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Processo nº 152/2017
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 21 de Junho de 2018

ASSUNTO:
- Alegações facultativas
- Caducidade da concessão do terreno
- Falta de audiência prévia
- Princípios da imparcialidade, da igualdade, da justiça e da boa-fé

SUMÁRIO:
- As alegações facultativas previstas no artº 68º do CPAC destinam-se para as partes fazerem uma análise crítica dos dados recolhidos nos autos até àquela fase, subsumindo-os ao direito aplicável, nas quais a Recorrente pode alegar novos fundamentos do seu pedido, cujo conhecimento tenha sido superveniente, ou restringi-los expressamente (cfr. nº 3 do artº 68º do CPAC), mas nunca formular um novo pedido.
- Vigora no contencioso administrativo o princípio da estabilidade da instância previsto no artº 212º do CPC, segundo o qual uma vez citada a parte contrária, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei.
- O legislador do CPAC não prevê a possibilidade legal da acrescentação do pedido na fase das alegações facultativas.
- O termo do prazo da concessão provisória sem esta ter sido convertida em definitiva determina inevitavelmente a declaração da caducidade da concessão, que consiste numa actividade vinculada da Administração.
- A audiência de interessados é uma das formas da concretização do princípio da participação dos particulares no procedimento administrativo, legalmente previsto no artº 10º do CPAC, nos termos do qual os órgãos da Administração Pública devem assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objecto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disserem respeito.
- E destina-se a evitar, face ao administrado, o efeito surpresa e, no mesmo passo, garantir o contraditório, de modo a que não sejam diminuídos os direitos ou interesses legalmente protegidos dos administrados.
- A preterição dessa formalidade pode, em certos casos, ser ultrapassada se daí não resulte qualquer ilegalidade determinante da anulação do acto, isto é, quando, atentas as circunstâncias concretas, a intervenção do interessado se tornou inútil, seja porque o contraditório já se encontre assegurado, seja porque não haja nada sobre que ele se pudesse pronunciar, seja porque, independentemente da sua intervenção e das posições que o mesmo pudesse tomar, a decisão da Administração só pudesse ser aquela que foi tomada.
- Os princípios da imparcialidade, da igualdade, da justiça e da boa-fé não são operantes nas actividades administrativas vinculadas.
O Relator,
Ho Wai Neng




Processo nº 152/2017
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 21 de Junho de 2018
Recorrente: Companhia de Desenvolvimento e Fomento Predial X, Lda.
Entidade Recorrida: O Chefe do Executivo da RAEM

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
A Recorrente Companhia de Desenvolvimento e Fomento Predial X, Lda., melhor identificada nos autos, vem interpor o presente Recurso Contencioso contra o despacho do Chefe do Executivo de 15/12/2016, que declarou a caducidade da concessão do terreno com área de 1,575m2, situada em Macau, na Ilha de Coloane, na Zona..., designado por lote “...”, concluíndo que:
- O presente Recurso vem interposto do douto Despacho do Exmo. Senhor Chefe do Executivo de 4 de Janeiro de 2017, exarado sobre o parecer do Exmo. Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 12 de Outubro de 2016, que concordou com o proposto no processo nº 53/2016 da Comissão de Terras, tornado público por Despacho do Exmo. Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas nº 56/2016, publicado no Boletim Oficial de Macau nº II Série, de 4 de Janeiro de 2017, devidamente notificado à ora Recorrente no dia 10 de Janeiro de 2015, por Ofício nº 5/DAT/2017 de 09 de Janeiro de 2017 da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (doravante DSSOPT), que vem declarar a caducidade da concessão do terreno com a área de 1575 m2, designado por lote “...”, situado em Macau, na Ilha de Coloane, na Zona..., descrito na CRP sob o nº ... a folhas … do livro …, pelo decurso do prazo de validade da concessão;
- Mais declara o despacho recorrido que, em consequência da caducidade, as benfeitorias por qualquer forma incorporadas no terreno reverterão, livre de quaisquer ónus ou encargos, para a Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), sem direito a qualquer indemnizaçãc por parte da Recorrente;
- No dia 11 de Dezembro de 1989 a ora Recorrente pediu a concessão, por arrendamento e com dispensa de concurso público, do terreno identificado no art. 1º deste articulado, para nele implementar um edifico industrial para fabrico de calçado;
- Por Despacho nº 63/SATOP/90, publicado no Boletim Oficial de Macau nº 33, de 13 de Agosto de 1990, foi autorizada a concessão, por arrendamento e com dispensa de concurso público, do referido terreno a favor da ora Recorrente, conforme cópia ora se junta sob a designação de documento nº 2 e cujo teor, à semelhança dos demais documentos juntos, se dá aqui por integralmente reproduzido;
- Uma vez que não chegou a ser celebrada escritura pública do contrato de concessão, a mesma passou a ser titulada pelo sobredito despacho;
- E nos termos do nº 1 da cláusula segunda do contrato de concessão, o prazo de concessão foi fixado em 25 anos, contados a partir da data da publicação do sobredito despacho, ou seja, até 12 de Agosto de 2015, podendo a mesma contudo ser sucessivamente renovada até 19 de Dezembro de 2049;
- Conforme o previsto na cláusula terceira do contrato, o terreno seria aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, compreendendo 8 pisos, destinado as finalidades industrial e de estacionamento, ficando parte do rés-do-chão e os 2º e 3º pisos afectados a indústria de fabrico de calcado, a explorar directamente pela concessionária, sendo que o prazo global de aproveitamento do terreno foi fixado em 30 meses, contados da data de publicação no Boletim Oficial de Macau do despacho que autoriza o respectivo contrato;
- A Concessionária, ora Recorrente, pagou a totalidade das prestações do prémio do contrato no valor de MOP2,171,288.00 e de imediato deu início aos procedimentos necessários ao aproveitamento do terreno;
- Por requerimento de 22 de Novembro de 1990 - Talão 6180 - a Recorrente submeteu a DSSOPT o pedido de aprovação do projecto de arquitectura, o qual veio a ser aprovado por despacho de 04 de Setembro de 1991, ou seja, decorridos mais de 10 meses sobre a data do pedido, Ofício nº 4522/DEUDEP/91, de 19 de Setembro de 1991;
- A Recorrente veio manifestar junto da DSSOPT, através de requerimento de 16 de Dezembro de 1991 com registo nº 6644, a sua intenção de apresentar os respectivos projectos de especlalidades, chamando a atenção daqueles serviços que ainda se encontrava a aguardar as sobredltas informações que haviam sido solicitadas;
- Em 18 de Janeiro de 1992 a Recorrente submeteu à DSSOPT o pedido de aprovação do Projecto de Construção, conforme requerimento Talão nº 296 o qual veio a ser aprovado, conforme Ofício nº 3594/DEUDEP/92, de 24 de Julho;
- A situação das infra-estruturas da zona onde se situava o terreno, nomeadamente a abertura de arruamentos e criação de plataformas, estava parada e sem qualquer evolução circunstâncias essas às quais a Recorrente era completamente alheia e que se imputavam em exclusivo à DSSOPT;
- Tais circunstâncias impediram a ora Recorrente de dar início à construção, pois só após a conclusão desses trabalhos a serem levados a cabo pela Administração é que a ora Recorrente poderia dar início ao aproveitamento à construção, O que necessariamente levou a que a Recorrente tivesse que pedir uma prorrogação do prazo de aproveitamento e (re) aprovação do projecto de construção, o que fez por requerimento datado de 21 de Janeiro de 1993 com entrada na DSSOPT com o Registo nº 913;
