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Processo nº 149/2018
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 14 de Junho de 2018

ASSUNTO:
- Erro de julgamento
- Nulidade da sentença

SUMÁRIO:
- Ainda que houver factos assentes e provados que permitem imputar o cumprimento defeituoso da Autora nos contratos de empreitada em causa, se a Ré daí não ter retirado qualquer efeito útil em sede de pedidos, nunca se pode dizer que o Tribunal a quo ignorou tais factos e cometeu assim um erro de julgamento, ou existia nulidade da sentença por omissão da pronúncia.
O Relator,

Ho Wai Neng







Processo nº 149/2018
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 14 de Junho de 2018
Recorrente: XXX Cotai Limitada (Ré)
Recorrida: B Contracting & Engineering Company Limited (Autora)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 08/09/2017, julgou-se a acção parcialmente procedente e em consequência condenou a Ré XXX Cotai Limitada a pagar à Autora B Contracting & Engineering Company Limited o montante global de MOP3,409,400.37.
Dessa decisão vem recorrer a Ré, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
- Vem o presente recurso interposto da sentença proferida nos presentes autos, de fls. 782-805, que, ignorando as cláusulas contratuais acordadas entre as partes, por um lado, e minimizando a matéria provada quanto aos atrasos na execução das empreitadas e sua conclusão por terceiros a custas da Ré, por outro, afastou sumariamente, de forma escassa e deficiente - para não dizer infundamentada -, quer o direito da Ré às multas contratualmente estipuladas, quer o direito contratual da Ré à resolução dos contratos e a indemnização pelos prejuízos sofridos, mais deixando de apreciar a compensação de créditos invocada pela Ré;
- A omissão de pronúncia do julgador é por si só suficiente para ferir de manifesta nulidade a sentença recorrida, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 571.° do CPC de Macau, razão pela qual deverá o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser de imediato conhecidas por este douto Tribunal as questões submetidas a apreciação, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 630.° do CPC de Macau;
- A sentença recorrida incorre ainda em erro de julgamento e violação de lei, designadamente do disposto nos artigos 399.° (liberdade contratual), 799.° (cláusula penal), 797.° (decurso de prazo admonitório), 426.° (resolução do contrato), 1148.° e 1149.° (resolução e indemnização no contrato de empreitada), todos do Código Civil de Macau, bem como no n.º 3 do artigo 412.° (excepções peremptórias), n.º 1 do artigo 430. ° (selecção da matéria de facto relevante), no n.º 3 do artigo 562.° (atendibilidade de factos não impugnados) e, no artigo 575.° (caso julgado formal), todos do CPC de Macau;
- Consequentemente, deverá a dita sentença ser nesta parte revogada e substituída por outra decisão que, (re)conhecendo a relevância dos factos assentes e da matéria de facto provada e debruçando-se sobre as cláusulas contratuais acordadas, reconheça finalmente os créditos da Ré e admita a invocada compensação-excepção, por o processo fornecer os elementos indispensáveis ao seu conhecimento; ou, em alternativa, ordenando ao Tribunal a quo que dê seguimento e conheça da respectiva excepção peremptória, procedendo a novo julgamento da causa, atento o disposto no n.º 1 do artigo 147.° do CPC de Macau;
- Vindo profusamente provado - cfr. alíneas gg) a ii); ll) e mm); e, oo) a qq) da sentença recorrida -, relativamente a cada uma das três empreitadas, que a Ré, após a Autora as ter dado por terminadas, procedeu à vistoria conjunta, identificou os trabalhos inacabados e denunciou os defeitos existentes, mais notificando a Autora que iria accionar a cláusula 5.ª dos Contratos de Empreitada, aplicando a respectiva sanção pecuniária compulsória, não se compreende como pôde o Tribunal a quo considerar que a correspondência naquelas referida «é inócua e irrelevante»;
- A inclusão daquela matéria nas alíneas GG) a II); LL) e MM); e OO) a QQ) da especificação, em sede de saneador, significa que o Tribunal a quo considerou que a mesma era "relevante, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito", nos termos do artigo 430.° do CPC de Macau;
- Na data prevista para a conclusão das empreitadas, a Ré interpelou a Autora, concedendo-lhe prazo admonitório, para que, até 31 de Julho de 2008, no caso da loja D, e 15 de Agosto de 2008, no caso das lojas F e G, terminasse os trabalhos em falta e eliminasse os defeitos verificados;
- A função da cláusula 5.ª dos Contratos de Empreitada é, fundamentalmente, ressarcitiva e tarifada, de natureza compulsória, actuando como meio de pressão sobre o devedor, mediante a ameaça de uma sanção pecuniária, com vista ao cumprimento pontual das obrigações que assumiu;
- Se o Tribunal a quo pretendia afastar a aplicabilidade da cláusula 5.ª dos Contratos de Empreitada, não só se impunha que dela tivesse conhecido - e a verdade é que a mesma não vem sequer referida ou citada na sentença -, como havia que especificar os fundamentos de facto e de direito que implicavam o seu repúdio;
- O direito de estipular tal cláusula é manifestação do princípio da autonomia privada e da liberdade contratual afirmada no artigo 399.° do Código Civil de Macau, segundo a qual, dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver, bem como reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais contratos típicos;
- A lei não proíbe que as partes introduzam no contrato uma cláusula penal compulsória visando o cumprimento tempestivo da prestação;
- A cláusula do contrato em que as partes fixam uma multa a pagar pelo empreiteiro por cada dia de atraso na conclusão da obra, é uma cláusula penal com função compulsória;
- Para a efectivação da cláusula penal compulsória não é necessário que o dono da obra alegue e prove a culpa do empreiteiro;
- É irrelevante para a efectivação da cláusula penal compulsória a existência ou inexistência de prejuízos;
- Ao desconsiderar a matéria provada/assente, tornando-a "inócua e irrelevante", o Tribunal a quo desrespeitou uma decisão anterior transitada já em julgado, violando o disposto no artigo 575.° do CPC, e fez um erróneo exame crítico das provas, assente numa convicção viciada e contrária à própria logicidade intrínseca da factualidade assente em sede de selecção da matéria de fado e dada como provada em julgamento;
- Na apreciação da prova, o tribunal é livre de formar a sua convicção; porém, contanto que essa apreciação não contrarie as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e das práticas da indústria e do comércio, por referência ao homem médio suposto pela ordem jurídica;
- Se campo há em que a sanção penal compulsória é perfeitamente comum, esse campo é o das empreitadas de obras;
- A título de sanção penal compulsória, tem a Ré o direito ao montante total de HKD$2,930,000.00;
- O princípio da autonomia privada e da liberdade contratual, previsto e plasmado no artigo 399.° do Código Civil, consente a faculdade aos contratantes de, na regulamentação convencionai dos seus interesses, se afastarem das regras tipo legalmente fixadas para o contrato celebrado, podendo nele fixar cláusulas divergentes;
- Tal princípio constitui mesmo o corolário da autonomia privada, sofrendo apenas as limitações decorrentes da imperatividade das normas que regulam o objecto negocial ou que regulem especificamente certo tipo de contrato;
- Autora e Ré-Recorrente celebraram entre si os contratos de empreitada (cujos contornos constam do Doc. 2 junto aos autos pela Autora), tendo acordado na cláusula 12.ª que, "na eventualidade de qualquer incumprimento de qualquer obrigação do Empreiteiro no âmbito deste Contrato; incapacidade do Empreiteiro de executar atempada mente a Empreitada durante o Prazo do Contrato; ou qualquer negligência, falta ou recusa do Empreiteiro de executar a Empreitada ou qualquer parte desta em conformidade com este Contrato; ou de cumprimento das ordens ou instruções do Gestor do Projecto, o Dono da Obra pode, notificando essa falta ao Empreiteiro por escrito com uma antecedência de 14 dias, e desde que essa falta não seja solucionada dentro desses 14 dias, pôr imediatamente termo à contratação do Empreiteiro no âmbito deste Contrato.";
- No âmbito da referida liberdade contratual que a lei lhes reconhece, nada obstava a que as partes acordassem em cláusula resolutória que possibilitasse ao dono da obra pôr termo ao contrato face à incapacidade do empreiteiro em executar atempadamente a empreitada ou perante o incumprimento das ordens ou instruções do Gestor do Projecto;
- Num contrato de empreitada cujo prazo de execução era de 46 dias, não se afigura irrazoável mas antes e até bastante generoso um prazo admonitório de 14 dias, correspondente a uma extensão de 1/3 (um terço) no prazo da empreitada;
- Razões não havia para que o Tribunal a quo omitisse o conhecimento da cláusula 12.ª dos Contratos de Empreitada, mais rejeitando - por omissão - a sua aplicação;
- Ainda que, caso o Tribunal a quo considerasse que tal cláusula era inaplicável face a limitações decorrentes da imperatividade das normas, competia-lhe dela conhecer e, fundamentando, invocar e interpretar a norma cuja imperatividade impedia a aplicabilidade do regime contratualmente acordado pelas partes;
