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Proc. nº 891/2017
Jurisdição Cível
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 12 de Julho de 2018
Descritores:
     - Recurso jurisdicional
     - Delimitação objectiva
     - Casino
     - Salas de fumo
     - Multa administrativa
     - Art. 118º, nº2, do CPAC
     - Poder judicial

SUMÁRIO:

I - O recurso jurisdicional apresenta-se como uma forma de impugnação judicial dirigida contra uma sentença, à qual a parte inconformada arremete vícios e violações próprios. Significa isto que o TSI, em recurso para si interposto de decisão da primeira instância, está condicionado na sua actuação pela delimitação objectiva contida na respectiva alegação, nos termos do art. 589º do CPC.

II - De acordo com os nºs 4, 5 e 9 do Despacho 141/2014,e do nº10 das Directrizes sobre as Salas de Fumo, publicadas no BO nº 24, II série, de 11/06/2014, a partir de 7/10/2014, os casinos interessados nas salas de fumo deveriam obedecer àqueles novos requisitos, e quanto às autorizações anteriores concedidas para o fumo no interior das salas do casino aplicar-se-iam igualmente as mesmas disposições novas, caso ainda não houvesse salas a funcionar ao abrigo da referida e anterior autorização, tendo em conta o disposto no art. 11º, nº1 e nº2, “fine”, do Código Civil.

III - O art. 118º, nº2, do CPAC, que ao tribunal confere poderes de plena jurisdição, prevê que ele, perante uma anulação do acto punitivo, por exemplo, com fundamento em desproporcionalidade na medida concreta da multa ou por vício de forma invalidante e insuprível, acabe por – encurtando caminho e evitando que o procedimento administrativo volte à entidade competente para, em execução do julgado, proceder à reedição do acto punitivo sem os vícios que estiveram na base da anulação – fazer de imediato o que mais tarde poderia a Administração realizar, fixando “o quantitativo da multa”, bem como “a espécie e duração da sanção acessória”.

IV - Face referido em 3, o poder de intervenção judicial não permite alterar oficiosamente o objecto do recurso, nem ultrapassar o poder administrativo e ponderar aquilo que a Administração não ponderou. Se tal fosse possível, o tribunal iria decidir alterar na casa da justiça aquilo que o Administrador tinha feito casa administrativa e tal equivaleria a dizer que o tribunal poderia fazer administração activa, o que contrariaria o princípio da separação de poderes.

Proc. nº 891/2017

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I - Relatório
A (MACAU), S.A., sociedade comercial com sede em Macau, na …, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º…, --------
Recorreu contenciosamente para o Tribunal Administrativo da RAEM (Proc. nº 1172/15/-ADM), -------
Da decisão sancionatória do Exmo. Senhor Director dos Serviços de Saúde, de 28 de Janeiro de 2015, que lhe aplicou uma multa no valor de MOP$ 100.000,00 por alegada violação do estipulado no artigo 6.º da Lei n.º 5/2011.
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Na oportunidade, foi proferida sentença que julgou o recurso contencioso parcialmente procedente e, em consequência, às duas infracções administrativas aplicou a multa de MOP$ 30.000,00 a cada uma, no total de MOP$ 60.000,00.
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Contra esta sentença vem agora interposto o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações a recorrente A formulou as seguintes conclusões:
«1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Macau de fls. 316 a 327 dos presentes autos, do passado dia 18 de Maio de 2017, que julgou parcialmente improcedente o recurso contencioso interposto pela ora Recorrente em 27 de Fevereiro de 2015 (a “Sentença Recorrida”), parcialmente mantendo a Decisão Sancionatória do Exmo. Senhor Director dos Serviços de Saúde, com o n.º 0009/GPCT/2015, datada de 28 de Janeiro de 2015, que aplicou à ora Recorrente uma multa no valor de MOP$ 100.000,00 por alegada violação do estipulado no artigo 6.º da Lei n.º 5/2011 (a “Decisão Sancionatória”);
2. Por não concordar com a Sentença Recorrida, vem agora a Recorrente interpor o presente recurso, suscitando para o efeito um conjunto de vícios que, tal como seguidamente se irá provar, implicarão, a final, o deferimento do presente recurso e, dessa forma, a revogação da Sentença Recorrida;
A. Do vício da Incompetência dos Serviços de Saúde
3. A Recorrente mantém a firme convicção que o procedimento que está na base da Decisão Sancionatória está inquinado de nulidade, porquanto entende que os Serviços de Saúde não dispunham de competência para realizar a operação de fiscalização que esteve na sua génese;
4. Nos termos do artigo 28.º da Lei n.º 5/2011, conjugado com os artigos 9.º, n.º 1 do Despacho n.º 141/2014 e da alínea 2) do artigo 2.º do Regulamento Administrativo n.º 34/2003, a competência de fiscalização do seu cumprimento cabe, em exclusivo, à DICJ, contrariamente ao que defende a Entidade Recorrida, entendimento ora sufragado pelo Tribunal a quo, e com o qual a Recorrente profundamente discorda;
5. Este entendimento encontra suporte legal indiscutível na Lei n.º 10/2012, publicada a 27 de Agosto, nomeadamente no seu artigo 2.º, n.º 1, alínea 4) e no artigo 5.º, nos termos dos quais, sem prejuízo do disposto no artigo 5.º, é interdita a entrada nos casinos a Trabalhadores da Administração Pública, incluindo os trabalhadores dos institutos públicos e os agentes das Forças e Serviços de Segurança, excepto quando autorizados pelo Chefe do Executivo;
6. O aludido artigo 5.º enumera as pessoas autorizadas a entrar em casinos no âmbito do exercício das suas funções públicas, prevendo-se entre outros, os funcionários da DICJ, mas já não os funcionários dos Serviços de Saúde, os quais sempre teriam que ser devidamente autorizados caso a caso para o efeito pelo Chefe do Executivo;
7. O próprio Exmo. Sr. Director dos Serviços de Saúde perfilha deste entendimento, porquanto refere expressamente na Decisão Sancionatória que o pessoal indicado nos Autos de Notícia n.º 001/GPCT/2014 e n.º 002/GPCT/2014 terá sido alegadamente autorizado pelo Chefe do Executivo nos termos do referido artigo 5.º;
8. Assim, não se consegue compreender o entendimento do douto Tribunal a quo nesta sede, quando defende que o pessoal dos Serviços de Saúde - e, em particular, do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo - tem competência para fiscalizar a Lei n.º 5/2011 nos casinos;
9. Segundo o entendimento do Tribunal a quo, a alínea 8) do n.º 1 do artigo 5.º Lei n.º 10/2012 não exige uma autorização concreta e determinada para certos funcionários, bastando-se uma autorização genérica, defendendo, ademais, ser difícil entender que tal autorização “caso a caso” tenha por objectivo restringir a concessão de autorização apenas para casos concretos;
10. Contudo, o legislador ao individualizar expressamente as pessoas referidas nas alíneas 1) a 7) do n.º 1 do artigo 5.º do referido diploma legal de todas as demais (que encontram assento na sua alínea 9)) tem como objectivo distinguir entre as pessoas que têm a possibilidade, no âmbito das suas funções, de entrar nos casinos e aquelas que só estão habilitadas a tal acesso após autorização concreta e específica por parte do Chefe do Executivo;
11. Só assim pode ser entendida a expressão “caso a caso” contida na referida alínea 8), compreensão confortada quer pelos elementos literal, sistemático e teleológico, subjacentes à interpretação da norma em concreto;
12. De facto, quanto ao elemento sistemático, é manifesto que se fosse pretendido dotar os Serviços de Saúde (qualquer seu órgão ou entidade a si subordinada, como é o caso do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo) de competências para fiscalizar o cumprimento das disposições da Lei n.º 5/2011 nos casinos, tal teria sido reflectido na alteração à referida legislação, nomeadamente por ocasião da publicação do Regulamento n.º 34/2011;
13. Não tendo tal alteração sido efectuada, e nem sequer ponderada, não se vislumbra de que forma é que se pode defender que a menção genérica constante do artigo 25.º-A do Decreto-Lei n.º 81/99/M, referente à competência do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo para fiscalizar o cumprimento da legislação relativa à prevenção e controlo do tabagismo abrange a referida fiscalização nos casinos;
14. Por outro lado, a ratio subjacente àquela alínea 8), mais não é do que a confirmação da competência exclusiva conferida à DICJ de fiscalizar o cumprimento das disposições da Lei n.º 5/2011 nos casinos;
15. Em suma, a única forma de os funcionários dos Serviços de Saúde terem acesso aos casinos para procederem a actividades de fiscalização é por via da referida alínea 8), o que não sucedeu in casu;
16. Ainda nesta sede, há que chamar à colação o princípio lex specialis derrogat lex generalis e que encontra manifestação na relação entre o artigo 5.º da Lei n.º 10/2012 e o Decreto-Lei n.º 81/99/M, alterado pelo Regulamento Administrativo n.º 34/2011;
17. Com efeito, não obstante a competência genérica atribuída aos Serviços de Saúde (por via do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo) de fiscalizar o cumprimento da legislação relativa à prevenção e controlo do tabagismo (ex vi artigo 25.º-A do Decreto-Lei n.º 81/99/M), tais funcionários não estão legalmente autorizados a entrar nos casinos para exercer tais competências fiscalizadoras, excepto perante autorização expressa, concreta e determinada por parte do Chefe do Executivo (ex vi artigo 5.º da Lei n.º 10/2012);

18. Ora, tal como referido na Sentença Recorrida, o artigo 28.º da Lei n.º 5/2011, elenca, como entidades titulares dos poderes de fiscalização das normas do referido diploma legal, os Serviços de Saúde, o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos e o Corpo de Polícia de Segurança Pública, adiante designado por CPSP, conquanto que a referida fiscalização se compreenda “no âmbito das suas atribuições”;
19. A ratio daquela condição tem como objectivo clarificar que as mencionadas entidades dispõem de competência de fiscalização genérica, mas que em certos casos alguma ou algumas delas poderão ter competência exclusiva.
20. É o que sucede em matéria de fiscalização nos casinos, onde só a DICJ dispõe de competência fiscalizadora, tal como decorre do Regulamento Administrativo n.º 34/2003, aprovado em 18 de Setembro de 2003;
21. Exemplo cabal da competência exclusiva da DICJ para o cumprimento da Lei 5/2011 nos casinos encontra-se na Instrução 1/2014 emitida por aquela, a qual veio regulamentar as condições a que devem obedecer a definição das áreas de jogo no âmbito da referida Lei;
22. Concluindo, é totalmente improcedente o argumento aduzido na Decisão Sancionatória, e acolhido pelo Tribunal a quo, no sentido de que o pessoal dos Serviços de Saúde tem, nos termos do Artigo 25.º-A do Decreto-Lei n.º 81/99/M, aditado pelo Regulamento Administrativo n.º 34/2011 competência para fiscalizar a aplicação da Lei n.º 5/2011 nos casinos;
23. Ademais, jamais o funcionário responsável pelos autos que estão na base da presente lide judicial foi, até à emissão da Decisão Sancionatória, autorizado pelo Chefe do Executivo a frequentar a área de jogo em apreço, tendo tal argumento, aliás, apenas sido aduzido na Decisão Sancionatória, com a mera referência à existência de uma autorização genérica, sem contudo ser mencionada a sua data, ou qualquer número de referência e muito menos o respectivo âmbito e conteúdo;

