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Processo n.º 55/2017
(Recurso contencioso)

Relator: Fong Man Chong
Data: 13 de Setembro de 2018


Assuntos:
- Demolição de obras ilegais
- Fundamentação da decisão administrativa


SUMÁRIO:

I – Apurando-se a existência de obras não autorizadas no prédio (que violam os artigos 8º/-12) e 10º/-4) do Regulamento de Segurança contra Incêndio, aprovado pelo DL nº 24/95/M, de 9 de Junho), titulado pelo Recorrente, sobre este recai o dever de proceder à demolição de tais obras ou à sua regularização caso estejam reunidos os respectivos requisitos, ainda que tais não foram ordenadas nem executadas pelo Recorrente, enquanto proprietário (obras estas que supostamente foram ordenadas pela ex-proprietária), uma vez que está em causa o interesse público (segurança pública de pejamento e evacuação) que se sobrepõe sobre o interesse particular.

II - As disposições sancionatórias do referido Regulamento (artigos 87.º e seguintes), quando aludem a obras ilegais já concretizadas, desconformes ao Regulamento e causadoras de pejamento ou de obstrução à evacuação, utilizam o termo infractores não apenas para se referirem aos autores ou executores das obras, mas para visarem aqueles que detêm o domínio do espaço e que, por isso, estão em condições de fazer cessar a infracção ou de, pelo contrário, a perpetuar.

III - A fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio acto (ainda que o possa ser de forma remissiva), expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do acto um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação), equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.

IV - Com efeito, resultam claramente indicados os motivos de facto que levaram à catalogação das obras como ilegais, estão arregimentadas as razões que impedem a legalização de tais obras e a consequente necessidade da sua demolição, e está explicada a razão pela qual cabe ao Recorrente a obrigação de demolir. Para além disso, em sede de direito, o acto remete para o quadro normativo do Regulamento de Segurança contra Incêndios e para o direito real de propriedade e suas inerências.
V – Face ao exposto, o acto revela-se suficientemente claro, aos olhos de um destinatário normal, quanto aos motivos da sua estatuição, não padecendo da obscuridade e da contradição assinaladas pelo Recorrente, pelo contrário, fornece-se ao destinatário o conhecimento do “iter” seguido pela entidade decisora e como tal a decisão não merece censura.



O Relator,

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Fong Man Chong















Processo n.º 55/2017
(Recurso Contencioso)