- Em resposta, a DSSOPT veio informar a Recorrente que a questão das infra-estruturas só poderia ter seguimento assim que estivesse executado o desmonte e regularização do terreno abrangido pelo loteamento de Seac Pai Van, trabalho esse da responsabilidade da DSSOPT e que, na perspectiva da DSSOPT, levaria cerca de 3 (três) anos, e que tal implicaria uma revisão dos contratos existentes por forma a contemplar a nova situação, cfr. Ofício 1804/DEUDEP/93, de 1 de Abril de 1993;
- A DSSOPT informou ainda a Recorrente por Oficio nº 283/8120.2/SOLDEP/93, de 28 de Abril de 1993 que o pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno só coderia ter seguimento quando se encontrassem concluídas as infra-estruturas da Zona de Seac Pai Van;
- Por Oficio da Comissão de Terras nº 96/ACTEXA/93, de 19 de Abril de 1993, foi a Recorrente notificada da minuta das condições do contrato de concessão por alteração das cláusulas 3ª e 4ª, as quais foram aceites pela Recorrente por requerimento de 5 de Maio de 1993;
- Por Despacho nº 74/SATOP/93, publicado no Boletim Oficial de Macau nº 21, de 24 de Maio de 1993, foram alteradas as cláusulas 3ª e 4ª do contrato de concessão;
- Por Despacho do Senhor Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas de 30 de Agosto de 1993 exarado na informação nº 063/SOTSDB/98, de 6 de Agosto de 1993, e dado a conhecer à Recorrente por Oficio nº 851/8120.1/SOLDEP/93, de 2 de Dezembro de 1993, foi decidido o seguinte i) Afectar o loteamento de SEAC PAI VAN à finalidade habitacional em vez de industrial; ii) Atribuir a obra de regularização e loteamento do terreno a uma empresa com capacidade técnica para a sua execução;
- Através do sobredito oficio a DSSOPT informou ainda a Recorrente que, face à nova finalidade do terreno, haveria necessidade de esta se pronunciar quanto à aceitação da revisão do contrato de concessão,
- E que a revisão do contrato de concessão implicava nomeadamente a definição de um novo prazo de aproveitamento compatível com o prazo previsto para a disponibilização do lote;
- Resulta assim do referido despacho que, para além da comunicação que a DSSOPT deveria efectuar a cada um dos concessionários com vista a obter o seu acordo, muitas outras acções impendiam sobre a Administração, como seja a aprovação de um plano de loteamento, a revisão do contrato com a EMPIMAC, a definição com a CM das Ilhas dos critérios e métodos de controle da exploração, a revisão de contratos de concessão e a definição de novos prazos de aproveitamento;
- O Despacho do Senhor Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas de 30 de Agosto de 1993 constitui inequivocamente uma modificação unilateral do contrato de concessao, a raves a qua oram Impostas a teraçoes su stanciais ao mesmo, com consequências importantes sobre a Recorrente ao nível da execução do contrato;
- Por força da alteração da finalidade dos terrenos naquela zona e do impacto que essa alteração traz para os contratos de concessão existentes, a Administração reconheceu a necessidade de estabelecer novos prazos de aproveitamento por força da impossibilidade objectiva que resultava para as concessionárias em cumprir com o aproveitamento no prazo contratualmente estipulado, derrogando por essa via o prazo de aproveitamento estipulado anteriormente na cláusula quinta do contrato de concessão;
- E essas condições foram prontamente aceites pela Recorrente por carta datada de 20 de Dezembro de 1993;
- A Recorrente informou a DSSOPT que apenas se poderia pronunciar acerca da proposta de revisão do contrato após ter conhecimento dos termos e das condições da mesma e requereu à DSSOPT que lhe fossem fornecidas todas as informações relevantes, nomeadamente plantas e outros elementos com as novas directrizes e condicionamentos urbanísticos para que pudesse ser elaborado o novo Estudo de Aproveitamento;
- A este requerimento do Recorrente a DSSOPT não deu qualquer resposta;
- Face à decisão de alteração da finalidade do terreno imposta pela Administração, a ora Recorrente, enquanto Concessionária, nada mais poderia fazer que não fosse aguardar pela concretização do plano de urbanização e de infra-estruturas a definir pelo Governo, e bem assim aguardar que a Administração viesse a concretizar a revisão do contrato com a EMPIMAC, sociedade responsável pelos trabalhos de terraplanagem e pelo Plano de Exploração e Recuperação da Pedreira de Coloane, com intervenção em Seac Pai Van;
- Após o que, a Recorrente seria contactada pela Administração com vista à revisão dos restantes elementos do contrato de concessão (uma vez que a mudança de finalidade já havia sido modificada com a concordância da Recorrente);
- A Administração nunca chegou a concluir os referidos planos de urbanização e de infra estruturas;
- A DSSOPT a considerar suspensos todos os prazos de aproveitamento relativos às concessões atribuídas nos terrenos localizados no novo parque habitacional de Seac Pai Van, como era o caso da concessão sub judice para que pudessem posteriormente ser definidos novos prazos de aproveitamento, de acordo com o decidido pelo Senhor Secretário Adjunto por Despacho de 30 de Agosto de 1993;
- É notório e reconhecido pela própria Administração a sua responsabilidade pelos atrasos verificados no presente processo administrativo, facto que obstou a que os termos da revisão do contrato de concessão imposta pela Administração em virtude da alteração da finalidade do aproveitamento do terreno viessem a ser discutidos e concretizados;
- Desde 1993, apesar de não poder dar qualquer uso ao terreno concessionado, a Recorrente sempre manifestou o propósito de garantir a possibilidade de investir no terreno concessionado, conforme proposto no Oficio da DSSOPT nº 851/8120.1/SOLDEP/93, de 2 de Dezembro de 1993 e aceite por carta datada de 20 de Dezembro de 1993;
- Apesar de não poder dar uso para os fins concessionados por alteração das condições imposta pela Administração, a Recorrente nunca deixou de pagar as rendas devidas;
- O Governo nunca deixou de cobrar as rendas referentes à concessão, bem sabendo que a concessionária não podia dar uso ao terreno concessionado para os aludidos fins industriais;
- A Recorrente tem cumprido pontualmente com todas as suas obrigações enquanto concessionária;
- A Recorrente tem pago pontual e assiduamente a respectiva renda de concessão à Direcção dos Serviços de Finanças, tendo procedido à instalação eléctrica e pagamento das respectivas taxas, e tendo procedido aos necessários trabalhos de manutenção e limpeza do terreno;
- Apesar do silêncio da Administração, a ora Recorrente nunca deixou de diligenciar pelos procedimentos necessários para que fosse realizando trabalhos preparatórios do desenvolvimento do terreno;
- Em 13 de Novembro de 2006 a Requerente veio submeter à Direcção dos Serviços de Cartografia e Cadastro (doravante DSCC) o pedido de planta de implantação no terreno;
- No âmbito dos trabalhos relativos ao plano de infra-estruturas que iam ser levados a cabo pela Administração, em 11 de Abril de 2011 a DSSOPT, por Oficio nº 4113/DURDEP/2011, de 11 de Abril de 2011 e por referência ao Prac. nº 29/2006/D, veio solicitar à Recorrente para que esta efectuasse trabalhos de vedação do terreno concessionado por forma a que pudesse a Administração dar início aos trabalhos de infra-estruturas;
- A Recorrente de imediato efectuou esses mesmos trabalhos tendo para esse efeito realizado novos trabalhos de vedação;
- Em 29 de Maio de 2012 a Requerente submeteu na DSCC o pedido de Planta de Alinhamento Oficial (PAO), porém, os serviços não se dignaram emitir a requerida PAO;
- Perante o novo silêncio da Administração, a Recorrente veio ao fim de quase 1 ano, por requerimento datado de 16 de Maio de 2013, insistir com a DSCC pela emissão da requerida PAO;
- E só em face da insistência da Recorrente é que em 17 de Março de 2014 a DSCC veio responder à Recorrente por Oficio nº 0399/CAR/02.01.199/480/2014, informando-a que a DSSOPT, por Oficio nº 753/DPU/2014, de 12 de Março de 2014, veio informar que não podia ser emitida a PAO uma vez que não havia ainda plano urbanístico definido para aquela zona;