- Acresce que as empreitadas em causa tinham por objecto a realização de obras de decoração numa galeria comercial de um hotel de luxo, estando a Autora contratualmente obrigada, nos termos dos §1.º, 2.° e 7.° da cláusula 2.ª dos respectivos Contratos de Empreitada, a realizar a empreitada utilizando os conhecimentos, o cuidado e a diligência que se esperam dum empreiteiro competente, devidamente qualificado e experiente em empreitadas com o mesmo âmbito, objecto e complexidade, mais devendo executar e completar os trabalhos segundo padrões de alta qualidade, de modo profissional e eficiente e, bem assim, dentro do período de tempo ajustado para a Empreitada, assegurando que os trabalhos eram executados e completados em conformidade com os desenhos técnicos, de modo a que, quando terminados, estivessem aptos à sua finalidade e cumpriam com os requisitos da empreitada;
- Porém, na data prevista para a conclusão das empreitadas, os trabalhos não tinham sido completados nas lojas F e D, apresentando ainda todos os trabalhos realizados diversos defeitos, quer ao nível da sua execução, quer ao nível dos acabamentos;
- Nos termos do §1.º da cláusula 4.ª dos Contratos de Empreitada, a gestora do projecto deveria apenas aceitar a obra quando estivesse satisfeita com os trabalhos realizados e respectiva aptidão para a sua finalidade, devendo ainda a empreiteira remover todos os resíduos, equipamento, materiais supérfluos ou trabalhos temporários;
- A Ré concedeu um prazo admonitório à Ré, atenta a regra constante da parte final do §.1.º da cláusula 12.ª e nos termos do §.3.º da cláusula 5.ª dos Contratos de Empreitada, até 31 de Julho de 2008, relativamente à loja D, e até 15 de Agosto de 2008, relativamente à loja F;
- Ao contrato de empreitada aplicam-se, não só as regras que especificamente o regulam, prescritas nos artigos 1133.° e ss. do Código Civil de Macau, mas também as regras gerais relativas ao cumprimento e incumprimento das obrigações que com aquelas se não revelem incompatíveis;
- O devedor tem de realizar a prestação a que está vinculado em conformidade com os três princípios que conformam o cumprimento das obrigações: o seu cumprimento pontual (artigos 400.°, n.° 1 e 752.°, n.º 1 do Código Civil de Macau), o seu cumprimento nos termos impostos pela boa fé (artigo 752.°, n.° 2 do Código Civil de Macau) e, salvo convenção, disposição legal ou uso em contrário, o cumprimento integral e não por partes (artigo 753.° do Código Civil de Macau);
- Atento o disposto no n.° 1 do artigo 797.° do Código Civil de Macau, duas são as causas que podem estar na origem do incumprimento definitivo: o credor perdeu objectivamente o interesse no cumprimento da prestação - alínea a) - ou decorreu o prazo (admonitório) de cumprimento estabelecido pelo accipiens - alínea b);
- Integra ainda o conceito de incumprimento definitivo em sentido amplo, a impossibilidade culposa de cumprimento, quer seja a física, quer seja a jurídica (cfr. artigo 790.° do Código Civil de Macau);
- Apesar de ter sido concedido prazo à Autora-empreiteira para a conclusão dos trabalhos e eliminação dos defeitos, ao abrigo do §.3.º da cláusula 5.ª e para efeitos da parte final do §.1.º da cláusula 12.ª dos respectivos Contratos de Empreitada, e ainda em conformidade com o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 797.º do Código Civil de Macau, esta não conseguiu fazê-lo, nem na empreitada referente à boutique D, nem na empreitada relativa à boutique F;
- A realização das vistorias conjuntas, a identificação e arrolamento dos trabalhos em falta e defeitos, juntamente com a concessão de prazo admonitório, constituem o "iter procedimental" a que aludem os artigos 1146.° e 1147.°, em conjugação com o artigo 797.°, n.º 1 b), do Código Civil de Macau, conferindo à Ré, decorrido o prazo concedido, a faculdade de declarar o incumprimento do contrato;
- Mesmo admitindo que ao caso se aplicava a resolução a que alude o artigo 1148.° do Código Civil de Macau, não poderia deixar de se entender que o prazo que a Ré concedeu à Autora, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 797.° do mesmo Código, no seguimento da realização das vistorias conjuntas e da identificação e arrolamento dos trabalhos em falta e defeitos, conferia à Ré, decorrido o prazo concedido, a faculdade de declarar o incumprimento do contrato;
- Razões não havia para que o Tribunal a quo repudiasse o exercício do direito de resolução, fosse com base na cláusula contratual 12.ª ou com base no artigo 1148.° do Código Civil;
- As regras sobre a interpretação da declaração negocial são válidas também para a interpretação das decisões judiciais;
- A doutrina da impressão do destinatário, recondutível ao âmbito do princípio da protecção da confiança, impõe ao declarante um ónus de clareza na manifestação do seu pensamento, desta forma se concedendo primazia ao ponto de vista do destinatário da declaração, a partir de quem tal declaração deve ser focada;
- A lei não se basta com o sentido compreendido realmente pelo declaratário, i.e., significando o entendimento subjectivo deste, mas apenas concede relevância ao sentido que apreenderia o declaratário normal - a pessoa com capacidade, razoabilidade, conhecimento e diligência;
- Se o Tribunal a quo resolveu oportunamente integrar na especificação as alíneas JJ) e RR), foi porque considerou que tal matéria era importante para a decisão a tomar a final e que aquela estava, naturalmente, em conexão com as empreitadas sub judice, ou ali não teria inserido a locução coordenativa conclusiva "pelo que", que encerra sem margem para qualquer dúvida uma consequência e relação causa-efeito;
- O percurso cognitivo do Tribunal a quo, feito em sede de despacho sanador, para inclusão das referidas alíneas na especificação, afigura-se perceptível e compreensível face ao alegado pela Ré em sede de contestação;
- Ao acrescentar, precisamente, a locução coordenativa conclusiva "pelo que" - que, recorda-se, não constava da redacção original nem foi um juízo conclusivo feito pela Ré -, o Tribunal a quo pretendeu estabelecer o nexo de causalidade entre a resolução do contrato, por incumprimento definitivo e culposo, e (a contratação e) o pagamento às empreiteiras que acabaram por concluir a empreitada;
- Outra conclusão não se pode retirar, designadamente pelo "declaratário normal", que não seja uma conclusão semelhante àquela ora retirada, sob cena de a inclusão daquela matéria na especificação ser inútil e irrelevante para a decisão da causa, o que não se admite, não só em virtude do disposto no artigo 430.º do CPC de Macau, mas também por não ser lícita a prática de actos inúteis - cfr. artigo 87.º do mesmo Código;
- O juízo ora feito pelo Tribunal a quo na sentença recorrida, para além de formalmente contrário ao que o Tribunal decidira já anteriormente em sede de despacho-selecção da matéria de facto, transitado em julgado, implica ainda a derrogação do princípio de que só os factos pertinentes e relevantes para a decisão da causa são levados à especificação e questionário;
- Da matéria provada resulta indubitavelmente que a contratação de terceiros para a conclusão das obras e respectivo pagamento advém da resolução dos contratos de empreitada, por incumprimento definitivo e culposo da Autora, sendo o juízo ora feito contraditório ao que anteriormente se decidira;
- A contratação daquelas empreiteiras é consentida pelo §2.º da cláusula 12.ª dos Contratos de Empreitada, cabendo à empreiteira-Autora, nos termos da mesma cláusula, pagar à dona da obra o que esta despendeu com a contratação de outros empreiteiros para a conclusão da empreitada;
- A compensação pode ser deduzida em defesa como excepção peremptória e só importa reconvenção na parte em que exceda o crédito a compensar e desde que o réu peça a condenação do autor no pagamento do excesso;
- Nos casos em que, sendo o contracrédíto do réu de montante inferior ao crédito do autor, aquele apenas alega tal crédito, não pedindo a condenação do autor no seu pagamento, mas invocando matéria factual que, em caso de provada, reduzirá ou impedirá a produção dos efeitos jurídicos dos factos alegados pelo autor, estaremos perante a dedução de uma excepção peremptória (compensação-excepção);
- A Ré não tinha que deduzir qualquer pedido reconvencional para ver atendido o seu direito de crédito por via de compensação, pois «[p]ara fazer operar a compensação, o pedido reconvencional só tem razão de ser para se obter o reconhecimento da parte do crédito do reconvinte que excede o do seu credor»;
- O dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à apreciação do Tribunal (salvo, naturalmente, aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras) e de conhecimento oficioso de excepções, é o corolário da obrigação de julgar contido entre nós no artigo 7.° do Código Civil;
- Ao desvalorizar a matéria de facto assente e a prova produzida, mais se abstendo de conhecer as cláusulas contratuais aplicáveis ao caso, o Tribunal a quo não só ignorou toda a fundamentação e razões apontadas pela Ré, como não decidiu o que mais importava: as questões suscitadas;