24. Assim, estamos perante um vício de incompetência absoluta dos Serviços de Saúde, que desta forma praticou um acto incluído nas atribuições de outra entidade pública, in casu, a DICJ, e que, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 122.º do Código Procedimento Administrativo, tem como consequência a nulidade de todo o procedimento.
25. Nessa medida, tendo o Tribuna a quo mantido a Decisão Sancionatória, deve a Sentença Recorrida ser revogada por violação das normas substantivas relativas às regras de competência;
26. Termos em que, à luz da alínea b) do n.º 2 do artigo 122.º do Código Procedimento Administrativo, deve a Sentença Recorrida ser revogada, declarando-se nula a Decisão Sancionatória e, consequentemente, não ser aplicada qualquer sanção à ora Recorrente.
B. Do vício de violação de lei
27. Tal como se referiu no âmbito do procedimento administrativo e, bem assim, no competente Recurso Contencioso, a área referida pela Decisão Sancionatória - designada por “Pit 11”, cumpre todos os requisitos e obteve todas as autorizações legais para se considerar uma área para fumadores;
28. Outro foi o sentido da decisão do Tribunal a quo, como qual não concorda a ora Recorrente porquanto aquele não faz uma aplicação correcta das disposições normativas aplicáveis ao caso sub judice;
29. Ora, a área denominada por “Pit 11”, localizada no rés-do-chão do casino “X” (L01 Casino Floor), designada por “Y”, objecto da acção de fiscalização dos Serviços de Saúde e onde se verificou uma alegada infracção ao disposto no artigo 6.º da Lei n.º 5/2011, encontra-se devidamente assinalada e demarcada como uma área para fumadores nas plantas submetidas à apreciação e aprovação de Sua Exa. o Chefe do Executivo como uma área para fumadores, tendo sido autorizada como área para fumadores, por Despacho de 30 de Dezembro de 2012 de Sua Exa. o Senhor Chefe do Executivo, exarado sob a proposta dos. Serviços de Saúde n.º 616/SS/P/2012;
30. O referido despacho não foi objecto de qualquer revogação ou alteração, pelo que mantém assim a sua total validade e eficácia nos precisos termos e com a amplitude com que foi proferido - permissão aos jogadores que frequentem a referida sala “Y” de fumarem nas respectivas mesas de jogo ou nas máquinas de jogo que aí se encontrem instaladas;
31. Da mesma maneira, não se verificou qualquer alteração aos pressupostos de facto que estiveram na base do referido Despacho uma vez que a área aí autorizada como área para fumadores é precisamente a mesma onde foi realizada a acção de fiscalização que esteve na génese do procedimento administrativo objecto dos presentes autos, e que os Serviços de Saúde trataram, erradamente, como uma área interdita a fumadores;
32. Resumindo e concluindo, a área designada por “Pit 11”, onde é operada a sala “Y”, em que foi realizada a acção de fiscalização a que a Decisão Sancionatória faz referência, é uma área para fumadores conforme autorização expressa concedida por Despacho de Sua Excelência o Senhor Chefe do Executivo, a quem, nos termos da lei, compete a autorização para a criação destas áreas;
33. Mantendo-se tal Despacho em vigor, é carecido de sentido que se exija, à luz da legislação em vigor, um novo despacho a autorizar fumar no “Pit 11” da autoria de Sua Excelência o Chefe do Executivo;
34. A alegada “legislação em vigor” compreende os artigos 9.º e 12.º das “Normas relativas aos requisitos a que devem obedecer as áreas para fumadores nos casinos”, publicadas em Anexo ao Despacho n.º 296/2012, com as alterações que lhe foram introduzidas através do Despacho n.º 141/2014;
35. A Sentença Recorrida, no âmbito deste quadro legal, concluiu erradamente que a partir de 7 de Outubro de 2014, teriam sido eliminadas todas as áreas de fumadores instaladas em áreas comuns de jogo, criadas ao abrigo do Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2012, conforme decorreria dos termos estabelecidos no n.º 10 das “directrizes sobre as salas de fumo” emitidas pela Entidade Recorrida ao abrigo dos supra referidos normativos legais, e publicadas no Boletim Oficial da RAEM, n.º 24, II Série, de 11 de Junho de 2014 (doravante as “directrizes”);
36. Em bom rigor, a eliminação daquelas áreas nestes moldes, i.e. através da emissão das directrizes dos Serviços de Saúde, configuraria uma revogação do acto administrativo praticado pelo Exmo. Senhor Chefe do Executivo, que tinha expressamente autorizado a ora Requerente a criar as referidas áreas de fumadores, ao abrigo do Despacho n.º 296/2012;
37. Mas tal conclusão é infirmada pelos princípios jurídico-administrativos aplicáveis, pois a competência para a revogação de um acto administrativo caberá, por princípio, ao seu próprio autor ou superiores hierárquicos, a não ser que se trate de acto da competência exclusiva do subalterno, conforme resulta do artigo 131.º do CPA;
38. Ou seja, a esta luz, apenas o Exmo. Senhor Chefe do Executivo tinha competência para revogar a autorização concedida à ora Recorrente para criar áreas para fumadores no casino X e jamais a Entidade Recorrida;
39. E muito menos, acrescente-se, por via da emissão de directrizes que apenas visam, como decorre da própria lei, estabelecer os concretos termos de execução das normas previstas no Despacho n.º 141/2014;
40. Finalmente, tal entendimento encontra ainda suporte legal no artigo 13.º do Despacho n.º 141/2014, nos termos do qual se prevê que a redução e cancelamento das referidas áreas é da expressa competência do Chefe do Executivo;
41. De todo o modo, e sem conceder, não pode deixar de se notar que a área designada por “Pit 11” e onde se encontra instalado o “Y”, à data de 7 de Outubro, não era uma área comum de jogo, mas sim uma área de jogo de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores, ou seja, estaria sempre excluído do âmbito de aplicação da referida norma das directrizes e, como tal, não sujeito a qualquer tipo de novel autorização;
42. De facto, em cumprimento dos requisitos previstos na Instrução n.º 1/2014, a área denominada por “Pit 11”, encontra-se fisicamente separada das restantes instalações do casino, constituindo uma unidade independente, distinta e isolada tratando-se de um espaço suficientemente delimitado em área demarcada através de separadores físicos e barreiras arquitectónicas que permitem identificar o uso exclusivo a que se acha afecta, comunicando com uma parte comum do casino;
43. Acresce que tal área é de acesso condicionado a determinados jogadores pelo registo e verificação da identidade do respectivo jogador, no âmbito de programas de fidelização ou de marketing do casino, através da emissão de um cartão de membro temporário ou definitivo de acesso, sendo utilizada para exploração da actividade de promoção de jogos de fortuna ou azar em casino para actividades de regime promocional das concessionárias e subconcessionárias autorizadas pela DICJ, caracterizando-se pela utilização de fichas de jogo próprias e diferenciadas a acrescer às fichas de jogo usadas nas áreas comuns de jogo dos casinos;
44. Ou seja, cumpre os procedimentos internos específicos de operação definidos pela DICJ nas suas instruções - razão pela qual, aliás, foi considerada apta a ser operada como área de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores, quer pela DICJ - enquanto entidade competente para a sua certificação, quer por outras entidades como os Serviços de Saúde, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes e o Corpo de Bombeiros, aquando a 1.ª vistoria em que lhe foi atribuída pelos Serviços de Saúde a classificação de “Satisfaz”;

45. Do mesmo modo, a DICJ, no uso das suas competências, apôs também no referido Auto de Vistoria, a classificação de “Satisfaz”, por referência ao cumprimento das normas previstas na Instrução n.º 1/2014, assim como as demais entidades públicas que certificaram o local conforme as disposições legais aplicáveis, para efeito de, como acima se disse, esta área ser considerada como uma área de jogo de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores;
46. Por essa razão, no local mostrava-se afixado um dístico de sinalização visível, onde se dava conta aos jogadores membros desta sala de jogo localizada no “Pit 11” de que se trata de uma área para fumadores, de acesso reservado a membros, denominada por “Y”, onde é permitido aos jogadores fumarem enquanto jogam;
47. Destarte, tendo a área denominada por “Pit 11” sido i) autorizada por Despacho de Sua Excelência o Chefe do Executivo datado 30 de Dezembro de 2012, como área para fumadores (despacho que, como se disse, não foi objecto de qualquer alteração ou revogação mantendo todos os seus efeitos) e ii) considerada como apta para operar e encontrando-se a operar como área de jogo de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores, conforme Auto de Vistoria n.º 15/GPCT/2014 dos Serviços de Saúde, dúvidas não podem restar de que na mesma é permitido aos jogadores fumarem nas respectivas mesas de jogo ou nas máquinas eléctricas ou mecânicas, incluindo “slot machines”, sem quaisquer restrições;
48. Por outro lado, sendo uma área para fumadores, devidamente autorizada como tal, não está, obviamente, sujeita ao cumprimento do disposto nos n.ºs 1 a 3 do artigo 6.º da Lei n.º 5/2011, conforme erradamente se refere na Decisão Sancionatória e é assumida na Sentença Recorrida;
49. Para o efeito, não é correcta a consideração que a área denominada como “Pit 11” foi apenas autorizada como área de acesso condicionado a partir do dia 21 de Outubro de 2014, pois a permissão para fumar na área denominada por “Pit 11” já linha sido concedida por via do Despacho do Exmo. Sr. Chefe do Executivo de Dezembro de 2012, quer porque a comunicação de 21 de Outubro de 2014 não revogou o Despacho do Exmo. Sr. Chefe do Executivo de Dezembro de 2012 - mantendo-se este último em vigor, quer porque a comunicação de 21 de Outubro de 2014 formalizava a autorização da DICJ à conversão de todas as mesas de jogo da área denominada por “Pit 11” em mesas de jogo VIP, e não, à conversão em área de acesso condicionado;
50. Isto é, a autorização para a conversão em área de acesso condicionado já havia sido obtida anteriormente e não apenas naquela data;
51. Acresce ainda que não se vislumbra, em nenhum dispositivo legal, a exigência de que as áreas de acesso condicionado sejam simultaneamente salas de jogo VIP, pelo que mais uma vez só se pode concluir que a Decisão Sancionatória assentou em pressupostos errados, padecendo por esse motivo do vício de violação de lei, por força de uma interpretação enviesada dos preceitos legais em vigor, pelo que deveria ter sido anulada nos termos dos artigos 20.º e 21.º do CPAC, isentando de qualquer sanção a ora Recorrente;
52. Nesses termos andou mal o Tribunal a quo ao manter a Decisão Sancionatória, pelo que também a Sentença Recorrida está inquinada por vício de violação de lei substantiva, por errada interpretação das disposições acima referidas, nomeadamente;
53. A talhe de foice, refira-se ainda que, não obstante a ora Requerente ter apresentado um pedido de alteração das áreas de fumadores em 29 de Agosto de 2014, conforme enunciado na Sentença Recorrida, o que é facto é que a área denominada por “Pit 11” não deixou de estar autorizada como área para fumadores, impondo-se apenas alterações não substanciais no espaço físico onde se encontra localizada, não se prejudicando a autorização anteriormente obtida;

54. Na verdade, tratou-se de um pedido de alteração que, de per si, não representou uma diminuição dos direitos adquiridos da ora Requerente por via da supra referida autorização, sendo certo que tais alterações foram achadas conformes às disposições legais aplicáveis pelos Serviços de Saúde;
55. Por essa razão não se compreende qual a relevância de tal facto, pois, na verdade, tal área era já uma área de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores, não podendo ser objecto de qualquer alegada eliminação;
56. Pelo exposto, a Decisão Sancionatória encontra-se inquinada do vício de violação de lei, com fundamento em erro manifesto na interpretação dos preceitos legais em vigor e aplicáveis ao caso em apreço - devendo por isso ser declarada anulável nos termos conjugados do artigo 20.º e da alínea c) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC.
57. Uma vez que a Sentença Recorrida manteve a Decisão Sancionatória, é ela igualmente impugnável com fundamento em violação de lei substantiva por erro manifesto na aplicação das normas aplicáveis, nomeadamente;
C. Da multa aplicada e da medida da pena
58. Nesta sede, o Tribunal a quo decidiu que o montante da multa aplicada carece de justiça, e que a Entidade Recorrida exerceu erradamente o poder discricionário, ao ter aplicado à Recorrente a multa pelo montante máximo;
59. Tendo decidido “(...) que os fundamentos apresentados pela Recorrente são parcialmente procedentes, aplicando a cada uma das duas infracções administrativas praticadas pela Recorrente e previstas e punidas nos termos do artigo 6.º e na alínea 7) do n.º 7 do artigo 23.º da Lei 5/2011 a multa de MOP$30.000,00, i. e. no total de MOP$60.000,00”;
60. Da análise da cronologia relevante dos factos que antecederam a aplicação da Decisão Condenatória, resulta que foram efectuadas duas acções de fiscalização nos dias 29 e 30 de Outubro de 2014, no seguimento das quais foram levantados os autos de notícia n.º 001/GPCT/2014 e 002/GPCT/2014 respectivamente;
61. Seguidamente, em 26 de Janeiro de 2015, a Entidade Recorrida proferiu despacho, que concordou com a Proposta n.º 007/GPCT/2015, decidindo aplicar à Recorrente a multa no montante máximo de MOP$100,000.00 e exigindo-lhe afixar imediatamente o dístico de sinalização relativo à interdição de fumar em lugar visível das áreas do Casino X, tendo em 28 de Janeiro de 2015, a Entidade Recorrida, através do ofício n.º 0009/GPCT/2015, notificada a Recorrente de tal decisão;
62. Ou seja, em resultado dos autos n.º 001/GPCT/2014 e n.º 002/GPCT/2014, a ora Recorrente foi notificada em 28 de Janeiro de 2015 da Decisão Sancionatória, nos termos do qual foi condenada no pagamento de uma multa no montante máximo de MOP$100,000.00 e lhe foi exigido a afixação imediata dos dísticos de sinalização relativos à interdição de fumar nas áreas em questão,
63. Surpreendentemente, o douto Tribunal a quo, apesar de reconhecer que o valor da multa aplicada era desrazoável e desproporcional, decidiu aplicar não uma, mas duas multas no montante de MOP$30,000.00 cada, no montante total de MOP$60,000.00, uma por cada uma das alegadas infracções a que os Autos n.º 001/GPCT/2014 e n.º 002/GPCT/2014 fazem menção;
64. Uma tal decisão enferma de nulidade, porquanto se debruça sobre objecto diferente do que está em causa nos presentes autos, na medida em que o objecto dos autos de recurso que correram termos no Tribunal Administrativo tiveram como objecto a Decisão Sancionatória e não os Autos n. º 001/GPCT/2014 e n.º 002/GPCT/2014;
65. Nos termos do artigo 571.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 149.º do CPAC, “é nula a sentença quando condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido”.