- Face à evidente inércia da Administração na elaboração do Plano Urbanístico durante todo este longo período, a Recorrente nada mais poderia ter feito que não fosse aguardar pela revisão da concessão a levar a cabo pela Administração;
- Em 17 de Abril de 2014 a Recorrente veio uma vez mais insistir com a DSSOPT para que fosse dado andamento ao seu processo, solicitando para tanto o envio da minuta de revisão da concessão;
- Pedido esse que, uma vez mais, não mereceu por parte da DSSOPT qualquer resposta;
- No mesmo dia 17 de Abril de 2014, a Recorrente pediu novamente à DSCC a emissão de uma PAO;
- Da mesma forma, não teve qualquer resposta quanto a este pedido;
- Um ano depois, em 1 de Abril de 2015 a Recorrente veio submeter novo pedido de emissão da PAO
- Em resposta a este pedido, e quase 1 ano depois, veio a DSOPT informar a Recorrente por Ofício nº 364/DPU/2016 de 2 de Março de 2016, que o processo de Plano Urbanístico estava em fase de recolha de opinião pública, sem se pronunciarem no entanto sobre os reiterados pedidos de emissão de PAO anteriormente submetidos;
- A PAO veio finalmente a ser emitida em 9 de Maio de 2016;
- a demora extraordinária na emissão da PAO é apenas imputável à Administração, que não cuidou de elaborar e desenvolver atempadamente o Plano Urbanístico para a zona de Seac Pai Van, bloqueando a execução das concessões atribuídas aos respectivos concessionários e "congelando" os prazos de aproveitamento estipulados contratualmente;
- Com a emissão da PAO a Recorrente, não obstante ter visto a área de terreno reduzida em 30% em virtude da alteração de finalidade imposta pela Administração, de imediato elaborou o novo Projecto de Arquitectura para construção de um edifício habitacional e comercial com 20 pisos e 3 caves para estacionamento, e submeteu-o a aprovação em 25 de Agosto de 2016;
- Por carta dirigida ao Exmo. Senhor Chefe do Executivo em 21 de Junho de 2016 a Recorrente veio uma vez mais impulsionar o processo, explanando o historial de todo o seu processo e manifestando vontade em executar o contrato de concessão, requerendo o andamento célere do processo;
- O processo de apreciação do Projecto de Arquitectura submetido pela Recorrente veio a ter o seu andamento, tendo merecido a aprovação nomeadamente do Corpo de Bombeiros e da CEM em 28 e 13 de Julho de 2016, respectivamente;
- Depois de decorridos um longo período de 22 anos sem que a Recorrente pudesse aproveitar o terreno, por causa imputável em exclusivo à Administração, davam-se agora sinais por parte da Administração de que o processo de revisão do contrato de concessão pudesse vir a ter o tão esperado andamento, criando assim legítimas expectativas na Recorrente de que o contrato poderia vir a ser revisto, novo prazo de aproveitamento pudesse vir a ser definido e o terreno pudesse vir a ser aproveitado;
- Por Ofício nº 5/DAT/2017 de 09 de Janeiro de 2017 da DSSOPT, foi a ora Recorrente notificada da decisão ora recorrida que vem declarar a caducidade da concessão do terreno;
- A Recorrente nunca, em momento algum do processo administrativo de revisão do contrato de concessão, foi chamada a apresentar esclarecimentos e justificações fosse do que fosse, nem nunca foi dado à Recorrente o direito de audiência prévia, consagrado na lei;
- É inegável que os atrasos objectivamente verificados no âmbito do contrato de concessão sub judice se ficaram a dever em exclusivo às decisões da Administração que vieram a constituir modificações unilaterais do contrato que impediram a Recorrente de aproveitar o terreno por mais de 20 anos, obrigando-a por um lado a aguardar pela conclusão do Plano Urbanístico a ser definido pela Administração para aquela zona, e a aguardar por outro lado pela revisão da concessão condicionada a esse mesmo Plano;
- Em momento algum a Administração - nem a DSSOPT, nem directamente a entidade recorrida - notificou a Recorrente da sua intenção em declarar a caducidade da concessão e, por isso mesmo não facultou nem a notificou dos elementos resultantes do n.º 2 do artigo 94.º do CPA;
- A Recorrente não pôde exercer o direito elementar de se pronunciar sobre as questões relevantes do procedimento, nem requerer diligências complementares de prova;
- A preterição da realização da audiência de interessados inquina o acto, por vício de forma, que aqui se invoca para os devidos efeitos legais, nomeadamente para efeitos do estatuído na alínea a) do n.º 1 do artigo 21.º do C.P.A.C, porquanto, não se verificando nenhuma das situações previstas do artigo 96.º do CPA e a entidade recorrida não deu cumprimento ao estabelecido no artigo 93.º do C.P.A., verifica-se o invocado vício de forma, cor preterição de formalidade essencial decorrente do referido normativo, que conduz à anulabilidade do acto, como estatui o artigo 124.º do CPA;
- A decisão recorrida, sustentada no parecer da Comissão de Terras nº 53/2016, omite circunstânctas essenciais para a decisão de caducidade que veio a ser proferida e por isso parte de pressupostos falsos e errados, de facto e de direito;
- O despacho posto em crise contém, para além desse elemento objectivo (caducidade preclusiva), os elementos sancionatórios proferidos contra a Recorrente quais sejam a de não poder reaver benfeitorias e bem assim não poder reclamar quaisquer compensações;
- A posição adoptada pela Entidade Recorrida passa, essencialmente, por uma análise rígida do contrato de concessão sem cuidar de saber se o contrato se modificou, em resultado ce uma decisão de interesse público adoptada pela própria Administração;
- A Administração fez tábua rasa de todas as circunstâncias factuais ocorridas na execução do contrato que apenas a ela são imputáveis, mormente a modificação contratual imposta unilateralmente pela própria Administração;
- A própria Administração quem reconhece (no próprio processo administrativo) e confessa publicamente que o aproveitamento do lote concessionado, para fins habitacionais, está dependente da existência de um plano de pormenor para a Zona de Seac Pai Van e que a Administração ainda não completou os estudos para o plano que não aprovou;
- A modificação das condições contratuais pode ser permitida por um conjunto de cirunstâncias, sendo uma dessas circunstâncias a alteração do interesse público durante a fase de execução do contrato que, em determinados casos, justifica a alteração unilateral dos contratos administrativos;
- Os contratos administrativos estão sujeitos aos princípios gerais que regem todas as relações contratuais, entre os quais o princípio da estabilidade das relações contratuais, o princípio pacta sunt servanda e o princípio da protecção dos direitos e expectativas contratualmente adquiridos; não obstante, por vezes a alteração da conjuntura de interesse público pode pôr em causa a plenitude de tais princípios, como foi o caso dos autos;
- É esse interesse público que domina a acção da Administração e que pode determinar que esta possa, em determinados casos, a proceder à alteração unilateral dos contratos;
- No que concerne os contratos administrativos, entre os quais o de concessão, nada impede que Administração e administrado alterem os negócios que celebram, sobretudo quando estão em causa razões de interesse público;
- No caso dos autos a Entidade Recorrida actuou inicialmente de boa-fé propondo à concessionária a alteração contratual sujeita, necessariamente às alterações do Plano Urbanístico da Zona de Seac Pai Van, ou seja, dependente de actos que cabiam em exclusivo à Administração;
- Esse acordo foi confessado pela Administração, ficando a suspensão do aproveitamento pois, sujeita à instância da Administração, ou seja, à realização de actos que só Administração pode promover e realizar, entre os quais a elaboração do plano e gestão das infra-estruturas públicas;
- As condições e razões dessa suspensão...ainda perduram, na medida em que ainda não foi elaborado e aprovado o Plano Urbanístico de Seac Pai Van;
- Os prazos suspensos...não podem por natureza causar qualquer caducidade!