- Decorre daqui uma omissão de pronúncia e a consequente nulidade da sentença, atento o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 571.°, em conjugação com o disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 563.° e, bem assim, no artigo 415.°, todos do CPC de Macau;
- Nada obstando à apreciação das questões suscitadas ~ dos créditos da Ré e respectiva compensação -, cabe a este douto Tribunal Superior conhecer delas, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 630.° do CPC de Macau, da respectiva factualidade assente e dada como provada, bem como das cláusulas contratuais aplicáveis;
- Quando confrontado com a inabilidade ou impossibilidade do empreiteiro de eliminar os defeitos, a cláusula 12.ª dos Contratos de Empreitada, bem como os artigos 1148.° e 1149.º do Código Civil de Macau, conferem ao dono da obra, não só a faculdade de exigir a resolução do contrato, mas também de ser compensado ou requerer uma indemnização, nos termos gerais, pelos prejuízos sofridos, com o que se aplicam as demais regras relativas ao cumprimento e incumprimento das obrigações que não sejam incompatíveis com as regras especiais do contrato de empreitada;
- A função do art. 790.º n.º 2 do CCiv é, perante o incumprimento de uma das partes num contrato sinalagmático, proporcionar à outra parte uma opção entre duas alternativas: - exigir simplesmente uma indemnização por incumprimento, que naturalmente abrangerá todos os danos suportados em virtude da não realização da prestação da outra parte (interesse contratual positivo), mantendo-se, porém, a sua própria obrigação; - obter a resolução do contrato, cuja eficácia retroactiva lhe permite libertar-se da sua obrigação, pedindo eventualmente a restituição da sua prestação já realizada, acrescida de uma indemnização, que, neste caso, se limita aos danos da não conclusão do contrato (interesse contratual negativo);
- Tendo o credor optado por resolver o contrato, regressa à situação anterior à sua celebração, ficando com o direito a ser indemnizado pelo chamado "interesse contratual negativo ou de confiança", isto é, do prejuízo que não sofreria se o não tivesse celebrado, vendo assim reposto o seu património no estado em que se encontraria se não tivesse celebrado o contrato;
- Tendo a Ré optado pela resolução, não teria direito, em princípio dogmático, dada a íntima conexão entre os efeitos da resolução e os efeitos da retroactividade inerente à nulidade e à anulabilidade (decorrentes da letra dos artigos 427.° e 282.° do Código Civil), a indemnização pelo interesse contratual positivo;
- Tal construção dogmática deverá, contudo, sofrer derrogação por falência da premissa que a sustenta - a destruição da relação contratual, devendo neste caso atentar-se no disposto no n.º 2 do artigo 428.° do Código Civil de Macau;
- Têm entendido a doutrina e a jurisprudência que, em tais casos, a responsabilidade do empreiteiro se deva cifrar no quantitativo necessário à realização cabal da obra, no montante que exceder o preço estipulado por aquele para a sua integral realização, o que equivale à satisfação do interesse contratual positivo, não obstante o fenómeno resolutivo verificado;
- A retroactividade da resolução só tem lugar até onde a finalidade desta o justificar: as coisas não podem passar-se inteiramente como se nunca tivesse existido o contrato, pois este existiu de facto e dele podem ter surgido obrigações, direitos e situações não abrangidas pela razão de ser da resolução. E que esta, portanto, não elimina, subsistindo não obstante ela;
- «a responsabilidade indemnizatória do empreiteiro deve-se cifrar no custo do que não fez. Principalmente se já tiver recebido a totalidade do preço ou mesmo mais do que corresponde à obra feita. É assim que o dono da obra, em diligência normal não assente nas regras jurídicas, congeminará o prejuízo»;
- No caso de resolução do contrato de empreitada por incumprimento definitivo do empreiteiro, tem o dono da abra direito a ser indemnizada, devendo a indemnização, se as circunstâncias do caso concreto e motivos de equidade o justificarem, satisfazer não só o interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor na situação em que se contraria se não tivesse celebrado o contrato, como o interesse contratual positivo, visando colocar o dono da obra na situação em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido;
- Nos termos do §2.º da cláusula 12.ª dos Contratos de Empreitada, resolvido o contrato por incumprimento definitivo e culposo, poderia a Ré contratar outros empreiteiros para realizarem os trabalhos em falta e completarem a empreitada, mais retendo quaisquer montantes em dívida à Autora até que aquela estivesse concluída;
- O montante dos danos sofridos pela Ré, decorrentes da resolução dos contratos de empreitada (referentes às lojas F e D) por incumprimento definitivo e culposo da Autora ascende a HK$2.308.571,00 - cfr. alíneas JJ) e RR) da Especificação;
- Mesmo escapando a esta construção jurídica, haveria ainda assim a considerar os efeitos da própria resolução dos contratos;
- Operada a resolução, o que foi cumprido e o que faltava cumprir, por cada um dos contraentes, deve ser perspectivado à luz do efeito restitutório resultante da função recuperatória da resolução;
- Não sendo razoável que a retroactividade da resolução imponha a demolição da obra executada, basta-se a mesma (retroactividade) com a compensação restitutória, havendo que avaliar o valor da obra executada e efectuar a compensação restitutória com o montante do preço já pago;
- Se o preço total das empreitadas referentes às boutiques F e D, incluindo os trabalhos adicionais, era de HK$4.271.939,00 - cfr. alíneas F) e R) da Especificação e resposta aos quesitos 3.°, 6.°, 9.°, 16.°, 28.° e 31.° - e faltava obra no vaiar de HK$2.308.571,00 (cfr. alíneas JJ) e RR) da Especificação), o valor da obra feita pela Autora remonta a HKD$1.963.368,00 devendo, por sua vez, ser abatido o montante que a Ré já pagou por conta das referidas empreitadas, ou seja, HK$1.567.467,70 (cfr. alíneas L) e U) da Especificação), tendo assim a Autora direito à restituição, a título de resolução dos contratos de empreitada referentes às boutiques F e D, da quantia de HK$395.900,30;
- Nos termos do preceituado no n.º 1 do artigo 838.° Código Civil de Macau, «Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor (...)»;
- A existência de um crédito da Autora sobre a Ré é um dado adquirido, resultando da matéria de facto provada que o montante em dívida ascende, consoante as apontadas soluções jurídicas, a HK$3.310.097,45 ou a HK$1.001.526,45;
- Porém, no primeiro caso, também a Ré estará credora da Autora pelo montante de HK$2.308.571,00, pelos prejuízos decorrentes da contratação de terceiros para a finalização das empreitadas e, e em qualquer caso, pelo montante global de HK$2,930,000.00, a título de sanção penal compulsória;
- Assim, no primeiro daqueles casos, ao referido montante de HK$3.310.097,45, em dívida à Autora, haverá que deduzir a quantia de (a) HK$2.308.571,00, a que a Ré tem direito a título de indemnização pelos prejuízos sofridos; e de (b) HK$2,930,000.00, a título de sanção penal compulsória, com o que esta nada deve à Autora;
- No segundo daqueles casos, à mencionada quantia de HK$1.001.526,45, em dívida à Autora, haverá que deduzir o montante de HK$2,930,000.00, que a Autora deve à Ré a título de sanção penal compulsória, com o que esta nada deve à Autora.
*
A Autora respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 881 a 896 dos autos, cujo teores aqui se dão por integralmente reproduzidos, pugnando pela improcedência do recurso.
*
Foram colhidos os vistos legais.
*
II – Factos
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
a) A Autora é uma sociedade constituída em Macau, tendo por objectivo a exploração de actividade relativa a construção civil e materiais de construção, conforme doc. a fls. 21 a 27;
b) A Ré é uma sociedade constituída em Macau, tendo por objectivo a venda a retalho, a consignação, a importação ou exportação, a venda em armazém de mercadores especiais, a prestação de outros serviços de apoio, nomeadamente respeitantes a planeamento estratégico, divulgação e serviço pós-venda de produtos vendidos nas suas filiais ou empresa-mãe, conforme doc. a fls. 28 a 44;
c) Em 27 de Novembro de 2007, a Autora e a Ré celebraram três contratos de obras de decoração, com os n.ºs PKG0404/XXX-MO/2007/202, PKG0404/XXX-MO/2007/202 (sic.) e PKG0404/XXX-MO/2007/203, conforme doc. a fls. 45 a 102;
d) Em 15 de Fevereiro de 2008, a Autora e a Ré celebraram o contrato de obras de decoração com o n.º PKG0404/XXX-MO/2008/047, conforme doc. a fls. 103 a 105;
e) No âmbito dos ditos quatro contratos de obras de decoração, ficou a cargo da Autora a realização das obras de decoração das seguintes quatro lojas, a saber:
1. F to XXX Galleria, loja nº 1112 (F) sita no rés-do-chão do Hotel “...... Hotel, ...... Macau”;
2. G to XXX Galleria, loja nº 1123A (G) sita no rés-do-chão do Hotel “...... Hotel, ...... Macau”;
3. D to XXX Galleria, loja nº 1121 (D) sita no rés-do-chão do Hotel “...... Hotel, ...... Macau”; e
4. Zone C Wall bay to XXX Galleria, zona C da área comercial (Zone C Wall bay) sita no rés-do-chão do Hotel “...... Hotel, ...... Macau”.
