打印全文
Processo nº 395/2018
(Autos de recurso laboral)

Data: 4/Outubro/2018

Assuntos: Falta de elementos
      Liquidação em execução de sentença

SUMÁRIO
Estando provado o direito do Autor e a falta de cumprimento das obrigações assumidas pelas Rés, apenas faltando a prova de alguns elementos necessários para fixar o seu quantitativo, deve o Tribunal relegar para liquidação em execução de sentença.
O n.º 2 do artigo 564.º do Código de Processo Civil reporta-se unicamente aos casos de falta de elementos para fixar o objecto ou a quantidade da condenação, e não faz qualquer distinção entre as situações em que esses elementos não existem no momento da formulação do pedido ou da prolação da sentença e as situações em que a falta desses elementos resulta da falta ou fracasso da prova na acção declarativa.
Sendo assim, em qualquer dessas situações, deve o Tribunal relegar a fixação do respectivo montante em execução de sentença, sempre que não disponha de elementos seguros para fixar o objecto ou a quantidade da prestação devido pelo devedor.
       
       

O Relator,

________________
Tong Hio Fong

Processo nº 395/2018
(Autos de recurso laboral)

Data: 4/Outubro/2018

Recorrente:
- A (Autor)

Recorrido:
- B (1.ª Ré) e C (2.ª Ré)