66. O Tribunal a quo não respeitou a limitação constante daquela norma, tendo extravasado do objecto dos presentes autos, mediante a condenação da ora Recorrente por duas infracções, quando, na verdade, o objecto dos presentes autos se cingia à Decisão Sancionatória e não, pelo menos directamente, às alegadas infracções a que fazem referência os Autos n.º 001/GPCT/2014 e n.º 002/GPCT/2014;
67. Nesse sentido, a Sentença Recorrida é nula por violação do princípio do pedido, à luz dos artigos 571.º e 564.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 149.º do CPAC.
68. De todo o modo, e sem conceder, mesmo que se admitisse a individualização dos Autos n.º 001/GPCT/2014 e n.º 002/GPCT/2014 para efeitos da determinação da medida da pena aplicável a cada um deles - o que não se admite nem sequer é legalmente possível - sempre se diria que, por um lado, se trataria de uma infracção continuada e, como tal, apenas susceptível de ser punida com uma multa;
69. Por outro lado, caso também não se entendesse assim, às multas individualmente determinadas deveria ser aplicado o instituto do concurso de penas / infracções, pelo que nunca a multa global poderia resultar da soma aritmética das duas multas individuais;
70. Por outro lado, quanto à medida da pena concretamente aplicada, veio o Tribunal reconhecer razão à ora Recorrente, no sentido de que, a ser aplicável uma qualquer multa - o que não se concede e por mera cautela de patrocínio se equaciona - nunca a mesma poderia ter sido pelo montante máximo;
71. Apesar de a ora Recorrente se congratular com tal entendimento, por ser mais conforme com os princípios e as regras jurídicas que estão e devem estar subjacentes à determinação da medida da pena, ainda assim entende que a concreta medida da pena a ser aplicada eventualmente não é razoável;

72. De facto, por um lado, e tal como reconhecido pelo Tribunal a quo, a Recorrente seria um agente primário, por outro lado, esta sempre pautou o seu comportamento pelo mais estrito cumprimento da lei e constante valorização e engrandecimento da RAEM;
73. Nessa senda, a Recorrida tem sido presença activa no esforço de diversificação da oferta turística em Macau, com o objectivo de tornar a Região numa capital mundial de entretenimento;
74. Por outro lado, nada no comportamento da Recorrente durante todo o tempo que tem operado em Macau poderá indiciar que esta venha a proceder de outra forma que não a de acatar e tomar as medidas necessárias para que qualquer eventual violação à legislação vigente não volte a verificar-se;
75. Pelo que a referência à natural dimensão económica que assume uma operadora no sector dos jogos de fortuna ou azar em casino para justificar a aplicação à ora Recorrente da sanção máxima prevista no artigo 25.º da Lei n.º 5/2011 suscitada na Decisão Sancionatória, acompanhada do juízo de que se não for aplicada a sanção mais pesada, a Recorrente continuará a violar a lei a seu bel-prazer, tem de ser repudiada;
76. Assim, atendendo a que, a aplicar-se uma multa à Recorrente, “o grau de ilicitude e do erro é ordinário” e a Recorrente é primária - tal como reconhecido pelo Tribunal a quo -, nunca poderá ser aplicada à Requerente uma multa no montante máximo, ao arrepio dos mais elementares princípios jurídicos que enformam a matéria da determinação da medida da pena como sucedeu na Decisão Sancionatória.
77. De todo o modo, atendendo ao juízo do Tribunal a quo e transpondo-o para a Decisão Condenatória, certo é que a medida da pena a aplicar em concreto à Recorrente jamais poderá ser superior a MOP$30,000.00, sob pena de violação dos referidos princípios e regras de jurídicas;
78. Assim sendo, e caso se entenda aplicar uma multa à ora Recorrente - o que não se concede mas cuja hipótese se coloca por mero dever de patrocínio - deverá a ponderação feita na Sentença Recorrida pelo Tribunal a quo sobre a medida da pena transposta para a Decisão Sancionatória, aplicando-se uma multa nunca superior a MOP$30,000.00;
D. Da aposição de dísticos de sinalização relativos à interdição de fumar pelos funcionários dos Serviços de Saúde
79. Por fim, no dia em que foi notificada à Recorrente a Decisão Recorrida, alguns funcionários dos Serviços de Saúde deslocaram-se ao local onde a suposta infracção se verificou, tendo imediatamente aposto os dísticos relativos à interdição de fumar sem ter sido dada à ora Recorrente a oportunidade de o fazer;
80. A actuação dos Serviços de Saúde, para além de persecutória, configura naturalmente um caso de execução ilegal do acto administrativo, por não se verificar o cumprimento dos requisitos estabelecidos no artigo 139.º do CPA;
81. Não obstante, e como se referiu supra, uma vez que a ora Recorrente considera que não lhe deve ser aplicada qualquer sanção, uma vez que actuou no estrito cumprimento da lei vigente, deve ser autorizada a remoção dos dísticos de sinalização relativos à interdição de fumar apostos pelos funcionários dos Serviços de Saúde, sendo para o efeito, a ora Recorrente autorizada a fazê-lo.
NESTES TERMOS, e nos mais de direito aplicável, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a Sentença Recorrida e declarada NULA a Decisão Sancionatória, com fundamento em vício de incompetência absoluta da Entidade Recorrida, nos termos conjugados do artigo 598.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 149.º do CPAC, e da alínea b) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA;

Caso assim não se entenda, deverá a Sentença Recorrida ser revogada, devendo a Decisão Sancionatória ser ANULADA, nos termos conjugados do artigo 598.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 149.º do CPAC, e do artigo 131.º do CPA, por se mostrar inquinada do vício de violação de lei:
(i) por manifesta contradição com os preceitos legais aplicáveis ao caso em apreço;
(ii) por erro manifesto na apreciação dos factos que serviram de base à Decisão Sancionatória pela Entidade Recorrida.
Por outro lado, deve a Sentença Recorrida ser declarada NULA, com fundamento na violação do princípio do pedido, à luz dos artigos 571.º e 564.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 149.º do CPAC.
Requer ainda que lhe seja dada autorização para retirar os dísticos relativos à interdição de fumar apostos pelos Serviços de Saúde na área designada por área designada por “Pit 11” localizada no rés-do-chão do casino denominado por “X” (L01 Casino Floor), também conhecida por “Y”.».
*
A entidade recorrida respondeu ao recurso, cujas alegações sintetizou pela seguinte forma:

«i. Contrariamente ao que ditam as boas regras jurídicas, as presentes alegações de recurso não foram apresentadas de forma articulada e, portanto, não devem ser aceites e, em consequência, devem ser desentranhadas do processo.
ii. Com o presente recurso jurisdicional pretende a Recorrente demonstrar que a sentença recorrida viola as normas substantivas relativas às regras de competência, padece do vício de violação de lei por erro manifesto na aplicação das normas aplicáveis, viola o princípio do pedido, requerendo ainda que lhe seja dada autorização para retirar os dísticos relativos à interdição de fumar apostos pelos Serviços de Saúde no local “Pit 11”.
iii. Não pode a Entidade Recorrida deixar de discordar da posição defendida pela ora Recorrente, pelo que se impugnam todas as alegações de recurso.
iv. Relativamente à alegada incompetência absoluta dos Serviços de Saúde, a Recorrente continua a confundir a competência legalmente atribuída aos Serviços de Saúde para fiscalizar o cumprimento do regime de prevenção e controlo do tabagismo, incluindo nos casinos, com a necessidade de haver uma autorização expressa do Chefe do Executivo para a entrada dos trabalhadores dos Serviços de Saúde nos casinos, por força da Lei n.º 10/2012.
v. A Recorrente faz uma interpretação pessoalizada e conveniente para os seus interesses quer da alínea 8) do n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 10/2012, quer dos restantes normativos legais relacionados com esta matéria, ignorando por completo o senso comum e a realidade prática.
vi. A autorização, caso a caso, nos termos propalados pela Recorrente seria inviável do ponto de vista prático e acarretaria visíveis prejuízos para o interesse público, dada a inoperacionalidade e a paralização dos Serviços de Saúde no que se refere às suas funções de fiscalização do regime de prevenção e controlo do tabagismo que tal autorização acarretaria.
vii. Vigora no ordenamento jurídico da RAEM o princípio da concorrência de competências e não o da exclusividade de competências a um órgão administrativo, sendo a atribuição de competências pelo legislador da RAEM aos Serviços de Saúde para a prática de actos de fiscalização do cumprimento das matérias reguladas na Lei n.º 5/2011 um excelente exemplo daquele princípio.
viii. Os trabalhadores que lavraram os Autos n.º 001/GPCT/20l4 e n.º 002/GPCT/2014 tiveram autorização do Chefe do Executivo para, no exercício das suas funções, entrarem nos casinos ao abrigo da alínea 8) do n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 10/2012.
ix. Atentas as normas legais aplicáveis em matéria de competência, nomeadamente, o n.º 1 do artigo 28.º da Lei n.º 5/2011, o n.º 1 do artigo 10.º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 141/2014 e a alínea j) do n.º 1 do artigo 25.º-A do Decreto-Lei n.º 81/99/M, de 15 de Novembro, aditado pelo Regulamento Administrativo n.º 34/2011, bem andou o Tribunal a quo ao decidir que “para assegurar o GPCT o cumprimento eficaz das suas missões legalmente fixadas, nomeadamente, a fiscalização do cumprimento da legislação relativa à prevenção e controlo do tabagismo, a autorização genérica do Exmo. Chefe do Executivo para o pessoal do GPCT entrar nos casinos durante um período fixado, está obviamente em conformidade com as situações reais do exercício das suas funções, não apresentando qualquer inconveniente, nem violação da lei acima referida.” (tradução livre).
x. O facto de o Regulamento Administrativo n.º 34/2003 conferir poderes à DICJ para fiscalizar, supervisionar e monitorizar a actividade das concessionárias de jogo, não implica que os Serviços de Saúde estejam impedidos de fiscalizar o cumprimento do regime de Prevenção e Controlo do Tabagismo.
xi. E tanto assim é que, embora o artigo 28.º da Lei n.º 5/2011 e o n.º 1 do artigo 10.º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 141/2014 sejam normativos legais posteriores ao mencionado Regulamento, conferiram directa e expressamente poderes de fiscalização aos Serviços de Saúde dentro dos casinos no âmbito da Lei n.º 5/2011.
xii. Os Serviços de Saúde são competentes para fiscalizar o cumprimento da Lei n.º 5/2011 nos casinos, não se verificando o vício de incompetência absoluta alegado pela Recorrente, devendo a sentença recorrida ser mantida com todas as legais consequências.
xiii. A Recorrente convenientemente confunde matéria factual com matéria legal, numa tentativa de enquadrar o local “Pit 11” no âmbito das áreas autorizadas para fumadores por Despacho do Chefe do Executivo e, como tal, não sujeita ao cumprimento do previsto no artigo 6.º da Lei n.º 5/2011, assim tentando esquivar-se ao pagamento da multa.
xiv. A Recorrente labora em equívoco quando afirma que “a área referida pela Decisão Sancionatória - designada por “Pit 11”, cumpre todos os requisitos e obteve todas as autorizações legais para se considerar uma área para fumadores”.
xv. A Recorrente limita-se a fazer um conjunto de interpretações erróneas da legislação em vigor para fundamentar o seu pedido de anulação da decisão sancionatória, fazendo tábua rasa de que o regime substantivo de criação e alteração das áreas para fumadores nos casinos foi modificado pela redacção dada pelo Despacho do Chefe do Executivo n.º 141/2014 ao Despacho n.º 296/2012.
xvi. No Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2012 o legislador fazia a distinção entre áreas para fumadores e áreas para não fumadores, sendo que as áreas para fumadores estariam inseridas nas chamadas áreas destinadas ao público para jogo, enquanto que o Despacho do Chefe do Executivo n.º 141/2014 veio revogar esta classificação, substituindo-a por duas novas categorias de áreas destinadas ao público para jogo para efeitos do regime jurídico de prevenção e controlo do tabagismo da RAEM, as denominadas áreas comuns de jogo dos casinos e áreas de acesso condicionado - vide o artigo 6.º do Despacho n.º 296/2012 com a nova redação dada pelo Despacho n.º 141/2014.
xvii. Contrariamente ao pretendido pela Recorrente, conforme o artigo 9.º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2012, com a nova redacção dada pelo Despacho n.º 141/2014, dentro destas novas categorias, o legislador veio proibir a actividade de fumar dentro das áreas de acesso comum de jogo dos casinos, com excepção das salas de fumo autorizadas para o efeito pelo Chefe do Executivo.

