a arguida A, durante o exercício das funções, não levou consigo a “bolsa de cinta para serviço” como um dos artigos de equipamento (vd. fotos 15 a 16, fls. 89 a 90 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
17
Nos termos do art.º 279.º, n.º2, al. g) e n.º9 do Estatuto, devem os funcionário observar o dever de assiduidade como um dos deveres gerais, ou seja devem comparecer regular e continuadamente ao serviço.
18
Nos termos do art.º 6, als. (6), (1) e (2) da Lei 7/2006, ao pessoal do corpo de guardas prisionais compete efectuar o serviço diurno ou nocturno que lhe competir por escala, exercer vigilância nas instalações prisionais e observar os reclusos nos locais de trabalho, recintos ou zona habitacional com a discrição possível, a fim de detectar situações que atentem contra a ordem e segurança do estabelecimento ou contra a integridade física e moral de todos os que nela se encontrem.
19
Depois de realizada a cerimónia de desfile, devem as guardas prisionais, de serviço, comparecer de imediato aos postos de trabalho a que pertencem.
20
Nos termos das Instruções de Serviço da presente Direcção n.º0003-IS/DSV/2006 (Instruções de Trabalhos Diários das Zonas Prisionais), os guardas prisionais em serviço não podem sair do seu posto de trabalho sem qualquer autorização, bem como devem manter as portas dos pisos fechadas e trancadas.
21
Caso os guardas prisionais necessitem de ausentar-se do posto de trabalho, devem previamente pedir junto do chefe de Piquete, guarda de Piquete ou chefe e só podem sair após obtido a autorização.
22
Deve o guarda prisional assegurar a segurança e a ordem do piso onde a vigilância fica a seu cargo e manter as portas fechadas e trancadas quando não se encontrem em utilização.
23
Durante todo o período do exercício de funções, a arguida A não foi organizado nem destacado a sair do seu posto de trabalho para outro posto de trabalho ou lugar para exercer outras funções (vd. “relatório do trabalho diário do piquete”, fls. 40 dos autos e “registo de entrada e saída de guarda”, fls. 74 dos autos).
24
Todas as vezes, antes de sair do seu posto de trabalho, a arguida não pediu, a qualquer forma, a sua autorização, junto de qualquer um dos seus superiores hierárquicos ou o informou; antes da sua ausência do posto de trabalho, também não havia qualquer superior hierárquico dela que estava à volta dela ou próximo dela (vd. “lista telefónica dos serviços do EPM”, a fls. 105 dos autos, “relatório do trabalho diário do piquete”, a fls. 40 dos autos e “mapa de transferência de trabalho”, a fls. 74 dos autos, e videocassetes da presente Direcção).
25
Segundo o documento n.º 0005-CI/SSV/2005 titulado “descanso durante o exercício de funções” apreciado e autorizado em 28 de Janeiro de 2005 pelo Director F, nela indica expressamente que, a partir de 28 de Janeiro de 2005, “durante o exercício de funções, pode o pessoal do corpo de guardas prisionais ausentar-se do posto de trabalho para descanso por 20 minutos, mas o qual deve ser organizado e autorizado pelo chefe geral de Piquete” (o “chefe geral” aqui se refere ao chefe de Piquete) (vd. fls. 70 dos autos)
26
Embora o intervalo de descanso feito pela arguida A no período entre 18H39 e 18H59 (pontos 18 e 19 do presente Relatório) corresponda ao tempo de descanso de vinte minutos previsto no artigo anterior (das 18H45 às 19H05 conforme consta no verso do “registo de entrada e saída de guarda”, a fls. 74 dos autos, mas entre isso e aquela mostrado no videocassete do EPM, existe uma discrepância), antes da sua ausência do posto de trabalho, a arguida não pediu nem informou, a qualquer forma junto de qualquer um dos seus superiores hierárquicos, a sua ausência do posto de trabalho; e antes da sua ausência do posto de trabalho, na altura também não havia qualquer superior hierárquico que estava em serviço junto ou próximo dela (vd. fotos 215 a 226, a fls. 142 a 143 dos autos, extraídas do videocassete desta Direcção).
27
O pórtico detector de metais instalado na entrada da zona prisional feminina (bloco) é um equipamento pelo qual quaisquer pessoas incluindo guardas prisionais devem passar para entrarem no bloco e simultaneamente também devem ser examinadas pela guarda prisional com detector metal (ou seja B ora arguida no presente processo que se responsabilizava pela verificação de segurança daquela posto de trabalho no 1º andar).
28
Segundo as Instruções de Serviço n.º0033-IS/DSV/2006 (Instruções de Entrada e Saída da Zona de Segurança), constantes de fls. 64 e 64v dos autos, ao entrarem na zona de segurança (incluindo o bloco), os trabalhadores devem submeter-se à verificação de segurança de primeiro grau e só podem entrar desde que tenham concluído de forma correcta o respectivo processo de verificação de segurança. Ao receberem a verificação de segurança de primeiro grau, devem os examinandos passar lentamente pelo pórtico detector de metais e tirar todos os objectos levados consigo (vd. Instruções de Serviço n.º0009-IS/DSV/2006, a fls. 45 e 46 dos autos - Instruções de Revista de Segurança do EPM)
29
De acordo com o despacho n.º 00038-DP/EPM/2010 proferido em 1 de Abril de 2010 pelo Director F, quaisquer pessoas (incluindo guardas prisionais), ao entrarem na zona prisional, devem ser submetidas ao exame feito através de instalações e equipamentos tais como detectores destinados à verificação de segurança (vd. fls. 71 dos autos).
30
Na prática concreta, todas as guardas prisionais incluindo A sabem que, durante a verificação de segurança feita pelo detector de metal, são obrigadas a ficar de pé espontaneamente e abrir a “bolsa de cinta” para ser examinada pela guarda prisional.
31
Segundo a al. 5) das Instruções de Serviço n.º0014-01-IS/DSV/2006 (Instruções do Uso de Uniformes pelo Pessoal do Corpo de Guardas Prisionais) constante de fls. 53 dos autos, o modelo e o uso de uniformes são previstos nas Instruções de Serviços n.º0014-02-IS/DSV/2006 (Instruções do Uso de Uniformes e de Equipamentos pelo Pessoal do Corpo de Guardas Prisionais), a fls. 54 a 63 dos autos e, para todos os modelos de uniformes de A a I, a fls. 55 a 63 dos autos, excepto o modelo G de fls. 61 dos autos (fatos de protecção especial), no uso de uniformes e de equipamentos é usada obrigatoriamente a “bolsa de cinta”.
32
Segundo as Instruções de Serviço n.º0009/DSV/2008, a fls. 78 dos autos, para as guardas prisionais que exerçam funções em blocos, no verão é-lhes permitido o uso de camiseta desportiva de cor branca com emblema estampado do EPM, mas quando as mesmas saiam de blocos, têm que vestir decentemente os uniformes de trabalho ou de treino (n.º3) sem dispensa do uso de “bolsa de cinta”.
33
Nos anos 2005, 2007 a 2011, 2013 e 2014 a arguida A foi classificada com menção de “satisfaz muito” e quanto à sua classificação de serviço em 2006 e 2012, foi classificada com menção de “satisfaz”, pelo que é aplicável a ela a circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. a) do Estatuto.
34
Nas declarações de audiência, a arguida A não confessou as cinco infracções quanto à ausência do posto de trabalho sem autorização que lhe eram imputadas nos pontos 7, 9, 10, 11 e 12 da presente acusação, mas confessou as restantes infracções, pelo que também é-lhe aplicável a circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. b) do Estatuto.
35
As infracções cometidas pela arguida A não são publicadas, pelo que é-lhe aplicável a circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. f) do Estatuto.
36
Mas para além das circunstâncias atenuantes previstas no art.º 283.º, als. a), b) e f) do Estatuto, não lhe são aplicáveis outras circunstância atenuantes.
37
No dia 31 de Maio de 2005, a arguida A violou o dever de pontualidade previsto no art.º 279.º, n.º2, al. h) e n.º10 do Estatuto, por ter chegado atrasada para exercer funções, tendo-lhe sido aplicada a pena de repreensão escrita prevista no art.º 312.º do Estatuto e no art.º 7.º, n.º2 do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, pelo que no presente processo é aplicável a ela a sucessão como circunstância agravante prevista no art.º 283.º, n.º1, al. g) e n.º4 do Estatuto (vd. fls. 290 a 293 dos autos).
38
No presente processo disciplinar, a arguida A, no dia 20 de Junho de 2010, durante o exercício de funções, praticou no posto de trabalho mais de duas infracções, pelo que é lhe aplicável a acumulação de infracções como circunstância agravante prevista no art.º 283.º, n.º1, al. h) e n.º5 do Estatuto.
39
A arguida B confessou voluntariamente as infracções, pelo que é-lhe aplicável a circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. b) do Estatuto.
40
As infracções cometidas pela arguida B não são publicadas, pelo que é-lhe aplicável a circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. f) do Estatuto.
41
Mas para além das circunstâncias atenuantes previstas no art.º 283.º, als. b) e f) do Estatuto, não lhe são aplicáveis outras circunstância atenuantes.
42
Não lhe são aplicáveis as circunstâncias agravantes previstas no art.º 283.º do Estatuto.
Segundo a factualidade provada:
43
As arguidas A e B não cumpriram as suas atribuições e deveres como guardas prisionais, ignorando as importâncias dos seus trabalhos.
44
A arguida A, com dolo, agiu de forma livre, voluntária e consciente ao praticar os actos acima indicados.
45
Não há prova que a arguida B tenha praticado deliberadamente os actos acima indicados.
46
As arguidas A e B tinham perfeito conhecimento de que os seus actos eram proibidos e punidos nos termos da lei e das instruções de serviço.
47
A arguida A cometeu cinco infracções constantes respectivamente nos pontos 7º, 9º, 10º, 11º e 12º da presente acusação por não ter cumprido as atribuições previstas no art.º 6.º, als. 1), 2) e 6) da Lei n.º7/2006, violando o dever de assiduidade dos deveres gerais, previsto no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. g) e 9 do Estatuto, podendo cada infracção ser punida com pena de multa ao abrigo do art.º 11.º, n.2, al. f) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, pela ausência do posto de trabalho sem para tal estar devidamente autorizado ou sem ser previamente substituído.
48
Tendo em consideração os actos praticados pela arguida A, bem como os factos que a arguida evidentemente não cumpriu e desprezou os seus deveres no exercício das funções, tendo não só se ausentado cinco vezes do seu posto de trabalho no mesmo dia (uma das quais se ausentou por mais de uma hora), como também, duas vezes perante tal situação, não tendo fechado e trancado as portas, tudo isso mostra que a arguida não procedeu, de forma prudente, à vigilância e à supervisão das reclusas, não fazendo caso da segurança e da ordem do estabelecimento prisional, pelo que, nos termos do art.º 12.º, n.º1 do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, e dos art.ºs 314.º, n.º1, 303.º, n.º2, al. a) e 316.º do Estatuto, após ter ponderado as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos, o grau de culpa da arguida, a instrutora considera que se pode aplicar à arguida A a pena de suspensão pelo período entre 10 a 120 dias.
