Processo n.º 1078/2015 Data do acórdão: 2018-7-5 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– pena de prisão
– suspensão da execução da pena
– art.o 48.o, n.o 1, do Código Penal
S U M Á R I O
Se a experiência da arguida, no passado, de ter ficado condenada em pena de prisão suspensa na execução já não lhe conseguiu evitar a prática, em autoria material, do crime doloso de desobediência desta vez, então já não é de formar qualquer juízo de prognose favorável a ela para efeitos do n.o 1 do art.o 48.o do Código Penal.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 1078/2015
(Autos de recurso penal)
Recorrente (arguida): A
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformada com a sentença proferida a fls. 21v a 24 dos autos de Processo Sumário n.° CR2-15-0187-PSM do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB), que a condenou como autora material de um crime consumado de desobediência (por recusa injustificada de submissão ao exame de pesquisa de álcool), p. e p. pelo art.o 115.o, n.o 5, da Lei do Trânsito Rodoviário (LTR), conjugado com o art.o 312.o, n.o 1, alínea a), do Código Penal (CP), na pena de cinco meses de prisão efectiva, com inibição de condução por quatro meses, veio a arguida A, aí já melhor identificada, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), imputando ao Tribunal sentenciador a violação do art.o 64.o do CP (devido à não opção pela aplicação prevalecente da pena de multa), a violação do art.o 44.o do CP (pela não decisão da substituição da pena de prisão por pena de multa), e também a violação do art.o 48.o do CP (pela decisão de não suspensão da execução da pena de prisão), para pedir a final a aplicação de pena não privativa de liberdade, por ser ela, segundo alegou ela própria, uma pessoa perfeitamente integrada na sociedade do ponto de vista social, pessoal e profisionalmente, tendo a seu cargo seus pais (tendo a sua mãe uma incapacidade parcial permanente) e uma filha menor de tenra idade (com problemas educacionais relevantes), todos dela carecendo no dia-a-dia (cfr. a motivação do recurso apresentada em original a fls. 62 a 75 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu a Digna Delegada do Procurador no sentido de improcedência do recurso (cfr. a resposta de fls. 89 a 92).
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 101 a 102), pugnando também pelo não provimento do recurso.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já descrita como provada na fundamentação fáctica da sentença recorrida (ora concretamente a fls. 21v a 22) e sendo o objecto do recurso circunscrito tão-só à problemática da medida da pena, é de tomar tal factualidade provada como fundamentação fáctica da presente decisão de recurso, nos termos permitidos pelo art.º 631.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, ex vi do art.º 4.º do Código de Processo Penal.
Da fundamentação fáctica da sentença ora recorrida, sabe-se o seguinte:
– o crime de desobediência (por recusa injustificada de submissão ao exame de pesquisa de álcoll) por que vinha condenada a recorrente na sentença ora recorrida foi praticado em 20 de Outubro de 2015;
– a recorrente declarou ter por habilitações académicas o 5.o ano do ensino secundário, trabalhar como escriturária em companhia de imediação imobiliária, com cinco mil patacas de rendimento mensal, e precisar de sustentar os pais e uma filha;
– a recorrente não é delinquente primária;
– em 23 de Março de 2011, no Processo n.o CR3-09-0101-PCC do TJB, foi condenada por decisão transitada em julgado em 4 de Abril de 2011, pela prática de um crime de ofensa simples à integridade física, um crime de denúncia caluniosa e um crime de dano, na pena única de um ano de prisão, suspensa na execução por um ano, tendo essa punição declarada extinta em 28 de Junho de 2013;
– em 8 de Maio de 2014, no Processo n.o CR3-14-0092-PCS do TJB, foi condenada por decisão transitada em julgado em 29 de Maio de 2014, pela prática de um crime de desobediência, na pena de cinco meses de prisão, suspensa na execução por dezoito meses, com inibição de condução por três meses.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Pois bem, a recorrente veio pedir, materialmente, uma pena penal não privativa de liberdade pela prática do seu crime de desobediência por que vinha condenada nesta vez na sentença ora recorrida.
Há que abordar esse desejo da recorrente por partes:
Desde logo, é certo que o crime doloso de desobediência p. e p. pelo art.o 115.o, n.o 5, da LTR, conjugado com o art.o 312.o, n.o 1, alínea a), do CP, é punível com pena de prisão ou pena de multa.
Entretanto, também entende o presente Tribunal de recurso que não se pode aplicar à recorrente a pena de multa, em detrimento da pena de prisão, porquanto, no caso dos autos, a pena de multa não dá para realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, sobretudo na vertente de prevenção especial de crime, precisamente porque a recorrente não é delinquente primária e ficou já condenada em dois processos penais anteriores por crimes dolosos (um dos quais também foi crime de desobediência), daí que há que preveni-a, através da aplicação da pena de prisão, do cometimento, no futuro, de novo crime (cfr. o critério material vertido no art.o 64.o do CP na decisão da escolha da espécie da pena).
Pretendeu a recorrente também que a sua pena de prisão desta vez fosse substituída por pena de multa, à luz do art.o 44.o do CP. Contudo, a circunstância (que se pode vê nos elementos coligidos na parte II do presente acórdão de recurso) de ela ter voltado a cometer um novo crime doloso ainda na plena vigência do período de suspensão da execução da pena de prisão por que tinha sido condenada no Processo n.o CR3-14-0092-PCS já activa a excepção ressalvada na parte final do n.o 1 do art.o 44.o do CP, pelo que precisamente devido à necessidade de a prevenir do cometimento de futuro crime, não pode ser substituída a pena de prisão por pena de multa.
Por fim, roga subsidiariamente a recorrente a suspensão da execução da sua pena de prisão desta vez. Mas, se a experiência dela, no passado, de ter ficado condenada em pena de prisão suspensa na execução já não a conseguiu evitar a prática, em autoria material, do crime doloso de desobediência desta vez, então já não é de formar qualquer juízo de prognose favorável a ela para efeitos do n.o 1 do art.o 48.o do CP, pelo que a execução imediata da pena de prisão se apresenta como o único meio para prosseguir de modo adequado e suficiente as finalidades da punição, mormente a nível de prevenção especial falando, e a despeito de todo o alegado pela própria arguida na sua motivação.
Improcede, pois, o recurso, sem mais indagação por desnecessária.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas do recurso pela arguida, com três UC de taxa de justiça.
Comunique a presente decisão ao Processo n.o CR3-14-0092-PCS do Tribunal Judicial de Base.
Macau, 5 de Julho de 2018.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
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