xviii. Já dentro das designadas áreas de acesso condicionado, para efeitos do regime jurídico de prevenção e controlo do tabagismo da RAEM, só é permitido fumar mediante autorização prévia e expressa do Chefe do Executivo.
xix. Com a entrada em vigor da nova redacção do Despacho n.º 296/2012 dada pelo Despacho n.º 141/2014, o Despacho autorizativo de 30 de Dezembro de 2012 que criou as zonas de fumadores no casino X, onde se inclui a zona “Pit 11”, acabou por caducar ope legis.
xx. A entrada em vigor de lei superveniente que acarrete a perda de efeitos jurídicos da lei antiga que respalda a prática de um acto autorizativo, fá-lo caducar, sendo que a caducidade vista nesta perspectiva opera quando o novo regime faz desaparecer os pressupostos, quer de facto, quer de direito que justificavam o acto.
xxi. A manutenção do acto, face à nova regulação, deixa-o sem objecto físico ou jurídico, perdendo, portanto, a correspondência entre a previsão normativa e a realidade factual à qual aquela visa aplicar-se, resultando a caducidade dos efeitos do acto da superveniência de novos pressupostos de direito extintivos do objecto do acto autorizativo anterior.
xxii. No caso sub judice, é a própria lei nova que dispõe sobre o objecto do acto autorizativo de 30 de Dezembro de 2012, fixando no seu n.º 4 que “as salas de fumo das áreas comuns de jogo devem ser criadas até ao dia 6 de Outubro de 2014” e no n.º 5 que “a partir da data prevista no número anterior, nas áreas comuns de jogo só é permitido fumar nas salas de fumo”.
xxiii. Acresce que o n.º 10 das Directrizes sobre as Salas de Fumo, publicadas no Boletim Oficial da RAEM, n.º 24, II Série, de 11 de Junho de 2014, estabelece que “a partir de 7 de Outubro de 2014 são eliminados todas as áreas para fumadores de jogo, que hajam sido criadas ao abrigo do Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2012”, Directrizes estas que, importa esclarecer, foram emitidas ao abrigo do artigo 9.º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 141/2014 e que nunca poderiam determinar a revogação do acto administrativo praticado pelo Chefe do Executivo.

xxiv. As referenciadas Directrizes, como bem analisou o Tribunal a quo, não contrariam as disposições previstas no n.º 3 do artigo 5.º e no n.º 1 do artigo 37.º da Lei n.º 5/2011 e no n.º 1 do artigo 6.º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 141/2014, nem quaisquer outras.
xxv. O legislador ao dispor directamente sobre o objecto do acto autorizativo de 30 de Dezembro de 2012, ou seja, as áreas para fumadores autorizados no casino X, onde se inclui a zona “Pit 11”, que passam a ser com o Despacho n.º 141/2014 área comum de jogo dos casinos, faz caducar ope legis os efeitos do acto autorizativo de 30 de Dezembro de 2012.
xxvi. Quanto à afirmação da Recorrente de que em 7 de Outubro de 2014 o local “Pit 11” estava inserido numa área comum de jogo, ficou cabalmente provado nos presentes autos que tal asserção não corresponde à verdade (vide, a este propósito, o Ofício n.º 2707/CONF/2014, mediante o qual a DICJ informou os Serviços de Saúde que a área “Pit 11” localizada no rés-do-chão do Casino “X” foi autorizada como área de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores no dia 21 de Outubro de 2014, tendo começado a pagar o duplo prémio a partir desse mesmo dia).
xxvii. Não restam dúvidas que no procedimento em análise é aplicada a chamada regra da decisão prévia dependente de um procedimento autorizativo.
xxviii. A Recorrente não podia, nem pode criar as chamadas zonas para fumadores, quer na versão de 2012, quer na versão de 2014, sem a prévia autorização da Administração.
xxix. A actividade de fumar nos casinos é proibida por lei, quer no regime pretérito de 2012, quer no regime ora em vigor de 2014, e só a título excepcional e sob autorização da Administração é que se pode fumar nos casinos.
xxx. Esta condição de prévia autorização das áreas para fumadores não se afigura de todo desconhecida à Recorrente, muito pelo contrário, como o comprovam os seguintes pedidos apresentados pela Recorrente, a saber: (1) Alteração física do local “Pit 11” no rés-do-chão do casino X; (2) Transformação do local “Pit 11” em área de acesso condicionado, para efeitos do regime jurídico de prevenção ao tabagismo; (3) Autorização de criação de duas salas de fumo localizadas no rés-do-chão do referido casino (vide a planta síntese de 2014, a fls. 00585, Volume 4 do processo administrativo).
xxxi. É inegável que a Recorrente fez alterações no espaço físico onde o “Pit 11” se localiza, daí o Tribunal a quo ter concluído que “a área Pit 11, que foi autorizada a transformar-se em área de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores em 21 de Outubro de 2014, obviamente não tem a mesma localização e área da Pit 11 onde foi autorizada a criação de área para fumadores através do Despacho do Chefe do Executivo de 30 de Dezembro de 2012” (tradução livre).
xxxii. Não se compreende, portanto, a teimosia da Recorrente quanto a esta matéria e a sua insistência no Auto de Vistoria de 25 de Setembro de 2014, na medida em que, como a Recorrente tem obrigação de saber, apesar de requerida a autorização, iniciada a instrução do procedimento e praticados alguns actos preparatórios do acto final, como, por exemplo, uma vistoria, tal não significa que a Recorrente tenha já a autorização para criar ou alterar a área para fumadores, agora de acesso condicionado.
xxxiii. O procedimento administrativo de obtenção de uma autorização para a criação ou alteração de uma área de acesso condicionado para efeitos do regime jurídico de prevenção e controlo do tabagismo, não finda com autos de vistoria nos quais consta a classificação de “satisfaz”, até porque estamos aqui perante a estrutura de um procedimento complexo lato sensu.
xxxiv. A vistoria é um mero acto de instrução, um acto da verificação dos pressupostos de facto do procedimento, um acto preparatório do acto final, este da competência do Chefe do Executivo, não indo os seus efeitos além dos chamados actos preparatórios dos actos finais da Administração.
xxxv. Embora tenham sido emitidos pareceres positivos pelas quatro entidades envolvidas durante a vistoria, tal não significa que tais pareceres resultem num acto final de aprovação ou alteração das áreas de jogo de acesso condicionado, para efeitos do regime jurídico de prevenção e controlo do tabagismo.

xxxvi. É, pois, patente a incoerência do raciocínio da Recorrente, visto que o local “Pit 11” se encontrava inserido na área comum de jogo quando foi autorizado como área para fumadores, ao abrigo do Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2012 na redacção original, e em conformidade com as normas legais agora vigentes, não é permitido fumar no referido local até que haja um despacho do Chefe do Executivo a autorizá-lo.
xxxvii. Independemente de o local em causa ser agora considerado como área comum de jogo ou como área de acesso condicionado, o que releva para este efeito é que quando foi autorizado como área para fumadores, o local “Pit 11” encontrava-se inserido na área comum de jogo, tendo sido autorizado como área para fumadores de acordo com determinados pressupostos, entretanto alterados.
xxxviii. Da análise comparativa entre a planta síntese de 2012 e a nova planta síntese entregue no passado dia 30 de Setembro de 2014, conclui-se que há efectivamente um aumento da percentagem da área para fumadores no casino X, que passou de 49,72% para 49,86%.
xxxix. Ademais, esta denominação de áreas de acesso condicionado só surgiu com o Despacho do Chefe do Executivo n.º 141/2014, o que significa que em 30 de Dezembro de 2012, data do acto autorizativo do Chefe do Executivo, não existia a distinção entre tais áreas e as denominadas áreas comuns de jogo dos casinos, pelo que não faz sentido a insistência da Recorrente de que o “Pit 11” sempre foi uma área de acesso condicionado, incluindo em 2012, quando essa designação foi criada muito posteriormente.
xl. A partir de 7 de Outubro de 2014 foram automaticamente eliminadas todas as áreas de fumadores instaladas em áreas comuns de jogo, que haviam sido criadas ao abrigo do Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2012, passando, nas áreas comuns de jogo dos casinos, a ser permitido fumar apenas nas salas de fumo localizadas nas áreas para fumadores.
xli. Por outro lado, compete ao Chefe do Executivo autorizar a criação e alteração das áreas para fumadores, sob proposta do Director dos Serviços de Saúde.

xlii. Até à presente data, não houve qualquer proposta da Entidade Recorrida ao Chefe do Executivo sobre a alteração das áreas para fumadores do casino X e, por conseguinte, não há no caso em apreço qualquer autorização do Chefe do Executivo para a criação e alteração das áreas para fumadores no citado casino.
xliii. Aquilo que a Recorrente diz serem “direitos adquiridos (...) por via da supra referida autorização”, mais não é do que uma excepção a uma actividade que é legalmente proibida, pois o princípio geral previsto na Lei n.º 5/2011 é o de proibição de fumar nos casinos, não existindo, como é evidente, qualquer “direito ao fumo”.
xliv. O Tribunal a quo só poderia ter decidido da forma como decidiu, pois no “Pit 11” é efectivamente proibido fumar.
xlv. Cai, assim, por terra toda a argumentação aduzida pela Recorrente, não padecendo a decisão sancionatória do alegado vício de violação de lei e, por conseguinte, a sentença recorrida também não enferma desse mesmo vício.
xlvi. Não assiste igualmente qualquer razão à Recorrente quando alega que a “decisão enferma de nulidade, porquanto se debruça sobre objecto diferente do que está em causa nos presentes autos”, sendo, portanto, nula por violação do princípio do pedido, à luz dos artigos 571.º e 564.º do CPC aplicáveis ex vi do artigo 149.º do CPAC.
xlvii. ln casu, a Recorrente na sua petição de recurso veio alegar que, uma vez que a determinação dos montantes a aplicar pela violação da Lei n.º 5/2011 constitui um poder discricionário da Entidade Recorrida, caso se considerasse ser de aplicar uma multa à Recorrente, não pode o seu montante ser reduzido em sede do recurso contencioso, devendo, por isso, a decisão recorrida ser anulada - vide o artigo 85.º e a conclusão n.º 35 da petição de recurso.
xlviii. Sucede que, tendo o Tribunal a quo considerado que nos presentes autos está em causa a aplicação à Recorrente de uma multa por um orgão administrativo e, bem assim, que a pena aplicada à Recorrente é desproporcional, aquele Tribunal aplicou o disposto no n.º 2 do artigo 118.º do CPAC.