E a Ré obrigou-se a efectuar o pagamento das despesas das obras a favor da Autora nos termos dos contratos;
f) Como resulta do artigo 1º do contrato relativo à loja nº 1112 (F) do rés-do-chão do Hotel “......”, as despesas das obras de decoração de tal loja, no montante de HKD2.414.822,00 seriam pagas em quatro prestações, designadamente, conforme doc. a fls. 47;
1. Aquando da outorga do contrato, seria paga a quantia correspondente a 20% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD482.964,40;
2. Aquando da conclusão de 50% das obras, seria paga a quantia correspondente a 35% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD845.187,70;
3. Aquando da conclusão total e entrega das obras, seria paga a quantia correspondente a 35% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD845.187,70;
4. Findo o prazo de garantia de 12 meses, seria paga a quantia correspondente a 10% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD241.482,20.
g) Na carta junta ao contrato primitivo, ou seja, “Final Submission of Schedule of Rates”, a Autora e a Ré já confirmaram que iria ser utilizado “Non directional stainless steel ceiling panel”, ou seja, materiais em aço inoxidável da linha fina, para construção de tectos, conforme doc. a fls. 60;
h) Conforme consta do traçado fornecido pela Ré em 22 de Fevereiro de 2008, a Ré pretendeu colocar nos tectos 37 rociadores contra incêndio, conforme doc. a fls. 111;
i) No entanto, a Ré decidiu, em 11 de Julho de 2008, que fossem colocados nos tectos 26 rociadores contra incêndio, em vez de 37 rociadores contra incêndio, conforme doc. a fls. 112;
j) Conforme consta do traçado confirmado em 06 de Março de 2008, a Ré já confirmou a largura (incluindo a do revestimento) de 120mm das paredes divisórias para vestiários, conforme doc. a fls. 117;
k) Aliás, conforme as exigências da empresa de consultadoria contratada pela Ré, durante a realização das obras, a Autora ainda realizou os seguintes oito trabalhos a mais:
1. Alteração da localização dos sistemas sonoros e da iluminação de emergência instalados nos tectos em aço inoxidável, conforme doc. a fls. 142 a 149;
2. Preenchimento das fendas existentes nos tectos e plataforma em mármore dentro da linha de demarcação da área arrendada da loja, conforme doc. a fls. 150 a 154;
3. Incremento da armação de suporte para aparelho de televisão “plasma” , conforme doc. a fls. 155 a 160;
4. Aumento da largura da camada de argamassa da plataforma, conforme doc. a fls. 161 a 171;
5. Alteração da dimensão das peças de madeira, de forma de calha, instaladas nos tectos, de 250Wx200H para 324Wx280H, conforme doc. a fls. 172 a 178;
6. Modificação da concepção da recebedoria, conforme doc. a fls. 179 a 185;
7. Modificação dos materiais de revestimento das paredes interiores, conforme doc. a fls. 186 a 196;
8. Alteração da demarcação da área arrendada nas lojas, conforme doc. a fls. 197 a 209;
l) A Ré efectuou, respectivamente em 02 de Fevereiro de 2008 e 07 de Agosto de 2008, o pagamento à Autora das 1ª e 2ª prestações das despesas das obras referidas na alínea f), num total de HKD1.328.152,10, conforme doc. a fls. 210 a 211;
m) Como resulta do artigo 1º do contrato relativo à loja nº 1123A (G) do rés-do-chão do Hotel “......”, para empreitar as obras de decoração de tal loja, a Ré obrigou-se a pagar à Autora, a título de despesas das obras combinadas, a quantia de HKD591.939,00, conforme doc. a fls. 65 a 83;
n) As despesas das obras referidas na alínea m) dos factos assentes seriam pagas pela Ré à Autora em quatro prestações, designadamente, conforme doc. a fls. 67:
1. Aquando da outorga do contrato, seria paga a quantia correspondente a 20% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD118.387,80;
2. Aquando da conclusão de 50% das obras, seria paga a quantia correspondente a 35% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD207.178,65;
3. Aquando da conclusão total e entrega das obras, seria paga a quantia correspondente a 35% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD207.178,65;
4. Findo o prazo de garantia de 12 meses, seria paga a quantia correspondente a 10% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD59.193,90.
o) Em 29 de Julho de 2008, a Ré pediu à Autora para modificação dos trabalhos relativos às grelhas de ventilação de ar condicionado já instaladas nos tectos;
p) Aliás, conforme exigido pela Ré, a Autora também realizou, para além das obras combinadas, as seguintes 6 obras de decoração:
1. Substituição da(s) tapete(s) no(s) cabine(s) de prova por tapete(s) resistente(s) ao fogo, conforme doc. a fls. 223 a 236;
2. No que diz respeito ao portão de correr, montagem de “chuck” para chapas de gesso e da estrutura de suporte, conforme doc. a fls. 236 a 243;
3. Alteração da localização das instalações AV e montagem de prateleiras de parede, conforme doc. a fls. 244 a 249;
4. Instalação de equipamentos eléctricos na plataforma em aço inoxidável, conforme doc. a fls. 250 a 254;
5. Construção de tectos de gesso duplos para a instalação por outros empreiteiros de equipamentos electromecânicos, conforme doc. a fls. 255 a 263;
6. Aumento da largura da camada de argamassa da plataforma, conforme doc. a fls. 264 a 274;
q) A Ré efectuou, respectivamente em 02 de Fevereiro de 2008 e 07 de Agosto de 2008, o pagamento à Autora das 1ª e 2ª prestações das despesas das obras referidas na alínea n) dos factos assentes, no montante de HKD118.387,80 e de HKD207.178,65, respectivamente, conforme doc. a fls. 275 a 276;
r) Como resulta do artigo 1º do contrato relativo à loja nº 1121 (D) do rés-do-chão do Hotel “......”, para empreitar as obras de decoração de tal loja, a Ré obrigou-se a pagar à Autora, a título de despesas das obras combinadas, a quantia de HKD1.196.578,00, conforme doc. a fls. 84 a 102;
s) As despesas das obras referidas no item r) seriam pagas pela Ré à Autora em quatro prestações, designadamente:
1. Aquando da outorga do contrato, seria paga a quantia correspondente a 20% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD239.315,60;
2. Aquando da conclusão de 50% das obras, seria paga a quantia correspondente a 35% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD418.802,30;
3. Aquando da conclusão total e entrega das obras, seria paga a quantia correspondente a 35% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD418.802,30;
4. Findo o prazo de garantia de 12 meses, seria paga a quantia correspondente a 10% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD119.657,80.
t) Aliás, conforme exigido pela Ré, a Autora também realizou, para além das obras combinadas, as seguintes 6 obras de decoração:
1. Aumento da largura da camada de argamassa da plataforma, conforme doc. a fls. 286 a 296;
2. Fornecimento e colocação de tapete(s) resistente(s) ao fogo, conforme doc. a fls. 297 a 308;
3. Aditamento da obra “Logo Anagram Artwork”, conforme doc. a fls. 309 a 322;
4. Construção de tectos de gesso duplos para a instalação por outros empreiteiros de equipamentos electromecânicos, conforme doc. a fls. 323 a 330;
5. Fornecimento e instalação de cacifo(s) revestido(s) de espelho(s) cinzento(s), conforme doc. a fls. 331 a 339;
6. Substituição de tintas nas paredes interiores da loja por revestimentos de espelho, ou seja, “Mirror Wall Panels”, conforme doc. a fls. 340 a 351;
u) A Ré efectuou, em 17 de Março de 2008, o pagamento à Autora da 1ª prestação das despesas das obras referida no item s), no montante de HKD239.315,60, conforme doc. a fls. 352;
v) Como resulta do artigo 1º do contrato relativo à zona C da área comercial (Zone C Wallbay) do rés-do-chão do Hotel “......”, para empreitar as obras de decoração de tal loja, a Ré obrigou-se a pagar à Autora, a título de despesas das obras combinadas, a quantia de HKD138.000,00, conforme doc. a fls. 103 a 105;
w) As despesas das obras referidas na alínea v) dos factos assentes seriam pagas pela Ré à Autora em três prestações, designadamente:
1. Aquando da outorga do dito contrato, seria paga a quantia correspondente a 20% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD27.600,00;
2. Aquando da conclusão total e entrega das obras, seria paga a quantia correspondente a 70% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD96.600,00;
3. Findo o prazo de garantia de 12 meses, seria paga a quantia correspondente a 10% da totalidade das despesas das obras, ou seja, HKD13.800,00.