49
A arguida A cometeu cinco infracções constantes respectivamente nos pontos 6º, 8º, 10º, 11º e 14º da presente acusação por não ter cumprido as atribuições previstas no art.º 6.º, als. 1), 2) e 6) da Lei n.º7/2006, violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais, previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c), 4 e 5 do Estatuto, podendo cada infracção ser punida com pena de multa ao abrigo do art.º 11.º, n.2, als. a) e b) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro.
50.
Contudo, tendo em consideração os actos praticados pela arguida A, bem como os factos que a arguida evidentemente não cumpriu e desprezou os seus deveres no exercício das funções, tendo não só se ausentado cinco vezes do seu posto de trabalho no mesmo dia (uma das quais se ausentou por mais de uma hora), como também duas vezes perante tal situação, não tendo fechado e trancado as portas, tudo isso mostra que a arguida não procedeu, de forma prudente, à vigilância e à supervisão das reclusas, não fazendo caso da segurança e da ordem do estabelecimento prisional, pelo que, nos termos do art.º 12.º, n.º1 do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro e dos art.ºs 314.º, n.º1, 303.º, n.º2, al. a) e 316.º do Estatuto, após ter ponderado as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos, o grau de culpa da arguida, a instrutora considera que se pode aplicar à arguida A a pena de suspensão pelo período entre 10 a 120 dias.
51
A arguida A cometeu uma infracção constante no ponto 15º da presente Acusação, por não ter observado as ordens do superior hierárquico para dar cumprimento às Instruções de Serviço n.º0033-IS/DSV/2006 (Instruções de Entrada e Saída da Zona de Segurança), n.º0009-IS/DSV/2006 (Instruções de Revista de Segurança do EPM), violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais, previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c), 4 e 5 do Estatuto, assim nos termos do art.º 11.º, n.ºs 1 e 2, als. a) e b) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, e do 313.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e e), 302.º e 316.º do Estatuto, depois de consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos e o grau de culpa da arguida, pode-se aplicar à arguida A a pena de multa.
52
A arguida A cometeu uma infracção constante no ponto 16º da presente Acusação, por não ter observado as ordens do superior hierárquico para dar cumprimento às Instruções de Serviço n.º0014-01-IS/DSV/2006 (Instruções do Uso de Uniformes pelo Pessoal do Corpo de Guardas Prisionais), n.º0014-02-IS/DSV/2006 (Instruções do Uso de Uniformes e de Equipamentos pelo Pessoal do Corpo de Guardas Prisionais), violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais, previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c), 4 e 5 do Estatuto, assim nos termos do art.º 11.º, n.ºs 1 e 2, als. a) e b) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, e do 313.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e e), 302.º e 316.º do Estatuto, depois de consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos e o grau de culpa da arguida, pode-se aplicar à arguida A a pena de multa.
53
Nos termos do art.º 316.º, n.4 do Estatuto, não pode aplicar-se ao mesmo funcionário ou agente mais de uma pena disciplinar por cada infracção, após sintetizadas e ponderadas todas as infracções cometidas nos autos pela arguida A e consideradas todas as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos, a instrutora entende que deve a mesma arguida ser punida com pena de suspensão de 10 a 120 dias.
54
Nos termos do art.º 322.º do Estatuto e da Ordem Executiva n.º 111/2014, compete ao Exm.º Secretário a Segurança aplicar a pena de suspensão, e nos termos do art.º 316.º do Estatuto, pode ser especialmente atenuada ou agravada a pena.
55
A arguida B cometeu uma infracção constante no ponto 21 do presente relatório (ou seja o ponto 15º da Acusação) por não ter observado as ordens do superior hierárquico para dar cumprimento às Instruções de Serviço n.º0033-IS/DSV/2006 (Instruções de Entrada e Saída da Zona de Segurança), n.º0009-IS/DSV/2006 (Instruções de Revista de Segurança do EPM), violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais, previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c), 4 e 5 do Estatuto, assim nos termos do art.º 11.º, n.ºs 1 e 2, als. a) e b) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, e do 313.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e e), 302.º e 316.º do Estatuto, depois de ponderadas as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos e o grau de culpa da arguida, pode-se aplicar à arguida B a pena de multa.
56
Nos termos do art.º 321.º do Estatuto e do art.º 16.º, n.º1 do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, compete ao Exm.º Director do EPM aplicar a pena de multa, e nos termos do art.º 316.º do Estatuto, pode ser especialmente atenuada ou agravada a pena.».
5- A acusação foi notificada à recorrente no dia 26/05/2015.
6- No A anteceder o despacho sancionatório, foi elaborado o relatório final, com o seguinte teor:
«Governo da Região Administrativa Especial de Macau
Direcção dos Serviços Correccionais
Processo disciplinar n.º 00012-PDD/EPM/2011
Arguidas:
1. A, guarda, 4.º escalão, de nomeação definitiva da carreira do corpo de guardas prisionais, actualmente exerce funções na Divisão de Segurança e Vigilância do EPM, da Direcção dos Serviços Correccionais (anterior Divisão de Segurança e Vigilância, do Departamento de Assuntos Prisionais do EPM).
2. B, guarda, 1.º escalão, em regime de contrato administrativo de provimento (foi contratada por assalariamento, antes da entrada em vigor da Lei n.º12/2015), actualmente exerce funções na Divisão de Segurança e Vigilância do EPM, da Direcção dos Serviços Correccionais (anterior Divisão de Segurança e Vigilância, do Departamento de Assuntos Prisionais do EPM).
RELATÓRIO
O processo disciplinar em causa foi instaurado ao abrigo do despacho do Director dos Serviços Correccionais F (antigo director do EPM), de 9/8/2011, tendo a signatária sido nomeada como instrutora do referido processo disciplinar, a fim de apurar os factos quanto ao “caso um” constante da carta de denúncia recebida pela presente Direcção dos Serviços Correccionais (antigo EPM) e remetida pela Comissão de Fiscalização da Disciplina das Forças e Serviços de Segurança de Macau, e aos factos e suas responsabilidades disciplinares pela prática eventual dos actos de violação de instruções de trabalho e de vários deveres pelas guardas prisionais A e B, conforme constam no Relatório n.º 00009-RT/DOI/2011 (vd. fls. 2 dos autos), e nos termos do art.º 6.º, n.º1, al. c) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, só é necessário organizar um processo.
Segundo o despacho exarado em 13/5/2015 pelo Director destes Serviços F, a fls. 384 do processo disciplinar em causa, e o despacho proferido em 7/5/2015 pelo Exm.º Senhor Secretário para a Segurança sobre o Parecer do Gabinete do Secretário para a Segurança n.º03-LC/2015 (vd. fls. 386 dos autos), pela instrutora foi elaborada a nova Acusação e realizado o procedimento legal consequente.
De acordo com o despacho exarado pelo Director F em 4/1/2016 a fls. 444 do presente processo disciplinar, bem como o despacho exarado pelo Secretário para a Segurança em 14/8/2015 no Parecer do Gabinete do Secretário para a Segurança n.º 01-BC/2015 (fls. 445 a 449 dos autos), nos termos do Regulamento Administrativo n.º27/2015, art.ºs 21.º e 22.º da Lei n.º7/2006, art.º 1.º do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, o art.- 137.º, n.º1 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau (daqui em diante “Estatuto”), aprovado pelo D.L n.º87/89/M, de 21 de Dezembro, alterado pelos Lei n.º4/2010, Lei n.º14/2009 e o D.L n.º62/98/M, de 28 de Dezembro, elaborado de novo o relatório seguinte:
1º
A instrução do presente processo disciplinar inicia-se logo após a instauração do processo, comunicando-se ao Director F e às duas arguidas acima indicadas, ao abrigo do art.º 328.º, n.º3 do Estatuto.
2º
Foram tomadas as averiguações e outras diligências necessárias previstas no art.º 329.º do Estatuto no sentido de apurar os factos, bem como foram juntos aos presentes autos o certificado de registo disciplinar das duas arguidas.
3º
Após elaborada a nova Acusação, a instrutora deduziu de novo acusação contra as duas arguidas, e nos termos do art.º 333.º, n.º1 do Estatuto, procedeu à notificação pessoal das mesmas, concedendo-lhes o prazo para apresentar novamente a contestação escrita (vd. fls. 402 dos autos).
4º
Durante a contestação, o advogado constituído pela arguida A requereu e lhe foi autorizada a consulta dos autos no seu próprio escritório (vd. fls. 404 e 408 dos autos), tendo o advogado, mais tarde, em 15/6/2015, entregado a contestação escrita constantes de fls. 411 a 417 dos autos (vd. registo de recepção de documento, a fls. 418 dos autos)
5º
Durante a contestação, a arguida B não requereu a consulta dos autos nem apresentou contestação escrita.
6º
Na fase de audição de declarações, após a contestação, a instrutora ouviu as declarações da testemunha guarda G indicada pela arguida na sua contestação (vd. fls. 420 a 422 dos autos).
Dados de identificação das arguidas:
7º
A, guarda, 4.º escalão, de nomeação definitiva da carreira do corpo de guardas prisionais, actualmente exerce funções na Divisão de Segurança e Vigilância do EPM, da Direcção dos Serviços Correccionais (anterior Divisão de Segurança e Vigilância, do Departamento de Assuntos Prisionais do EPM), cujo certificado de registo disciplinar consta nos autos, fls. 285 a 286).
8º
B, guarda, 1.º escalão, em regime de contrato administrativo de provimento (foi contratada por assalariamento, antes da entrada em vigor da Lei n.º12/2015), actualmente exerce funções na Divisão de Segurança e Vigilância do EPM, da Direcção dos Serviços Correccionais (anterior Divisão de Segurança e Vigilância, do Departamento de Assuntos Prisionais do EPM), cujo certificado de registo disciplinar consta nos autos, fls. 283 a 284).
Factos apurados em fase de instrução:
9º
No dia 20 de Junho de 2010, a arguida Ao ia exercer suas funções no 2º andar da zona prisional feminina, com horário de trabalho das 13H00 às 20H00 (vd. fls. 6, 40 e 74 dos autos).
10º
No dia 20 de Junho de 2010, a arguida B ia exercer suas funções no 1º andar da zona prisional feminina (rés-do-chão), com horário de trabalho das 13H00 às 20H00 (n.ºK0XX na escala de serviço) (vd. fls. 6, 40 e 74 dos autos).
11º
No supracitado período de tempo em que as arguidas A e B exerciam funções, os seus superiores hierárquicos eram chefe C e, D e E, como guarda e chefe de piquete, respectivamente.