Data : 13/Setembro/2018

Recorrente : A

Recorrida : Secretário para os Transportes e Obras Públicas

*
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    
    I - RELATÓRIO
A, Recorrente, devidamente identificado nos autos, inconformado com o despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, datado de 29/22/2016, exarado na Informação n.º 09232/DURDEP/2016 (doravante designado por despacho recorrido) que indeferiu o recurso hierárquico necessário por ele interposto, e que manteve a decisão final de 20/11/2016, proferida pelo Senhor Subdirector da DSSOPT (que ordenara a demolição de obras ilegalmente executadas na XXXXXX, em Macau), veio em 11/01/2017, ao abrigo do disposto no artigo 36.º, n.º 8, al. 2) da Lei n.º 9/1999 (Lei de Bases da Organização Judiciária), conjugado com o artigo 25.º, n.º 2, al. b) do CPAC, interpor para o TSI o recurso contencioso contra o despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, acima citado, tendo formulado as seguintes conclusões :
1. O recorrente recebeu a notificação da DSSOPT feita pelo seu subdirector B no exercício das competências conferidas pelo despacho n.º 12/SOTDIR/2015 publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 38, II Série, de 23 de Setembro de 2015. (vide anexo I)
2. Segundo a supra mencionada notificação, o despacho de 29 de Novembro de 2016 exarado na Informação n.º 09232/DURDEP/2016 rejeitou as alegações do recurso hierárquico necessário interposto pelo recorrente e manteve a decisão final de 20 de Setembro de 2016 tomada pelo subdirector da DSSOPT B.
3. O recorrente está inconformado com a aludida decisão do despacho recorrido.
4. Antes de tudo, o despacho recorrido refere que: o novo proprietário goza de direitos reais totais e exclusivos sobre a sua fracção autónoma, e está obrigado a cumprir a legislação vigente no sentido de garantir o estado legal do seu bem imóvel, pelo que deve assumir a responsabilidade pela demolição de obra ilegal. De resto, os futuros proprietários antes de realizar a aquisição devem apurar se existe ou não edificação informal no bem imóvel pretendido e negociar com os proprietários anteriores a responsabilidade pelo tratamento desta, sob pena de assumirem as consequências.
5. O recorrente, ao adquirir em 28 de Julho de 2014 a fracção sita em Macau, na XXXXXX, procedeu à transacção em conformidade com o diploma legal regulador das transacções de bens imoveis vigente em Macau bem como as práticas habituais, incluindo a certificação notarial da transacção e o conhecimento das informações relativas ao imóvel bem como da situação jurídica deste.
6. No que tange à situação jurídica do bem imóvel em causa, o recorrente, mediante o notário responsável pela celebração de escritura e segundo a certidão de registo predial, confirmou os dados tais como o antigo proprietário. Ao notário também não parece ilegal a transacção.
7. Na verdade, o recorrente não conseguia conhecer, mediante os documentos legais existentes, se existiam ou não situações difíceis de saber sobre o bem imóvel em causa, ainda que antes de aquirição se dirigisse à referida fracção.
8. Logo, era impossível para o recorrente negociar com o antigo proprietário a responsabilidade pelo tratamento da edificação informal, incluindo as despesas com a demolição.
9. Aliás, o recorrente, apesar de ter realizado maiores esforços, ainda não conseguiu ter conhecimento da eventual existência de edificação informal na fracção em causa. Pois, a responsabilidade não é do recorrente.
10. O despacho recorrido também menciona que: no que diz respeito ao tratamento dos assuntos relativos às obras ilegais, a DSSOPT precisa, por um lado, de satisfazer as expectativas legais dos cidadãos e, por outro, de ter em conta a intrínseca associação da grande quantidade das obras ilegais à população, de forma que evite conflitos sociais e caos. Para isso, em face da realidade em Macau, a estratégia actualmente adoptada pela DSSOPT é classificar os casos, dando prioridade aos de renovação e de construção de novas edificações informais, ou de edificações que apresentem perigos de colapso, bem como aos casos em que as edificações informais ponham em perigo os prédios a que estas se anexem, ou a segurança contra incêndio, ou a higiene, com vista a parar a deterioração das obras ilegais e, ao mesmo tempo, abordar os casos de edificações ilegais já existentes em função do seu grau de urgência. A DSSOPT propõe o acompanhamento de caso segundo a classificação do grau de prioridade, pelo que actualmente está a acompanhar diferentes casos de forma ordenada.
11. Nos termos do CPA,
Artigo 7.º
(Princípio da justiça e da imparcialidade)
No exercício da sua actividade, a Administração Pública deve tratar de forma justa e imparcial todos os que com ela entrem em relação.
12. Segundo o despacho recorrido, a DSSOPT classifica diferentes casos, dando prioridade aos de renovação e de construção de novas edificações informais, ou de edificações que apresentem perigos de colapso, bem como aos casos em que as edificações informais ponham em perigo os prédios a que estas se anexem, ou a segurança contra incêndio ou a higiene, com vista a parar a deterioração das obras ilegais e, ao mesmo tempo, abordar os casos de edificações ilegais já existentes em função do seu grau de urgência. No entanto, a fracção sita na vizinhança do recorrente também apresenta tais situações. O respectivo fundamento foi mencionado no recurso hierárquico, só que não foi admitido.
13. Parece ao recorrente que o facto de a Administração não ter exercido equitativamente a sua actividade se mostra imparcial, violando evidentemente o princípio de justiça e imparcialidade.
14. Nos termos do CPA,
Artigo 114.º
(Dever de fundamentação)
1. Para além dos casos em que a lei especialmente o exija, devem ser fundamentados os actos administrativos que, total ou parcialmente:
a) Neguem, extingam, restrinjam ou afectem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;
b) Decidam reclamação ou recurso;
c) Decidam em contrário de pretensão ou oposição formulada por interessado;
d) Decidam em contrário de parecer, informação ou proposta oficial;
e) Decidam de modo diferente da prática habitualmente seguida na resolução de casos semelhantes, ou na interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou preceitos legais;
f) Impliquem revogação, modificação ou suspensão de acto administrativo anterior.
2. Salvo disposição legal em contrário, não carecem de ser fundamentados os actos de homologação de deliberações tomadas por júris, bem como as ordens dadas pelos superiores hierárquicos aos seus subalternos em matéria de serviço e com a forma legal.
15. À luz do mesmo Código,
Artigo 115.º
(Requisitos da fundamentação)
1. A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituem neste caso parte integrante do respectivo acto.
2. Equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
3. Na resolução de assuntos da mesma natureza, pode utilizar-se qualquer meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que tal não envolva diminuição das garantias dos administrados.