xlix. A decisão judicial proferida no âmbito do citado normativo legal pode alterar o quantitativo da multa e a espécie e duração da sanção acessória - o que acabou por ser feito pelo Tribunal a quo.
1. Nas palavras de Viriato Lima e Álvaro Dantas, “A decisão judicial, ao contrário do que sucede no regime de recurso contencioso, que é de mera anulação, como se diz no artigo 20.º, pode alterar a pena aplicada e a espécie e a medida da sanção acessória. Trata-se, pois, de um regime de plena jurisdição, nesta parte”.
li. Contrariamente ao defendido pela Recorrente, não se vislumbra que a sentença recorrida tenha violado o princípio do pedido por ter condenado em objecto diverso do pedido pela Recorrente.
lii. Face ao que antecede e atentos todos os elementos constantes nos presentes autos, a Entidade Recorrida discorda em absoluto do entendimento sufragado pela Recorrente quanto ao facto de a medida da pena a aplicar em concreto à Recorrente jamais poder ser superior a 30.000,00 MOP (trinta mil patacas).
liii. Tal entendimento é demonstrativo de que a Recorrente faz um aproveitamento indevido, inoportuno e completamente insensato do juízo do Tribunal a quo, o que é de lamentar, pelo que nada mais se irá acrescentar a este respeito.
liv. No que se refere à aposição dos dísticos de sinalização relativos à interdição de fumar, a Entidade Recorrida opõe-se, de modo veemente, ao alegado pela Recorrente, que continua grotescamente a insistir numa narrativa que foi totalmente contrariada pela prova documental e testemunhal produzida nos presentes autos.
lv. A Recorrente insiste em ignorar o auto de afixação a fls. 01048 a 01052, Volume 5, do processo administrativo, bem corno as declarações prestadas em audiência pelas suas próprias testemunhas, que foram unânimes ao afirmar que a aposição dos dísticos relativos à interdição de fumar não foram colocados de imediato pelos trabalhadores dos Serviços de Saúde.
lvi. Foi, efectivamente, dada à Recorrente a oportunidade para proceder à afixação dos dísticos, tendo a mesma ignorado por completo as instruções dadas pelos trabalhadores dos Serviços de Saúde, atitude essa de lamentar.

lvii. A actuação da Administração foi legal é legítima, porque estamos perante uma prestação de facto positivo que, ao não ser cumprida pela Recorrente, determinou o recurso por parte dos Serviços de Saúde ao procedimento executivo regulado no artigo 144.º do CPA,
lviii. A determinação da afixação dos dísticos de proibição de fumar no local em apreço teve por finalidade primordial a protecção da saúde pública, em particular a saúde dos trabalhadores e dos próprios clientes do casino afectados pelo fumo passivo.
lix. Pelos motivos acima aduzidos, não deve ser ordenada a remoção dos dísticos de sinalização relativos à interdição de fumar aqui referenciados.
lx. A sentença recorrida não enferma dos vícios alegados pela Recorrente, nem de quaisquer outros, não padecendo, assim, de qualquer ilegalidade.
Nestes termos e nos demais de direito, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo-se a douta sentença recorrida com as legais consequências.
Assim estarão Vossas Excelências,
Senhores Venerandos Juízes,
Fazendo a costumada
JUSTIÇA!»
*
O Digno Magistrado do MP junto do TSI emitiu o seguinte parecer:
“Recorre “A (Macau), S.A.” da decisão de 18 de Maio de 2017, da Mm.ª Juiz do Tribunal Administrativo, exarada a fls. 316 e seguintes dos autos, que, considerando parcialmente procedente o recurso contencioso por si interposto de decisão sancionatória, em matéria de infracção administrativa, lhe aplicou duas multas de Mop $30.000 (trinta mil patacas), no total de Mop $60.000 (sessenta mil patacas), em substituição de uma multa de Mop $100.000 (cem mil patacas) com que fora punida no âmbito do procedimento administrativo.
Como ressuma das suas alegações de recurso jurisdicional, a recorrente insurge-se contra o julgamento dos vícios de incompetência e de erro nos pressupostos que havia imputado ao acto sanci0onatório, e também verbera a decisão na parte em que fixou novos quantitativos de multa, aduzindo que viola o princípio do pedido, no que é contraditada pela entidade recorrida na sua minuta de contra-alegação.
Vejamos.
O acto recorrido contenciosamente é a decisão de 26 de Janeiro de 2015, da autoria do Director dos Serviços de Saúde, que aplicou uma multa de Mop $100.000 à recorrente, nos termos do artigo 23.º, n.º 1, alínea 7), da Lei 5/2011, por violação do artigo 6.º da mesma Lei.
Nos termos do artigo 25.º da referida Lei 5/2011, a aplicação das multas e das sanções acessórias previstas nos artigos 23.º e 24.º do mesmo diploma é da competência do director dos Serviços de Saúde. Ora, é irrefutável que o autor do acto recorrido foi o director dos Serviços de Saúde. Nenhuma questão de incompetência se coloca, pois, quanto à autoria do acto administrativo objecto de escrutínio contencioso.
A recorrente colocou a tónica da competência no acto de fiscalização. Mas, independentemente das divergências interpretativas que a expressão no âmbito das respectivas atribuições, constante do artigo 28.º da Lei 5/2011, pudesse suscitar, a questão não reveste, a nosso ver acuidade, já que é insusceptível de projectar qualquer efeito invalidante no acto recorrido. Como já referido, o acto foi praticado pela entidade inequivocamente competente, que é o director dos Serviços de Saúde. A forma como o conhecimento da infracção chegou até si, fosse por intermédio da DICJ, fosse através dos Serviços de Saúde, parece irrelevante. Todavia, se alguma irregularidade ou nulidade houvesse quanto aos actos de fiscalização e forma do conhecimento da infracção por parte da entidade competente para decidir e impulsionar a instrução, ela confinar-se-ia à competência fiscalizadora, e a sua eventual projecção no procedimento administrativo estaria sanada, já que apenas a violação do direito de audiência e de defesa constitui nulidade insuprível- artigo 11.º, n.º 2, do DL 52/99/M - violação que evidentemente não está em causa.
De todo o modo, cabe dizer que o procedimento administrativo reporta acções de fiscalização conjuntas, levadas a cabo pelos Serviços de Saúde e pela DICJ, o que, de resto, está mencionado na acusação e na decisão sancionatória, e não foi objecto de específica impugnação por parte da recorrente. Acrescendo ainda que, conforme documento junto pela entidade recorrida com a sua contestação, a intervenção fiscalizadora levada a cabo pelos elementos pertencentes aos Serviços de Saúde foi precedida da competente e válida autorização de entrada em casinos, dada pelo Chefe do Executivo.
Improcede este fundamento do recurso quanto ao julgamento do vício da incompetência.
Também o julgamento do vício de erro nos pressupostos vem questionado. Entende a recorrente que tinha autorização para utilizar o espaço objecto de intervenção sancionatória - Pit 11 do L01 Floor do Casino X - como área para fumadores, o que só uma errada interpretação dos normativos legais terá conduzido a que acabasse por ser punida.
Não se crê que lhe assista razão.
O Despacho 141/2014 do Chefe do Executivo, de 3 de Junho de 2014, e as alterações que introduziu às “Normas relativas aos requisitos a que devem obedecer as áreas para fumadores nos casinos”, nomeadamente através do aditado artigo 5.º-A, vieram modificar as regras que vigoravam acerca das excepções à proibição de fumar nos casinos. A par das já existentes “áreas para fumadores” passam a estar previstas as “salas de fumo”, que, nas áreas comuns de jogo, tinham que ser criadas até ao dia 6 de Outubro de 2014, data a partir da qual, em tais áreas (áreas comuns de jogo), só passava a ser permitido fumar nas salas de fumo.
Pois bem, o Pit 11 do L01 Floor do Casino X era uma área comum de jogo, que estava autorizada, desde Dezembro de 2012, a funcionar como espaço para fumadores. Só viria a ser autorizada a funcionar como área de acesso condicionado em 21 de Outubro de 2014.

Ora, a partir de 7 de Outubro de 2014, por força das alterações introduzidas às “Normas relativas aos requisitos a que devem obedecer as áreas para fumadores nos casinos” pelo Despacho 141/2014 do Chefe do Executivo, deixou de ser permitido fumar em tal espaço (área comum de jogo) fora das salas defumo. Portanto, não tendo sido criada e aprovada uma sala de fumo naquele Pit 11, enquanto área comum de jogo que foi entre 7 e 21 de Outubro de 2014, nem tendo ele sido ainda licenciado como área para fumadores, enquanto espaço de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores que passou a ser a partir de 21 de Outubro de 2014, tem que se concluir que, em 29 e 30 de Outubro, quando foram lavrados os autos de notícia, não era permitido fumar naquele espaço. Daí que se impusesse à recorrente assinalar o espaço como zona para não fumadores, através dos dísticos adequados, o que não tendo ela feito, legitimou a intervenção sancionatória.
Improcede igualmente este fundamento do recurso.
Por fim, a recorrente verbera a decisão na parte em que a puniu por duas infracções e lhe aplicou duas multas, alvitrando que houve violação do princípio do pedido.
O processo por infracções administrativas encerra um procedimento de natureza sancionatória, onde, a par da regulamentação estabelecida nos diplomas que prevêem as infracções, são aplicáveis as regras do regime geral das infracções administrativas e normas e princípios do direito penal e processual penal. Por isso, os infractores têm de saber os factos que lhes são imputados e a punição para eles prevista, a fim de poderem pronunciar-se e exercer adequadamente a sua defesa, sob pena de nulidade insuprível (artigo 11.º, n.º 2, do DL 52/99/M). Pois bem, a recorrente, apesar da existência de dois autos de notícia, de que tomou conhecimento, foi confrontada com uma acusação que valorou a matéria como integrando uma única infracção, para a qual foi avançada a aplicação de uma única multa, aliás pelo mínimo legal então em vigor. Foi desta matéria acusatória que se defendeu. E, mais tarde, foi notificada de uma decisão sancionatória, que, tendo igualmente considerado ter sido cometida uma única infracção, aplicou uma única multa, desta feita pelo máximo então legalmente admissível. Foi esta matéria sancionatória que impugnou contenciosamente. Posto isto, cabe perguntar se podia o tribunal alterar o número de infracções que a Administração considerou cometidas e punir a recorrente em consonância com o número de infracções que teve por praticadas.
A questão não é isenta de dúvidas. Estamos no domínio das infracções administrativas, para as quais o Código de Processo Administrativo Contencioso estabelece uma regra que foge ao figurino do recurso contencioso como recurso de mera legalidade, conferindo ao juiz poderes de plena jurisdição. Trata-se da norma do artigo 118.º, n.º 2. Crê-se, todavia, que a letra da norma aponta apenas para a interferência do tribunal ao nível da graduação da multa e da fixação da sanção acessória. Já não ao nível da qualificação e número de infracções, bem como em matéria de número de sanções. É que, sobre esta visão diversa da integração dos factos no número de infracções e sanções, nunca a recorrente foi ouvida. O que, constituindo uma decisão surpresa, viola aquele direito de audiência e defesa que, em processo sancionatório, constitui nulidade insuprível.
Daí que nos inclinemos para a procedência do recurso nesta parte, devendo revogar-se a decisão na parte em que condenou por duas infracções e impôs uma multa diversa por cada uma delas, mantendo-se apenas a condenação por uma infracção, no montante de MOP $30.000, que o tribunal recorrido teve por bem fixar.
Ante o exposto, e na procedência parcial do recurso jurisdicional, entendemos dever a decisão recorrida ser parcialmente revogada, mediante absolvição da recorrente de uma das infracções por que foi condenada.”
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Cumpre decidir.
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II – Os Factos
A sentença impugnada deu por assente a seguinte factualidade (por nós numerada sequencialmente e com destaque nosso a bold nalguns segmentos):
1- Nos dias 3, 13 e 22 de Dezembro de 2012, a recorrente apresentou ao Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo, o pedido de criação da área para fumadores no casino X, bem como juntou os respectivos dados sobre o pedido e os dados actualizados (vd. fls. 360 a 401 do Apenso n.º3, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
2 - No dia 28 de Dezembro de 2012, a entidade recorrida elaborou a Informação n.º 616/SS/P/2012, indicando que o pedido de criação da área para fumadores no casino X formulado pela recorrente reúne o respectivo disposto no art.º5º, n.º3, art.º 37.º, n.º1 da Lei n.º5/2011 «Regime de Prevenção e Controlo do Tabagismo», nos art.ºs 3.º a 6.º do Anexo «Normas relativas aos Requisitos a que devem obedecer as Áreas para Fumadores nos Casinos» aprovado pelo Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2012, bem como no Despacho dos Serviços de Saúde n.º16/SS/2012, assim propondo autorizar à recorrente a criação da área para fumadores na posição e âmbito do casino X conforme descritos nos dados sobre o pedido e na planta dos dados actualizados. No dia 30 de Dezembro de 2012, o Chefe do Executivo proferiu o despacho de autorização na mesma Informação (vd. fl. 1 a 204 do Apenso n.º1; fls. 205 a 358 do Apenso n.º2; fls. 359 a 490 do Apenso n.º3, cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos).
3 - Na supracitada planta, foi descrita como área para fumadores a área do casino X L01 Casino Floor Pit 11 (vd. fls. 364, 376, 382, 393 e 397 do Apenso n.º3, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
4 - No dia 31 de Dezembro de 2012, através do ofício n.º628/SS/O/2012, a entidade recorrida notificou a recorrente da supracitada decisão do Chefe do Executivo (vd. fls. 491 a 496 do Apenso n.º4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