12º
No dia 20 de Junho de 2010, das 13H09 às 13H12, a arguida A não fechou nem trancou, durante três minutos, a porta do 2º andar que dá acesso a outros pisos (vd. fotos 2 a 10, fls. 106 a 107 dos autos, e fotos 1.1 a 1.8, fls. 263 a 264 dos autos, extraídas da videocassete da Direcção dos Serviços Correccionais (ou seja o antigo EPM, daqui em diante designada por “presente Direcção”).
13º
No dia 20 de Junho de 2010, das 13H12 às 14H12, a arguida A saiu do seu posto de trabalho no 2º andar e entrou no 1º andar da zona prisional feminina e aí ficava (rés-do-chão), mas principalmente permanecia na sala de descanso; a arguida saiu e se ausentou do seu posto de trabalho durante uma hora (vd. fotos 12 a 24, fls. 108 a 110 dos autos, e fotos 1 a 18, fls. 190 a 193 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
14º
No dia 20 de Junho de 2010, das 14H12 às 14H19, a arguida A não fechou nem trancou, durante sete minutos, a porta do 2º andar que dá acesso a outros pisos (vd. fotos 29 a 36, fls. 111 a 112 dos autos, e fotos 2.1 a 2.5, fls. 265 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
15º
No dia 20 de Junho de 2010, das 16H04 às 16H17, a arguida A saiu do seu posto de trabalho no 2º andar e entrou no 1º andar da zona prisional feminina e aí permanecia (rés-do-chão); a arguida saiu e se ausentou do seu posto de trabalho durante treze minutos (vd. fotos 80 a 101, fls. 119 a 123 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
16º
No dia 20 de Junho de 2010, das 16H18 às 16H26, a arguida A não fechou nem trancou, durante oito minutos, a porta do 2º andar que dá acesso a outros pisos (vd. fotos 104 a 108, fls. 123 a 124 dos autos, e fotos 111 a 124, fls. 124 a 126 dos autos, bem como fotos 3.1 a 2.9, fls. 266 a 267 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção). Na altura, das 16H20 às 16H26, a arguida saiu do seu posto de trabalho no 2º andar, dirigindo-se ao 3º andar e aí permanecia; a arguida saiu e se ausentou do seu posto de trabalho durante seis minutos (vd. fotos 116, fls. 125 dos autos e 3.7 a 3.9, fls. 267 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
17º
No dia 20 de Junho de 2010, das 17H03 às 18H13, a arguida A não fechou nem trancou, durante uma hora e dez minutos, a porta do 2º andar que dá acesso a outros pisos (vd. fotos 131 a 215, fls. 128 a 142 dos autos, e fotos 4.1 a 4.28, fls. 270 a 274 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção). Na altura, das 17H23 às 17H25, a arguida saiu do seu posto de trabalho no 2º andar dirigindo-se ao 3º andar; a arguida saiu e se ausentou do seu posto de trabalho durante dois minutos e nessa altura, havia reclusa que passou pelo 2º andar deslocando-se do 1º andar ao 3º andar (vd. fotos 155 a 166, fls. 132 a 133 dos autos e fotos 4 a 9, fls. 254 a 255 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
18º
No dia 20 de Junho de 2010, das 18H32 às 19H16, a arguida A saiu do seu posto de trabalho no 2º andar e entrou no 1º andar (rés-do-chão) da zona prisional feminina e aí permanecia e chegou a sair da zona prisional feminina no período entre 18H39 e 18H59 e ao regressar à zona prisional feminina, entrou directamente na sala de descanso e depois, permanecia em vários locais do 1º andar da zona prisional feminina, só até 19H16 saiu da sala de descanso e regressou ao seu posto de trabalho no 2º andar; durante quarenta e quatro minutos a arguida saiu e se ausentou do seu posto de trabalho (vd. fotos 222 a 226, fls. 143 dos autos e fotos 1 a 11, fls. 249 a 251 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
19º
Durante o supracitado período de tempo dos quarenta e quatro minutos em que a arguida A saiu e se ausentou do seu posto de trabalho (entre 18H32 e 19H16), altura em que a mesma só foi substituída por outra guarda prisional no período entre 18H39 e 18H59 num total de 20 minutos, para além desse período não havia outra guarda que a substituiu no seu posto de trabalho (vd. Doc. n.º0005-CI/SSV/2005, a fls. 70 dos autos e o verso do “Registo da Entrada e Saída de Guarda”, fls. 74 dos autos)
20º
No dia 20 de Junho de 2010, das 19H51 às 20H12, a arguida A não fechou nem trancou, durante vinte e um minutos, a porta do 2º andar que dá acesso a outros pisos (vd. fotos 227 a 249, fls. 144 a 147 dos autos, e fotos 5.1 a 5.16, fls. 275 a 277 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
21º
No dia 20 de Junho de 2010, a arguida A, ao entrar na zona prisional feminina para ir exercer funções ao seu posto de trabalho no 2º andar do bloco, não passou pelo pórtico detector de metais nem abriu a “bolsa de cinta para serviço” para ser examinada pela arguida B que se responsabilizava pela verificação de segurança no 1º andar; na altura, a arguida B, por sua vez, também não exigiu à arguida A que voltasse para passar pelo pórtico detector de metais nem lhe exigiu que abrisse a “bolsa de cinta para serviço” para ser examinada (vd. fotos 7 a 13, fls. 84 a 89 dos autos e fotos a fls. 91 e fotos 217 a 219, fls. 142 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
22º
No dia 20 de Junho de 2010, a arguida A, durante o exercício das funções, não levou consigo a “bolsa de cinta para serviço” como um dos artigos de equipamento (vd. fotos 15 a 16, fls. 89 a 90 dos autos, extraídas da videocassete da presente Direcção).
23º
Nos termos do art.º 279.º, n.º2, al. g) e n.º9 do Estatuto, devem os funcionário observar o dever de assiduidade como um dos deveres gerais, ou seja devem comparecer regular e continuadamente ao serviço.
24º
Nos termos do art.º 6, als. (6), (1) e (2) da Lei 7/2006, ao pessoal do corpo de guardas prisionais compete efectuar o serviço diurno ou nocturno que lhe competir por escala, exercer vigilância nas instalações prisionais e observar os reclusos nos locais de trabalho, recintos ou zona habitacional com a discrição possível, a fim de detectar situações que atentem contra a ordem e segurança do estabelecimento ou contra a integridade física e moral de todos os que nela se encontrem.
25º
Depois de realizada a cerimónia de desfile, devem as guardas prisionais, de serviço, comparecer de imediato aos postos de trabalho a que pertencem.
26º
Nos termos das Instruções de Serviço da presente Direcção n.º0003-IS/DSV/2006 (Instruções de Trabalhos Diários das Zonas Prisionais), os guardas prisionais em serviço não podem sair do seu posto de trabalho sem qualquer autorização, bem como devem manter as portas dos pisos fechadas e trancadas.
27º
Caso os guardas prisionais necessitem de ausentar-se do posto de trabalho, devem previamente pedir junto do chefe de Piquete, guarda de Piquete ou chefe e só podem sair após obtido a autorização.
28º
Deve o guarda prisional assegurar a segurança e a ordem do piso onde a vigilância fica a seu cargo e manter as portas fechadas e trancadas quando não se encontrem em utilização.
29º
Durante todo o período do exercício de funções, a arguida A não foi organizado nem destacado a sair do seu posto de trabalho para outro posto de trabalho ou lugar para exercer outras funções (vd. “relatório do trabalho diário do piquete”, fls. 40 dos autos e “registo de entrada e saída de guarda”, fls. 74 dos autos).
30º
Todas as vezes, antes de sair do seu posto de trabalho, a arguida não pediu, a qualquer forma, a sua autorização, junto de qualquer um dos seus superiores hierárquicos ou o informou; antes da sua ausência do posto de trabalho, também não havia qualquer superior hierárquico dela que estava à volta dela ou próximo dela (vd. “lista telefónica dos serviços do EPM”, a fls. 105 dos autos, “relatório do trabalho diário do piquete”, a fls. 40 dos autos e “registo de entrada e saída de guarda”, a fls. 74 dos autos, e videocassetes da presente Direcção).
31º
Segundo o documento n.º 0005-CI/SSV/2005 titulado “descanso durante o exercício de funções” apreciado e autorizado em 28 de Janeiro de 2005 pelo Director F, nela indica expressamente que, a partir de 28 de Janeiro de 2005, “durante o exercício de funções, pode o pessoal do corpo de guardas prisionais ausentar-se do posto de trabalho para descanso por 20 minutos, mas o qual deve ser organizado e autorizado pelo chefe geral de Piquete” (o “chefe geral” aqui se refere ao chefe de Piquete) (vd. fls. 70 dos autos)
32º
Embora o intervalo de descanso feito pela arguida A no período entre 18H39 e 18H59 (pontos 18 e 19 do presente Relatório) corresponda ao tempo de descanso de vinte minutos previsto no artigo anterior (das 18H45 às 19H05 conforme consta no verso do “registo de entrada e saída de guarda”, a fls. 74 dos autos, mas entre isso e aquela mostrado no videocassete do EPM, existe uma discrepância), antes da sua ausência do posto de trabalho, a arguida não pediu nem informou, a qualquer forma junto de qualquer um dos seus superiores hierárquicos, a sua ausência do posto de trabalho; e antes da sua ausência do posto de trabalho, na altura também não havia qualquer superior hierárquico que estava em serviço junto ou próximo dela (vd. fotos 215 a 226, a fls. 142 a 143 dos autos, extraídas do videocassete desta Direcção).
33º
O pórtico detector de metais instalado na entrada da zona prisional feminina (bloco) é um equipamento pelo qual quaisquer pessoas incluindo guardas prisionais devem passar para entrarem no bloco e simultaneamente também devem ser examinadas pela guarda prisional com detector metal (ou seja B ora arguida no presente processo que se responsabilizava pela verificação de segurança daquela posto de trabalho no 1º andar).
34º
Segundo as Instruções de Serviço n.º0033-IS/DSV/2006 (Instruções de Entrada e Saída da Zona de Segurança), constantes de fls. 64 e 64v dos autos, ao entrarem na zona de segurança (incluindo o bloco), os trabalhadores devem submeter-se à verificação de segurança de primeiro grau e só podem entrar desde que tenham concluído de forma correcta o respectivo processo de verificação de segurança. Ao receberem a verificação de segurança de primeiro grau, devem os examinandos passar lentamente pelo pórtico detector de metais e tirar todos os objectos levados consigo (vd. Instruções de Serviço n.º0009-IS/DSV/2006, a fls. 45 e 46 dos autos - Instruções de Revista de Segurança do EPM)
35º
De acordo com o despacho n.º 00038-DP/EPM/2010 proferido em 1 de Abril de 2010 pelo Director F, quaisquer pessoas (incluindo guardas prisionais), ao entrarem na zona prisional, devem ser submetidas ao exame feito através de instalações e equipamentos tais como detectores destinados à verificação de segurança (vd. fls. 71 dos autos).