x) A Ré pagou à Autora, em 17 de Março de 2008, a quantia de HKD27.600,00, correspondente ao pagamento parcial das despesas das obras referidas no item v), conforme doc. a fls. 353;
y) No decurso das obras da zona C do rés-do-chão, a Autora realizou conforme as instruções da Ré, para além dos trabalhos combinados, os trabalhos de instalação de aparelhos “LCD TV/DVD”;
z) As despesas das obras referidas no item y), no montante de HKD2.700,00 já foram previamente confirmadas pela Ré, conforme doc. a fls. 354 a 355;
aa) Concluídas todas as obras de decoração acordadas, a Autora fez a entrega da zona C da área comercial à Ré em 18 de Julho de 2008;
bb) A Ré fez a entrega, em 28 de Maio de 2008, da loja nº 1112 (F), da loja nº 1123A (G) e da loja nº 1121 (D) à Autora para esta iniciar a execução das obras de decoração;
cc) A Autora deixou a Ré depositar, a partir de Março de 2008, as mercadorias e os elementos decorativos e mobiliário, adquiridos pela última, relativos a F, G e D, na fracção ... do ...º andar da Fase ... do Edifício Industrial ...... sito em Macau, Bairro de Areia Preta, na Avenida de ......, nº ..., tendo a Ré, para o efeito, concordado em pagar mensalmente à Autora, a título de renda, a quantia de HKD5.000,00 por cada loja, ou seja, num total de HKD15.000,00, conforme doc. a fls. 359;
dd) A Ré pagou à Autora, em 07 de Abril de 2008, a renda do armazém relativa a Março, Abril e Maio de 2008, e em 27 de Junho de 2008, a renda do armazém relativa a Junho de 2008, conforme doc. a fls. 360;
ee) Após a conclusão das obras de decoração das quatro lojas e a entrega das mesmas à Ré, a Autora já várias vezes interpelou a Ré para o pagamento do remanescente das despesas das obras de decoração e das despesas com os trabalhos a mais;
ff) Em 18 de Junho de 2013, a Autora procedeu, através do seu advogado, à última interpelação da Ré.
gg) Por carta datada do dia 23 de Julho de 2008 –, conforme doc. a fls. 403 a 404 –, a Ré comunicou à Autora que iria accionar a cláusula 5ª do Contrato de Empreitada e a que alude o parágrafo 8º da Carta de Aceitação, na qual se refere que “o montante a aplicar a título de danos apurados e liquidados será de HKD60.000,00 por cada dia de calendário, tal como estipulado no Contrato”;
hh) Alguns dias mais tarde, a Ré comunicou à Autora, por carta expedida em 28 de Julho de 2008, complementada por mensagens electrónicas de 29 e 30 de Julho de 2008, não só a lista de trabalhos incompletos, como denunciou os defeitos existentes – relativamente à empreitada da loja 1112 (F) –, tendo logo exigido que os trabalhos em falta fossem concluídos e os defeitos eliminados até 15 de Agosto de 2008, conforme doc. a fls. 405 a 436;
ii) A Ré comunicou à Autora, em 29 de Agosto de 2008, a resolução do respectivo contrato, por incumprimento definitivo e culposo, conforme doc. a fls. 437 a 445;
jj) Pelo que, A Ré contratou e pagou às empreiteiras H Cleaning Services Limited, I Design Consultant & Construction Co., Ltd., J Engineering Co. Ltd. e K (Macau) Company Limited, o montante de HKD1.229.201,00, conforme doc. a fls. 446;
kk) Completada a empreitada – da loja 1112 (F) –, a Ré enviou à Autora, em 18 de Novembro de 2008, a conta final, a qual tinha em consideração as alterações à empreitada, os trabalhos adicionais, a multa contratualmente estabelecida por cada dia de atraso na conclusão da empreitada e, bem assim, os trabalhos realizados por terceiros para o acabamento da obra, conforme doc. a fls. 447 a 451;
ll) Por carta datada do dia 23 de Julho de 2008 –, conforme doc. a fls. 452 a 453 – a Ré comunicou à Autora que iria accionar a cláusula 5ª do Contrato de Empreitada e a que alude o parágrafo 8º da Carta de Aceitação, na qual se refere que “o montante a aplicar a título de danos Apurados e liquidados será de HKDD25.000,00 por cada dia de calendário, tal como estipulado no Contrato”;
mm) Alguns dias mais tarde, a Ré denunciou à Autora, por carta expedida em 28 de Julho de 2008, complementada por mensagens electrónicas de 29 e 30 de Julho de 2008, os defeitos existentes – relativamente à empreitada da loja 1123 (G) –, tendo logo exigido que os defeitos fossem eliminados até 15 de Agosto de 2008, conforme doc. a fls. 405 a 426 e 428 a 436;
nn) Completada a empreitada – da loja 1123 (G) –, a Ré enviou à Autora, em 18 de Novembro de 2008, a conta final, a qual tinha em consideração as alterações à empreitada, os trabalhos adicionais e a multa contratualmente estabelecida por cada dia de atraso na conclusão da empreitada, conforme doc. a fls. 447 a 451;
oo) Por carta datada do dia 23 de Julho de 2008 –, conforme doc. a fls. 458 a 459 –, a Ré comunicou à Autora que iria accionar a cláusula 5ª do Contrato de Empreitada e a que alude o parágrafo 8º da Carta de Aceitação, na qual se refere que “o montante a aplicar a título de danos apurados e liquidados será de HKD30.000,00 por cada dia de calendário, tal como estipulado no Contrato”;
pp) Alguns dias mais tarde, a Ré comunicou à Autora, por carta expedida em 28 de Julho de 2008, complementada por mensagens electrónicas de 29 e 30 de Julho de 2008, não só a lista de trabalhos incompletos, como denunciou os defeitos existentes – relativamente à empreitada da loja 1121 (D) –, tendo exigido que os trabalhos em falta fossem concluídos e os defeitos eliminados até 31 de Julho de 2008, conforme doc. a fls. 405 a 426, 428 a 436 e 460;
qq) A Ré comunicou à Autora, no dia 31 de Julho de 2008, a resolução do respectivo contrato, por incumprimento definitivo e culposo, conforme doc. a fls. 460;
rr) Pelo que, A Ré contratou e pagou às empreiteiras I Design Consultant & Construction Co., Ltd., The L Group Pty Ltd. e K (Macau) Company Limited, o montante de HKDD1.079.370,00, conforme doc. a fls. 461;
ss) Completada a empreitada – da loja 1121 (D) –, a Ré enviou à Autora, em 18 de Novembro de 2008, a conta final, a qual tinha em consideração as alterações à empreitada, os trabalhos adicionais, a multa contratualmente estabelecida por cada dia de atraso na conclusão da empreitada e, bem assim, os trabalhos realizados por terceiros para o acabamento da obra, conforme doc. a fls. 447 a 451;
tt) Nos termos da cláusula 2ª dos Contratos de Empreitada em causa, a Autora renunciou expressamente a qualquer indemnização decorrente de atrasos na empreitada, nomeadamente originados por acções do dono-da-obra;
uu) A Autora fez a encomenda a fornecedor dos tectos em aço inoxidável da linha fina referidos no item g) conforme exigido pela Ré;
vv) Todavia, na reunião de 17 de Junho de 2008, a Ré pediu para serem utilizados materiais em “Press Sand”, ou seja, em aço inoxidável de “press sand”, para construção de tectos, bem como aplicação de “nano-revestimento” em “Press Sand”, no sentido de evitar manchas de impressão digital;
ww) Pelo que a Autora teve que fazer novas encomendas de materiais em aço inoxidável de “press sand” conforme exigido pela Ré, e depois transportar tais materiais para a fábrica para aplicação de “nano-revestimento”, o que causou um acréscimo de despesas, no montante de HKD73.400,00, nomeadamente resultante da aplicação de “nano-revestimento” e do transporte;
xx) A Autora veio a pedir, conforme pretendido pela Ré, a fornecedor para furar os tectos em aço inoxidável, de modo a criar espaços para colocação dos rociadores contra incêndio;
yy) Em 11 de Julho de 2008, a Ré decidiu proceder ao ajustamento da distribuição dos rociadores contra incêndio a instalar nos tectos;
zz) Posto isto, a Autora fez novas encomendas de materiais a fornecedor conforme exigido pela Ré para substituição da parte afectada, tendo, para o efeito, que pagar a fornecedor, a título de despesas de …(sic.) de materiais, a quantia de HKD19.028,80;
aaa) Já antes do dia 01 de Julho de 2008 a Autora concluiu, de acordo com o traçado inicial, as obras de construção de paredes divisórias dos vestiários;
bbb) Em 03 de Julho de 2008, a Ré por email comunicou à Autora a sua intenção de alterar a largura das paredes divisórias dos vestiários, de 120mm para 100mm;
ccc) Razão pela qual, a Autora teve que realizar a demolição das paredes divisórias já construídas, e de comprar novas materiais que obedecessem às dimensões para proceder à nova instalação, o que implicou aumento dos trabalhos da Autora e acréscimo de despesas de HKD18.000,00;
ddd) As despesas adicionais aludidas nos itens ww), zz) e ccc) foram totalmente realizadas por motivos imputáveis à Ré;