- A Recorrente, sabendo que o Plano de Reordenamento Urbano de Coloane ainda não se encontra aprovado, cumpriu com o que pôde, nomeadamente, solicitando a emissão de Plantas de Alinhamento por 4 vezes, a saber, em 29 de Maio de 2012, em 16 de Maio de 2013, em 17 de Abril de 2014 e 1 de Abril de 2015;
- Ao longo desses 20 anos a Administração nada fez, e numa conduta que excede os limites da boa-fé, deixa decorrer o prazo da concessão estipulado no contrato, e continua, após esse período, a executar actos tendentes à revisão do contrato de concessão;
- Numa decisão surpresa, declara a caducidade;
- Também o facto de estar a decorrer o processo de revisão do contrato de concessão não foi considerado pelo Senhor Secretário para os Transportes e Obras públicas;
- A Administração, até à presente data, percebeu todas as vantagens do contrato de concessão, entre os quais o pagamento integral do prémio e de todas as Rendas, sem nunca ter permitido o aproveitamento e exploração da concessão por parte da Recorrente;
- Um dos requisitos para a modificação dos contratos é a necessidade de salvaguarda do equilíbrio financeiro do contrato e decorrente também dos princípios de protecção da propriedade privada, da tutela da confiança legítima dos particulares, da justiça, da boa fé, da prossecução do interesse público no respeito pelos direitos e interesses legítimos e da igualdade na repartição dos encargos públicos;
- Tal dever que vincula a Administração está consagrado na al. a) do art. 167º do CPA;
- O princípio do equilíbrio financeiro, fundando-se no princípio da boa-fé e da tutela da confiança, vincula a Administração a gerir e administrar o contrato em respeito pelos legítimos interesses da concessionária e pelas legítimas expectativas que a mesma possa legitimamente ter;
- O dever que incumbe à Administração de repor esse equilíbrio financeiro do contrato, no caso em apreço, implicaria necessariamente uma prorrogação do prazo da concessão dando novo prazo;
- No âmbito do regime jurídico instituído pela Lei nº 6/80/M, de 5 de Julho, em vigor à data da celebração do contrato de concessão, previa-se desde logo a possibilidade da renovação das concessões, quer definitivas, quer provisórias;
- Ao estabelecer um regime jurídico com prazos específicos de renovação no art. 55º dirigido especificamente às concessões definitivas, à contrário, o art. 54º necessariamente, terá de se referir às concessões provisórias;
- Qualquer interpretação que seja feita, quer ao contrato, quer à nova Lei de Terras, essa mesma interpretação nunca pode ser feita no sentido de se violarem os princípios do equilíbrio económico-financeiro, da boa-fé e da tutela da confiança, e da protecção dos direitos já constituídos na esfera jurídica do particular;
- Se não fosse pelo caminho da prorrogação da concessão, a mesma Lei de Terras, na redacção actual, já protege através do artigo 215º, al. 2) os interesses em causa nos presentes autos porquanto faz prevalecer as normas já acordadas entre a Administração e a Recorrente;
- O legislador da Lei de Terras, demonstrando um interesse em proteger os direitos já constituídos, impõe ao aplicador da Lei e à Administração um cuidado especial de atentar às normas clausuladas pelas partes no contrato de concessão a que respeitam;
- In casu, resulta do próprio contrato que as partes quiseram prever a possibilidade de ampliar a duração do contrato para além daquele inicialmente fixado;
- A lei nova não pode assim, por força do art. 215º, al.) 2, restringir as posições jurídicas contratualmente assumidas entre as partes;
- É evidente pois que a Administração e a Recorrente protegeram-se, e em especial, protegerarn a Recorrente, que veria sempre a possibilidade de se alargar tal prazo de concessão a qualquer momento por se tratar in casu de facto causado pela Administração;
- A protecção dos interesses e direitos da Recorrente está ainda consagrado na Lei Básica como decorre do art. 120º da Lei Básica;
- A Recorrente tem o direito próprio que é não só protegido pelo contrato de concessão, como, para além disso, tem a protecção soberana da Lei Básica da RAEM provada por quem tem uma legitimidade normogenética superior à legitimidade dos órgãos legislativos da Região;
- Ainda que se entendesse que foi entendimento dos órgãos legislativos da RAEM de restringir direitos previamente constituídos e salvaguardados nos contratos de concessão pretéritos, o certo é que a Assembleia Nacional Popular da Republica Popular da China protegeu tais direitos e todos os órgãos, quer legislativos, quer administrativos, quer judiciais, lhes deve obediência;
- É consabido que no direito administrativo é possível distinguir dois tipos de caducidade, enquanto formas de extinção dos actos administrativos: a caducidade preclusiva e a caducidade sanção;
- A primeira - caducidade preclusiva - tem apenas como requisito objectivo o mero decurso do tempo, operando a mesma automaticamente, pelo que a declaração de caducidade que venha a ser emitida, enquanto meramente enunciativa de um facto que se verifica na realidade, não tem efeitos constitutivos, mas meramente declarativos;
- Na segunda - caducidade sanção - existe já uma margem e um dever de apreciação da Administração, tendo a declaração de caducidade que vier a ser emitida, efeitos constitutivos;
- A Lei de Terras, no que respeita a concessões e a fortiori a direitos reais que entram na esfera jurídica dos particulares, não podia deixar de prever a possibilidade de se declarar a caducidade de tal direitos, com os elementos que implicam a determinação do incumprimento de uma das partes;
- Exige-se da parte da Administração a verificação e confirmação de dois pressupostos sine qua non: do lado dos pressupostos objectivos temos necessariamente o evidente decurso ao tempo, isto é, o decurso do prazo da concessão, e bem assim o não aproveitamento; do lado dos pressupostos subjectivos temos necessariamente o incumprimento, ou dito de outra forma, os elementos de culpa que motivam a cessação do direito concedido, ou seja, que o não aproveitamento se ficou a dever a culpa do concessionário;
- De acordo com o princípio da investigação o órgão da Administração competente teria de, uma vez decorrido o prazo da concessão, verificar no caso concreto se o concessionário estava em condições de aproveitar o terreno e se, não estava, se essa impossibilidade se lhe era imputável ou não;
- Nem a própria Entidade Recorrida sustenta a tese da caducidade preclusiva, e tantoassim é que a mesma, para motivar a declaração de caducidade, invoca o não aproveitamento por parte da Recorrente;
- A Administração ignorou, ou quis ignorar, o facto de esse não aproveitamento ser impossível de exigir da Recorrente, porquanto foi motivado pela própria Administração;
- Neste particular, a decisão incorre em manifesto abuso de direito;
- Resulta dos factos que a Administração investiu a Recorrente numa confiança de que iria ser titular de uma concessão com o fim prometido, o habitacional, para depois derrogar a sua própria palavra, sendo manifesto aqui o venire contra factum proprium que impede, por abusivo, que a Administração exerça o direito (se o houvesse) de declarar a dita caducidade;
- Por outro lado, e por saber que colocou a Recorrente na situação de impossibilidade de aproveitamento (que só à Administração se deve) para mais tarde vir a invocar essa mesma falta de aproveitamento contra a Recorrente, é manifesto tratar-se de uma inalegabilidade formal, ou seja, um impedimento que se justifica pelo facto de que quem cria uma situação de facto não pode invocar essa mesma situação em que deveras colocou a contraparte com o objectivo de retirar daí vantagens, como é o caso dos autos;