36º
Na prática concreta, todas as guardas prisionais incluindo A sabem que, durante a verificação de segurança feita pelo detector de metal, são obrigadas a ficar de pé espontaneamente e abrir a “bolsa de cinta” para ser examinada pela guarda prisional.
37º
Segundo a al. 5) das Instruções de Serviço n.º0014-01-IS/DSV/2006 (Instruções do Uso de Uniformes pelo Pessoal do Corpo de Guardas Prisionais) constante de fls. 53 dos autos, o modelo e o uso de uniformes são previstos nas Instruções de Serviços n.º0014-02-IS/DSV/2006 (Instruções do Uso de Uniformes e de Equipamentos pelo Pessoal do Corpo de Guardas Prisionais), a fls. 54 a 63 dos autos e, para todos os modelos de uniformes de A a I, a fls. 55 a 63 dos autos, excepto o modelo G de fls. 61 dos autos (fatos de protecção especial), no uso de uniformes e de equipamentos é usada obrigatoriamente a “bolsa de cinta”.
38º
Segundo as Instruções de Serviço n.º0009/DSV/2008, a fls. 78 dos autos, para as guardas prisionais que exerçam funções em blocos, no verão é-lhes permitido o uso de camiseta desportiva de cor branca com emblema estampado do EPM, mas quando as mesmas saiam de blocos, têm que vestir decentemente os uniformes de trabalho ou de treino (n.º3) sem dispensa do uso de “bolsa de cinta”.
39º
Nos anos 2005, 2007 a 2011, 2013 e 2014 a arguida A foi classificada com menção de “satisfaz muito” e quanto à sua classificação de serviço em 2006 e 2012, foi classificada com menção de “satisfaz”, pelo que é aplicável a ela a circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. a) do Estatuto.
40º
Nas declarações de audiência, a arguida A não confessou as cinco infracções quanto à ausência do posto de trabalho sem autorização que lhe eram imputadas nos pontos 13, 15, 16, 17 e 18 do presente Relatório (pontos 7º, 9º, 10º, 11º e 12º da Acusação), mas confessou as restantes infracções, pelo que também é-lhe aplicável a circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. b) do Estatuto.
41º
As infracções cometidas pela arguida A não são publicadas, pelo que é-lhe aplicável a circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. f) do Estatuto.
42º
Mas para além das circunstâncias atenuantes previstas no art.º 282.º, als. a), b) e f) do Estatuto, não lhe são aplicáveis outras circunstância atenuantes.
43º
No dia 31 de Maio de 2005, a arguida A violou o dever de pontualidade previsto no art.º 279.º, n.º2, al. h) e n.º10 do Estatuto, por ter chegado atrasada para exercer funções, tendo-lhe sido aplicada a pena de repreensão escrita prevista no art.º 312.º do Estatuto e no art.º 7.º, n.º2 do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, pelo que no presente processo é aplicável a ela a sucessão como circunstância agravante prevista no art.º 283.º, n.º1, al. g) e n.º4 do Estatuto (vd. fls. 280 a 293 dos autos).
44º
No presente processo disciplinar, a arguida A, no dia 20 de Junho de 2010, durante o exercício de funções, praticou no posto de trabalho mais de duas infracções, pelo que é lhe aplicável a acumulação de infracções como circunstância agravante prevista no art.º 283.º, n.º1, al. h) e n.º5 do Estatuto.
45º
Não são aplicáveis à arguida A as circunstâncias dirimentes previstas no art.º 284.º do Estatuto.
46º
Não é aplicável à arguida A o disposto no art.º 285.º do Estatuto quanto à exclusão da responsabilidade disciplinar.
47º
A arguida B confessou voluntariamente as infracções, pelo que é-lhe aplicável a circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. b) do Estatuto.
48º
As infracções cometidas pela arguida B não são publicadas, pelo que é-lhe aplicável a circunstância atenuante prevista no art.º 282.º, al. f) do Estatuto.
49º
Mas para além das circunstâncias atenuantes previstas no art.º 283.º, als. b) e f) do Estatuto, não lhe são aplicáveis outras circunstância atenuantes.
50º
Não lhe são aplicáveis as circunstâncias agravantes previstas no art.º 283.º do Estatuto.
51º
Não lhe são aplicáveis as circunstâncias dirimentes previstas no art.º 284.º do Estatuto.
52º
Não lhe é aplicável o disposto no art.º 285.º do Estatuto quanto à exclusão da responsabilidade disciplinar.
Matéria não provada:
53º
Nos autos não há provas suficientes que a arguida A, no dia 20 de Junho de 2010, durante o exercício das funções, tenha levado telemóvel ou Tablet PC ou artigo análogo para entrar na zona prisional feminina e no piso, embora o acto de a arguida A ter levado o impermeável para o posto de trabalho e para o piso onde exerce as suas funções contrarie o senso comum.
Apreciação da contestação da arguida A
54º
Quanto ao teor da contestação da arguida, à pretensão e aos fundamentos nela invocados, totalmente não se pode reconhecer nem aceitar.
Dos pontos 3 a 8 da contestação:
55º
De acordo com o art.º 289.º, n.º1 do Estatuto, “o procedimento disciplinar prescreve passados 3 anos sobre a data em que a falta houver sido cometida.” Os actos e factos de violação dos deveres disciplinares que à arguida A são imputadas na Acusação ocorreram efectivamente no dia 20 de Junho de 2010, mas não se pode considerar que o procedimento disciplinar resultante de tais actos prescreva necessariamente passados 3 anos sobre a data em que as infracções tinham sido cometidas.
56º
O processo disciplinar em epígrafe teve origem numa carta de denúncia contra a arguida A (vd. fls. 11v dos autos) recebida em 27/4/2011 pela presente Direcção, após feita a investigação preliminar (vd. fls. 2 a 22 dos autos), verificou-se que as arguidas A e B, no dia 20 de Junho de 2010, cometeram presumivelmente os actos e factos de violação de deveres disciplinares, razão pela qual, o Director F mandou instaurar processo disciplinar contra as duas arguidas.
57º
De acordo com o despacho do Director F constante de fls. 2 dos autos, o processo disciplinar foi instaurado no dia 08 de Setembro de 2011 e iniciada a instrução do caso no dia 14 de Setembro de 2011.
58º
Nos termos do art.º 289.º, n.º3 do Estatuto, “se antes do decurso do prazo prescricional referido no n.º1 for praticado relativamente à infracção qualquer acto instrutório com efectiva incidência na marcha do processo, a prescrição conta-se desde o dia em que tiver sido praticado o último acto, bem como nos termos do n.4 do mesmo artigo, “suspendem o prazo prescricional a instauração dos processos de sindicância e de averiguações e ainda a instauração dos processos de inquérito e disciplinar, mesmo que não tenham sido dirigidos contra o funcionário ou agente a quem a prescrição aproveite, mas nos quais venham a apurar-se faltas de que seja responsável”.
59º
Pelo que o que alega a contestante que o procedimento disciplinar em causa já prescreveu não tem suporte jurídico e fundamental, também não se pode dissolvê-lo ao invocar o disposto no art.º 286.º, n.º1 do Estatuto que o procedimento disciplinar já prescreveu, quanto à responsabilidade disciplinar da arguida A.
Dos pontos 9 a 27 da contestação:
60º
A arguida A indicou em várias partes da sua declaração que a ausência do posto de trabalho carece de autorização dada por seus superiores hierárquicos, também indicou como ia informá-los, daí podemos verificar que a mesma tinha perfeito conhecimento de que antes de ausentar-se do posto de trabalho, devem os guardas prisionais obter previamente a autorização dada pelos superiores hierárquicos nos termos da lei e das instruções de serviço.
61º
Feita a averiguação, ficou provado que não existe nos autos a situação do ponto 12 da contestação e isto já foi indicado no ponto 24º da Acusação, a fls. 393 dos autos. Quanto às situações descritas nos pontos 13, 15 e 16 da Contestação, evidentemente existe uma contradição entre aquelas e a verdade, bem como também se contrariam um a outros os pontos 13, 15 e 16.
62º
Após ouvida a testemunha G indicada pela arguida A, tendo a testemunha referido que não sabia as situações concretas, pelo que a testemunha não consegue provar que os teores dos pontos 12 a 15 da contestação correspondam à verdade.
63º
Na realidade, segundo consta do ponto 11 da Contestação, podemos concluir que a arguida A tinha perfeito conhecimento de que a ausência dos guardas prisionais do posto de trabalho carece de autorização prévia dada pelo superior hierárquico.
64º
A Acusação não viola o princípio non bis in idem, não existe a situação tal como indicada nos pontos 25 e 26 da Contestação.
65º
Segundo consta do ponto 48º da Acusação, “tendo em consideração os actos praticados pela arguida A, bem como os factos que a arguida evidentemente não cumpriu e desprezou os seus deveres no exercício das funções, tendo não só se ausentado cinco vezes do seu posto de trabalho no mesmo dia (uma das quais se ausentou por mais de uma hora), como também, duas vezes perante tal situação, não tendo fechado e trancado as portas, tudo isso mostra que a arguida não procedeu, de forma prudente, à vigilância e à supervisão das reclusas, não fazendo caso da segurança e da ordem do estabelecimento prisional, pelo que, nos termos do art.º 12.º, n.º1 do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, e dos art.ºs 314.º, n.º1, 303.º, n.º2, al. a) e 316.º do Estatuto, após ter ponderado as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos, o grau de culpa da arguida, a instrutora considera que se pode aplicar à arguida A a pena de suspensão pelo período entre 10 a 120 dias.” Mas é meramente uma descrição concisa dos factos objectivos quanto ao sucedido da prática de infracções - “tendo não só se ausentado do seu posto de trabalho por cinco vezes no mesmo dia (uma das quais se ausentou por mais de uma hora) e como também, duas vezes perante tal situação, não tendo fechado e trancado as portas”.
66º
O ponto 48º da Acusação refere-se ao que consta no ponto 47º da Acusação quanto aos cinco actos indicados respectivamente nos pontos 7º, 9º, 10º, 11º e 12º da Acusação, após ponderado as circunstâncias e o grau de culpa da arguida na prática dos ditos cinco actos, a instrutora considera que, de “os actos praticados pela arguida A, bem como os factos que a arguida evidentemente não cumpriu e desprezou os seus deveres no exercício das funções, tudo isso mostra que a arguida não procedeu, de forma prudente, à vigilância e à supervisão das reclusas, não fazendo caso da segurança e da ordem do estabelecimento prisional”, resulta que se pode aplicar à arguida a pena de suspensão de 10 a 120 dias nos termos da lei.