5 - No dia 29 de Agosto de 2014, a recorrente apresentou à entidade recorrida o pedido de criação de duas salas de fumadores no casino X e de alteração da área de fumadores, bem como juntou os respectivos documentos (vd. fls. 546 a 643 do Apenso n.º 4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
6 - No dia 26 de Setembro de 2014, o Chefe do Executivo proferiu o despacho, concordando com a Informação n.º446/SS/P/2014, autorizando o pessoal indicado no anexo para entrar em casinos de Macau pelo exercício das funções públicas, a fim de proceder à verificação in loco sobre o pedido de criação da área para fumadores em casino e de criação da sala de fumo, à supervisão da qualidade do ar e ao trabalho de controlo do tabagismo, pelo período de 1 de Outubro até 31 de Dezembro de 2014 (vd. fis.200 a 201 e 201v dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
7 - No dia 9 de Outubro de 2014, o Chefe do Executivo proferiu o despacho, concordando com a Informação n.º470/SS/P/2014, nos termos do art.º 9.º das «Normas relativas aos Requisitos a que devem obedecer as Áreas para Fumadores nos Casinos», autorizando a criação de duas salas de fumo no casino X, conforme previstas na planta do mesmo casino L01 Casino Area, constante do documento: 00040 do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo (vd. fls. 531 a 643 do Apenso n. º4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
8 - No dia 10 de Outubro de 2014, os Serviços de Saúde, através do ofício n.º546/SS/O/2014, notificaram a recorrente da supracitada decisão (vd. fls. 644 a 650 do Apenso n.º5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
9 - No dia 16 de Outubro de 2014, a entidade recorrida elaborou a Observação Interna n.º577/SS/N/2014, indicando que o Chefe do Executivo já tinha autorizado o pessoal indicado na Observação para entrar em casinos de Macau pelo exercício das funções públicas, a fim de proceder à verificação in loco sobre o pedido de criação da área para fumadores em casino e de criação da sala de fumo, à supervisão da qualidade do ar e ao trabalho de controlo do tabagismo, pelo período de 1 de Outubro até 31 de Dezembro de 2014 (vd. fls. 651 a 652 do Apenso n.º5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
10 - No dia 29 de Outubro de 2014, pessoal do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo, dos Serviços de Saúde como tinha sido autorizado para entrar em casinos de Macau pelo exercício das funções públicas, entrou na área Pit 11 do casino X para efectuar fiscalização onde verificou que, em locais bem visíveis daquela área de não fumadores não foram afixados os dísticos de proibição de fumar aprovados pelo regulamento administrativo. No mesmo dia, o supracitado pessoal tirou fotografias no local e elaborou o auto de notícia n.º 00l/GPCT/2014, indicando que a respectiva situação violou o art.º 6.º, n.ºs 1 a 3 da Lei n.º5/2011 (vd. fls. 653 a 656 do Apenso n.º5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
11 - No dia 30 de Outubro de 2014, pessoal do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo dos Serviços de Saúde como tinha sido autorizado para entrar em casinos de Macau pelo exercício das funções públicas, entrou na área Pit 11 do casino X para efectuar fiscalização onde verificou que, em locais bem visíveis daquela área de não fumadores não foram afixados os dísticos de proibição de fumar aprovados pelo regulamento administrativo. No mesmo dia, o supracitado pessoal tirou fotografias no local e elaborou o auto de notícia n.º002/GPCT/2014, indicando que a respectiva situação violou o art.º 6.º, n.ºs 1 a 3 da Lei n.º5/2011 (vd. fls. 657 a 659 do Apenso n.º5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
12 - No dia 31 de Outubro de 2014, pessoal dos Serviços de Saúde elaborou o Parecer n.º164/GJ/2014, indicando que, quando a área Pit 11 do casino X foi autorizada como área para fumadores, deve aquela ser incluída na área comum de jogos, e nos termos da lei vigente, antes de ser autorizada pelo Chefe do Executivo, tal área ainda pertence à área não fumadores, pelo que segundo os autos de notícia do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo, face à não afixação de dísticos de proibição de fumar naquela área, deve-se observar o art.º 93.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo para notificar a recorrente. No dia 4 de Novembro do mesmo ano, a entidade recorrida proferiu o despacho de autorização no respectivo parecer (vd. fls. 660 a 672 do Apenso n.º5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido)
13 - No dia 6 de Novembro de 2014, através do ofício n.º958/GPCT/2014, os Serviços de Saúde solicitaram à Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos que fornecesse os dados sobre a data concreta de ser autorizada a área Pit 11 de L01 Casino Floor do casino X como área de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores e a data quando começou a ser pago o dobro de prémio (vd. fls. 674 e 674v do Apenso n.5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido)
14 - No mesmo dia, quatro agentes do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo, dos Serviços de Saúde, deslocaram-se à área Pit 11 do casino X para fiscalização, tendo confirmado que entre a sala de contabilidade e as mesas de jogos naquela área não há uma separação efectiva, e tiraram fotografias in loco (vd. fls. 675 e 677-A do Apenso n.5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido)
15 - No mesmo dia, o chefe do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo, dos Serviços de Saúde, elaborou a Informação n.º184/GPCT/2014, nela indicando que, segundo o extracto dos factos constante dos autos de notícia n.ºs 001 e 002/GPCT/2014, a não afixação dos dísticos de proibição de fumar aprovados pelo regulamento administrativo, em locais bem visíveis da área de não fumadores de L01 Casino Floor Pit 11 do casino X, violou os n.ºs 1 a 3 do art.º 6.º da Lei n.º5/2011, propondo proceder à notificação de acusação contra o casino X e notificar o casino X para afixar os dísticos de proibição de fumar em locais bem visíveis da área de não fumadores de L01 Casino Floor Pit 11, bem como meter tal Informação ao Gabinete Jurídico para emitir parecer. No dia 10 de Novembro de 2014, a entidade recorrida proferiu despacho na mesma Informação para a remessa da Informação ao Gabinete Jurídico (vd. fls. 678 a 694 do Apenso n.º5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
16 - No dia 11 de Novembro de 2014, agente dos Serviços de Saúde elaborou o Parecer n.º166/GJ/2014, indicando que, antes de se aplicar a sanção pecuniária, tinha que observar o ponto 1.3 e seguintes da «Guia do procedimento sobre a infracção do Regime de Prevenção e Controlo do Tabagismo» para proceder à acusação pela forma articulada, e apenas na conclusão da fase de defesa, elaborar o relatório donde constam os factos apurados, factos provados e não provados, todas as circunstâncias favoráveis e desfavoráveis ao infractor. No dia seguinte, a entidade recorrida proferiu o despacho de concordância no respectivo Parecer (vd. fls. 695 a 698 do Apenso n.º5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
17 - Nos dias 13 e 14 de Novembro de 2014, a recorrente, através do seu mandatário judicial, apresentou opiniões à entidade recorrida face aos conteúdos constantes dos autos de notícia n.ºs 001 e 002/GPCT/2014, tendo ainda juntado os respectivos documentos (vd. fls. 1105 a 1152 do Apenso n.º5, fls. 1191 a 1237 do Apenso n.º6, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
18 - No dia 14 de Novembro de 2014, a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos, através do ofício n.º2707/CONF/2014, deu resposta aos Serviços de Saúde, indicando que, no dia 21 de Outubro de 2014, já tinha autorizado a área Pit 11 L01 Casino Floor do casino X como área de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores e no mesmo dia já foi iniciado o pagamento do dobro de prémio (vd. fls. 799 e 800 do Apenso n.5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido)
19 - No dia 20 de Novembro de 2014, o Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo, dos Serviços de Saúde, através do ofício n.º976/GPCT/2014, procedeu à acusação contra o processo n.ºSA-03/2014 respeitante à infracção detectada no casino X pertencente à recorrente. No mesmo dia, a recorrente recebeu o respectivo ofício (vd. fls. 801 e 809 do Apenso n.5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
20 - No dia 5 de Dezembro de 2014, face à supracitada acusação, a recorrente, através do seu mandatário judicial, apresentou resposta à entidade recorrida e juntou os respectivos documentos (vd. fls. 1054 e 1104 do Apenso n.5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
21 - No dia 12 de Dezembro de 2014, agente dos Serviços de Saúde elaborou o relatório da decisão sancionatória, indicando que, segundo os autos de notícia n.ºs 001 e 002/GPCT/2014, o relatório de fiscalização feito no dia 6 de Novembro do mesmo ano, conjugados com as fotografias tiradas in loco e as infracções presenciadas pelos agentes daqueles Serviços, era capaz de provar a existência da infracção, pelo que nos termos dos art.s 6.º e 23.º, n.º1, al. 7) da Lei n.º5/2011, propôs aplicar a multa de MOP10.000 ao casino X pertencente à recorrente (vd. fls. 1159 e 1166 do Apenso n.6, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
22 - No dia 15 de Dezembro de 2014, o chefe do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo, dos Serviços de Saúde, elaborou a Informação n.º208/GPCT/2014, nela indicando que não procederam as opiniões e os fundamentos apresentados pelo mandatário judicial da recorrente, propondo tomar decisão punitiva contra a infracção da recorrente e aplicar-lhe a multa de MOP10.000, bem como remeter ao Gabinete Jurídico para apreciar a minuta do ofício. No mesmo dia, a entidade recorrida proferiu o despacho de remessa de tal Informação ao Gabinete Jurídico (vd. fls. 1153 a 1364 do Apenso n.º6, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
23 - No dia 12 de Janeiro de 2015, a entidade recorrida elaborou a Observação Interna n.º015/SS/N/2015, exigindo ao subdirector dos Cuidados de Saúde Generalizados que analisasse de novo se era adequada a avaliação de sanção da respectiva infracção, face à responsabilidade social da recorrente e aos elementos tais como a influência do fumo de segunda mão causada aos trabalhadores de casino e aos indivíduos circundantes (vd. fls. 1026 do Apenso n.º5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
24 - No dia 26 de Janeiro de 2015, a entidade recorrida proferiu despacho concordando com o teor da Informação n.º007/GPCT/2015, determinando aplicar à recorrente a multa no valor máximo de MOP100.000, bem como exigindo à recorrente a afixação imediata dos dísticos de proibição de fumar na respectiva área do casino X (vd. fls. 1022 a 1039 do Apenso n.º5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
25 - No dia 28 de Janeiro de 2015, através do ofício n.º0009/GPCT/2015, a entidade recorrida notificou a recorrente da supracitada decisão, indicando na notificação que podia a recorrente no prazo designado apresentar reclamação a ela ou, interpor o recurso contencioso para o Tribunal Administrativo (vd. fls. 20 a 26 dos autos, fls. 1047 do Apenso n.º5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
26 - No dia 27 de Fevereiro de 2015, contra a supracitada decisão, a recorrente interpôs recurso contencioso para este Tribunal.
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III – O Direito
A - Questão prévia: Da regularidade formal das alegações.
Nas alegações de resposta ao recurso interposto pela recorrente contenciosa, A”, veio a entidade recorrida, além de chamar a atenção para o facto de as alegações daquela se limitarem a imputar à sentença os vícios assacados ao acto, recordar que elas não estão apresentadas sob a forma articulada, razão pela qual pede sejam desentranhadas.
Pois bem. Quanto ao primeiro aspecto, é verdade que o recurso jurisdicional deve ser apenas uma impugnação dirigida contra o seu objecto. Como este TSI teve já oportunidade de dizer, “O recurso jurisdicional apresenta-se como uma forma de impugnação judicial dirigida contra uma sentença, contra a qual a parte inconformada arremete vícios e violações próprios. Significa isto que o TSI, em recurso para si interposto de decisão da primeira instância, está condicionado na sua actuação pela delimitação objectiva contida na respectiva alegação, nos termos do art. 589º do CPC” (Ac. do TSI, de 7/12/2017, Proc. nº 416/2016). E a sorte para um mau uso das alegações, em desrespeito do art. 589º do CPC pode ser, em função da gravidade do desrespeito pela delimitação objectiva do recurso, a própria improcedência do recurso1.