- Está também expresso no próprio despacho recorrido o elemento de culpa porquanto sanciona a Recorrente no que respeita à perda de direitos decorrentes de benfeitorias ou compensações;
- Ao declarar a caducidade nos termos em que o fez, a Administração incorre no vício de violação de lei, por violação das seguintes normas legais: art. 120º da Lei Básica, art. 54º e 55º da Lei 6/80/M, de 5 de Julho; art. 48º e 215º da Lei 10/2013, al. a) do art. 167º do CPA, art. 326º do Código Civil e da cláusula segunda do contrato de concessão;
- Que gera a anulabilidade do acto, como resulta do artigo 124º do CPA, que aqui se invoca para os devidos efeitos legais, nomeadamente para efeitos do estabelecido na alínea d) do nº 1 do artigo 21º do CPAC;
- A decisão assenta em fundamentação de facto e de direito errada, pelo que está inquinada com o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e erro de direito;
- O pressuposto de que o acto recorrido partiu - isto é, de que o aproveitamento contratualmente estabelecido não se mostrava verificado e de que esse não aproveitamento se ficou a dever a culpa da Recorrente - está errado, pelo que o mesmo se encontra inquinado do vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto;
- Há uma manifesta discrepância entre o conteúdo ou objecto do acto e as normas jurídicas que lhe são aplicáveis, o que constitui um vício de violação de lei na vertente de erro de direito, na senda do que vem sendo jurisprudência unânime, isto é, de que o erro na interpreteção ou indevida aplicação da regra de direito (erro de direito) consubstancia uma hipótese de violação de lei;
- Donde resulta o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e erro de Direito, o que gera a anulabilidade do acto, como resulta do artigo 124º do CPA, que aqui se invoca para os devidos efeitos legais, nomeadamente para efeitos do estabelecido na alínea d) do nº 1 do artigo 21º do CPAC;
- Tendo em conta a decisão administrativa de alteração da finalidade do terreno e do consequente processo de revisão do contrato de concessão, a Recorrente tinha legitimas expectativas de que o contrato de concessão pudesse vir a ser revisto e o terreno pudesse vir a ser aproveitado;
- Ao longo de todos estes anos, a ora Recorrente por diversas vezes recorreu aos serviços de arquitectos, engenheiros e projectistas a fim de pôr em prática o efectivo aproveitamento do terreno;
- A Recorrente incorreu em avultadas despesas, nomeadamente com planeamentos de obra, projectos de arquitectura e engenharia, manutenção do terreno, instalação de ectricidade, cujo montante ascendeu a MOP$961,000, e o prémio no valor de MOP2,171,288.00, e rendas no valor de MOP44,100.00;
- A Administração Pública, no domínio do Direito Privado, e bem assim no domínio do Jireito Público, subordina-se ao princípio da Boa-Fé, nos termos previstos no artigo 8º do CPA, o qual foi manifestamente violado;
- A entidade recorrida, ao decidir como decidiu, violou o Princípio da Protecção da confiança Legítima, corolário do Princípio da Boa-Fé;
- A actuação da Administração Pública é total e manifestamente desproporcional e inadequada;
- Ao decidir como decidiu, o Exmo. Senhor Chefe do Executivo desrespeitou os mais elementares princípios fundamentais do direito que regem a actividade da Administração Pública, nomeadamente o princípio da colaboração entre a Administração e os particulares, o princípio da protecção da confiança legítima, corolário do princípio da boa fé, bem como o princípio da proporcionalidade,
- O que configura uma enfermidade do acto por violação de lei, o que gera a a anulabilidade do mesmo acto, como resulta do artigo 124º do CPA, que aqui se invoca para os devidos efeitos legais, nomeadamente para efeitos do estabelecido na alínea d) do nº 1 do artigo 21º do CPAC;
- No caso do tratamento dado pela Entidade Recorrida ao lote SN não aproveitado e cuja caducidade não foi declarada pela Entidade Recorrida, o Senhor Chefe do Executivo teve dois pesos e duas medidas;
- Também em 16 processos administrativos devidamente identificados as demoras dos serviços competentes foram consideradas pelo Senhor Chefe de Executivo para justificar a não declaração de caducidade das respectivas concessões;
- No que se refere aos 16 processos administrativos que mereceram essa decisão de não declaração de caducidade dos terrenos concessionados o Senhor Chefe do Executivo decidiu de forma diferente, considerando como falhas da Administração, e logo fundamentos cara a sua decisão, a não emissão atempada de Plantas de Alinhamento Oficial (cfr. Processo Administrativo nº 1181.1 da Direcção dos Serviços de Solos Obras públicas e Transportes relativo ao Despacho 56/SOPT/03), ou a falta de respostas ou demora nas mesmas aos pedidos do concessionários (cfr. Processo Administrativo nº 2328.01 da Direcção dos Serviços de Solos Obras públicas e Transportes relativo aos despachos 32/SOPT/01 e 67/SOPT/04, Processo Administrativo nº 2342.1 da Direcção dos Serviços de Solos Obras públicas e Transportes relativo ao Despacho 43/SOPT/01, Processo Administrativo nº 6270.1 da Direcção dos Serviços de Solos Obras públicas e Transportes relativo ao Despacho 173/SATOP/97), Processo Administrativo nº 6283.1 da Direcção dos Serviços de Solos Obras públicas e Transportes relativo ao Despacho 32/SATOP/98 e Processo Administrativo nº 6295.1 da Direcção dos Serviços de Solos Obras públicas e Transportes relativo ao Despacho 13/SATOP/98);
- Resulta inequívoco que, nestes novos 16 processos administrativos que vieram agora a ser divulgados pela Administração, o Senhor Chefe do Executivo teve dois pesos e duas medidas, em clara e grave violação do Princípio da Igualdade plasmado no nº 1 do artigo 5º do CPA e que vincula a Administração;
- No caso sub judice a entidade recorrida não considerou como fundamentos para a sua decisão factos que naqueles 16 processos administrativos vieram a ser justificativos para a não declaração de caducidade, tratando ostensivamente de forma diferente processos que se encontravam nas mesmas circunstâncias, e fazendo-o em claro prejuízo do ora Recorrente;
- A violação do princípio da igualdade gera uma enfermidade do acto recorrido por violação de lei, o que gera a anulabilidade do acto, como resulta do artigo 124º do CPA;
- Estando a Entidade Recorrida vinculada ao cumprimento da palavra dada, atendendo aos compromissos assumidos, à expectativa criada e atendendo à sua sujeição à Lei, declarada que esteja a anulação do acto recorrido, deverá a Entidade Recorrida ser condenada à prática de acto administrativo legalmente devido nos termos do artigo 24º, n.º 1, alínea a) do CPAC, que corresponde, in casu, em dar andamento ao processo de revisão de concessão.
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Regularmente citada, a Entidade Recorrida contestou nos termos constantes a fls. 326 a 341 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pelo não provimento do recurso.
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Só a Recorrente é que apresentou alegações facultativas, mantendo, no essencial, a posição já tomada na petição inicial, formulando, no entanto, pela primeira vez, o pedido de condenar a prática do acto legalmente devido pela Entidade Recorrida no sentido de dar andamento ao processo da revisão da concessão do terreno.