67º
Igualmente, o que consta no ponto 49º da Acusação – “tendo não só não fechado e trancado as portas, como também duas vezes perante tal situação tendo se ausentado do seu posto de trabalho” é meramente uma descrição concisa dos factos objectivos quanto ao sucedido da prática de infracções. O ponto 50º da Acusação refere-se ao que consta no ponto 49º da Acusação quanto aos cinco actos indicados respectivamente nos pontos 6º, 8º, 10º, 11º e 14º da Acusação, após ponderado as circunstâncias e o grau de culpa da arguida na prática dos ditos cinco actos, a instrutora considera que, de “os actos praticados pela arguida A bem como os factos que a arguida evidentemente não cumpriu e desprezou os seus deveres no exercício das funções, tudo isso mostra que a arguida não procedeu, de forma prudente, à vigilância e à supervisão das reclusas, não fazendo caso da segurança e da ordem do estabelecimento prisional”, resulta que se pode aplicar à arguida a pena de suspensão de 10 a 120 dias nos termos da lei.
68º
Na realidade, também se indica no ponto 53º da Acusação que a aplicação à arguida A da pena de suspensão de 10 a 120 dias é feita nos termos do art.º 316.º, n.º4 do Estatuto, depois de sintetizadas todas as infracções praticadas pela arguida A nos autos e consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes da mesma arguida nos autos, pelo que não existe a violação do princípio “non bis in idem”.
69º
Pelo que, não procede o que alega a arguida nos pontos 9 a 27 da sua contestação, não se podendo aceitá-lo.
Dos pontos 28 a 38 da contestação:
70º
Segundo as declarações da testemunha G indicada pela arguida A, tendo a testemunha referido que cada um tinha o seu modo de fazer diferente e pelo que não conseguiu provar os teores constantes dos pontos 30 a 36 da Contestação.
71º
De acordo com as provas constantes dos autos, justamente pode-se provar que os guardas prisionais (incluindo a testemunha G, a fls. 420 a 422 dos autos) têm perfeito conhecimento de que, nos termos das instruções de serviço e da ordem dos superiores hierárquicos, devem as portas dos pisos ser fechadas e trancadas (portas dos pisos e corredores), bem como ao passarem pelas portas devem imediatamente fechá-las e trancá-las, mesma a arguida confirmou isso conforme constante nas suas próprias declarações (vd. fls. 2009 dos autos, na parte superior)
72º
Pelo que, não procede o que alega a arguida nos pontos 28 a 38 da sua contestação, não se podendo aceitá-lo.
Dos pontos 39 a 49 da contestação:
73º
Não faz sentido o que alega a arguida no ponto 40 da sua contestação. No presente processo disciplinar são arguidas A e B, quanto a eventual violação de deveres disciplinares por parte de outra pessoa para além dos autos, contra aquela pode a arguida A fazer denúncia, mas isso não pode servir da razão de atenuação da pena.
74º
Nos termos do art.º 17.º da Lei n.º7/2006 (Estatuto do Pessoal da Carreira do Corpo de Guardas Prisionais, são condições de atribuição de recompensas: “ao pessoal do CGP que, no exercício das suas funções, se distinga por exemplar comportamento e actos de especial mérito ou bravura, podem ser atribuídas, separada ou cumulativamente, as seguintes recompensas: 1) licença por mérito; e 2) louvores.” Mas à arguida A nunca lhe foi atribuída a recompensa por ter praticado acto respeitantes às suas funções, tanto licença por mérito como louvores; segundo constam nos pontos 44 e 45 da contestação, em 2001 e 2005, respectivamente, à arguida A foi atribuído o “louvor” de natureza de grupo, como elogio tributado aos participantes nas respectivas actividades e elogio de espírito do desporto ou do grupo manifestado pelos participantes nas actividades, mas não têm ligação directa com as funções exercidas pela arguida, sendo tais elogios de natureza de grupo mas não de natureza individual, pelo que não reúnem qualquer uma das situações atenuantes previstas no art.º 282.º do Estatuto.
75º
As infracções e os factos praticados pela arguida A afectaram seria e profundamente os serviços e terceiros, dado que:
1. A arguida A não é do pessoal prisional recém-ingressado, mas sim uma guarda prisional sénior com mais de dez anos e tal do tempo de serviço, deve ter um perfeito conhecimento sobre a atribuição de execução da pena privativa de liberdade e da prisão preventiva e pelo que tem deveres de manter a ordem e segurança das instalações prisionais. São conteúdos importantes das funções de guardas prisionais a vigilância sobre os reclusos e o transporte dos mesmos. É grave que o guarda prisional não controle o seu poder de execução, isto não só falta da ética e deontologia profissional, como também não reúne o carácter permanente e obrigatório do serviço a prestar pelo pessoal do Corpo de Guardas Prisionais, previsto na Lei n.º7/2006 (Estatuto do Pessoal da Carreira do Corpo de Guardas Prisionais).
2. Mas a arguida não se esforçou para melhor desempenhar as suas funções, as infracções por si cometidas são muito perigosas para o estabelecimento prisional e para os reclusos até os trabalhadores ou terceiros (tais como visitantes ou qualquer pessoa que entre no estabelecimento prisional ou aí permaneça), as infracções cometidas pela arguida não são leves, uma vez que a falta de vigilância sobre reclusos pode ter uma consequência muito grave.
3. A instauração do presente processo disciplinar está na origem duma queixa apresentada por outras guardas prisionais por não terem satisfeito com os actos de violação de deveres disciplinares praticados pela arguida A, daí pode-se verificar que os actos da arguida já afectaram seriamente outras pessoas.
76º
Segundo a Acusação, nela já foram consideradas plenamente todas as circunstâncias atenuantes aplicáveis à arguida A, ou seja as circunstâncias atenuantes indicadas nos pontos 33º, 34º e 35º da Acusação, previstas no art.º 282.º, al. a), b) e f) do Estatuto, bem como, nos termos do art.º 332.º, n.2, al. b) e do art.º 316.º do Estatuto, também foram consideradas as circunstâncias agravantes aplicáveis a ela resultantes do seu registo disciplinar (vd. fls. 285 dos autos) e mais as circunstâncias agravantes resultantes da acumulação das infracções praticadas pela arguida no dia de ocorrência, pelo que, a Acusação já tomou em plena consideração todas as circunstâncias.
77º
Pelo que, não é admitido o que a arguida alegou nos pontos 39 a 49 da contestação que está fora das supracitadas três circunstâncias atenuantes.
Factos já apuradas:
78º
As arguidas A e B não cumpriram as suas atribuições e deveres como guardas prisionais, ignorando as importâncias dos seus trabalhos.
79º
A arguida A, com dolo, agiu de forma livre, voluntária e consciente ao praticar os actos acima indicados.
80º
Não há prova que a arguida B tenha praticado deliberadamente os actos acima indicados.
81º
As arguidas A e B tinham perfeito conhecimento de que os seus actos eram proibidos e punidos nos termos da lei e das instruções de serviço.
82º
A arguida A cometeu cinco infracções constantes respectivamente nos pontos 13º, 15º, 16º, 17º e 18º do presente relatório (ou seja os pontos 7º, 9º, 10º, 11º e 12º da Acusação) por não ter cumprido as atribuições previstas no art.º 6.º, als. 1), 2) e 6) da Lei n.º7/2006, violando o dever de assiduidade dos deveres gerais, previsto no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. g) e 9 do Estatuto, podendo cada infracção ser punida com pena de multa ao abrigo do art.º 11.º, n.2, al. f) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, pela ausência do posto de trabalho sem para tal estar devidamente autorizado ou sem ser previamente substituído.
83º
A arguida A cometeu cinco infracções constantes respectivamente nos pontos 12, 14, 16, 17 e 20 do presente relatório (ou seja os pontos 6º, 8º, 10º, 11º e 14º da Acusação) por não ter cumprido as atribuições previstas no art.º 6.º, als. 1), 2) e 6) da Lei n.º7/2006, violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais, previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c), 4 e 5 do Estatuto, podendo cada infracção ser punida com pena de multa ao abrigo do art.º 11.º, n.2, als. a) e b) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro.
84º
A arguida A cometeu uma infracção constante no ponto 21 do presente relatório (ou seja o ponto 15º da Acusação) por não ter observado as ordens do superior hierárquico para dar cumprimento às Instruções de Serviço n.º 0033-IS/DSV/2006 (Instruções de Entrada e Saída da Zona de Segurança), n.º 0009-IS/DSV/2006 (Instruções de Revista de Segurança do EPM), violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais, previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c), 4 e 5 do Estatuto, assim nos termos do art.º 11.º, n.ºs 1 e 2, als. a) e b) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, e do 313.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e e), 302.º e 316.º do Estatuto, depois de consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos e o grau de culpa da arguida, pode-se aplicar à arguida A a pena de multa.
85º
A arguida A cometeu uma infracção constante no ponto 22 do presente relatório (ou seja o ponto 16º da Acusação) por não ter observado as ordens do superior hierárquico para dar cumprimento às Instruções de Serviço n.º 0014-01-IS/DSV/2006 (Instruções do Uso de Uniformes pelo Pessoal do Corpo de Guardas Prisionais), n.º 0014-02-IS/DSV/2006 (Instruções do Uso de Uniformes e de Equipamentos pelo Pessoal do Corpo de Guardas Prisionais), violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais, previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c), 4 e 5 do Estatuto, assim nos termos do art.º 11.º, n.ºs 1 e 2, als. a) e b) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, e do 313.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e e), 302.º e 316.º do Estatuto, depois de consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos e o grau de culpa da arguida, pode-se aplicar à arguida A a pena de multa.
86º
Nos termos do art.º 316.º, n.4 do Estatuto, não pode aplicar-se ao mesmo funcionário ou agente mais de uma pena disciplinar por cada infracção, após sintetizadas e ponderadas todas as infracções cometidas nos autos pela arguida A e consideradas todas as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos, a instrutora entende que deve a mesma arguida ser punida com pena de suspensão de 10 a 120 dias.
87º
Nos termos do art.º 322.º do Estatuto e da Ordem Executiva n.º 111/2014, compete ao Exm.º Secretário a Segurança aplicar a pena de suspensão, e nos termos do art.º 316.º do Estatuto, pode ser especialmente atenuada ou agravada a pena.
88º
A arguida B cometeu uma infracção constante no ponto 21 do presente relatório (ou seja o ponto 15º da Acusação) por não ter observado as ordens do superior hierárquico para dar cumprimento às Instruções de Serviço n.º0033-IS/DSV/2006 (Instruções de Entrada e Saída da Zona de Segurança), n.º0009-IS/DSV/2006 (Instruções de Revista de Segurança do EPM), violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais, previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c), 4 e 5 do Estatuto, assim nos termos do art.º 11.º, n.ºs 1 e 2, als. a) e b) do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, e do 313.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e e), 302.º e 316.º do Estatuto, depois de ponderadas as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos e o grau de culpa da arguida, pode-se aplicar à arguida B a pena de multa.