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I) RELATÓRIO
A intentou junto do Tribunal Judicial de Base da RAEM acção declarativa de processo comum do trabalho, pedindo a condenação das Rés no pagamento do montante de MOP$310.122,50, acrescido de juros legais até efectivo e integral pagamento.
Realizado o julgamento, foi a 2.ª Ré C condenada a pagar ao Autor a quantia de MOP$107.037,50, acrescida de juros moratórios à taxa legal a contar da data da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório até efectivo e integral pagamento.
Inconformado, interpôs o Autor recurso jurisdicional para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual as Rés foram absolvidas do pedido relativamente às quantias reclamadas pelo Autor, ora Recorrente, a título de: subsídio de efectividade, subsídio de alimentação (delimitado apenas quanto à 1ª Ré), compensação pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, devolução da comparticipação no alojamento (delimitado apenas quanto à 1ª Ré) e compensação de trabalho extraordinário por turnos por falta de prova quanto: a) ao valor do salário de base mensal efectivamente pago pelas Rés ao Autor durante todo o período da relação laboral; b) à determinação do período exacto da relação de trabalho entre o Autor e a 1ª Ré.
2. Com o devido respeito, está o ora Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de erro de aplicação de Direito porquanto, em vez de ter absolvido as Rés do pedido, impunha-se que tivesse relegado para liquidação em execução de sentença quer a determinação do período exacto da relação de trabalho entre o Autor e a 1ª Ré quer o valor do salário de base mensal efectivamente pago pelas Rés ao Autor durante todo o período da relação laboral nos termos que resultam do disposto do n.º 2 do art. 564º do CPC, ex vi art. 1º do CPT, razão pela qual deve a mesma ser substituída por outra que proceda em conformidade.
3. Trata-se, de resto, da solução que foi seguida nas outras três decisões proferidas por outros Juízes do Juízo Laboral, tendo por “pano de fundo” a mesmíssima Base Instrutória e, bem assim, a mesmíssima fundamentação à resposta à matéria de facto assente.
Em concreto,
4. Resultando da douta Sentença que: “Segundo os factos dados provados nos autos, no Contrato de Prestação de Serviços 6/2000 celebrado entre a Ré e a Agência de Emprego ficou expressamente estipulado que o Autor teria direito a auferir a quantia de MOP$600.00 mensal a título de subsídio de alimentação e,
5. Ficando provado que durante o período em que o Autor prestou trabalho à 1ª Ré, a 1ª Ré não pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação (…)”.
6. Mais do que a prova da existência do direito, está-se perante uma situação onde apenas não existem os elementos indispensáveis para fixar o seu quantitativo, razão pela qual se impunha ao Órgão decisor ter relegado tal determinação para liquidação em sede de execução de sentença, nos termos que resultam do n.º 2 do art. 564º, o que desde já e para os legais e devidos efeitos se requer.
7. Do mesmo modo, tendo ficado “provado que durante o Autor prestou trabalho à 1ª Ré, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante em 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 1 de Maio e 1 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1ª Ré, mas esta nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios”, em vez de ter absolvido a 1ª Ré do pedido, está o Requerente em crer que o douto Tribunal a quo deveria ter condenado as Rés a pagar ao Autor o valor que vier a ser liquidado em sede de execução de Sentença, nos termos que resultam do n.º 2 do art. 564º, o que igualmente se invoca e requer.
Depois,
8. Resultando da Decisão ora posta em crise que: “Ficou provado que durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento” e a referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego, à semelhança das situações anteriores, está o ora Recorrente em crer que se impunha relegar para liquidação de Sentença o concreto montante devido pela 1ª Ré ao Autor, em vez de ter procedido à sua absolvição da 1ª Ré do pedido, sob pena de a douta Sentença se afastar injustificadamente da solução consagrada no n.º 2 do art. 564º, o que desde já se invoca e requer.
Por último,
9. Resultando da matéria de facto assente que: “Segundo os factos dados provados nos autos, no Contrato de Prestação de Serviços n.º 6/2000 celebrado entre a Ré e a Agência de Emprego ficou expressamente estipulado que o Autor teria direito a auferir um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço, e ficado provado que durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem prejuízo dos descansos semanais e férias anuais por ele gozados. Durante o período em que o Autor prestou trabalho à 1ª Ré não pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade e, entre 22/07/2003 a 31/03/2010, a 2ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade”.
10. Também aqui se impunha ao Tribunal a quo relegar para liquidação de Sentença o concreto montante devido pela 1ª Ré ao Autor, em vez de ter procedido à sua absolvição das Rés do pedido, sob pena de manifesta violação ao disposto no n.º 2 do art. 564º, razão pela qual deve a mesma ser substituída por outra que proceda em conformidade comas regras do Processo, o que desde já se invoca e requer.
Nestes termos e nos de mais de Direito que V. Exas. encarregar-se-ão de suprir, deve a douta Sentença ser substituída por outra, assim se fazendo a já costumada JUSTIÇA!”
*
Ao recurso responderam as Rés nos seguintes termos conclusivos:
“I. Resulta do disposto no n.º 2 do art. 564º do CPC que, na falta de elementos que permitam uma quantificação do dano, deve o tribunal relegar o seu apuramento para execução de sentença.
II. Essa falta de quantificação não poderá decorrer da ausência de prova, na acção declarativa, quanto aos factos sobre o objecto ou a quantidade.
III. O instituto da liquidação de sentença visa quantificar uma condenação anterior, estribada, por um lado, nos pedidos e causa de pedir enunciados pelo Autor ou pelo Réu, e, por outro, pela factualidade dada como provada e não provada e pela aplicação à mesma do direito, sendo dentro dessas precisas e estritas fronteiras que a determinação quantitativa perseguida pelo incidente de liquidação se pode movimentar e emergir, não podendo tal figura ter uma abrangência tal que, apesar da sua índole declarativa, se permita discutir, de novo e com idêntica amplitude, matéria essencial e constitutiva de direitos, que deveria ter sido debatida e demonstrada na acção declarativa propriamente dita e não foi. (Ac. TRL de 24.06.2011, Proc. 2562/04.4TVLSB.L1-6)
IV. In casu, alegava o ora Recorrente no seu petitório que iniciou funções para a 1ª Ré em 04/01/2003, e bem assim que, durante o período em que prestou trabalho as Rés pagaram ao Autor HKD7.500,00 de salário mensal, factos que não logrou provar.
V. Não estamos, assim, perante uma falta de quantificação de algo que se tivesse provado, mas antes de uma total ausência de prova dos factos alegados pelo Recorrente, in casu, factos relacionados com um dos elementos essenciais do contrato de trabalho, isto é, o salário.
VI. E não tendo sido feita a prova dos factos na acção declarativa, não poderá o Recorrente esperar que, a coberto do incidente de liquidação, seja essa matéria novamente submetida a julgamento em sede executiva como se de uma segunda oportunidade se tratasse.
VII. A decisão que relegasse para execução de sentença o apuramento dos sobreditos factos e a admissibilidade do incidente de liquidação constituiria in casu uma ofensa ao caso julgado quando o Recorrente, não obstante ter formulado os seus pedidos com base em factos concretos essenciais para a liquidação dos créditos a que diz ter direito, não os conseguiu provar em sede declarativa.