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O Ministério Público emitiu o seguinte parecer:
“Na petição e nas alegações de fls.353 a 429 dos autos, a recorrente assacaram, ao despacho aqui impugnado, o vício de forma por preterição da audiência, a ofensa dos direitos previamente constituídos e salvaguardados no actual ordenamento jurídico da RAEM, o erro nos pressupostos de facto, a violação dos princípios da boa fé, da protecção da confiança legítima e da igualdade, a violão da obrigação de rever a concessão ou negociar para troca por terreno equivalente.
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1. Natureza do despacho recorrido
Repare-se que No despacho em escrutínio datado de 15/12/2016 o Exmo. Senhor Chefe do Executivo determinou, concludente e expressamente, que «同意。因此,根據本批示組成部分的運輸公務司司長二零一六年十月十二日意見書所載的內容及理由,本人宣告土地委員會第52/2016號案卷所指的以租賃制度及公開競投方式的土地批給失效。» (cfr. fls.109 do P.A.)
Nos termos do disposto no n.º1 do art.115º do CPA, a expressa declaração da concordância implica que tal Parecer do Exmo. Sr. STOP faz parte integrante do despacho em causa, sendo totalmente absolvidos todos os fundamentos de facto e de direito aí expostos.
Interpretado em coerente articulação com o dito Parecer do Exmo. Sr. STOP e o Parecer n.º117/2016 da Comissão de Terras (cfr. fls.111 a 114 e 115 a 122 dos autos), colhemos tranquilamente que o despacho impugnado consiste em declarar a caducidade, por constata expiração do prazo de 25 anos, da concessão titulada no Despacho n.º63/SATOP/90.
De facto, a 2ª Cláusula do Despacho n.º63/SATOP/1990 estipulava que a concessão é de 25 anos. Por não haver lugar à escritura dessa concessão e de acordo com o disposto no n.º1 do art.4º do D.L. n.º8/91/M, o prazo de 25 anos conta-se a partir da data da publicação em BOM do Despacho n.º63/SATOP/90, publicação que ocorreu em 13/08/1990.
Ora, transparece na realidade que a alteração introduzida pelo Despacho n.º74/SATOP/93 incide apenas ao aproveitamento e à finalidade do terreno concedido à recorrente, estipulados na Cláusula Terceira daquele Despacho n.º63/SATOP/90, não tocando o dito prazo da concessão de 25 anos nem a sua contagem que se iniciou imediatamente a publicação.
Tudo isto torna patente e indubitável que em 12/08/2015 terminou irremediavelmente o prazo de 25 anos. Com efeito, nenhuma norma na revogada Lei n.º6/80/M e na actual Lei n.º10/2013 permite a suspensão, a interrupção, a prorrogação ou a renovação do prazo de qualquer concessão provisória de terrenos, cujo limite máximo é de 25 anos.
Bem, perfilhamos a sensata jurisprudência fixada pelo Venerando TUI no aresto tirado no Processo n.º28/2017, que preconiza: «III- Decorrido o prazo de 25 anos da concessão provisória (se outro prazo não estiver fixado no contrato) o Chefe do Executivo deve declarar a caducidade do contrato se considerar que, no mencionado prazo, não foram cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas. Quer isto dizer que o Chefe do Executivo declara a caducidade pelo decurso do prazo se o concessionário não tiver apresentado a licença de utilização do prédio, porque é mediante a apresentação desta licença que se faz a prova de aproveitamento de terreno urbano ou de interesse urbano.»
Convém realçar que a jurisprudência consolidada do Venerando TSI vem navegando na mesma direcção, afirmando constantemente que são vinculados os actos administrativos da declaração da caducidade das concessões provisórias de terrenos, desde que a caducidade tenha como fundamento a constatada expiração do prazo máximo de 25 anos. (a título exemplificativo, vide. Acórdãos prolatados nos Processos n.º672/2015, n.º375/2016 e 179/2016)
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2. Dos argumentos da recorrente
Chegando aqui, sobretudo contando com as brilhantes orientações jurisprudenciais, ficamos habilitados a analisar os fundamentos arrogados pela recorrente para sustentar a sua pretensão de anulação. Adiantando a conclusão, parece-nos que todos são insubsistentes.
2.1. No ordenamento jurídico da RAEM, encontra-se firmemente adquirida a jurisprudência que assevera que «Sempre que, no exercício de poderes vinculados por parte da Administração, o tribunal conclua, através de um juízo de prognose póstuma, que a decisão administrativa tomada era a única concretamente possível, a falta de audiência do interessado, prevista no art.93.º, n.º1, do Código do Procedimento Administrativo, degrada-se em formalidade não essencial do procedimento administrativo.» (vide arestos do TUI nos Processos n.º11/2012 e n.º20/2016, anda constantemente o mesmo sentido o douto TSI nos Processos n.º280/2013, n.º609/2013, n.º179/2016, n.º375/2016, n.º743/2016 e n.º26/2017)
Em homenagem destas iluminativas jurisprudências, não nos resta margem para dúvida de que a falta da audiência da recorrente é inócua e não projecta mínima invalidade ao despacho recorrido que, pois, se traduz em declarar a caducidade preclusiva da apontada concessão.
2.2. Inculca doutamente: «A Lei de Terras estabelece como princípio que as concessões provisórias não podem ser renovadas. A única excepção a esta regra é a seguinte: a concessão provisória só pode ser renovada a requerimento do concessionário e com autorização prévia do Chefe do Executivo, caso o respectivo terreno se encontre anexado a um terreno concedido a título definitivo e ambos estejam a ser aproveitados em conjunto (artigo 48.º).» (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º28/2017)
Ora, as disposições nos arts.49º e 55º da Lei n.º6/80/M bem como arts.48º da Lei n.º10/2013 permitem seguramente extrair que há sempre lugar à caducidade preclusiva de qualquer concessão provisória, desde que se verificam cumulativamente a expiração do prazo da correspondente concessão e a não conversão da provisória em definitiva.
No caso sub judice, a caducidade está expressamente estipulada no mencionado Despacho n.º63/SATOP/90 que titula a concessão declarada caduca pelo despacho posto em crise. E de qualquer modo, afigura-se-nos que a caducidade preclusiva está subtraída à vontade das partes, dado que a Lei de Terras é, sem dúvida alguma, um diploma de direito público, que visa disciplinar e regular relações que têm no seu âmago variados interesses públicos relevantes, e por isso, esta matéria, em especial a que fixa em 25 anos o prazo máximo de duração da concessão, é imperativo e impostergável (cfr. acórdão do TSI no processo n.º1074/2015).
Em acatamento às prudentes jurisprudências, e tendo em conta que a recorrente não aproveitou o terreno concedido a si no prazo de 25 anos previamente fixado, estamos convictos de que é sofisticada e fatalmente descabida a arrogada ofensa dos direitos previamente constituídos e salvaguardados no actual ordenamento jurídico da RAEM.
Bem ou mal, o que é irrefutável é que quaisquer direitos resultantes de contratos de concessão de terrenos não têm o atributo de propriedade privada, e por natureza são sempre direitos temporais e atempados, daí têm de ser exercidos nos prazos contratual ou legalmente fixados. Igualmente certo é que Lei n.º10/2013 não reduz nenhum dos prazos estabelecidos na Lei n.º6/80/M. Tudo isto cauciona-nos a entender sossegadamente que o disposto no art.215º da Lei n.º10/2013, só por si, não ofende os direitos decorrentes da sobredita concessão à recorrente.