89º
Nos termos do art.º 321.º do Estatuto e do art.º 16.º, n.º1 do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, compete ao Exm.º Director do EPM aplicar a pena de multa, e nos termos do art.º 316.º do Estatuto, pode ser especialmente atenuada ou agravada a pena.
90º
Nos termos do art.º 318.º, n.º1 do Estatuto, a competência disciplinar dos superiores envolve sempre a dos seus inferiores hierárquicos dento do serviço.
Sugestão:
91º
Após sintetizadas e ponderadas todas as infracções cometidas nos autos pela arguida A e consideradas todas as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos, propõe-se que seja aplicada à arguida A a pena de suspensão de 90 dias.
92º
Após sintetizada a infracção cometida nos autos pela arguida B e consideradas todas as circunstâncias atenuantes e agravantes existentes nos autos, propõe-se que seja aplicada à arguida B a pena de multa de 2 dias.».
7- No dia 5/02/2016, o Secretário para a Segurança proferiu o seguinte despacho (a.a.):
«Governo da Região Administrativa Especial de Macau
Gabinete do Secretário para a Segurança
DESPACHO DO SECRETÁRIO PARA A SEGURANÇA
N.º8/SS/2016
Assunto: Processo disciplinar
N.º: Proc. Disciplinar n.º00012-PDD/EPM/2011
Arguida: A, guarda, 4.º escalão, nomeada definitivamente no quadro da Direcção dos Serviços Correccionais
Depois de analisados os dados constantes do presente processo disciplinar, verificou-se que há indícios suficiente que a arguida A, quando estava de serviço no dia 20/6/2010, com dolo, agiu de forma livre, voluntária e consciente ao praticar os actos seguintes:
1) Ausentou-se do posto de trabalho por cinco vezes sem pedir a sua autorização ou informá-lo a qualquer forma, junto de qualquer um dos seus superiores hierárquicos (constam respectivamente a fls. 390 e 391 dos autos, dos pontos 7º, 9º, 10º, 11º e 12º da Acusação);
2) Não manteve, por cinco vezes, as portas fechadas e trancadas do piso onde a vigilância ficou a seu cargo (constam respectivamente a fls. 390 e 391 dos autos, dos pontos 6º, 8º, 10º, 11º e 14º da Acusação);
3) Ao entrar na zona prisional feminina para exercer funções, não passou pelo pórtico detector de metais nem abriu a “bolsa de cinta para serviço” para ser examinada (consta a fls. 392 dos autos, do ponto 15º da Acusação);
4) Durante o exercício das funções, não levou consigo a “bolsa de cinta para serviço” como um dos artigos de equipamento conforme as Instruções de Serviço (constam respectivamente a fls. 392 dos autos, do ponto 16º da Acusação).
Analisados os supracitados factos provados e os dados constantes dos autos, os actos da arguida violaram os deveres seguintes:
De acordo com o ponto 5 das Instruções de Serviço do EPM quanto às guardas prisionais (a actual Direcção dos Serviços Correccionais) n.º0003-IS/DSV/2006 (constante de fls. 338 dos autos): “Os guardas prisionais em serviço não podem sair do seu posto de trabalho sem qualquer autorização.”; Segundo o documento n.º 0005-CI/SSV/2005 (constante de fls. 70 dos autos) apreciado e autorizado pelo Director do EPM (o actual Director dos Serviços Correccionais), durante o exercício de funções, pode o pessoal do corpo de guardas prisionais ausentar-se do posto de trabalho para descanso por 20 minutos, mas o qual deve ser organizado e autorizado pelo chefe de Piquete. Pelo que os actos da arguida pertencem ao abandono do posto de trabalho, violando o art.º 22.º da Lei n.º7/2006 e o dever de assiduidade dos deveres gerais previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. g) e 9 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, aplicável ao regime disciplinar do pessoal do corpo de guardas prisionais.
De acordo com o ponto 10 das Instruções de Serviço do EPM quanto às guardas prisionais (a actual Direcção dos Serviços Correccionais) n.º0003-IS/DSV/2006 (constante de fls. 338 dos autos): “As portas dos pisos devem manter-se fechadas e trancadas.” A arguida não fechou nem trancou as portas do piso onde a vigilância ficava a seu cargo, violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c) e 4 e 5 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, aplicável ao regime disciplinar do pessoal do corpo de guardas prisionais.
Ao entrar na zona prisional feminina para exercer funções, a arguida não passou pelo pórtico detector de metais nem abriu a “bolsa de cinta para serviço” para ser examinada, os respectivos actos não observam as Instruções de Serviço do EPM (a actual Direcção dos Serviços Correccionais) n.ºs 0003-IS/DSV/2006 (constante de fls.64 e 64v dos autos) e 0009-IS/DSV/2006 (constante de fls.45 e 46 dos autos) do EPM (actual Direcção dos Serviços Correccionais) e o Despacho n.º00038-DP/EPM/2010 (constante de fls. 71 dos autos), exarado pelo Director do EPM (o actual Director dos Serviços Correccionais), violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c) e 4 e 5 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau.
Durante o exercício das funções, a arguida não levou consigo a “bolsa de cinta para serviço” como um dos artigos de equipamento conforme as Instruções de Serviço n.ºs 0014-01-IS/DSV/2006 (constante de fls.53 dos autos) e 0014-02-IS/DSV/2006 (constante de fls.54 dos autos) do EPM (a actual Direcção dos Serviços Correccionais), violando os deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais previstos no art.º 279.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e c) e 4 e 5 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau.
De acordo com o auto de declaração da arguida (constante de fls 174 a 178, 208 a 211, 212 a 215 dos autos, respectivamente), a arguida tinha perfeito conhecimento de que os supracitados actos são irregulares, que violam a lei e as instruções de serviço, por outro lado, como pessoal do corpo de guardas prisionais sénior com mais de dez anos e tal do tempo de serviço, deve ter um perfeito conhecimento sobre as atribuições e deveres de guarda prisional, tendo, contudo, ainda agido deliberadamente ao praticar os supracitados actos, pelo que, evidentemente a arguida não cumpriu os seus deveres por não ter observado as atribuições e deveres de guarda prisional e ter negligenciado a importância do seu trabalho e desprezado os seus deveres no exercício das funções, pelo que tem um grau de culpa bastante elevado.
Após ter ponderado as circunstâncias atenuantes previstas no art.º 282.º, al. a) e f), bem como as circunstâncias agravantes previstos no art.º 283.º, n.º1, al. g) e h), n.º4 e 5 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, todos aplicáveis à arguida, nos termos do art.º 316.º, n.ºs 1, 2 e 4, bem como os art.ºs 7.º, 12.º, n.º1 do D.L n.º60/94/M, e o art.º 303.º, n.º2, al. a) do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, no uso das competências conferidas pelo art.º 1 da Ordem Executiva n.º111/2014 e o art.º 322.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, determino aplicar à arguida A a pena de suspensão de 90 dias.
Mando que seja notificada a arguida de que a supracitada decisão é susceptível de recurso contencioso para o Tribunal de Segunda Instância.
Gabinete do Secretário para a Segurança da RAEM, aos 5 de Fevereiro de 2016.
O Secretário para a Segurança
H».
8- Por ter chegado atrasada ao serviço no dia 31 de Maio de 2005, foi a recorrente punida por violação do dever de pontualidade previsto no art.º 279.º, n.º2, al. h) e n.º10 do Estatuto, com a pena de repreensão escrita prevista no art.º 312.º do Estatuto e no art.º 7.º, n.º2 do D.L n.º60/94/M, de 5 de Dezembro, (vd. fls. 280 a 293 dos autos).
***
IV – O Direito
1 – Ao acto administrativo punitivo foram imputados os seguintes vícios:
- Prescrição do procedimento disciplinar;
- Ilegalidade do acto por obtenção de provas ilícitas;
- Falta de fundamentação;
- Erro nos pressupostos de direito;
- Exercício irrazoável do poder discricionário.
*
2 – Da prescrição do procedimento disciplinar
De acordo com o disposto no art. 1º do DL nº 60/94/M (Regime Disciplinar dos Guardas Prisionais), é aplicável a todo o pessoal do Corpo de Guardas Prisionais de Macau, independentemente da natureza do respectivo vínculo, o preceituado nos arts. 276º a 358º do ETAPM.
Segundo o art. 289º do ETAPM:
1. O procedimento disciplinar prescreve passados 3 anos sobre a data em que a falta houver sido cometida.
2. Se o facto qualificado de infracção disciplinar for também considerado infracção penal e os prazos de prescrição do procedimento criminal forem superiores a 3 anos, aplicar-se-ão ao procedimento disciplinar os prazos estabelecidos na lei penal.
3. Se antes do decurso do prazo prescricional referido no n.º 1 for praticado relativamente à infracção qualquer acto instrutório com efectiva incidência na marcha do processo, a prescrição conta-se desde o dia em que tiver sido praticado o último acto.
4. Suspendem o prazo prescricional a instauração dos processos de sindicância e de averiguações e ainda a instauração dos processos de inquérito e disciplinar, mesmo que não tenham sido dirigidos contra o funcionário ou agente a quem a prescrição aproveite, mas nos quais venham a apurar-se faltas de que seja responsável.
Como se vê, desde que determinada tempestivamente, e por quem detenha competência para o fazer, a instauração do procedimento importa a suspensão do prazo prescricional (nº 4, cit. art.). Como a instauração ocorreu dentro do prazo de 3 anos, certamente que por esse facto não podemos dizer estar esgotado o prazo prescricional. E esta suspensão, segundo alguma jurisprudência, perdura até ao trânsito em julgado da decisão judicial que recair sobre o recurso contencioso interposto da sanção (Ac. do TSI, 4/12/2014, Proc. nº 185/2014). Por este prisma, a prescrição ainda não se teria verificado.
Mas, por outro lado, e mesmo que se desconsidere o que se acaba de dizer, ainda temos que contar com o preceituado no nº 3 do mesmo artigo. Estamos aí perante uma causa de interrupção do prazo prescricional, a partir de cuja verificação se inicia nova contagem por inteiro do prazo da prescrição (neste sentido, os Acs. do TUI, de 30/11/2007, Proc. nº 19/2006 e de 17/07/2009, Proc. nº 30/2008).
Ora, e como bem observa o digno magistrado do MP no seu parecer, antes da acusação tiveram lugar actos instrutórios de relevante significado e com efectiva incidência na marcha do processo, de que é exemplo essencial a audição da arguida em 27/03/2013 (que de novo voltou a ser ouvida em 7/08/2013). Sendo assim, com a prática de qualquer um destes actos de instrução, teve lugar a interrupção da prescrição, contando-se desde então um novo prazo integral de 3 anos.
Por este prisma, o prazo de 3 anos contados desde 27/03/2013 terminaria em 27/03/2016. O que significa que o acto administrativo ora sindicado, datado de 5/02/2016, foi tomado antes do termo referido.