Na situação em apreço, embora a recorrente tivesse incorrido algumas vezes no vício de conferir à sentença os defeitos invalidantes imputados ao acto sindicado, a verdade é que as conclusões das alegações, frequentemente, vertem sobre o julgado falhas e maleitas específicas, ao considerar que ela andou mal em múltiplas situações e por diversas causas. E assim sendo, mesmo que não seja um modelo de perfeição alegatória, as alegações cumprem com a suficiência necessária os propósitos e requisitos impugnativos.
Quanto ao segundo aspecto, é evidente que as alegações devem ser articuladas. Não porque o imponham o CPC ou o CPAC (quanto a isso, nada prescrevem estes diplomas), mas porque o recomendem todas as regras não escritas acerca da compreensibilidade dos argumentos e posições das partes em cada momento do processo e, consequentemente, porque o aconselhem a celeridade e prontidão do andamento tramitacional dos autos, com bons e evidentes reflexos numa justiça mais ponderada. A articulação facilita, com efeito, a tarefa do tribunal e corresponde, à falta de melhores razões, à observância do dever de cooperação tendente à obtenção rápida e eficaz da justa composição do litígio (cfr. art. 8º, do CPC). Quando, por isso, se reitera a noção de que as alegações devem ser articuladas é nesse plano que falamos, sem quaisquer consequências cominatórias, que não aquelas que se relacionam com uma mais demorada intelecção e percepção do objecto da análise recursória.
No caso em apreço, ainda que não tenha sido articulada a peça alegatória, o método escolhido fica pouco a dever à articulação, porque cada raciocínio e argumento foi exposto sob a forma de parágrafos individualizados e autónomos, o que facilita a referida compreensibilidade da impugnação. O que faltou a cada um foi unicamente a sua sujeição a uma enumeração sequencial. E como, por fim, as conclusões estão convenientemente dispostas numa enumeração/articulação sequencial, cremos que está o TSI preparado para conhecer da bondade do recurso.
Avancemos, pois, para o conhecimento do recurso.
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B – Do recurso
1 – Da incompetência
O acto administrativo sindicado no recurso contencioso sancionou a recorrente A com uma multa de MOP$ 100.000,00, por alegadamente esta não ter afixado os dísticos de proibição de fumar na área do seu casino X.
A recorrente tinha imputado ao acto, em primeiro lugar, o vício de incompetência por parte dos Serviços de Saúde de Macau (SSM). Não quanto à competência sancionatória, que acabou por reconhecer, mas sim em relação à prévia operação de fiscalização que está na génese do acto administrativo em apreço, ou seja, por os SSM não terem alegadamente poderes para intervirem na fiscalização, a qual, por isso, seria ilegal por incompetência. E, porque o acto se serviu dessa actividade fiscalizadora realizada por entidade incompetente, também ele estaria ferido do mesmo mal.
Não tendo a sentença seguido esse entendimento, a recorrente insiste no recurso nesta matéria e acomete-a de erro na aplicação do direito.
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1.1 – A questão é a seguinte:
Elementos do pessoal dos Serviços de Saúde de Macau entraram no Casino “X”, para fiscalizarem se a recorrente tinha, ou não, aposto os dísticos de proibição de fumar no local próprio e visível.
É esta acção inspectiva que a recorrente acha que os SSM não podiam efectuar, uma vez que só a Direcção de Inspecção de Jogos a podia realizar. E tanto é assim, diz a recorrente, que os trabalhadores da Administração Pública não podem entrar nos casinos, a não ser sob prévia autorização do Chefe do Executivo, nos termos do art. 2º, nº1, al. 4), da Lei nº 10/2012.
Mas, segundo cremos, não tem razão.
Antes de mais nada, o art. 25º-A do DL nº 81/99/M (aditado pelo Regulamento Administrativo nº 34/2011) prevê expressamente que o Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo, no quadro das “atribuições” reconhecidas ao SSM, tem competência para “fiscalizar o cumprimento da legislação relativa à prevenção e controlo do tabagismo”.
Por outro lado, o art. 28º, nº3 da Lei nº 5/2011 estabelece que “ Os agentes de fiscalização dos Serviços de Saúde, no exercício das suas funções, podem entrar nos casinos…”, apenas lhe estando “…vedada a prática, directamente por por interposta pessoa de quaisquer jogos de fortuna ou azar” (cit. nº3).
Significa que os SSM, através daquele órgão, podem fiscalizar o cumprimento das normas sobre o controlo do tabagismo, independentemente de autorização específica do Chefe do Executivo.
Ora, esta competência originária está claramente abrangida pela previsão genérica dos poderes atribuídos aos Serviços de Saúde inscrita no art. 28º, nº1, da Lei nº 5/2011.
Mas, em defesa da sua tese, a recorrente convoca ainda o disposto no art. 5º da mesma Lei nº 10/2012, para dizer que, se a lei permite a entrada nos casinos de determinados trabalhadores da Administração, desde que no exercício das suas funções, e se nessa classe de funcionários não inclui os funcionários dos SSM é porque estes, só com autorização do Chefe do Executivo o poderiam fazer.
É certo que este artigo 5º não inclui os funcionários dos SS entre aqueles que, no exercício das suas funções, podem entrar nos casinos.
Pensamos, no entanto, que essa norma não estabelece uma proibição absoluta, mas simplesmente relativa. Quer dizer, estas classes de profissionais não estão impedidos de todo de entrar nas instalações dos casinos; podem entrar neles em missão de serviço!
Sendo assim, desde que haja quaisquer outros diplomas que prevejam a possibilidade de estes ou outros servidores do Estado estrarem nos casinos para desempenharem cabalmente a competência que eles (diplomas) lhes conferirem, então podemos concluir que o art. 5º se revela preceito parcialmente escusado. Quando, por exemplo, ele refere que podem entrar nos casinos “outros funcionários autorizados, caso a caso, pelo Chefe do Executivo”, está a referir-se a quaisquer outros funcionários que careçam de entrar nos casinos, por qualquer motivo relevante e devidamente justificado, fora do quadro das competências que lhe estejam legalmente atribuídas. Então, e como nos parece evidente, o facto de a lei obrigar a autorização do Chefe do Executivo para que os trabalhadores possam entrar nos casinos de Macau, não pode ter um significado geral e aplicável a todas as situações. Relativamente a este aspecto, o art. 2º, nº1, al. 4), da Lei nº 10/2012, quando interdita a entrada nos casinos aos trabalhadores da Administração Pública, excepto se autorizados pelo Chefe do Executivo, está obviamente a fazê-lo pensando nas entradas que eles mesmos pudessem querer fazer por outras razões, que não aquelas que se enquadrem nas competências específicas e no pleno exercício destas por parte desses funcionários, ou então por alguma razão ponderosa que o próprio Chefe do Executivo reconheça pertinente por qualquer motivo.
Ou seja, o exercício da competência tem que ser fundado e fundamentado no diploma que a contemple (como se sabe, não há competência sem texto, isto é, sem lei) e não na disponibilidade do Chefe do Executivo. Se bem pensamos, o Chefe do Executivo não poderia barrar a entrada de funcionários da Administração no casino, desde que em cumprimento da sua missão, i.é., realizando o seu serviço especialmente previsto nos diplomas que lhes atribuem os respectivos feixes de poderes de actuação.
Portanto, quando o art. 5º não inclui o pessoal inspectivo ou fiscalizador dos SSM, tal não quer necessariamente dizer que só com autorização do Chefe do Executivo ele pode actuar no interior dos casinos, sob pena de por esta via administrativa se poder estar a obstar o pleno exercício de competências originárias conferidas pela via legal.
Não faria, aliás, sentido que ao órgão próprio dos Serviços de Saúde de Macau fosse (como é) reconhecida, por exemplo, a competência para a medição dos parâmetros da qualidade do ar previstos no nº1 do art. 8º do Despacho do Chefe do Executivo nº 296/2012, alterado pelo Despacho nº 141/2014 (cfr. art. 8º, nºs 4 e 5), a fiscalização do cumprimento do referido Despacho nº 296/2012 (art. 10º) e a emissão de instruções técnicas necessárias à execução do referido Despacho (art. 12º), e depois não pudesse livremente agir em conformidade com esses poderes legais, sabendo nós que os SSM são uma pessoa colectiva de direito público que, no interior da Administração, está dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial (art. 1º, nº1, do DL nº 81/99/M), logo integrada na Administração Indirecta, e em que inexiste, como é sabido, uma relação de dependência directa do Chefe do Executivo2.
Finalmente, a circunstância de estar prevista na norma a competência atribuída à DICJ para a fiscalização, supervisão e monitorização da actividade das concessionárias, designadamente quanto ao cumprimento das obrigações legais, regulamentares e contratuais (art. 2º, al. 2), do Regulamento Administrativo nº 34/2003) não constitui um atropelo ao feixe de competências atribuído à DSS, nem sequer um obstáculo ao exercício das competências deste ente. É, aliás, muito fácil compatibilizar estas competências, que nem sequer se pode dizer sejam concorrenciais. É que se a DICJ pode fiscalizar os mais diversos níveis da actividade do casino (e eles estão dispersos pelos diversos preceitos desse Regulamento Administrativo), não está já especialmente previsto que a sua acção se dirija para os aspectos ligados ao controlo da qualidade do ar e do tabagismo no interior dos casinos, que são, como se depreende facilmente, áreas específicas da saúde e para as quais os Serviços de Saúde estão particularmente vocacionados e legal e originariamente legitimados para a respectiva actividade inspectiva e investigatória.
Para concluir, enfim, que a sentença andou bem quanto à análise deste vício.
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2 – Do vício de violação de lei
Sobre este assunto, a sentença explaniu o seguinte:
«…. Em conjugação com o dispositivo dos nºs 3 a 5 do mesmo despacho, podemos verificar que a partir de 7 de Outubro de 2014, só é permitido fumar na sala de fumo criada nesse dia ou antes, na área para fumadores dentro da área comum dos casinos, o que quer dizer que a área para fumadores já foi substituída pela sala de fumo dentro da área comum, mas na área comum autorizada para a criação da área para fumadores, se não foi criada sala de fumo, é ainda proibido fumar.
Quanto à área incomum de jogos (área de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores mas não ao uso público), o Despacho do Chefe do Executivo nº 141/2014 não dispõe expressamente que só seja permitido fumar apenas na sala de fumo, a partir de 7 de Outubro de 2014, pelo que as concessionárias e subconcessionárias podem requerer, conforme as suas vontades, a criação da sala de fumo dentro da área comum de jogos. Pelo que os jogadores ainda têm que fumar na supracitada área para fumadores ou na sala de fumo, bem como a criação ou alteração da área para fumadores ainda necessita da autorização do Chefe do Executivo (vd. o art.º 9.º das «Normas relativas aos Requisitos a que devem obedecer as Áreas para Fumadores nos Casinos» republicadas).
Além disso, de acordo com o art.12.º das «Normas relativas aos Requisitos a que devem obedecer as Áreas para Fumadores nos Casinos» republicadas: “Compete ao director dos Serviços de Saúde emitir as instruções técnicas que se mostrem necessárias à execução das presentes normas”, pelo que não há qualquer inadequação, segundo a Parte III das «Directrizes sobre as Salas de Fumo» elaboradas pela entidade recorrida (publicada no Boletim Oficial da RAEM, n. º24, II série, de 11 de Junho de 2014), respeitante ao procedimento incluindo a exigência técnica sobre a criação da sala de fumo que o devem observar as concessionárias ou subconcessionárias.
