Processo n.º 440/2016 Data do acórdão: 2018-7-12 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– erro notório na apreciação da prova
– art.o 400.o, n.o 2, alínea c), do Código de Processo Penal
S U M Á R I O
Como ante todos os elementos da prova referidos na fundamentação probatória da sentença recorrida, não se vislumbra ao tribunal de recurso que o tribunal recorrido tenha violado, de modo patente, quaisquer regras da experiência da vida humana em normalidade de situações, quaisquer normas jurídicas sobre o valor legal da prova, ou ainda quaisquer leges artis a observar no julgamento de factos, não pode ter ocorrido, por parte do Tribunal recorrido, o erro notório na apreciação da prova como vício previsto na alínea c) do n.o 2 do art.o 400.o do Código de Processo Penal.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 440/2016
(Recurso em processo penal)
Recorrente (arguido): B (B)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA
REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por sentença proferida a fls. 81 a 86v do subjacente Processo Comum Singular n.o CR3-16-0029-PCS do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, ficou condenado o arguido B, aí já melhor identificado, como autor material, na forma consumada, de um crime de fuga à responsabilidade, p. e p. pelo art.o 89.o da Lei do Trânsito Rodoviário, em 90 dias de multa (à quantia diária de 150 patacas, no total, pois, de 13500 patacas de multa, convertível, no caso de não ser paga nem substituída por trabalho, em 60 dias de prisão), e na inibição de condução por seis meses (suspensa na execução por um ano somente na condução de veículo de trabalho, mediante a prova do trabalho a apresentar no prazo de dez dias depois do trânsito em julgado da decisão)
Inconformado, veio o arguido recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI) para pedir a sua absolvição, tendo alegado (no seu essencial) o seguinte na sua motivação de fls. 92 a 96v dos presentes autos correspondentes:
– o Tribunal recorrido errou notoriamente na apreciação da prova como vício aludido no art.o 400.o, n.o 2, alínea a), do Código de Processo Penal (CPP), porque não houve qualquer prova nos autos susceptível a provar cabalmente que a camioneta então conduzida pelo recorrente tenha embatido na grade de ferro e nos dois motociclos referidos na sentença;
– e fosse como fosse, também não se poderia dar por provado o dolo do recorrente na prática do crime de fuga à responsabilidade.
Ao recurso, respondeu o Ministério Público a fls. 98 a 100v no sentido de improcedência do recurso.
Subidos os autos, opinou a Digna Procuradora-Adjunta a fls. 108 a 109, no sentido material de manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se que a sentença ora recorrida se encontrou proferida a fls. 81 a 86v dos autos, cujo teor integral se dá por aqui integralmente reproduzido.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
É nesses parâmetros que vai ser decidida a presente lide recursória.
O arguido apontou principalmente à decisão condenatória recorrida o vício de erro notório na apreciação da prova, previsto na alínea c) do n.o 2 do art.o 400.o do CPP.
Entretanto, ante todos os elementos da prova referidos na fundamentação probatória da sentença recorrida, não se vislumbra ao presente Tribunal de recurso que o Tribunal recorrido tenha violado, de modo patente, quaisquer regras da experiência da vida humana em normalidade de situações, quaisquer normas jurídicas sobre o valor legal da prova, ou ainda quaisquer leges artis a observar no julgamento de factos, pelo que não pode ter ocorrido o erro notório na apreciação da prova invocado na motivação do recurso no tocante ao facto acusado de embate da camioneta então conduzida pelo recorrente na grade de ferro e nos dois motociclos referidos na sentença recorrida.
Aliás, o Tribunal recorrido já explicou (nas páginas 4 a 6 do texto da sua sentença, concretamente a fls. 82v a 83v), conguentemente, o processo de formação da sua livre convicção no julgamento dos factos, permitida nos termos do art.o 114.o do CPP, sendo de frisar que o penúltimo parágrafo dessa explicação (escrito na página 6 do mesmo texto decisório) já rebateu, com incidência, a tese sustentada pelo recorrente no tangente à falta de dolo na prática do crime em questão (é que se o espaço da camioneta destinado à colocação de mercadorias era do tipo tudo fechado de fora, como é credível a tese do recorrente de que ele, na altura, por suspeitar, através do visto no espelho retrovisor do lado direito, a caída de alguma mercadoria da camioneta, desceu da camioneta com o propósito apenas de ver se ocorreu a caída de mercadoria?).
Sendo de respeitar assim a matéria de facto já dada por provada na sentença recorrida, o recurso não deixa de naufragar também na sua subsidiária parte relativa à alegada inverificação do dolo na prática do crime de fuga à responsabilidade, porquanto a factualidade assente na decisão recorrida (especialmente descrita nos 4.o, 8.o, 9.o e 10.o factos provados) dá para sustentar integralmente o cometimento pelo recorrrente de um crime doloso de fuga à responsabilidade.
Em suma, improcede o recurso, sem mais indagação por desnecessária ou prejudicada.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas do recurso pelo arguido, com duas UC de taxa de justiça e mil e oitocentas patacas de honorários a favor do seu Ex.mo Defensor Oficioso.
Macau, 12 de Julho de 2018.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chou Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
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