Seguindo às inspirativas interpretações jurisprudenciais dos TUI e TSI atinentes à eficácia retroactiva da Lei n.º10/2013 (vide. Acórdãos do TUI no Processo n.º81/2016 e do TSI no Processo n.º433/2015), temos por concludente e inequívoco que o art.215º desta Lei não infringe a disposição no art.122º da Lei Básica, que prescreve: «A Região Administrativa Especial de Macau reconhece e protege, em conformidade com a lei, os contratos de concessão de terras legalmente celebrados ou aprovados antes do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau que se prolonguem para além de 19 de Dezembro de 1999 e os direitos deles decorrentes. As concessões de terras feitas ou renovadas após o estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau são tratadas em conformidade com as leis e políticas respeitantes a terras da Região Administrativa Especial de Macau.»
2.3. Quanto à arguição do erro nos pressupostos de facto bem como da violação dos princípios da boa fé, da protecção da confiança legítima e da igualdade, impõe-se recordar que «IV- E o Chefe do Executivo não tem que apurar se este incumprimento das cláusulas de aproveitamento se deve ter por motivo não imputável ao concessionário. Isto é, não tem que apurar se a falta de aproveitamento se deveu a culpa do concessionário ou se, por exemplo, a Administração teve culpa, exclusiva ou não, em tal falta de aproveitamento. Ou, ainda, se a falta de aproveitamento se deveu a caso fortuito ou de força maior.» (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º28/2017)
A nível de doutrina e jurisprudência, é decerto assente que os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da boa fé se regem apenas os actos administrativos discricionários, sendo inoperantes a actos vinculados para efeitos da invalidade. Eis, sem margem para dúvida, a orientação constante e unânime das jurisprudências dos Venerandos TSI e TUI. (a título exemplificativo, vide. Acórdãos do TUI nos processos n.º14/2014 e n.º79/2015)
Seja como for, a violação do princípio da igualdade não releva no exercício de poderes vinculados, já que não existe um direito à igualdade na ilegalidade. O princípio da igualdade não pode ser invocado contra o princípio da legalidade: um acto ilegal da Administração não atribui ao particular o direito de exigir a prática no futuro de acto de conteúdo idêntico em face de situações iguais. (Acórdão do TUI no Processo n.º7/2007)
Na mesma linha de consideração, e na medida em que o despacho impugnado assume a natureza de acto vinculado, entendemos que o qual não colide com os princípios da colaboração entre a Administração e os particulares, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da protecção da confiança legítima como corolário do princípio da boa fé.
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Ora, repare-se que na conclusão CXXVIII da petição, a recorrente formulou ainda oum pedido cumulado, solicitando a condenação da entidade recorrida na «prática do acto administrativo legalmente devido nos termos do artigo 24º, n.º1, alínea a) do CPAC, que corresponde, in casu, em dar andamento ao processo de revisão de concessão».
Bem, a constatada verificação da caducidade preclusiva da concessão titulada pelo Despacho n.º63/SATOP/99 e a proibição da renovação de concessão provisória consagrada no n.º1 do art.48º da Lei n.º10/2013 determinam peremptoriamente a ilicitude e impossibilidade legal da pre-tendida revisão da concessão que está irremediavelmente caduca.
Nos termos do preceito no art.55º da Lei n.º10/2013, cai igualmente na impossibilidade legal a pretensão de troca por terreno equivalente.
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Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso contencioso.”
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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II – Pressupostos Processuais
O Tribunal é o competente.
As partes possuem personalidade e capacidade judiciárias.
Mostram-se regularmente patrocinadas.
Não existem nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – Factos
É assente a seguinte factualidade com base nos elementos probatórios existentes nos autos:
- Por Despacho nº 63/SATOP/90, publicado no Boletim Oficial de Macau nº 33, de 13 de Agosto de 1990, foi autorizada a concessão, por arrendamento e com dispensa de concurso público, do terreno com a área de 1575m2, designado por lote “...”, situado em Macau, na Ilha de Coloane, na Zona..., descrito na CRP sob o nº ... a folhas … do livro ….
- Uma vez que não chegou a ser celebrada escritura pública do contrato de concessão, a mesma passou a ser titulada pelo sobredito despacho.
- E nos termos do nº 1 da cláusula segunda do contrato de concessão, o prazo de concessão foi fixado em 25 anos, contados a partir da data da publicação do sobredito despacho, ou seja, até 12 de Agosto de 2015.
- Sendo que o prazo global de aproveitamento do terreno foi fixado em 30 meses, contados da data de publicação no Boletim Oficial de Macau do despacho que autoriza o respectivo contrato.
- A Concessionária, ora Recorrente, pagou a totalidade das prestações do prémio do contrato no valor de MOP2,171,288.00.
- Por despacho do Exmº. Senhor Chefe do Executivo, de 15/12/2016, exarado sobre o parecer do Exmº. Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 12/10/2016, que concordou com o proposto no Processo nº 53/2016 da Comissão de Terras, cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos, foi declarada a caducidade da concessão provisória do terreno acima em referência com fundamento do termo do prazo da concessão.
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IV – Fundamentação
A. Questão Prévia – Da admissibilidade do pedido formulado nas alegações facultativas:
Em sede das alegações facultativas, a Recorrente formulou pela primeira vez o pedido de condenar a prática do acto legalmente devido pela Entidade Recorrida no sentido de dar andamento ao processo da revisão da concessão do terreno.
Adiantamos desde já que se trata duma conduta processualmente inadmissível.
É certo que o legislador permite a cumulação dos pedidos no recurso contencioso (cfr. artº 24º do CPAC), mas a mesma tem de ser feita logo na petição inicial.
As alegações facultativas previstas no artº 68º do CPAC destinam-se para as partes fazerem uma análise crítica dos dados recolhidos nos autos até àquela fase, subsumindo-os ao direito aplicável, nas quais a Recorrente pode alegar novos fundamentos do seu pedido, cujo conhecimento tenha sido superveniente, ou restringi-los expressamente (cfr. nº 3 do artº 68º do CPAC), mas nunca formular um novo pedido.
É consabido que também vigora no contencioso administrativo o princípio da estabilidade da instância previsto no artº 212º do CPC, segundo o qual uma vez citada a parte contrária, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei.
Ora, o legislador do CPAC não prevê a possibilidade legal da acrescentação do pedido na fase das alegações facultativas, termos em que fica indeferido este pedido.
B. Do mérito do recurso contencioso:
O presente recurso contencioso consiste em apreciar a eventual legalidade/ilegalidade do acto recorrido, pelo qual se declarou a caducidade da concessão do terreno em questão.
A primeira questão que se coloca é a de saber qual a lei aplicável ao caso sub justice, será a nova Lei de Terra (Lei nº 10/2013) ou a antiga Lei de Terra (Lei nº 6/80/M)?
Encontramos a resposta directa na disposição do artº 215º da nova Lei de Terra, nos termos qual esta aplica-se às concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, com as seguintes ressalvas:
1. Quando esteja a correr um prazo fixado por legislação anterior e a presente lei o tiver modificado, é aplicado o prazo mais longo;
2. Os direitos e deveres dos concessionários são imediatamente regulados pela presente lei, sem prejuízo do convencionado nos respectivos contratos;
3. Quando tenha expirado o prazo anteriormente fixado para o aproveitamento do terreno e este não tenha sido realizado por culpa do concessionário, aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo 104.º e no artigo 166.º
Aplica-se, portanto e sem qualquer margem de dúvida, ao caso em apreço, a nova Lei de Terra.
Resolvida a questão da aplicação da lei no tempo, cumpre-se agora analisar a natureza do acto da declaração da caducidade.