16. Daí que, a Administração tem o dever de fundamentação, que por seu lado deve preencher o disposto no artigo 115.º do CPA.
17. O despacho recorrido menciona a estratégia adoptada pela DSSOPT, que é classificar os casos, dando prioridade aos de renovação e de construção de novas edificações informais, ou de edificações que apresentem perigos de colapso, bem como aos casos em que as edificações informais ponham em perigo os prédios a que estas se anexem, ou a segurança contra incêndio, ou a higiene, com vista a parar a deterioração das obras ilegais e, ao mesmo tempo, abordar os casos de edificações ilegais já existentes em função do seu grau de urgência. Sendo obscuro, contraditório ou insuficiente, tal fundamento não esclarece concretamente a motivação do acto.
18. A estratégia supra mencionada baseia-se em fundamento obscuro e contraditório, sem que esclareça de forma suficiente a chamada classificação, já para não falar de explicação clara do grau de urgência.
19. Ademais, o despacho recorrido, por um lado, afirma que o proprietário está obrigado a observar a legislação vigente no sentido de manter o estado legal do seu imóvel, por outro lado, possibilita a alguns infractores a evasão da regulação legal, assim incorrendo em contradição sem que pudesse esclarecer concretamente a motivação do acto.
20. Face ao exposto, o despacho recorrido deve ser anulado por violação do princípio da justiça e da imparcialidade e por adopção, na fundamentação, de fundamentos que, por obscuridade, contradição e insuficiência, não esclarecem concretamente a motivação do acto.
* * *
Citada a Entidade Recorrida, o Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, este veio tempestivamente apresentar a sua contestação, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. Por despacho de 29/11/2016 da entidade recorrida, exarado na informação nº 09232/DURDEP/2016 de 22/11/26, foi indeferido o recurso hierárquico necessário do recorrente contencioso, mantendo-se o acto administrativo praticado pelo subdirector em 20/9/2016.
2. O acto administrativo foi praticado de acordo com o nº 1 do artº 88º do do D.L. nº 24/95/M, de 9 de Junho (REGULAMENTO DE SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO), que ordenou o recorrente contencioso A que procedesse, por sua iniciativa, no prazo de 8 dias contados da data da recepção da notificação, à demolição das aludidas obras, à remoção dos materiais e equipamentos depositados no local para a reposição da situação anterior do local afectado pelas referidas obras.
3. Porém, o recorrente contencioso não procedeu à demolição das obras ilegais no prazo para demolição voluntária, contestando que já confirmou os dados do anterior proprietário imóvel com o notário com base na certidão de registo predial aquando da aquisição do imóvel em 28/07/2014, nem o notário viu ilegalidade no comércio do imóvel, pelo que, não devia assumir a responsabilidade pela demolição das obras.
4. O contrato de compra e venda de bens imóveis só é válido se for celebrado pela forma prescrita na lei do notariado, ao abrigo do artº 866º do Código Civil, aprovado pelo D.L. nº 39/99/M, de 3 de Agosto, e do artº 94º do Código do Notariado, aprovado pelo D.L. nº 62/99/M. Dispõe o artº 1º do Código do Registo Predial, aprovado pelo D. L. nº 46/99/M, de 20 de Setembro, “O registo predial destina-se essencialmente a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio imobiliário.”
5. Agora, o acto recorrido é o despacho que ordenou o proprietário para demolir as obras ilegais na fracção em causa, não é para questionar a validade do contrato de compra e venda do recorrente contencioso, nem para procurar saber se o recorrente contencioso tinha ou não conhecimento das obras ilegais na fracção aquando da aquisição do imóvel.
6. Aparentemente, as obras ilegais na fracção já deixaram de pertencer ao anterior proprietário desde 28/07/2014, ou seja, o dia em que o recorrente contencioso comprou a fracção, porquanto, o então proprietário perdeu todos os direitos sobre a fracção depois da venda da mesma, pelo que não se pode exigir ao anterior proprietário a demolição das obras ilegais (construção ilegal) neste processo.
7. Entendemos, portanto, quanto à responsabilidade pela demolição de construção ilegal, segundo o artº 1229º do CC, “O proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas.” Assim, dado que o recorrente contencioso é o proprietário da fracção em apreço, goza de modo pleno e exclusivo do direito real da fracção, tendo o dever de observar a lei vigente, de modo a garantir o estado legal da sua propriedade. Pelo exposto, o mesmo deve tomar responsabilidade pela demolição das obras ilegais.
8. Quanto à questão de tratamento desigual invocada pelo recorrente contencioso, a Administração já esclareceu a questão na informação nº 09232/DURDEP/2016 de 22/11/2016 e notificou ao recorrente contencioso através do ofício nº 17030/DURDEP/2016 de 13/12/2016.
9. Do teor do nº 3 de tal ofício resultou que a Administração já falou com o recorrente contencioso que estão a acompanhar os diversos casos de obras ilegais segundo os graus em que foram classificados. Por outras palavras, a Administração nunca disse ao recorrente contencioso que não iam tratar ou não iam acompanhar as obras ilegais encontradas nas lojas e habitações vizinhas.
10. Na realidade, a Administração está a acompanhar as obras ilegais encontradas nas lojas e habitações ao pé da fracção em apreço, para tais, tendo levantado os processos nºs 298/OI/2014, 344/BC/2015, 784/OI/2010 e 963/2003/F da DSSSOPT (cfr. Anexo 1)
11. Mesmo, tal como disse o recorrente contencioso, que a Administração não trate de todos os casos de uma forma uniformizada, isso também não dá direito a ele para exigir a Administração para não executar a lei, porque não há direito à igualdade na ilegalidade. Como escrevem JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS “em caso algum, pode ele (o princípio da igualdade) ser invocado contra o princípio da legalidade: um acto ilegal da Administração não atribui ao particular o direito de exigir a prática no futuro de acto de conteúdo idêntico em face de situações iguais”. Encontra-se o mesmo entendimento no acórdão de 3/4/2014 do processo nº 820/2010 do Tribunal de Segunda Instância.
12. Portanto, o recorrente contencioso não tem razão para dizer isso. Por outras palavras, aparentemente a Administração não violou os princípios da justiça e da isenção.
13. Na prática do acto administrativo a Administração já expressou, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão e a fundamentação, sem dúvida, foi expressa de forma consistente, clara e completa, na qual não se verificou a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