eee) Aliás, em 10 de Julho de 2008, as infiltrações começaram a verificar-se nos tubos de ventilação de ar condicionado cujas obras ficaram a cargo do departamento de electromecânica, o que causou danificações nos tectos, paredes divisórias e revestimentos por pintura já instalados pela Autora, e em consequência, esta teve que proceder à reconstrução da parte danificada, que originou um acréscimo das despesas, no valor de HKD9.400,00;
fff) A Autora já realizou os oito trabalhos a mais referidos no item k) conforme exigido pela Ré;
ggg) Apesar de várias interpelações feitas pela Autora, a Ré, até à presente data, ainda se recusou a efectuar o pagamento das despesas com os ditos trabalhos a mais, no montante de HKD256.795,20;
hhh) A Autora já em 24 de Julho de 2008 concluiu todas as obras de decoração acordadas e em 24 de Julho de 2008 fez a entrega da loja nº 1112 (F) à Ré;
iii) Até à presente data, a Ré tem-se recusado a pagar as 3ª e 4ª prestações das despesas das obras previstas no acordo referido no item f), que são respectivamente de HKD845.187,70 e de HKD241.482,20;
jjj) A Ré nem sequer efectuou o pagamento das despesas adicionais com os ditos trabalhos a mais;
kkk) Conforme foi inicialmente estipulado no contrato relativo à loja nº 1123A (G), não ficou a cargo da Autora, mas sim de outros empreiteiros a realização das obras de grelhas de ventilação de ar condicionado dentro da loja;
lll) A Autora concordou em realizar os trabalhos referidos no item o) cujo custo foi no montante de HKD136.687,60;
mmm) A Autora já realizou, conforme exigido pela Ré, os seis trabalhos a mais referidos no item p);
nnn) Mas as despesas resultantes dos ditos trabalhos a mais, no montante de HKD59.466,00 ainda não foram pagas pela Ré;
ooo) A Autora já em 22 de Julho de 2008 concluiu todas as obras de decoração acordadas e em 23 de Julho de 2008 fez a entrega da loja nº 1123A (G) à Ré;
ppp) Até à presente data, a Ré tem-se recusado a pagar as 3ª e 4ª prestações das despesas das obras previstas no acordo referido no item n), que são respectivamente de HKD207.178,65 e de HKD59.193,90;
qqq) No decurso das obras da loja nº 1121 (D), ficou danificado o espelho para caixa(s) de luz fornecido pela Ré durante o transporte, pelo que a Ré pediu à Autora para comprar novo espelho em sua substituição;
rrr) O espelho ficou danificado por motivo não imputável à Autora;
sss) Com a aquisição do novo espelho foram realizadas as despesas de HKD3.375,00;
ttt) Mas as despesas mencionadas no item sss) ainda não foram restituídas pela Ré à Autora;
uuu) Os trabalhos a mais referidos no item t) já foram levados a cabo conforme exigido pela Ré;
vvv) Mas ainda não foram pagas à Autora pela Ré as despesas resultantes dos ditos trabalhos a mais, que se computam em HKD289.940,00;
www) A Autora já em 24 de Julho de 2008 concluiu todas as obras de decoração acordadas e em 24 de Julho de 2008 fez a entrega da loja nº 1121 (D) à Ré;
xxx) Até à presente data, a Ré tem-se recusado a pagar as 2ª a 4ª prestações das despesas das obras previstas no acordo referido no item s), que são respectivamente de HKD418.802,30, HKD418.802,30 e de HKD119.657,80;
yyy) Até à presente data, a Ré tem-se recusado a pagar as 2ª e 3ª prestações das despesas das obras previstas no acordo referido no item w), respectivamente no montante de HKD96.600,00 e de HKD13.800,00;
zzz) De acordo com o artigo 4º dos contratos nºs PKG0404/XXX-MO/2007/202, PKG0404/XXX-MO/2007/202 (sic.) e PKG0404/XXX-MO/2007/203, deveria a Ré fazer a entrega em data sujeita a confirmação que se estimava ser em 01 de Março de 2008, da loja nº 1112 (F), da loja nº 1123A (G) e da loja nº 1121 (D) sitas no rés-do-chão do Hotel “......” à Autora para esta iniciar a execução das obras de decoração;
aaaa) Em Março de 2008 a Autora começou a preparar-se para a execução das obras;
bbbb) No entanto, por motivos imputáveis à Ré, esta só fez a entrega das três lojas à Autora em 28 de Maio de 2008, verificando-se assim o atraso de 88 dias;
cccc) Até 01 de Agosto de 2008, a Ré ainda continuou a enviar mercadorias de Hong Kong e depositá-las no armazém da Autora;
dddd) Mas a Ré não pagou à Autora a renda do armazém relativa a Julho e Agosto de 2008, que se computa em HKD30.000,00;
eeee) A Ré sempre se recusou a pagar as despesas referidas no item ee) dos factos assentes, situação que se mantém até à presente data;
ffff) Na data prevista para conclusão da empreitada da loja 1112 (F) – 23 de Julho de 2008 –, a Ré e a Autora procederam conjuntamente à verificação da obra e identificaram de imediato que alguns dos trabalhos previstos no caderno de especificações (incluindo alterações) ou trabalhos adicionais aceites pela Autora, não tenham sido completados, apresentando ainda os trabalhos realizados diversos defeitos, quer ao nível da sua execução, quer ao nível dos acabamentos;
gggg) A Autora não suprimiu, de acordo com as exigências da Ré, todos os defeitos denunciados no prazo contratualmente previsto e concedido pela Ré para o efeito, isto é até 26 de Agosto de 2008;
hhhh) Na data prevista para conclusão da empreitada da loja 1123 (G) – 23 de Julho de 2008 –, a Ré e a Autora procederam conjuntamente à verificação da obra e identificaram de imediato que alguns dos trabalhos previstos no caderno de especificações (incluindo alterações) ou trabalhos adicionais aceites pela Autora, apresentavam diversos defeitos, quer ao nível da sua execução, quer ao nível dos acabamentos;
iiii) A Autora corrigiu os defeitos até 18 de Agosto de 2008;
jjjj) Na data prevista para conclusão da empreitada da loja 1121 (D) – 23 de Julho de 2008 –, a Ré e a Autora procederam conjuntamente à verificação da obra e identificaram de imediato que alguns dos trabalhos previstos no caderno de especificações (incluindo alterações) ou trabalhos adicionais aceites pela Autora, não tenham sido completados, apresentando ainda os trabalhos realizados diversos defeitos, quer ao nível da sua execução, quer ao nível dos acabamentos;
kkkk) A Autora não suprimiu de acordo com as exigências da Ré, todos os defeitos denunciados no prazo contratualmente previsto e concedido pela Ré para o efeito isto é até 31 de Julho de 2008;
llll) A Ré ofereceu se para pagar o que entendeu ser apenas o devido.
*
III – Fundamentação
Na óptica da Ré, a sentença recorrida é nula por omissão da pronúncia, uma vez que ignorou, por um lado, as cláusulas contratuais acordadas entre as partes, e, por outro, não considerou a matéria provada quanto aos atrasos na execução das empreitadas e sua conclusão por terceiros a custas da Ré, afastando sumariamente, de forma escassa e deficiente, os seus direitos às multas contratualmente estipuladas, à resolução dos contratos e à indemnização pelos prejuízos sofridos, bem como deixou de apreciar ainda a compensação de créditos por si invocada.
Além disso, pelas mesmas circunstâncias, entende que a sentença recorrida incorre ainda em erro de julgamento e violação de lei, designadamente do disposto nos artigos 399.° (liberdade contratual), 799.° (cláusula penal), 797.° (decurso de prazo admonitório), 426.° (resolução do contrato), 1148.° e 1149.° (resolução e indemnização no contrato de empreitada), todos do Código Civil de Macau, bem como no n.º 3 do artigo 412.° (excepções peremptórias), n.º 1 do artigo 430. ° (selecção da matéria de facto relevante), no n.º 3 do artigo 562.° (atendibilidade de factos não impugnados) e, no artigo 575.° (caso julgado formal), todos do CPC de Macau.
Em consequência, pede que seja revogada a sentença recorrida nesta parte e substituída por outra decisão que, dando relevância aos factos assentes e da matéria de facto provada e debruçando-se sobre as cláusulas contratuais acordadas, reconheça finalmente os seus créditos e admita a invocada compensação-excepção, ou, em alternativa, ordenando ao Tribunal a quo que dê seguimento e conheça da respectiva excepção peremptória, procedendo a novo julgamento da causa, atento o disposto no n.º 1 do artigo 147.° do CPC de Macau.
A sentença recorrida tem o seguinte teor:
   “…
   Segundo o artº 1133º do C.Civ. «Empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço.»
   Da factualidade apurada resulta demonstrado que entre a Autora e a Ré foram celebrados quatro contratos de empreitada de determinadas obras.
   Vindo a Autora invocar ter realizado as obras que foram encomendadas, bem como aquelas que foram solicitadas para além do que havia sido contratado e que a Ré não pagou integralmente o preço que havia sido acordado nem aquele que é devido pelas obras a mais, bem como outros prejuízos que alega ter sofrido, pede a condenação da Ré no pagamento dos montantes que considera serem devidos.