Não se verifica, portanto, a apontada prescrição.
*
3 – Da obtenção de provas ilícitas
A recorrente defende ter sido ilícita a obtenção das provas que contra si foram utilizadas, para, com base nelas, vir a ser punida.
Segundo diz, o sancionamento só se ficou a dever ao facto de a entidade administrativa competente para a instrução e acusação se ter servido de vídeocassetes e fotografias do sistema de videovigilância instalado pelo Estabelecimento Prisional de Macau (EPM), actual Direcção dos Serviços Correccionais.
Em sua opinião, a obtenção daquela prova é ilegal pelos seguintes motivos:
1º. Por atentar contra o disposto no art. 2º, nº1, da Lei nº 2/2002. E isto porque a utilização dos registos de videovigilância não podia aqui ser feita, porque legalmente destinada unicamente a fins de investigação criminal e contravencional;
2º. Por ter sido feita uma recolha e utilização contra o disposto no art. 5º, da Lei nº 8/2005 (Lei de Protecção de Dados Pessoais)
3º. Por ter sido feita utilização de uma prova que já deveria ter sido destruída (art. 21º da Lei nº 2/2012).
Vejamos, então.
*
3.1 – O art. 2º, nº1, da Lei nº 2/2012 (Regime Jurídico da Videovigilância em Espaços Públicos), dispõe que:
“A utilização de sistemas de videovigilância destina-se exclusivamente a assegurar a segurança e ordem públicas, nomeadamente prevenir a prática de crimes, e a auxiliar a investigação criminal”.
E o art. 5º da mesma Lei, preceitua que:
Só é permitida a utilização de sistemas de videovigilância para os seguintes fins:
1) Protecção de edifícios públicos e instalações de interesse público, mesmo quando a sua exploração esteja concessionada a entidades privadas;
2) Protecção de edifícios classificados como património histórico ou cultural;
3) Protecção da segurança de pessoas e bens, públicos ou privados, e a prevenção da prática de crimes em locais onde exista um risco razoável para a sua ocorrência, nomeadamente:
(1) Em locais de detenção ou de cumprimento de medidas privativas de liberdade;
(2) Nos postos fronteiriços e quaisquer locais de contacto com o exterior da RAEM;
(3) Nas instalações portuárias e aeroportuárias, e nos serviços de transporte público, ferroviário e rodoviário;
4) Prevenção e segurança rodoviária de pessoas e bens;
5) Protecção de caminhos de acesso e de evacuação dos locais referidos nas alíneas 1) a 3).
Ora, de acordo com o nº 3), a utilização do sistema de videovigilância é permitida para protecção da segurança e bens públicos ou privados, e a prevenção da prática de crimes em locais onde exista um risco razoável para a sua ocorrência, nomeadamente em locais de detenção ou de cumprimento de medidas privativas de liberdade, tal como é, claramente, o caso dos estabelecimentos prisionais (vulgo cadeias ou prisões).
Como nos parece evidente, esta finalidade é um objectivo de prevenção de ordem geral, e não tem no seu pressuposto de incidência pessoal nenhuma classe especial de pessoas destinatárias. Portanto, tanto se aplica aos visitantes dos reclusos, como a estes próprios, como a quem lá trabalha, sem distinção de função. O que se pretende é manter a ordem e a protecção de bens e pessoas e prevenir a prática de ilícitos criminais. Todos estão, quanto a este aspecto, sob a “mira do olho da câmara”.
Como não se pode dizer que esta videovigilância se destinou a “vigiar” a recorrente, guarda prisional, então a sua utilização não parece violar a referida disposição legal, nem sequer os arts. 112º e 113º do CPPM.
De qualquer maneira, o que é decisivo é algo que mais adiante teremos ocasião de explanar.
*
3.2 – Diremos, então, o seguinte:
Em primeiro lugar, a Lei nº 2/2012 prescreve que “A presente lei regula a utilização de sistemas de videovigilância em espaços públicos pelas forças e serviços de segurança da Região Administrativa Especial de Macau, adiante designada por RAEM, enquanto dotadas de autoridade de polícia” (destaque nosso).
Ora, o que se pergunta com total pertinência é se as disposições dessa lei podem ser convocadas para regular o caso em presença. E isso implica começar por apurar se o diploma, quando fala de “forças e serviços de segurança” com poderes de polícia, engloba o EPM, ou como agora se designa, a Direcção dos Serviços Correccionais (DSC).
Vamos ver.
De acordo com o Regulamento Administrativo nº 27/2015, a Direcção dos Serviços Correccionais (DSC) é um serviço público, dotado de autonomia administrativa, que assegura a organização e gestão do serviço prisional e do serviço de execução das medidas tutelares educativas (art.1º).
E o que dizer dos guardas prisionais?
O DL nº 66/94/M, de 30/12, ao aprovar o Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, abrange as carreiras da Polícia Marítima e Fiscal (PMF), o Corpo da Polícia de Segurança Pública (CPSP) e o Corpo de Bombeiros (CB). Não inclui os guardas prisionais.
Por outro lado, o art. 2º da Lei nº 7/94/M (que reajusta o Estatuto referido) continua a excluir do pessoal militarizado os guardas do corpo de guardas prisionais.
Ou seja, os guardas prisionais não são elementos militarizados de forças de segurança!
Então, o que são?
De acordo com o art. 2º da Lei nº 7/2006, ao pessoal do Corpo de Guardas Prisionais compete “garantir a ordem e a segurança nas instalações prisionais, zelar pela observância dos regulamentos prisionais e contribuir para a correcta execução das penas privativas da liberdade, da prisão preventiva e das medidas de segurança privativas da liberdade” (destaque nosso).
Por outro lado, a Lei nº 2/2008, que procede a reestruturação das carreiras nas Forças e Serviços de Segurança, continua a englobar, nos moldes antes definidos, o Corpo de Guardas Prisionais (art. 1º).
Dito isto, podemos concluir:
O Estabelecimento Prisional de Macau/Direcção dos Serviços Correccionais, embora seja um serviço público, não é um serviço de segurança.
Mas o Corpo de Guardas Prisionais é uma força (não militarizada) destinada a manter a ordem e segurança, mas que apenas actua nas instalações no Estabelecimento Prisional.
Quais as consequências desta conclusão? Já veremos.
*
3.3 – Na sequência do que se concluiu no ponto anterior, somos levados imediatamente a concluir que a Lei nº 2/2012 não pode, sequer, aplicar-se ao caso. Porquê?
Porque quem mandou instaurar o procedimento disciplinar foi o Director do Estabelecimento Prisional, que não pertence às forças e serviços de segurança da RAEM, como é pressuposto da aplicação dessa Lei (art. 1º). Ou seja, a sua inaplicabilidade, em primeiro lugar, decorre da natureza do serviço em apreço.
Em segundo lugar, o diploma em apreço não podia aplicar-se aqui por outra razão. Veja-se:
O art. 14º da Lei nº 2/2012 plasma que “As imagens e sons recolhidos nos termos da presente lei podem constituir meios de prova em processo penal ou contravencional2 nas diferentes fases processuais”.
E isto está de acordo com o art. 2º, nº1 do mesmo diploma, segundo o qual “1. A utilização de sistemas de videovigilância destina-se exclusivamente a assegurar a segurança e ordem públicas, nomeadamente prevenir a prática de crimes, e a auxiliar a investigação criminal”.
Portanto, os sons e imagens captadas nos termos da referida Lei só têm valor probatório em processos penais e contravencionais, e não em processos de natureza administrativa infraccional de natureza disciplinar.
Ou seja, se as imagens captadas só podem ao abrigo daquele diploma servir de prova no âmbito daquele tipo de processos, a verdade é que delas nem sequer é possível obter cópias para outros fins, nomeadamente como elemento de prova em procedimentos disciplinares, visto que “é proibida a transferência de dados ou cópia das gravações para além dos fins a que se referem os artigos 14.º e 16.º da presente lei” (art. 18º cit. diploma).
Se isto é assim, à captação de imagens no EPM, desde que não tenham o fim previsto no art. 2º (como não tinham neste caso), não se aplicariam os limites temporais do art. 21º, nºs 1 e 2, da Lei nº 2/2012 para sua conservação e destruição. Dito de outra forma, a uma situação como esta só pode aplicar-se o regime geral que decorre do Regime Jurídico do Tratamento e Protecção de Dados, constante da Lei nº 8/2005.
E quanto a isso, o art. 5º, nº1, al. 2) e 6º, al. 2) e 5), da lei acabada de citar permitiria a recolha e tratamento de imagens da recorrente, precisamente porque:
- Tinham em vista uma finalidade directamente relacionada com o exercício da actividade do responsável pelo tratamento (O director do EPM);
- Tal finalidade tem que ver com o poder de exercício da sua competência disciplinar sobre os guardas prisionais (art. 5º, nº1, al.2), Lei nº 8/2005);
- O tratamento deste dado foi tratado de forma compatível com essa finalidade (art. 5º, nº1, al.2, Lei nº 8/2005);
Por outro lado:
- Não tinha que ser destruída a imagem captada, porque podia ser conservada “durante o período necessário para a prossecução da finalidade da recolha ou do tratamento posterior” (art. 5º, nº1, al. 5), Lei nº 8/2005);
- Não tinha a recorrente que dar o consentimento à utilização destes dados, porque o seu tratamento se mostrou necessário, quer para o “cumprimento da obrigação legal a que o responsável pelo tratamento esteja sujeito” (art. 6º, al. 2), da Lei nº 8/2005), quer para a “Prossecução de interesses legítimos do responsável pelo tratamento ….” (art. 6º, al. 5), da Lei nº 8/2005).
Portanto, e em suma, não cremos que se possa dizer violada nenhuma disposição da Lei nº 2/2012, nomeadamente dos arts. 2º, nº1, 5º e 21º, nºs 1 e 2, porque inaplicável, sequer, ao caso.
De resto, embora referente a uma situação um tanto diferente desta, este TSI já produziu um aresto (de 25/02/2016, Proc. nº 268/2009)3 em que se aceitou como válida, em matéria disciplinar, a prova obtida por imagens captadas por sistema de videovigilância.
Não se ignora, igualmente, a solução da jurisprudência comparada seguida no Ac. da Relação do Porto, de 26/06/2017, Proc. nº 6909/16, onde se diz que “É de aceitar as imagens captadas por sistema de videovigilância como meio de prova em processo disciplinar e na subsequente acção judicial em que se discuta a aplicação de sanção disciplinar, mormente o despedimento».
Todavia, e tal como do dito aresto resulta, a aceitação daquelas imagens fica dependente do facto de serem observados “os pressupostos que decorrem da legislação sobre a protecção de dados” (e no mesmo sentido, o Ac. da RL, de 8/10/2014, Proc. nº 149/14). E aqui foram.