Indica-se no ponto 10 da Parte II das supracitadas directrizes sobre as salas de fumo, “A partir de 7 de Outubro de 2014 são eliminadas todas as áreas de fumadores instaladas em áreas comuns de jogo, que hajam sido criadas ao abrigo do Despacho do Chefe do Executivo nº 296/2012”, embora no texto não seja ideal a expressão utilizada “área comum de jogos”, a que se refere é ainda a área para fumadores criada na “área comum de jogos” prevista no art. 8.º das Normas relativas aos Requisitos a que devem obedecer as Áreas para Fumadores nos Casinos, anexas ao Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2012. Quer dizer, a partir dessa data, a área para fumadores criada dentro da área comum de jogos deve ser substituída pela sala de fumo. Pelo que evidentemente as directrizes não estão em oposição com o art. 5.º, n.º3, e o art. 37.º da Lei nº 5/2011 (Regime de Prevenção e Controlo do Tabagismo) e o art. 6.º, nº 1 das Normas relativas aos Requisitos a que devem obedecer as Áreas para Fumadores nos Casinos republicadas.
ln casu, de acordo com os dados constantes dos apensos, o Chefe do Executivo, em 9 de Outubro de 2014, proferiu o despacho autorizando a criação de duas salas de fumo no casino X (área Pit 11 localiza-se na posição direita da área LOl Casino Area, constante as plantas do casino X LO1 Casino Area, a fls. 678 a 694, Informação n.º 184/GPCT/2014 do Apenso n.º5 e a fls. 585, do Apenso n.º4), bem como a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos também em 21 de Outubro de 2014 autorizou a área Pit 11 do casino X como área de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores (ou seja área incomum de jogos) e começou no mesmo dia o pagamento do dobro do prémio.
Daí podemos verificar que a área Pit 11, antes do dia 7 de Outubro de 2014 ainda era área comum para fumadores autorizada e ainda não foi criada sala de fumo embora existisse área para fumadores. Pelo que na supracitada área é proibido fumar a partir dessa data, mesmo que a partir de 9 de Outubro do mesmo ano tenha sido autorizada a criação de duas salas de fumo, tendo em consideração que a referida área só foi autorizada para servir da área de acesso condicionado a determinados jogos e jogadores do casino a partir de 21 de Outubro de 2014 e no exterior de duas salas de fumo ainda não foi obtida a autorização prevista no art. 9.º das Normas relativas aos Requisitos a que devem obedecer as Áreas para Fumadores nos Casinos republicadas, sendo proibido fumar.
Pelo que, é correcto o facto dado como provado pela entidade recorrida de a recorrente, nos dias de fiscalização indicados nos autos de notícias n.ºs 001 e 002/GPCT/2014 e no dia 6 de Novembro de 2014, não ter afixado em locais bem visíveis daquela área de não fumadores os dísticos de proibição de fumar aprovados pelo regulamento administrativo, não estando em oposição com o art. 6.º da Lei n.º 5/2011.
E mesmo que não se tome em consideração o disposto no art. 24.º do Código do Processo Administrativo Contencioso, evidentemente, carece de fundamento jurídico, o pedido formulado pela recorrente respeitante à remoção dos dísticos de proibição de fumar afixados na respectiva área do casino.
Pelo exposto, deve-se julgar improcedente a alegação da recorrente, quanto à errada interpretação da lei pela entidade recorrida causando erro nos pressupostos de facto».
O conteúdo do trecho transcrito traduz o melhor entendimento sobre o vício em apreço, pelo que o acolhemos, para os devidos efeitos.
Acrescentamos apenas que, a partir do Despacho do Chefe do Executivo nº 141/2014, se modificaram os condicionalismos da proibição de fumar no interior dos casinos, com a alteração dos arts. 3º, 4º e 6º das “Normas Constantes aos requisitos a que devem obedecer as áreas para fumadores nos casinos” constantes do Anexo ao Despacho do Chefe do Executivo nº 296/2012.
Atente-se que de acordo com os nºs 4 e 5 desse Despacho 141/2014, “As salas de fumo das áreas comuns de jogo devem ser criadas até ao dia 6 de Outubro de 2014” (nº4) e que “A partir da data prevista no número anterior [6/10/2014], nas áreas comuns de jogo só é permitido fumar nas salas de fumo” (nº5). Isto significa que, desde aquela data, os casinos interessados nas salas de fumo deveriam obedecer àqueles novos requisitos. (a lei vale para o futuro) e quanto às autorizações anteriores concedidas para o fumo no interior das salas do casino aplicar-se-iam igualmente as mesmas disposições novas, caso ainda não houvesse salas a funcionar ao abrigo da referida e anterior autorização, tendo em conta o disposto no art. 11º, nº1 e nº2, “fine”, do Código Civil.
O próprio nº10 das Directrizes sobre as Salas de Fumo, publicadas no BO nº 24, II série, de 11/06/2014, emitidas ao abrigo do art. 9º do Despacho do CE nº 141/2014, prescreve que “a partir de 7 de Outubro de 2014 são eliminadas todas as áreas para fumadores de jogo, que hajam sido criadas ao abrigo do Despacho do Chefe do Executivo nº 296/2012”. Ou seja, as áreas de fumadores instaladas em área comum de jogo, criadas ao abrigo do Despacho do CE nº 296/2012, acabaram por ser extintas a partir de 7/10/2014.
Em suma, fumar nos casinos é proibido por lei (proibição relativa, entenda-se). O que significa que criar ou alterar zonas de fumo não é possível pelas concessionárias, sem a prévia autorização do Chefe do Executivo.
Ora, a alteração pretendida, por conduzir a uma solução nova para uma nova situação de facto, teria que obedecer “ex novo” aos novos condicionalismos normativos.
Ora, em 9/10/2014 o Chefe do Executivo, concordando com a Informação nº 470/SS/P/2014, em 9/10/2014 limitou-se a autorizar a criação de duas salas de fumo no casino “X”, conforme previstas na planta do L01 Casino Area. Com esta alteração, a zona de Pit 11 passaria de área para fumadores em área comum de jogo (despacho do CE de 30/12/2012) para área de acesso condicionado (despacho do CE de 9/10/2014). Mas, ao contrário do pensa a recorrente, por ser idêntica a área em questão, nem por isso a permissão de fumar na área para fumadores concedida em 2012 se prolongaria na área de acesso condicionado autorizada em 2014, por ser nova e diferente esta situação e respectiva autorização. Sendo autorizações juridicamente distintas, os pressupostos da segunda deveriam ocorrer segundo os parâmetros normativamente fixados “ex novo”.
Dito isto assim, parece que competia à recorrente proceder como manda o art. 6º, nº1, da Lei nº 5/2011.
Não se crê, portanto, que ocorra alguma violação de normas legais ou regulamentares na situação em apreço.
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3 – Da multa e da medida da pena
A multa impugnada tinha o valor de 100.000,00 patacas, por aplicação do art. 23º, nº1, al. 7), da Lei nº 5/2001.
A sentença recorrida, por cada uma das duas infracções ocorridas em 29 e 30 de Outubro de 2014, considerando todo o circunstancialismo que rodeou a prática dos ilícitos e o facto de não ser reincidente, aplicou, ao abrigo do art. 118º, nº2, do CPAC, a multa de MOP$ 30.000,00 a cada, no total de MOP$60.000,00.
A recorrente entende que uma multa de MOP$ 100.000,00, não pode ser substituída por duas de MOP$ 30.000,00 cada uma.
E isto é, em seu entender, motivo de nulidade, face aos arts. 564º nº1 e 571º, ambos do CPC, “ex vi” art. 149º do CPAC, por a sentença ter ultrapassado o limite da sua capacidade pronunciativa e decisória, tanto mais que o objecto do recurso contencioso era o acto administrativo punitivo e não o procedimento respectivo concernente aos autos de notícia nºs 001/GPC/2014 e 002/GPCT/2014.
Mesmo que assim não se entenda, acha que, sem conceder, a determinação da medida da sanção sempre deveria ter considerado tratar-se de uma infracção continuada e, como tal, apenas punível com uma única multa e não duas individualizadas.
Pois bem. Não está em causa a possibilidade de o tribunal, mesmo que conceda procedência ao recurso contencioso, aplicar uma multa correspondente à infracção cometida e detectada. Assim o permite o art. 118º, nº2, do CPAC.
Se estivermos certos, o que esta disposição prevê é que o tribunal, perante uma anulação do acto punitivo, por exemplo, com fundamento em desproporcionalidade na medida concreta da multa ou por vício de forma invalidante e insuprível, acabe por – encurtando caminho e evitando que o procedimento administrativo volte à entidade competente para, em execução do julgado, proceder à reedição do acto punitivo sem os vícios que estiveram na base da anulação – fazer já o que mais tarde poderia a Administração realizar. Repare-se: o tribunal pode, em tal caso, “fixar o quantitativo da multa”, bem como “fixar a espécie e duração da sanção acessória”. É uma novidade no nosso sistema jurídico/processual contencioso, que foge aos padrões clássicos do poder judicial no contencioso de matriz anulatória, e que acaba por conferir à situação um toque de plena jurisdição ao exercício do poder jurisdicional nesta espécie processual.
A dúvida está em saber se o tribunal, interpretando o objecto da censura administrativa, pode transformar em duas infracções aquela situação que a Administração tomou como uma só.
Esta questão pode parecer bizarra, mas não é. Em nossa opinião, o tribunal não pode alterar o objecto do recurso do acto de aplicação da multa, uma vez que este meio, ainda que com algumas especialidades, segue os termos do recurso contencioso (art. 118º, nº1, do CPAC). Ou seja, tanto quanto nos parece, o poder de intervenção judicial não pode ultrapassar o poder administrativo e ponderar aquilo que a Administração não ponderou. Se tal fosse possível, o tribunal iria decidir em sua casa aquilo que o Administrador tinha feito na sua e tal equivaleria a dizer que o tribunal poderia fazer administração activa, o que contrariaria o referido princípio da separação de poderes.
O tribunal, portanto, apenas pode agir naqueles limites acima mencionados. Logo, se o objecto da atenção e análise do tribunal é o acto punitivo com os seus limites substanciais (bem ou mal respeitados) o que o julgador tem é que ver se ele é de válido ou inválido. E se concluir pela sua invalidade fundada em vícios formais (não substanciais, segundo cremos), o que pode fazer é substituir-se à Administração, afeiçoando-o aos limites razoáveis da multa e fixando, eventualmente, a espécie e duração da sanção acessória mais adequada. Mas, já não disporá de competência para a qualificação e número de infracções. Talqualmente, nem poderá “fixar”3 uma multa sobre factos que a Administração não considerou para a fixar ela própria, sob pena de o recorrente estar a ser confrontado pela primeira vez com uma sanção que nunca esteve no seu horizonte, nem fez parte da sua impugnação judicial.
Se para cada dia em que os serviços de inspecção competente tenham detectado a falta de aposição de dísticos de proibição de fumar, a entidade competente não aplicou duas multas, mas uma só por considerar estar perante uma infracção continuada, parece que o tribunal não pode considerar que está perante dois ilícitos autónomos e aplicar uma multa individual a cada uma delas. Essa matéria não estava em discussão no processo, pelo que nessa parte a decisão não pode manter-se. Consequentemente, ao aplicar duas multas de MOP$ 30.000,00, ultrapassou os limites de intervenção judicial (art. 571º, nº1, al. d), do CPC).
Razão pela qual, o recurso jurisdicional merece parcial provimento, devendo a sanção ficar reduzida a MOP$ 30.000,00.
***
IV – Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder parcial provimento ao recurso, em consequência do que:
1. Se declara nula a sentença impugnada na parte em que, por ter considerado duas infracções, aplicou a multa de MOP$ 30.000,00 a cada uma; e----
2. Se confirma em toda a parte restante, nomeadamente, naquela em que fixou em MOP$ 30.000,00 o valor da multa à infracção.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça em 8UCs.
T.S.I., 12 de Julho de 2018
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Mai Man Ieng
1 José Cândido de Pinho, Manual de Formação de Direito Processual Administrativo Contencioso, CFJJM, 2ª ed., pág. 362.
2 Sobre as especificidades deste tipo de Administração, ver Lino Ribeiro e Cândido de Pinho, Código de Procedimento Administrativo de Macau, Anotado e Comentado, pág. 161 e sgs.
3 É curioso como o CPAC permite “fixar” a multa e sanção acessória e não “condenar”.
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891/2017 29