   Por banda da Ré para além de impugnar vem excepcionar o incumprimento parcial da empreitada e o cumprimento defeituoso, alegando que comunicou à Autora a resolução de dois contratos e ofereceu o pagamento parcial das empreitadas pelos valores que entendeu serem devidos.
   Destarte, estando por assente que entre as partes foram celebrados os quatros contratos e os termos dos mesmos, no que concerne à Autora impõe-se que esta demonstre que executou as empreitadas e as obras a mais que alega terem-lhe sido pedidas e respectivo valor, bem como, que sofreu os demais prejuízos que invoca e seu valor.
   Por banda da Ré, sendo apenas pedida a improcedência da acção, por se tratar de matéria de excepção peremptória impeditiva do direito da Autora cabia-lhe demonstrar que as obras não foram realizadas, ou no que concerne aos dois contratos que considerou resolvidos que os defeitos impediam o uso da obra para os fins a que se destina – cf. nº 1 do artº 1148º do C.civ. -.
   Tendo sido quatro os contratos celebrados entre as partes analisemos a situação relativamente a cada um deles.
   Contrato relativo à loja nº 1112 F.
   No que a este contrato concerne o que resultou demonstrado foi que o que havia sido acordado foi que fosse aplicado “Non directional stainless steel ceiling panel” – cf. al. g) -, material este que já havia sido encomendado pela Autora quando a Ré exigiu que fosse aplicado aço inoxidável de “press sand” com “nano-revestimento” – cf. al. uu) e vv) – o que veio a originar um acréscimo de custos no montante de HKD73.400,00 – cf. al ww) -. Relativamente aos rociadores de incêndio resulta também demonstrado que inicialmente haviam sido planeados 37 rociadores contra incêndio, numero que depois de encomendado o tecto foi alterado para 26, originando nova encomenda de material que importou em HKD19.028,80 – cf. al. h), i), xx), yy) e zz) -. De igual modo se demonstrou que foi pedida a alteração das paredes divisórias dos vestiários de 120mm para 100mm depois de já estarem feitas, o que implicou um acréscimo de despesas de HKD18.000,00 – cf. al j), aaa), bbb) e ccc) -. Sendo que todas estas despesas foram realizadas apenas por motivos imputáveis à Ré – cf. al. ddd) -.
   Igualmente ficou demonstrado – cf. al. eee) – que as obras realizadas pelo departamento de electromecânica causaram infiltrações que danificaram os tectos obrigando à sua reparação o que importou em HKD9.400,00. Contudo no que a esta matéria concerne, se é evidente que não é imputável a reparação à Autora, a verdade é que da matéria apurada não resulta também que se possa imputar à Ré uma vez que se desconhece o vinculo com esta do dito departamento de electromecânica, quem era e para quem trabalhava, pelo que, no que a este pedido concerne há que improceder.
   Os oito trabalhos a mais pedidos pela Ré relativamente a esta obra também foram realizados pela Autora o que importou no valor de HKD256.795,20, o qual também não foi pago pela Ré – cf. al. k), fff), ggg) e jjj) -.
   As obras de decoração da loja foram concluídas em 24 de Julho de 2008 e a loja entregue à Ré, sem que hajam sido pagas as 3ª e 4ª prestações – cf. al. hhh) e iii) -.
   Destarte, demonstrou a Autora ter realizado a obra a que estava obrigada no que concerne a este contrato, bem como, os trabalhos a mais pedidos pela Ré, as alterações pedidas pela Ré e os custos de uns e outros, sendo certo que pela Ré nada mais foi pago para além das 1ª e 2ª prestações do preço da empreitada – cf. al. l) -.
   Ou seja, no que concerne à loja da F verifica-se não ter sido pago pela Ré à Autora os seguintes montantes:
- Alteração do tipo de aço: HKD73.400,00;
- Alteração do número de rociadores de incêndio: HKD19.028,80;
- Alteração das paredes divisórias dos vestiários: HKD18.000,00;
- Oito trabalhos a mais realizados: HKD256.795,20;
- 3ª e 4ª prestações do preço da empreitada: HKD845.187,70 e HKD241.482,20;
   Tudo perfazendo o total de HKD1.453.893,90, equivalente a MOP1.497.510,72.
   Por fim e no que concerne à excepção do incumprimento e cumprimento defeituoso invocadas pela Ré o que se demonstrou foi que em 23 de Julho de 2008, Autora e Ré procederam em conjunto à verificação da obra, tendo sido identificados os trabalhos que não haviam sido completados e os que tinham defeitos, sendo que a Autora não suprimiu todos os defeitos denunciados no prazo concedido pela Ré para o efeito, isto é, até 26 de Agosto de 2008 – cf. al. ffff) e gggg) -.
   Para além daqueles dois factos consta ainda a matéria das alíneas gg) a ii) as quais aludem a correspondência remetida pela Ré à Autora, a qual contudo é inócua e irrelevante em face da matéria que se provou de que a loja foi vistoriada pelas partes em 23 de Julho de 2008 e entregue no dia a seguir, bem como, do prazo concedido para suprir os defeitos e que não o foram na totalidade.
   Assim sendo o que resulta demonstrado em matéria de excepção invocada pela Ré é que a obra em causa foi executada com defeitos e que esses defeitos não foram corrigidos.
   De acordo com o disposto no artº 1148º do C.Civ. «1. Não sendo eliminados os defeitos nem sendo construída de novo a obra, o dono da obra pode exigir a redução do preço ou a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina. 2. A redução do preço é feita nos termos do artigo 874º».
   A Ré comunicou à Autora em 29 de Agosto de 2008 a resolução do contrato, contudo, o exercício desse direito pressupunha que a loja não pudesse ser usada para o fim a que se destina o que de modo algum se provou, nem tão pouco se alegou.
   Destarte poderá apenas haver lugar à redução do preço.
   A redução do preço nos termos do artº 874º do C.Civ é feita por avaliação dos defeitos que não hajam sido corrigidos, contudo em momento algum a Ré pediu que fosse indemnizada pelo valor dos defeitos nem tão pouco foi requerida a avaliação dos mesmos.
   Da alínea jj) – a qual consta dos factos considerados assentes aquando da elaboração do saneador – resulta apenas que a Ré pagou às companhias ali indicadas o valor ali referido, mas desconhecemos, para fazer o quê e qual o motivo que terá levado a fazer o que eventualmente haja sido feito mas se desconhece. Menos ainda se provou que esse valor haja sido pago por causa imputável à Autora na realização da obra empreitada, ou seja, não há nexo de causalidade algum entre o valor ali referido como tendo sido pago e a empreitada realizada pela Autora, sendo certo que esta fez a obra, entregou a loja, com defeitos é certo, e o valor ali indicado corresponde a mais de metade do valor da empreitada, pelo que, segundo as regras da razoabilidade pouco credível é que tenha algo a ver com a execução da obra em causa, o que em face dos factos se desconhece.
   Destarte, não tendo a Ré reconvindo no sentido de ser pedido a indemnização/redução do preço em face dos defeitos da obra, limitando a sua defesa a invocar a resolução do contrato, no que, como se referiu não lhe assiste razão, pese embora haja invocado o cumprimento defeituoso mas daí não retirando qualquer efeito em sede de pedidos, cabe apenas julgar procedente a pretensão da Autora no que a esta obra concerne, demonstrado que está que a realizou, o valor da mesma e que o preço não foi pago.
   Contrato relativo à loja nº 1123A G.
   No que a esta loja concerne ficou demonstrado que a Ré pediu à Autora para realizar os trabalhos relativos às grelhas de ar-condicionado as quais tinham ficado a cargo de outros empreiteiros, o que acarretou um custo de HKD136.687,60 – cf. al. o), kkk) e ll) -, bem como, que realizou os seis trabalhos a mais pedidos pela Autora no valor de HKD59.466,00 – cf. al. p), mmm) e nnn) –, e que a Autora concluiu a obra em 22 de Julho de 2008 e em 23 de Julho de 2008 foi a mesma entregue à Ré, não tendo esta pago aqueles valores nem as 3ª e 4ª prestações do preço acordado no valor de HKD207.178,65 e HKD59.193,90 – cf- al. q), ooo) e ppp) -, sendo certo que os defeitos encontrados foram corrigidos no prazo concedido pela Ré – cf. hhhh) e iiii) -.
   Nos termos do artº 400º do C.Civ. os contratos devem ser pontualmente cumpridos, pelo que, está a Ré em mora no que concerne ao pagamento destes valores no montante global de HKD462.526,15 equivalente a MOP476.401,93.
   Contrato relativo à loja nº 1121 D.
   Relativamente a esta loja ficou demonstrado que a pedido da Ré a Autora adquiriu um espelho que havia sido danificado durante o transporte, por motivo não imputável à Autora, no valor de HKD3.375,00 – cf. al. qqq), rrr), sss) e ttt) -, bem como, que a Autora realizou os trabalhos a mais pedidos pela Ré no valor de HKD289.940,00 – cf. al. t), uuu) e vvv) -, tendo a obra sido concluída em 24 de Julho de 2008 e nessa data entregue à Ré – cf. al. www) – sendo que a Ré ainda não pagou as 2ª, 3ª e 4ª prestações do preço acordado no valor de HKD418.802,30, HKD418.802,30 e de HKD119.657,80 – cf. al. r), s) e xxx) -, tudo perfazendo o total de HKD1.250.577,40 equivalente a MOP1.288.094,72.