Face a tudo o que se acaba de expor, não procede o vício invocado, não se podendo dizer violados, nem os arts. 2º, 4º, 5º e 6º da Lei 2/2012, nem os artrs. 5º e 6º da Lei nº 8/2005.
*
4 – Da falta de fundamentação
Entende a recorrente que o acto sindicado não contém fundamentos suficientes para suportar a pena de suspensão de 90 dias.
Quanto a este vício, também não achamos que a recorrente tenha razão.
Os factos estão suficientemente descritos no acto de uma forma que não deixa dúvidas a ninguém. Percebe-se, a partir deles, qual a actuação infraccional concreta em que a recorrente teria alegadamente incorrido, com a pormenorizada exposição das circunstâncias de tempo, lugar e modo de como tudo sucedeu.
Quanto à subsunção dos factos ao direito, não se duvide, nem por um momento, que o acto em apreço a fez de uma forma impoluta. Depois da narrativa factual, integrou a acção no grupo de normas, que citou, concernentes aos diversos específicos deveres funcionais enquanto guarda prisional. E, por fim, tomou em devida conta as diversas circunstâncias atenuantes e agravantes aplicáveis ao caso.
Razão pela qual não podemos concordar que se possa dizer violado o dever de fundamentação a que aludem os arts. 114º e 115º do CPA.
*
5 – Do vício de violação de lei (erro sobre os pressuposto de direito)
Em sua opinião, a situação de facto verificada não poderia ser submetida ao regime da sucessão a que alude o art. 283º, nºs1, al. g) e 4, do ETAPM.
Cremos que a recorrente tem razão neste ponto.
Tal como diz o digno Magistrado do MP no seu parecer final dos autos,
«Afigura-se assistir razão à recorrente, neste ponto. De facto, a decisão punitiva considerou haver uma relação de sucessão entre as infracções investigadas no questionado procedimento disciplinar, ocorridas em 20 de Junho de 2010, e a infracção ocorrida em 31 de Maio de 2005, sendo que, nesta, estava em causa a violação do dever de pontualidade. Pois bem, no caso de infracções de natureza diferente, como sucede entre as referidas infracções de 31 de Maio de 2005 e de 20 de Junho de 2010, a sucessão só opera quando, entre o cumprimento da pena imposta pela primeira e a prática da segunda, medeie um período de tempo inferior a um ano, tal como sustenta a recorrente, respaldada na doutrina de Leal-Henriques. É a conclusão que se impõe pela leitura conjugada das normas dos números 3 e 4 do artigo 283.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, posto que deva reconhecer-se que o texto do referido número 4 não prima pela clareza.
Na situação em análise, esse requisito temporal não ocorria, tendo, assim, sido valorada e ponderada, na determinação da pena, uma circunstância agravante inexistente.
Procede, por isso, o suscitado erro nos pressupostos de direito.»
Confrontemos as disposições dos nºs 3 e 4 do art. 283º do ETAPM:
“A reincidência dá-se quando a infracção é cometida antes de decorrido 1 ano sobre o dia em que tiver findado o cumprimento da pena imposta por virtude de idêntica infracção” (art. 283º, nº3, do ETAPM).
“A sucessão dá-se quando a infracção for cometida depois de decorrido 1 ano sobre o dia a que se reporta o número anterior ou quando as infracções forem de natureza diferente» (art. 283º, nº4, do ETAPM).
Significa isto o seguinte:
- Se a infracção for cometida dentro do período de um ano após o cumprimento de pena imposta em virtude idêntica infracção, estaremos perante a circunstância agravante de reincidência.
- Se a infracção for cometida depois de decorrido o período de um ano após o dia em que tiver terminado o cumprimento de pena por infracção da mesma natureza, então estar-se-á perante a agravante de sucessão (nº4, 1ª parte).
- De sucessão se falará, ainda, «quando as infracções forem de natureza diferente» (nº4, “fine”) se entre o cumprimento da anterior e o cometimento se verificar um período inferior a um ano (neste sentido Leal Henriques, Manual de Direito Disciplinar, 2ª ed., CFJJ, pág. 149).
Ora, o acto considerou existir a agravante de sucessão, levando em linha de conta a infracção cometida pela recorrente em 31/05/2005, pela qual foi punida com a pena de repreensão escrita (em 3/08/2005, cfr. fls. 285-286 e 290 do p.a. e tradução a fls. 280-292 e 284 do apenso “traduções”), pela violação do dever de pontualidade.
Por conseguinte, se o dever de pontualidade foi violado em 31/05/2005 e punido em 3/08/2005, e se ele é de diferente natureza da dos deveres de assiduidade, zelo e de obediência alegadamente violados em 20/06/2010, então parece claro que não estamos perante a sucessão (sobre a diferença de natureza entre deveres de pontualidade e assiduidade, v.g., ver Ac. do TSI, de 10/03/2016, Proc. nº 456/2015).
E isto configura um erro nos pressupostos de direito (na verdade, violação de lei) que importa a anulação pelo seguinte: À recorrente foi aplicada uma pena que teve em consideração uma agravante que não se verificava. É forçoso, por isso, admitir que, inexistindo esta, a dosimetria concreta da pena provavelmente seria diferente e inferior à que foi aplicada.
Assim sendo, mesmo que se não acolha a solução invalidante atrás apontada, pela verificação do vício agora em exame o acto não pode deixar de ser anulado.
A pena terá que ser, portanto, refeita, se entretanto inexistir qualquer outra causa que a tanto obste.
E o tribunal não pode, sequer, dizer qual a pena então mais correcta, substituindo-se nesse domínio à entidade administrativa competente, sob pena de estar a fazer administração activa, tendo em conta que “No domínio das penas concretas em matéria disciplinar, não pode o Tribunal substituir-se ao órgão sancionador, sob pena de ingerência no seu exclusivo campo de poderes e, portanto, sem quebra de violação do princípio da separação e independência de poderes, visto que o tribunal não pode fazer administração activa” e que “O princípio da separação de poderes é justificado nestes casos por se estar no âmbito de uma tarefa da Administração incluída na chamada discricionariedade administrativa, e só cede ante um clamoroso e grosseiro erro que denote uma notória injustiça e manifesta desproporção entre a falta cometida e a sanção infligida” (Ac. do TSI, de 10/03/2016, Proc. nº 456/2015; no mesmo sentido, Ac. do TSI, de 6/07/2017, Proc. nº 1011/2015).
Procede, pois, o vício.
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6 – Exercício irrazoável do poder discricionário.
Quanto a este fundamento, entende a recorrente que a entidade administrativa não tomou em consideração o disposto no art. 317º, nº1, do ETAPM, ao não suspender a pena disciplinar.
Além disso, invoca que os factos não deveriam levar à aplicação da pena de suspensão, mas, quando muito, à de multa. Razão pela qual entende ter sido irrazoável o exercício do poder discricionário, nos termos do art. 21º, nº1, al. d), do CPAC e 3º e 5º do CPA.
Cumpre-nos, porém, referir que o acto que aplicou esta pena será anulado pelos dois fundamentos atrás expostos. E essa anulação prejudica, como é óbvio, o conhecimento deste vício, já que se não sabe qual virá a ser a pena disciplinar a aplicar em sede de execução do presente aresto.
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V – Decisão
Face ao exposto, acordam em julgar procedente ao recurso, anulando o acto punitivo sindicado.
Sem custas.
T.S.I., 14 de Junho de 2018
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José Cândido de Pinho Mai Man Ieng
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Lai Kin Hong
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Tong Hio Fong
(vencido nos termos da declaração
de voto que se junta)
DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO
Votei vencido por entender que não existe a alegada violação de lei.
Ao contrário do que se entende no Acórdão, salvo o devido respeito, julgo eu que não merece reparo o acto recorrido ao ter ponderado a agravante da sucessão em desabono da recorrente.
A questão em causa é saber quando há lugar a sucessão a que se alude o n.º 4 do artigo 283.º do ETAPM.
A reincidência dá-se quando a infracção é cometida antes de decorrido 1 ano sobre o dia em que tiver findado o cumprimento da pena imposta por virtude de idêntica infracção (artigo 283.º, n.º 3 do ETAPM).
Trata-se aqui de uma circunstância mais gravosa, portanto, só se verifica quando o agente volta a cometer dentro de um ano a contar do cumprimento da pena disciplinar uma infracção idêntica.
Ao passo que a sucessão consiste numa circunstância menos gravosa, e diz o n.º 4 da mesma disposição legal que “a sucessão dá-se quando a infracção for cometida depois de decorrido 1 ano sobre o dia a que se reporta o número anterior ou quando as infracções forem de natureza diferente”.
Neste n.º 4 do artigo 283.º do ETAPM, o legislador usou a conjunção alternativa “ou” para distinguir as duas situações: ou “quando a infracção for cometida depois de decorrido 1 ano sobre o dia a que se reporta o número anterior” ou “quando as infracções forem de natureza diferente”.
Salvo melhor entendimento, sou da opinião que o n.º 4 do artigo 283.º do ETAPM, quanto se referem a infracções de natureza diferente, não pretende fazer destrinça entre infracções de natureza diferente cometidas antes de decorrido 1 ano sobre o dia em que tiver findado o cumprimento da pena disciplinar e infracções de natureza diferente cometidas depois de decorrido 1 ano, ou seja, independentemente de a nova infracção, de natureza diferente, ter sido cometida antes ou depois de um ano a contar do cumprimento da pena disciplinar, deve ser considerada verificada a circunstância agravante da sucessão.
A meu ver, não obstante a prática de uma infracção de natureza diferente ser uma circunstância menos gravosa em comparação com a prática de infracção da mesma natureza, mas não devemos deixar de considerá-la ainda como agravação na medida em que se trata de uma prática de infracção disciplinar pela segunda vez (pelo menos).
Deste ponto de vista, a sucessão verifica-se, das duas uma, ou quando o agente comete idêntica infracção depois de decorrido 1 ano sobre o dia em que tiver findado o cumprimento, ou quando comete infracção de natureza diferente e independentemente da data em que a mesma venha a ser praticada.
No caso dos autos, na medida em que a recorrente tinha sido punida com a pena de repreensão escrita em 3.8.2005, pela violação do dever de pontualidade, e voltou a cometer em 2010 novas infracções disciplinares pela violação dos deveres de zelo e de obediência dos deveres gerais, entendo eu que há-de considerar a circunstância agravante da sucessão referida na alínea g) do n.º 1 e n.º 4 do artigo 283.º do ETAPM, daí que não procede o vício de violação de lei, devendo este Tribunal julgar improcedente o recurso contencioso.
1 Vd. «Manual de Direito disciplinar», de Manuel Leal-Henriques, Centro de formação Jurídica e Judiciária. fls.97 a 100.
2 Nomeadamente as infracções rodoviárias (cfr. art. 16º da mesma lei).
3 Nele interveio como juiz adjunto quem no presente aresto é relator.
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Rec. Cont. 246/2016 1 / 76