14. Neste caso, os fundamentos pelos quais foi praticado o acto administrativo foram expressamente expostos na informação nº 09232/DURDEP/2016 e foram notificados ao recorrente contencioso através do ofício nº 17030/DURDEP/2016 (cfr. fls. 109 a 113 e 161 a 162 do P.A. nº 959/BC/2012/F). Nesta informação foi dito expressamente que foram encontradas na fracção em causa obras sem licença, incluindo a construção ilegal no pátio composta por elementos fixos tais como paredes de betão, janelas de vidro e gaiolas, palas e vedação metálicas, etc., violando o artº 8º, nº 12, do D.L. nº 24/95/M, de 9 de Junho (REGULAMENTO DE SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO), o que faz com que os lugares percam as suas funções como os pontos de penetração para realizar operações de salvamento de pessoas e combate a incêndios em caso de incêndio, pondo em risco a segurança pessoal e patrimonial. Pelo exposto, a referida obra não pode ser legalizada e nos termos do artº 88º do mesmo Decreto-Lei, a Administração ordenou a demolição da referida construção ilegal.
15. Perante esta fundamentação, qualquer homem médio percebe logo os factos e fundamentos jurídicos que conduziram ao acto recorrido. Fica, deste modo, demonstrado que o despacho recorrido não padece de vício de falta de fundamentação por obscuridade, contradição ou insuficiência.
* * *
O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls. 90 a 91v) :
     Vem o presente recurso contencioso dirigido contra o acto de 29 de Novembro de 2016, da autoria do Exm.º Secretário para os Transportes e Obras Públicas, que rejeitou o recurso hierárquico necessário interposto do despacho de 20 de Setembro de 2016, do Subdirector dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, que ordenara a demolição de obras ilegalmente executadas na XXXXXX em Macau.
     O recorrente questiona a legalidade do acto, aduzindo, desde logo, que labora em erro ao fazer recair sobre si a responsabilidade pela demolição das obras ilegais, e acrescentando que o acto traduz um tratamento discriminatório do recorrente, por comparação com a inércia relativa a situações idênticas que ocorrem na vizinhança, com a inerente violação do princípio da imparcialidade, ao que acresce que padece de fundamentação obscura e contraditória.
     A autoridade recorrida refuta os argumentos do recorrente, pronunciando-se pela legalidade do acto e pela sua manutenção na ordem jurídica.
     Vejamos.
     O recorrente é o proprietário da fracção em causa, disso não há dúvidas. E assevera que as obras que são causa do dissídio já estavam executadas quando, em 2014, adquiriu a fracção, o que, podendo admitir-se como verdadeiro e que a entidade recorrida não contesta, é, no entanto, irrelevante, salvo melhor juízo.
     Estão em causa infracções ao Regulamento de Segurança contra Incêndios. As disposições sancionatórias deste Regulamento (artigos 87.º e seguintes), quando aludem a obras ilegais já concretizadas, desconformes ao Regulamento e causadoras de pejamento ou de obstrução à evacuação, utilizam o termo infractores não apenas para referirem os autores ou executores das obras, mas para visarem aqueles que detêm o domínio do espaço e que, por isso, estão em condições de fazer cessar a infracção ou de, pelo contrário, a perpetuar. E é por isso que falam de proprietários como responsáveis pelo pagamento das multas e como responsáveis em assumir a obrigação de fazer executar os trabalhos que sejam necessários para evitar as demolições de obras ilegais – cf., v.g., artigos 87.º e 88.º do Regulamento. Nem podia ser de outro modo, dadas as prerrogativas inerentes ao direito de propriedade, que inviabilizam que seja outrem, que não o proprietário, a proceder voluntariamente à demolição das obras ilegais detectadas nos seus prédios.
     Improcede, pois, este primeiro fundamento do recurso.
     Quanto a outras aventadas situações ilegais, na vizinhança, e alegada diferença de tratamento por parte da Administração, isso é manifestamente indiferente para interferir com a validade do acto recorrido.
     Ainda que haja outros casos de obras semelhantes, nas imediações, e postura diversa da Administração relativamente a essas obras idênticas, não assiste ao recorrente o direito de reclamar da Administração uma actuação nivelada pela bitola da ilegalidade. Pode dizer-se, a este propósito, que o princípio da igualdade não pode afastar o princípio da legalidade. Do mesmo modo, não pode a actuação administrativa ser considerada parcial por ter cumprido a legalidade.
     É também improcedente este fundamento do recurso.
     Finalmente, o recorrente assevera que o acto padece de vício de forma por insuficiente fundamentação.
     Em matéria de fundamentação, o artigo 115.º do Código do Procedimento Administrativo prescreve que ela deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituem neste caso parte integrante do respectivo acto, equivalendo à sua falta a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
     A partir deste inciso legal, a doutrina e a jurisprudência vêm apontando a relatividade do conceito e vincando que o que importa é que, perante o acto, um destinatário médio fique inteirado da motivação da decisão, das razões que levaram a Administração a decidir da forma como decidiu e não doutra. Consideram, por isso, que não vale como fundamentação a adopção de proposições ou juízos conclusivos desacompanhados da concretização factual em que assentam, porquanto dessa forma não se logra esclarecer a motivação do acto, desiderato essencial do dever de fundamentação.
     No caso vertente, e atendo-nos à matéria sobre que versou o acto recorrido e ao teor deste, estamos em crer que se mostra suficientemente cumprido aquele dever de fundamentação, do mesmo passo que se nos afiguram descabidas as críticas que a petição de recurso veicula em tal matéria.
     Com efeito, resultam claramente indicados os motivos de facto que levaram à catalogação das obras como ilegais, estão arregimentadas as razões que impedem a legalização de tais obras e a consequente necessidade da sua demolição, e está explicada a razão pela qual cabe ao recorrente a obrigação de demolir. Para além disso, em sede de direito, o acto remete para o quadro normativo do Regulamento de Segurança contra Incêndios e para o direito real de propriedade e suas inerências.
     Ante o exposto, o acto revela-se suficientemente claro, aos olhos de um destinatário normal, quanto aos motivos da sua estatuição, não padecendo da obscuridade e da contradição assinaladas pelo recorrente, pelo que se tem por satisfeita a exigência legal de fundamentação.
     Soçobra igualmente este vício.
     Termos em que, face à improcedência dos vícios assacados ao acto, o nosso parecer vai no sentido de ser negado provimento ao recurso.
     Macau, 4 de Maio de 2018
* * *
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
* * *
    II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
    III – FACTOS
São os seguintes factos considerados assentes com interesse para a decisão do litígio, conforme os elementos juntos no processo administrativo respectivo:
1) - 於2012年10月8日10時,就Reg編號1754/2012投訴之事宜,土地工務運輸局(下稱工務局)監察處稽查人員對澳門XXXXXX單位(CRP:AR/C)進行調查,並即時編寫第113935/2012號的實況筆錄 (見行政卷宗附件一)。
2) - 根據上述實況筆錄,發現位於澳門XXXXXX單位(CRP:AR/C)存在下列無准照工程,有關情況如下:


工程
工程狀況
違反《防火安全規章》的條文
1.2.1
在緊貼上述單位窗戶的樓宇外牆上安裝金屬花龍
已完成
違反第8條第12款的規定,阻礙進入樓宇的穿入點。
1.2.2
在通天加建由混凝土牆、磚塊牆、玻璃窗戶、金屬花龍、金屬簷篷、金屬欄栅、金屬閘門及塑膠煙通所組成之僭建物。
已完成
違反第8條第12款的規定,阻礙進入樓宇的穿入點。
1.2.3
在公共梯間加建金屬閘門。
已完成
違反第10條第4款的規定,阻塞疏散通道。

3) - 上述工程是澳門XXXXXX單位(CRP:AR/C)使用。
4) - 根據當時從電腦聯網獲得的物業登記局資料顯示(見行政卷宗附件二),第1項所指單位之業權人資料如下:


業權人姓名
聯絡地址
1.4.1
C
澳門XXXXXX

5) - 於2014年07月28日,上述地下XX單位之業權由A購買取得(見行政卷宗附件三)。


業權人姓名
聯絡地址
1.5.1
A
EM MACAU, XXXXXX
6) - 其後,工務局於2016年05月03日,就REG編號05591/2016(001)投訴之事宜,監察處稽查人員再到現場調查,發現有關僭建物仍然存在(見第52-55頁)。
7) - 工務局於2016年06月03日透過第07506/DURDEP/2016號公函通知澳門XXXXXX單位(CRP:AR/C)之利害關係人A以下事宜 (見行政卷宗附件四):
(1) - 有關工程違規的情況、工務局將依法作出清拆決定及違法者可被科處罰款事宜。
(2) - 於收到通知日起計5天期限內,就上指之事宜及其他對構成有關程序之標的之問題,發表書面意見,亦可申請採取補足措施以及提供有關證據方法。同時亦可在辦公時間內到工務局城市建設廳監察處查閱有關卷宗。