A nova Lei de Terra prevê duas situações da caducidade da concessão dos terrenos urbanos, a saber:
1. A falta de aproveitamento dentro do prazo fixado (cfr. artº 166º da Lei nº 10/2013); e
2. O termo do prazo da concessão provisória sem esta ter sido convertida em definitiva (cfr. artº 52º, todos da Lei nº 10/2013).
Para a primeira situação, a Lei de Terra permite, a requerimento do concessionário, a suspensão ou prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno sob autorização do Chefe do Executivo, por motivo não imputável ao concessionário e que o Chefe do Executivo considere justificativo (nº 5 do artº 104º da Lei nº 10/2013).
O que já não acontece para a segunda situação, pois o legislador não prevê outra alternativa para além da caducidade da concessão provisória.
Ou seja, uma vez decorrido o prazo da concessão provisória do terreno sem esta ter sido convertida em definitiva, independentemente havendo ou não culpa do concessionário ou prévia declaração da caducidade com fundamento na falta de aproveitamento do terreno dentro do prazo fixado, verifica-se sempre a caducidade da concessão provisória.
É a chamada caducidade-preclusão (ou caducidade preclusiva), que depende somente dum facto objectivo simples, que é justamente o decurso do prazo legal ou contratualmente estabelecido.
No mesmo sentido, este TSI já se pronunciou em vários processos relacionados com a declaração da caducidade da concessão. A título exemplificativo, cita-se o acórdão de 08/06/2016, proferido no Proc. nº 179/2016/A.
Como a lei se impõe, sem qualquer alternativa, a verificação da caducidade no caso do termo do prazo da concessão provisória sem esta ter sido convertida em definitiva, a respectiva declaração da caducidade constitui uma actividade administrativa vinculada.
Feito o estudo preliminar da natureza do acto da declaração da caducidade para os casos do termo do prazo da concessão provisória sem esta ter sido convertida em definitiva, voltamos então ao caso dos autos.
Para a Recorrente, o acto recorrido padece dos seguintes vícios:
a) vício de forma por falta de audiência prévia;
b) erro no pressuposto de facto e de direito, com violação do artº 120º da Lei Básica, dos artºs 54º e 55º da Lei nº 6/80/M, dos artºs 48º e 215º da Lei nº 10/2013, da al. a) do artº 167º do CPA, do artº 326º do C.C. e da cláusula 2ª do Contrato de Concessão;
c) violação dos princípios da boa-fé, da tutela da confiança, da igualdade e da proporcionalidade.
1. Da falta de audiência prévia:
Como é sabido, a audiência de interessados é uma das formas da concretização do princípio da participação dos particulares no procedimento administrativo, legalmente previsto no artº 10º do CPAC, nos termos do qual os órgãos da Administração Pública devem assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objecto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disserem respeito.
E destina-se a evitar, face ao administrado, o efeito surpresa e, no mesmo passo, garantir o contraditório, de modo a que não sejam diminuídos os direitos ou interesses legalmente protegidos dos administrados.
A doutrina e a jurisprudência portuguesa, cujo sistema jurídico é igual ou semelhante ao nosso, pelo que citamos a título do Direito Comparado, têm vindo a entender que a preterição dessa formalidade pode, em certos casos, ser ultrapassada se daí não resulte qualquer ilegalidade determinante da anulação do acto, isto é, quando, atentas as circunstâncias concretas, a intervenção do interessado se tornou inútil, seja porque o contraditório já se encontre assegurado, seja porque não haja nada sobre que ele se pudesse pronunciar, seja porque, independentemente da sua intervenção e das posições que o mesmo pudesse tomar, a decisão da Administração só pudesse ser aquela que foi tomada (Ac. do STA, proferidos nos Recursos nºs 1240/02, 671/10 e 833/10, respectivamente, de 03/03/2004, 10/11/2010 e 11/05/2011).
No caso em apreço, já vimos que a lei se impõe, sem qualquer alternativa, a verificação da caducidade no caso do termo do prazo da concessão provisória sem esta ter sido convertida em definitiva, pelo que a respectiva declaração da caducidade constitui uma actividade administrativa vinculada.
Nesta conformidade, a audiência da Recorrente deixa de ter qualquer relevância, uma vez que nada pode influenciar a decisão a tomar pela Entidade Recorrida.
2. Do erro no pressuposto de facto e de direito, com violação do artº 120º da Lei Básica, dos artºs 54º e 55º da Lei nº 6/80/M, dos artºs 48º e 215º da Lei nº 10/2013, da al. a) do artº 167º do CPA, do artº 326º do C.C. e da cláusula 2ª do Contrato de Concessão:
Antes de mais, cumpre-nos dizer que no acto impugnado não existe qualquer erro no pressuposto de facto, visto que já decorreu o prazo de 25 anos e concessão mantém-se a natureza provisória à data da declaração da caducidade.
Não está em causa a declaração da caducidade com base na falta de aproveitamento do terrreno dentro do prazo estipulado por culpa do concessionário, pelo que a alegada inexistência da culpa na falta de aproveitamento dentro do prazo é inócua, não tem qualquer relevância prática para o caso em apreço.
Quanto ao erro no pressuposto de direito, as alegadas violações também não se verificam.
É certo que a Lei de Terra antiga (Lei nº 6/80/M) não prevê expressamente a caducidade da concessão provisória com o decurso do prazo da concessão, mas tal resulta da interpretação sistemática da própria Lei.
Vejamos.
Em primeiro lugar, o legislador da Lei de Terra antiga diferenciou duas fases da concessão: provisória e definitiva.
Dispõe o artº 49º da Lei nº 6/80/M que “A concessão por arrendamento é inicialmente dada a título provisório, por prazo a fixar em função das características da concessão e só se converterá em definitiva se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento mínimo previamente estabelecidas e o terreno estiver demarcado definitivamente”.
Só as concessões convertidas em definitivas é que são passíveis de renovação (cfr. artº 55º, nº 1 da Lei nº 6/80/M).
A falta de aproveitamento do terreno dentro do prazo estipulado ou legal implica a declaração da caducidade da concessão provisória (cfr. artº 166º, nº 1, al. a) e nº 2 da Lei nº 6/80/M).
Ora, estas disposições legais permitem concluir que no âmbito da vigência da Lei nº 6/80/M, uma concessão de terreno chegada ao termo do prazo da concessão e que ainda está numa situação provisória, isto é, não se encontra convertida em definitiva, a verificação da caducidade da mesma é inevitável, já que nunca pode ser objecto de renovação.
Nesta conformidade, não se vê como é que o acto recorrido que foi praticado em cumprimento do dever vinculado resultante da Lei nº 10/2013 viola o artº 120º da Lei Básica.
Por força dos artºs 48º, nº 1 e 52º, todos da nova Lei de Terras, o termo do prazo da concessão provisória sem esta ter sido convertida em definitiva determina inevitavelmente a declaração da caducidade da concessão, que consiste numa actividade vinculada da Administração, pelo que nunca se pode dizer que a Entidade Recorrida agiu com abuso de direito, e/ou com violação dos preceitos legais e da cláusula contratual em causa.
3. Da violação dos princípios da boa-fé, da tutela da confiança, da igualdade e da proporcionalidade:
A alegada violação dos vícios em causa só tem interesse para actividade administrativa discricionária, nunca é operante no exercício do poder vinculado.
Já vimos que o acto recorrido foi praticado no âmbito do exercício do poder vinculado, pelo que os alegados vícios não deixam de se julgar improcedentes.
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Tudo visto, resta decidir.
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V – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em julgar improcedente o recurso contencioso, confirmando o acto recorrido.
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Custas pela Recorrente com 15UC de taxa de justiça.
Notifique e D.N..
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RAEM, aos 21 de Junho de 2018.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Fui presente
Joaquim Teixeira de Sousa
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152/2017