   Tendo as partes procedido à verificação da obra em 23 de Julho de 2008, na véspera da sua conclusão e entrega, foram identificados trabalhos que não estavam completos ou tinham defeitos, sendo que a Autora não suprimiu todos os defeitos até à data concedida pela Ré – cf. al. jjjj) e kkkk) -.
   A situação desta loja é idêntica à da F já antes analisada.
   Demonstrando-se em sede de matéria de excepção invocada pela Ré que a obra em causa foi executada com defeitos e que esses defeitos não foram corrigidos, de acordo com o disposto no artº 1148º do C.Civ. apenas poderá haver lugar à redução do preço, uma vez que podendo a loja ser usada para o fim a que se destina, também aqui não há fundamento para a resolução do contrato como a Ré pretende.
   A redução do preço nos termos do artº 874º do C.Civ é feita por avaliação dos defeitos que não hajam sido corrigidos, contudo em momento algum a Ré pediu que fosse indemnizada pelo valor dos defeitos nem tão pouco foi requerida a avaliação dos mesmos.
   Da alínea rr) – a qual consta dos factos considerados assentes aquando da elaboração do saneador – resulta apenas que a Ré pagou às companhias ali indicadas o valor ali referido, mas desconhecemos, para fazer o quê e qual o motivo que terá levado a fazer o que eventualmente haja sido feito mas se desconhece. Menos ainda se provou que esse valor haja sido pago por causa imputável à Autora na realização da obra empreitada, ou seja, não há nexo de causalidade algum entre o valor ali referido como tendo sido pago e a empreitada realizada pela Autora, sendo certo que esta fez a obra, entregou a loja, com defeitos é certo, e o valor ali indicado corresponde a mais de dois terços do valor da empreitada, pelo que, segundo as regras da razoabilidade pouco credível é que tenha algo a ver com a execução da obra em causa, o que em face dos factos se desconhece.
   Destarte, não tendo a Ré reconvindo no sentido de ser pedido a indemnização/redução do preço em face dos defeitos da obra, limitando a sua defesa a invocar a resolução do contrato, no que, como se referiu não lhe assiste razão, pese embora haja invocado o cumprimento defeituoso mas daí não retirando qualquer efeito em sede de pedidos, cabe apenas julgar procedente a pretensão da Autora no que a esta obra concerne, demonstrado que está que a realizou, o valor da mesma e que o preço não foi pago.
   Contrato relativo à Zona C Wall bay.
   Quanto a este contrato consta que para além das obras acordadas inicialmente, a pedido da Ré foi ainda realizada a instalação de aparelhos LCD TV/DVD no valor de HKD2.700,00, tendo sido realizadas as obras acordadas e esta outra e entregue esta zona da área comercial à Ré em 18 de Julho de 2008 – cf. al. y), z) e aa) -.
   Deste contrato a Ré apenas pagou a primeira prestação estando por pagar as 2ª e 3ª no valor de HKD96.600,00 e HKD13.800,00 – cf. al. w), x) e yyy) -.
   Nos termos do artº 400º do C.Civ. os contratos devem ser pontualmente cumpridos pelo que está a Ré em mora no que concerne ao pagamento destes valores no montante global de HKD113.100,00 equivalente a MOP116.493,00.
   Do atraso no início das obras.
   Vem também a Autora reclamar ser indemnizada pelo atraso no início das obras uma vez que o mesmo lhe causou prejuízos.
   Contudo no que a esta matéria concerne o que se prova é o que consta das alíneas tt), ou seja, que a Autora renunciou a qualquer indemnização decorrente de atrasos na empreitada originados pelo dono da obra, como é o caso desta.
   Por outro lado, nenhuma das alegadas despesas em que a Autora teria incorrido por força desse atraso se provaram.
   Pelo que, para além de nos termos contractados não ser devida indemnização alguma com este fundamento, nada mais se provou no que concerne a esta matéria, sendo irrelevante para o efeito o que consta das al. zzz) a bbbb), improcedendo este pedido.
   Do pedido de pagamento das rendas do armazém.
   No que a esta matéria concerne o que se provou foi que a Autora a pedido da Ré deixou esta depositar materiais que lhe pertenciam num armazém de que a Autora dispunha mediante o pagamento de HKD15.000,00 pelas três lojas – cf. al. cc) -, sendo que a Ré pagou a renda relativa aos meses de Março, Abril e Maio e Junho de 2008 – cf. al. dd) -, mas já não o fez quanto aos meses de Julho e Agosto de 2008, sendo certo que continuou a enviar mercadorias para o referido armazém – cf. al. cccc) e dddd) -.
   Destarte, nos termos do art 400º do C.Civ. é devido o pagamento do valor relativo à utilização do armazém nestes dois meses, no montante global de HKD30.000,00 equivalente a MOP30.900,00.
   Dos juros de mora.
   Nos termos do nº 1 do artº 794º do C.Civ. o devedor entra em mora se não cumprir a obrigação quando for extrajudicialmente interpelado para o efeito, o que no caso em apreço ocorreu em 18 de Junho de 2013 – cf. al. ee) e ff) – sem que a Ré haja procedido ao pagamento dos montantes devidos.
   Alega a Ré ter-se oferecido para pagar o que entendia ser devido – cf. al. llll) - contudo, tal oferta pressupunha que a Autora aceitasse as contas que a Ré oferecia e o que esta entendia ser o devido, não correspondendo ao pagamento do preço que agora se apura estar em dívida.
   Pelo que, sendo a obrigação pecuniária, nos termos do nº 1 do artº 794 e do artº 795º ambos do C.Civ. são devidos juros à taxa dos juros legais sobre a totalidade dos montantes em dívida a contar de 18 de Junho de 2013.
    Nestes termos e pelos fundamentos expostos, julga-se a acção parcialmente procedente porque parcialmente provada e em consequência condena-se a Ré a pagar à Autora o montante global de MOP3.409.400,37, acrescida dos juros de mora à taxa dos juros legais a contar de 18.06.2013 até efectivo e integral pagamento.
    Custas a cargo da Autora e Ré na proporção do decaimento.
    Registe e Notifique.”
Quid iuris?
Analisada a contestação da Ré, ora Recorrente, destaca-se que ela nunca formulou qualquer pedido reconvencional no sentido de pedir o reconhecimento dos seus créditos.
Diz que invocou a compensação como excepção, mas tal invocação não foi feita na contestação, mas sim nas alegações de direito após o julgamento da matéria de facto, o que viola o disposto do artº 409º do CPCM.
Aliás, a própria Ré qualificou a sua defesa na Contestação como simplesmente “POR IMPUGNAÇÃO” (vide fls. 379 dos autos) e em lado algum da Contestação com referência da defesa “POR EXCEPÇÃO”.
Também não resulta da contestação a intenção da Ré no sentido de que caso a acção vier julgar-se procedente, sejam compensados os seus créditos, resultantes das multas contratuais, com os créditos da Autora, pois não concretizou o valor para o efeito.
Só o fez, como já referimos anteriormente, nas alegações de direito.
Não tendo feito a defesa por excepção em tempo oportuno, o Tribunal não tem o dever de a apreciar, pelo que não se verifica a alegada nulidade da sentença por omissão da pronúncia.
Também não se verifica o alegado erro de julgamento.
Bem notou a sentença recorrida que a invocação do cumprimento defeituoso da Autora pela Ré na Contestação visa simplesmente para demonstrar que lhe assiste o direito de resolução unilateral dos contratos de empreitada em causa, razão pela qual nunca formulou qualquer pedido reconvencional da indemnização ou redução do preço em face dos defeitos das obras.
O Tribunal a quo apreciou a questão do alegado direito de resolução do contrato de empreitada e não o reconheceu, por entender que o exercício desse direito pressupunha que os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina, o que de modo algum se provou, nem tão pouco se alegou.
Trata-se duma decisão correcta com a qual concordamos na sua íntegra, pelo que a sentença recorrida não merece qualquer censura ou reparação nesta parte.
Assim sendo, ainda que houver factos assentes e provados que permitem imputar o cumprimento defeituoso da Autora nos contratos de empreitada em causa, se a Ré daí não ter retirado qualquer efeito útil em sede de pedidos, nunca se pode dizer que o Tribunal a quo ignorou tais factos e cometeu assim um erro de julgamento.
*
Tudo visto, resta decidir.
*
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a sentença recorrida.
*
Custas pela Ré.
Notifique e registe.
*
RAEM, aos 14 de Junho de 2018.

Relator Ho Wai Neng

Primeiro Juiz-Adjunto José Cândido de Pinho

Segundo Juiz-Adjunto Tong Hio Fong



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149/2018