8) - 2016年06月16日利害關係人A委託D大律師樓E大律師遞交登記編號86239/2016信函,主要內容如下(見行政卷宗附件五):
(1) - 業權人透過E大律師表示上述之僭建物未有跡象顯示會必然直接地阻礙到消防員進人;
(2) - 請求對業權人作出不予罰款之決定;
(3) - 要求查閱行政卷宗。

9) - 受利害關係人委託之E大律師於2016年08月10日親臨工務局查閱卷宗。
10) - 其後,工務局副局長根據《防火安全規章》第八十八條第一款之規定,以及行使刊登於2015年9月23日第38期《澳門特別行政區公報》第二組第12/SOTDIR/2015號批示所授予的權限,於2016年09月20日第07551/DURDEP/2016號報告書內作出批示,命令上述工程所有人或受託人於告示刊登日起計8天期限內,自行拆除上述工程,同時該等人士以及使用人必須移走其內存有的所有物料、設備及遷離現場,以促使受該工程影響的地方恢復原狀 (見行政卷宗附件六)。
11) – 工務局透過於2016年09月23日在第13179/DURDEP/2016號公函通知利害關係人A及E大律師,其提出的書面意見中的理由陳述不被接納,並透過隨函附上的第105/NOT/2016號通知書,命令上述人士於被通知日起計8天期限內,自行拆除上述工程, 同時該等人士以及使用人必須移走其內存有的所有物料、設備及遷離現場,以促使受該工程影響的地方恢復原狀 (見行政卷宗附件七)。
12) - 2016年10月11日E大律師向工務運輸司司長提起必要訴願 (見行政卷宗附件八)。

13) - 利害關係人遞交的必要訴願內容如下:
(1) - 委託D大律師樓E大律師之題述單位業權人A(利害關條人)表示於2014年7月28日購人題述單位時,前業權人並未有向利害關係人說明單位有被指控之無准照工程,且利害關係人對物業沒有進行過裝修或任何工程;
(2) - 表示利害關係人一直注意金屬閘門的開關狀態,以確保樓宇疏散通道長期保持暢通無阻,且不會妨礙樓宇其他人士通過有關通道,也沒有阻塞有關通道;
(3) - 表示未有跡象顯示在單位內的通天加建由混凝土牆、磚塊牆、玻璃窗戶、金屬花籠、金屬簷篷、金屬欄栅、金屬閘門及塑膠煙通所組成之僭建物會必然直接地阻礙到消防員進人,故利害關係人沒有違反第24/95/M號法令核准的《防火安全規章》第八條第十二款之規定;

(4) - 指澳門XXXXXX多間鋪位或單位皆建有不同之僭建物,指工務局選擇性執法,只針對利害關係人而對其他單位之僭建物視若無睹;
(5) - 要求工務局接納訴願且認為其訴願理由成立,及要求工務局撤回本卷宗對利害關係人須自行拆除涉案物業之相關工程的決定。

14) - 工務局分析及結論:
(1) - 新業主對其獨立單位享有完全及排他性的物權,並有義務遵守現行法例,確保其物業處於合法的狀態,故須承擔清拆相關違法工程之責任。另外,準業主在購買物業前應事先了解清楚該物業是否存在違法僭建,並與原業主協商清楚處理違法僭建物的責任,否則,新業主將須承擔相關後果。
(2) - 就僭建物,根據《防火安全規章》第十條第四款的規定,樓宇的公共通道被視作樓宇的疏散通道,應保持暢通無阻,此外,上述單位的窗戶及天井,按照第八條第十二款的規定,屬可供進行搶救及滅火工作用之穿人點,不應設置花籠、格柵等固定構件。違法者在題述地點進行之改動,使相關地點在發生火警時,失去了作為疏散通道、穿入點的功能,危及人身及財產的安全。因此,該工程不能被合法化。為著使違法狀況符合都市性法律規範,工務局可著令清拆有關工程。地下XX單位(CRP:AR/C)的業權人應聘請合資格人士向本局遞交拆卸計劃的申請,同時按工務局已核准圖則回復原狀。
(3) - 工務局在處理非法工程的事務上,一方面需滿足市民的合法訴求,另一方面需考量數量龐大的非法工程與市民的密切性,避免產生社會矛盾,出現混亂。為此,目前因應本澳的實際情況,工務局現時所訂定的策略,對不同的個案作出分類及分級,優先處理翻新及新建或出現殘危的情建物,以及對於僭建物附著的大廈構成危險、或影響消防安全、衛生惡化的情況列作優先處理,目的是要凍結非法工程惡化的情況,同時以先後緩急處理的方式處理舊有僭建物。工務局是按個案處理評級作出跟進,因此,工務局現正有序地對不同個案作出跟進。

16) - 工務運輸司司長作岀批示后由工務局副局長作出回覆,內容如下:

Assunto: Resposta ao recurso hierárquico necessário do interessado
Local: XXXXXX (CRP:AR/C)
Processo n.º 959/BC/2012/F
No exercício das competências conferidas pelo despacho n.º 12/SOTDIR/2015 publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 38, II Série, de 23 de Setembro de 2015, notifico o Senhor do seguinte:
Quanto ao seu recurso hierárquico necessário de 11 de Outubro de 2016 interposto para o Secretário para os Transportes e Obras Públicas do ofício n.º 13179/DURDEP/2016 e da notificação n.º 105/NOT/2016, ambos emitidos pela DSSOPT a 23 de Setembro de 2016, respondo ao Senhor que, à luz do despacho de 29 de Novembro de 2016 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas exarado na Informação n.º 09232/DURDEP/2016, foram rejeitadas as alegações do seu recurso hierárquico necessário e mantida a decisão final de 20 de Setembro de 2016 do subdirector da DSSOPT B. Logo, o interessado ainda está obrigado a cumprir a referida decisão final, porque:
1. O novo proprietário goza de direitos reais totais e exclusivos sobre a sua fracção autónoma, e está obrigado a cumprir a legislação vigente no sentido de garantir o estado legal do seu bem imóvel, pelo que deve assumir a responsabilidade pela demolição de obra ilegal. De resto, o futuro proprietário antes de realizar a aquisição deve apurar se existe ou não edificação informal no bem imóvel pretendido e negociar com o antigo proprietário a responsabilidade pelo tratamento desta, sob pena de assumir as consequências.
2. De acordo com o disposto no artigo 10.º, n.º 4 do Regulamento de Segurança contra Incêndios, as vias públicas dos prédios são considerados caminhos de evacuação destes e devem conservar-se permanentemente desobstruídas e desimpedidas. Aliás, segundo o artigo 8.º, n.º 12, as janelas e o pátio da fracção em causa são pontos de penetração através dos quais se prevê ser possível realizar operações de salvamento de pessoas e de combate a incêndios, pelo que não devem dispor de elementos fixos tais como grades e grelhagens. A alteração realizada pelo infractor nos locais em causa fará com que estes percam, no momento de incêndio, a função como caminhos de evacuação e pontos de penetração, pondo em perigo a segurança pessoal e patrimonial. Tais obras não podem, deste modo, ser legalizadas. A fim de fazer a infracção conforme às normas jurídicas urbanísticas, a DSSOPT pode ordenar a demolição das respectivas obras. Fica o proprietário da fracção CRP:AR/C obrigado a contratar pessoa qualificada para apresentar junto da DSSOPT o pedido do plano de demolição, e a restaurar a primitiva forma segundo o projecto aprovado pela DSSOPT.
3. No que diz respeito ao tratamento dos assuntos relativos às obras ilegais, a DSSOPT precisa, por um lado, de satisfazer as expectativas legais dos cidadãos e, por outro, de ter em conta a intrínseca associação da grande quantidade das obras ilegais à população, de forma que evite conflitos sociais e caos. Para isso, em face da realidade em Macau, a estratégia actualmente adoptada pela DSSOPT é classificar os casos, dando prioridade aos de renovação e de construção de novas edificações informais, ou de edificações que apresentem perigos de colapso, bem como aos casos em que as edificações informais ponham em perigo os prédios a que estas se anexem, ou a segurança contra incêndio, ou a higiene, com vista a parar a deterioração das obras ilegais e, ao mesmo tempo, abordar os casos de edificações ilegais já existentes em função do seu grau de urgência. A DSSOPT propõe o acompanhamento de caso segundo a classificação do grau de prioridade, pelo que actualmente está a acompanhar diferentes casos de forma ordenada.
4. O proprietário está obrigado a cumprir a legislação vigente no sentido de garantir o estado legal do seu bem imóvel, pelo que deve assumir a responsabilidade pela demolição das respectivas obras ilegais.
5. A carta submetida pelo Senhor não contém nenhuma prova fáctica e direito de que possa resultar a alteração da decisão da demolição das referidas obras ilegais.
À luz do disposto no artigo 22.º e artigo 25.º, n.º 2, al. a) do CPAC, aprovado pelo DL n.º 110/99/M de 13 de Dezembro, e no artigo 36.º, al. 8), subalínea 2) da Lei n.º 9/1999 (Lei de Bases da Organização Judiciária) republicada no Boletim Oficial n.º 44/2004, I Série, de 1 de Novembro, o interessado pode, no prazo de 30 dias a contar da data de recepção desta notificação, interpor recurso contencioso para o TSI do supra referido despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas. Tal recurso, todavia, não tem efeito suspensivo relativamente à atrás mencionada decisão de ordem de proibição de obras.
Com os melhore cumprimentos.
Director
(subdirector)
(Ass. vide o original)
B
13 de Dezembro de 2016”
* * *
    IV - FUNDAMENTOS
A resolução do presente recurso passa pela análise e resolução das seguintes questões :
- Legalidade da decisão que ordenou a demolição de obras ilegais verificadas no imóvel pertencente ao Recorrente;
- Falta de fundamentação de decisão ora recorrida;
- Alegada violação do princípio da justiça e da imparcialidade.
*
Comecemos pela primeira questão: legalidade ou ilegalidade da decisão.
O Recorrente questiona a legalidade do acto, aduzindo, desde logo, que labora em erro, ao fazer recair sobre si a responsabilidade pela demolição das obras ilegais, e acrescentando que o acto traduz um tratamento discriminatório do Recorrente, por comparação com a inércia relativa a situações idênticas que ocorrem na vizinhança, com a inerente violação do princípio da imparcialidade, ao que acresce que padece de fundamentação obscura e contraditória.
A decisão de mandar demolir as obras ilegais foi tomada na sequência da verificação in loco e análise técnica em conformidade com os padrões fixados pelo Regulamento de Segurança contra Incêndios, aprovado pelo DL nº 24/95/M, de 9 de Junho, o que se alcança pela leitura do respectivo auto do PA, quer em sede graciosa, quer na contenciosa, o Recorrente não chegou a apresentar provas suficientes para contrariar ou impugnar a decisão ora posta em crise, quer no aspecto técnico, quer jurídico.
É de lembrar-se que os artigos 8º (Condições de acesso e de intervenção) e 10º do citado Regulamento dispõem, respectivamente:
8.1. A localização e a inserção urbana dos edifícios pode ser condicionada considerando as condições de acesso e de intervenção dos bombeiros.
(…)
8.12. As paredes exteriores dos edifícios através das quais se prevê ser possível realizar operações de salvamento de pessoas e de combate a incêndios (fachadas acessíveis), não devem dispor de elementos salientes que dificultem o acesso aos pontos de penetração no edifício (janelas, varandas, galerias, etc.) e estes não devem dispor de elementos fixos (grades, grelhagens, vedações, etc.) que impeçam ou dificultem a sua transposição; além disso, quando os pontos de penetração forem vãos de janelas, o pano de peito não deve ter espessura superior a 0,30 m numa extensão, abaixo do peitoril, de 0,50 m, pelo menos, para permitir o engate das escadas de ganchos.
(…)
8.13. Os edifícios devem possuir, em função da sua altura, fachadas acessíveis servidas por vias de acesso que disponham de faixas que permitam o acesso, o estacionamento, a manobra e a operação das viaturas e auto-escadas dos bombeiros, em «número» e «percentagem de perímetro exterior», de acordo com o disposto nos Quadros III e IV.
     
Depois, o artigo 10º (Generalidades) estipula:
10.1. Os edifícios devem ser concebidos de modo a proporcionarem, em cada nível, meios de evacuação fáceis, rápidos e seguros a todos os ocupantes, em caso de incêndio.
10.2. Todas as edificações devem dispor de meios directos de saída para a via pública ou para espaços livres e abertos que a ela conduzam; estes espaços livres e abertos devem dispor, em toda a sua extensão, de largura e condições de segurança idênticas às saídas dos edifícios.
10.3. O número, dimensões, localização e constituição dos meios de evacuação devem ser fixados tendo em atenção a finalidade, a altura, o efectivo previsível, as distâncias de percurso, a área dos pisos e a capacidade de resistência ao fogo dos elementos estruturais e de compartimentação das construções, por forma a permitir uma evacuação rápida e segura dos ocupantes, em caso de incêndio.
10.4. Os caminhos de evacuação devem conservar-se permanentemente desobstruídos e desimpedidos em toda a sua largura e extensão; é interdito qualquer aproveitamento ou pejamento, mesmo que temporário, dos caminhos de evacuação susceptível de afectar a segurança do edifício ou dificultar a evacuação, em caso de incêndio.
(…)
Estão em causa infracções ao Regulamento de Segurança contra Incêndios. As disposições sancionatórias deste Regulamento (artigos 87.º e seguintes), quando aludem a obras ilegais já concretizadas, desconformes ao Regulamento e causadoras de pejamento ou de obstrução à evacuação, utilizam o termo infractores não apenas para referirem os autores ou executores das obras, mas para visarem aqueles que detêm o domínio do espaço e que, por isso, estão em condições de fazer cessar a infracção ou de, pelo contrário, a perpetuar. E é por isso que falam de proprietários como responsáveis pelo pagamento das multas e como responsáveis em assumir a obrigação de fazer executar os trabalhos que sejam necessários para evitar as demolições de obras ilegais – cf., v.g., artigos 87.º e 88.º do Regulamento. Nem podia ser de outro modo, dadas as prerrogativas inerentes ao direito de propriedade, que inviabilizam que seja outrem, que não o proprietário, a proceder voluntariamente à demolição das obras ilegais detectadas nos seus prédios.
O Recorrente invoca o fundamento de que tais obras ilegais não foram executadas por ele nem por ordem dele, mas sim supostamente executadas pela ex-proprietária da fracção autónoma em causa, só que isto não é razão bastante para desresponsabilizar o Recorrente, já que a decisão toca ao statu quo do imóvel actual, ou seja, das obras ilegais agora verificadas e existentes, e que agora o Recorrente é proprietário, ele tem de assumir a responsabilidade daí decorrente. Uma coisa que ele pode fazer é, depois de demolir as obras ilegais, exigirá a responsabilidade da ex-proprietária da fracção em causa, mas na restrita relação interna entre ele e a ex-proprietária.
Pelo que, improcede a argumentação do Recorrente neste ponto.
*
2ª questão: falta de fundamentação da decisão
Nesta matéria, a doutrina e a jurisprudência vêm apontando a relatividade do conceito e vincando que o que importa é que, perante o acto, um destinatário médio fique inteirado da motivação da decisão, das razões que levaram a Administração a decidir da forma como decidiu e não doutra. Consideram, por isso, que não vale como fundamentação a adopção de proposições ou juízos conclusivos desacompanhados da concretização factual em que assentam, porquanto dessa forma não se logra esclarecer a motivação do acto, desiderato essencial do dever de fundamentação.
A fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio acto (ainda que o possa ser de forma remissiva), expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do acto um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação), equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
A fundamentação formal distingue-se da fundamentação material. À fundamentação formal interessa a enunciação dos motivos que determinaram o autor a proferir a decisão com um concreto conteúdo; à fundamentação material interessa a correspondência dos motivos enunciados com a realidade, bem como a sua suficiência para legitimar a actuação administrativa no caso concreto.
Como ensina Vieira de Andrade (O dever de fundamentação expressa de actos administrativos, Almedina, 2003, p. 231.), o dever formal cumpre-se «... pela apresentação de pressupostos possíveis ou de motivos coerentes e credíveis; enquanto a fundamentação material exige a existência de pressupostos reais e de motivos correctos susceptíveis de suportarem uma decisão legítima quanto ao fundo».
    Ora, no caso a fundamentação da decisão tem o seguinte teor:
(1) - 新業主對其獨立單位享有完全及排他性的物權,並有義務遵守現行法例,確保其物業處於合法的狀態,故須承擔清拆相關違法工程之責任。另外,準業主在購買物業前應事先了解清楚該物業是否存在違法僭建,並與原業主協商清楚處理違法僭建物的責任,否則,新業主將須承擔相關後果。
(2) - 就僭建物,根據《防火安全規章》第十條第四款的規定,樓宇的公共通道被視作樓宇的疏散通道,應保持暢通無阻,此外,上述單位的窗戶及天井,按照第八條第十二款的規定,屬可供進行搶救及滅火工作用之穿人點,不應設置花籠、格柵等固定構件。違法者在題述地點進行之改動,使相關地點在發生火警時,失去了作為疏散通道、穿入點的功能,危及人身及財產的安全。因此,該工程不能被合法化。為著使違法狀況符合都市性法律規範,本局可著令清拆有關工程。地下A單位(CRP:AR/C)的業權人應聘請合資格人士向本局遞交拆卸計劃的申請,同時按工務局已核准圖則回復原狀。
(3) - 工務局在處理非法工程的事務上,一方面需滿足市民的合法訴求,另一方面需考量數量龐大的非法工程與市民的密切性,避免產生社會矛盾,出現混亂。為此,目前因應本澳的實際情況,工務局現時所訂定的策略,對不同的個案作出分類及分級,優先處理翻新及新建或出現殘危的情建物,以及對於僭建物附著的大廈構成危險、或影響消防安全、衛生惡化的情況列作優先處理,目的是要凍結非法工程惡化的情況,同時以先後緩急處理的方式處理舊有僭建物。工務局是按個案處理評級作出跟進,因此,工務局現正有序地對不同個案作出跟進。
    No caso vertente, e atendo-nos à matéria sobre que versou o acto recorrido e ao teor deste, estamos em crer que se mostra suficientemente cumprido aquele dever de fundamentação, do mesmo passo que se nos afiguram descabidas as críticas que a petição de recurso veicula em tal matéria.
Com efeito, resultam claramente indicados os motivos de facto que levaram à catalogação das obras como ilegais, estão arregimentadas as razões que impedem a legalização de tais obras e a consequente necessidade da sua demolição, e está explicada a razão pela qual cabe ao Recorrente a obrigação de demolir. Para além disso, em sede de direito, o acto remete para o quadro normativo do Regulamento de Segurança contra Incêndios e para o direito real de propriedade e suas inerências.
Face ao exposto, o acto revela-se suficientemente claro, aos olhos de um destinatário normal, quanto aos motivos da sua estatuição, não padecendo da obscuridade e da contradição assinaladas pelo Recorrente, pelo contrário, fornece-se ao destinatário o conhecimento do “iter” seguido pela entidade decisora, como tal não merece censura.
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3ª questão: alegada violação do princípio da justiça e da imparcialidade
Finalmente, passemos a ver a terceira questão: alegada violação do princípio da justiça e da imparcialidade (artigo 7º do CPA).
Neste ponto, o Recorrente alega o seguinte:
12. Segundo o despacho recorrido, a DSSOPT classifica diferentes casos, dando prioridade aos de renovação e de construção de novas edificações informais, ou de edificações que apresentem perigos de colapso, bem como aos casos em que as edificações informais ponham em perigo os prédios a que estas se anexem, ou a segurança contra incêndio ou a higiene, com vista a parar a deterioração das obras ilegais e, ao mesmo tempo, abordar os casos de edificações ilegais já existentes em função do seu grau de urgência. No entanto, a fracção sita na vizinhança do recorrente também apresenta tais situações. O respectivo fundamento foi mencionado no recurso hierárquico, só que não foi admitido.
13. Parece ao recorrente que o facto de a Administração não ter exercido equitativamente a sua actividade se mostra imparcial, violando evidentemente o princípio de justiça e imparcialidade.
É uma alegação vaga, desprovida de substância adequada.
Pois, estando provado que as obras não foram autorizadas, nem são obras conformes aos padrões fixados pelo referido Regulamento de Segurança contra incêndios, à Administração Pública resta mandar demolí-las, não se vê como é que se chega à conclusão de que a decisão da Administração Pública viola o princípio da justiça e imparcialidade, sendo certo que a existência de obras ilegais nos prédios vizinhos não permite concluir que a Administração Pública, quando manda o Recorrente a demolir as obras ilegais, viola o referido princípio, salvo se se provar que a Administração trate de obras ilegais de forma desigual sem fundamentos bastantes. Mas no caso não temos estes elementos, nem estes foram concretamente alegados e comprovados.
Repita-se, a existência das obras ilegais nos prédios vizinhos nunca podem constituir fundamento da “legalização” das obras ilegais do imóvel do Recorrente.
Pelo que, improcede a imputação à decisão recorrida o vício da violação do princípio da justiça e da imparcialidade (artigo 7º do CPA).
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    Síntese conclusiva:
    I – Apurando-se a existência de obras não autorizadas no prédio (que violam os artigos 8º/-12) e 10º/-4) do Regulamento de Segurança contra Incêndio, aprovado pelo DL nº 24/95/M, de 9 de Junho), titulado pelo Recorrente, sobre este recai o dever de proceder à demolição de tais obras ou à sua regularização caso estejam reunidos os respectivos requisitos, ainda que tais não foram ordenadas nem executadas pelo Recorrente, enquanto proprietário (obras estas que supostamente foram ordenadas pela ex-proprietária), uma vez que está em causa o interesse público (segurança pública de pejamento e evacuação) que se sobrepõe sobre o interesse particular.
II - As disposições sancionatórias do referido Regulamento (artigos 87.º e seguintes), quando aludem a obras ilegais já concretizadas, desconformes ao Regulamento e causadoras de pejamento ou de obstrução à evacuação, utilizam o termo infractores não apenas para se referirem aos autores ou executores das obras, mas para visarem aqueles que detêm o domínio do espaço e que, por isso, estão em condições de fazer cessar a infracção ou de, pelo contrário, a perpetuar.
III - A fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio acto (ainda que o possa ser de forma remissiva), expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do acto um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação), equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
IV - Com efeito, resultam claramente indicados os motivos de facto que levaram à catalogação das obras como ilegais, estão arregimentadas as razões que impedem a legalização de tais obras e a consequente necessidade da sua demolição, e está explicada a razão pela qual cabe ao Recorrente a obrigação de demolir. Para além disso, em sede de direito, o acto remete para o quadro normativo do Regulamento de Segurança contra Incêndios e para o direito real de propriedade e suas inerências.
V – Face ao exposto, o acto revela-se suficientemente claro, aos olhos de um destinatário normal, quanto aos motivos da sua estatuição, não padecendo da obscuridade e da contradição assinaladas pelo Recorrente, pelo contrário, fornece-se ao destinatário o conhecimento do “iter” seguido pela entidade decisora e como tal a decisão não merece censura.
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     Tudo visto, resta decidir.

* * *
V - DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em julgar improcedente o presente recurso, mantendo-se a decisão punitiva da entidade administrativa recorrida.
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    Custas pelo Recorrente, que se fixa em 6 UCs.
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    Notifique e Registe.
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RAEM, 13 de Setembro de 2018.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
      *
Mai Man Ieng
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