VIII. Andou bem o Tribunal a quo ao absolver as Rés dos pedidos relativamente às quantias reclamadas a título de subsídio de efectividade, subsídio de alimentação (delimitado apenas quanto à 1ª Ré), compensação pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório, devolução da comparticipação no alojamento (delimitado apenas quanto à 1ª Ré) e compensação pelo trabalho extraordinário por turnos, por total ausência de prova quanto à data do início da relação laboral com a primeira Ré e ao salário mensal auferido, pelo que nada há a apontar à decisão recorrida que fez uma correcta aplicação e interpretação do direito.
Termos em que, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá o recurso a que ora se responde ser julgado improcedente, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação dos 280 trabalhadores não residentes por parte da 1.ª Ré para a 2.ª Ré, com efeitos a partir de 21/07/2003 (Cfr. fls.22 a 24, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (A)
Até 31/07/2011 o Autor exerceu as suas funções para a 2.ª Ré, enquanto trabalhador não residente. (B)
Até 21/07/2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (1.º)
O Autor foi recrutado pela D – e, exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 6/2000 celebrado entre a referida Agência de Emprego e a 1.ª Ré. (2.º)
O referido contrato de prestação de serviço foi objecto de apreciação, fiscalização e renovação por parte da Entidade Pública competente.
O Autor era um dos 280 trabalhadores a que alude o despacho descrito na al. A) dos Factos Assentes. (3.º)
A data do início do Autor da 2ª Ré era de 22/07/2003. (4.º)
Durante toda a prestação de trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pelas Rés. (5.º)
Mais, eram as Rés que fixavam o local e o horário de trabalho do Autor de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades. (6.º)
Durante todo o período de trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e as instruções das Rés. (7.º)
Ao longo do período que prestou trabalho, as Rés apresentaram ao Autor contratos individuais de trabalho, previamente redigidos e cujo conteúdo o Autor se limitou a assinar, sem qualquer negociação. (8.º)
Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor o salário de base mensal. (9.º)
Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços 6/2000, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (10.º)
Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor não deu qualquer falta ao trabalho, sem prejuízo dos descansos semanais e férias anuais por ele gozados. (11.º)
Durante o período em que o Autor prestou trabalho à 1ª Ré, a 1ª Ré não pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (12.º)
Entre 22/07/2003 a 31/03/2010, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (13.º)
Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços 6/2000 celebrado entre a Ré e a Agência de Emprego, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $600.00 patacas mensais por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (14.º)
Durante o período em que o Autor prestou trabalho à 1ª Ré, a 1ª Ré não pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (15.º)
Entre 22/07/2003 a 31/03/2010, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (16.º)
Durante o período em que o Autor prestou trabalho à 1ª Ré, o Autor prestou a sua actividade de segurança em 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 1 de Maio e 1 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1.ª Ré. (17.º)
Durante o referido período de tempo, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (18.º)
Entre 22/07/2003 e 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança em 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 1 de Maio e 1 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 2.ª Ré. (19.º)
Durante o referido período de tempo, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (20.º)
Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HK$750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (22.º)
A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente do Autor residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego. (23.º)
Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia: Turno A: (das 08h às 16h), Turno B: (das 16h às 00h), Turno C: (das 00h às 08h). (24.º)
Durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o Autor sempre respeitou o regime de turnos especificamente fixados pelas Rés. (25.º)
Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo. (26.º)
Em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo, o Autor prestava trabalho durante dois períodos de 8 horas cada num período de 24 horas, sempre que se operasse uma mudança entre os turnos (C-B) e (B-A). (27.º).
As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (28.º)
O Autor gozava anualmente 24 dias de férias anuais, prestando trabalho nos outros dias em cada ano durante a relação de trabalho entre o Autor e a 1ª Ré. (32.º)
O Autor gozava anualmente 24 dias de férias anuais e 52 dias de descanso semanal, prestando trabalho nos outros dias em cada ano durante a relação de trabalho entre a Autor e a 2ª Ré. (33.º)
*
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
*
A questão que se coloca neste recurso é saber se, não logrando o Autor a prova da data a partir da qual ele começou a prestar funções para com a 1.ª Ré, bem como o valor do seu salário mensal, deveriam as Rés ser absolvidas do pedido, ou antes ser condenadas a pagar ao Autor no montante que se vier a liquidar em execução de sentença.
Entende o Autor ora recorrente que o Tribunal a quo devia relegar para liquidação de sentença o concreto montante devido pelas Rés, mas estas defendem que uma vez não ficarem provados todos os factos constitutivos alegados pelo Autor, não há lugar a liquidação em execução de sentença.
A nosso ver, julgamos assistir razão ao recorrente.
Em boa verdade, estando provado o direito do Autor e a falta de cumprimento das obrigações assumidas pelas Rés, apenas faltando a prova de alguns elementos necessários para fixar o seu quantitativo, deve o Tribunal relegar para liquidação em execução de sentença.
Como observa Viriato de Lima, “numa acção de condenação por indemnização por facto ilícito, só é possível a condenação em liquidação em execução, se se provaram todos os pressupostos da responsabilidade civil, embora sem se ter apurado o montante do dano. Se não se provou a existência de danos, impõe-se a absolvição do pedido, não sendo possível condenar o réu no que se liquidar em execução de sentença”.1
Ainda que o valor de indemnização alegado e peticionado pelo autor tenha sido julgado como não provado na fase declarativa, nada obsta a que se proceda à determinação do seu valor exacto na fase de liquidação em execução de sentença.
A jurisprudência portuguesa dominante vai no mesmo sentido, nomeadamente o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 4.12.2003, citado em termos de direito comparado: “O art. 661.º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil (que corresponde ao artigo 564.º, n.º 2 do CPC de Macau), tanto se aplica ao caso de o autor ter formulado inicialmente pedido genérico e não ter sido possível convertê-lo em pedido específico, como ao de ele ter logo formulado pedido específico, mas não se chegarem a coligir dados suficientes para se fixar, com precisão e segurança, o objecto ou a quantidade da condenação, razão pela qual a dedução inicial de pedido líquido não obsta a que a sentença condene em quantia a liquidar em execução de sentença”; e o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 11.10.2017: “Temos, portanto, como certo que tal disposição será aplicável a todos os casos em que o Tribunal, no momento em que profere a decisão, carece de elementos para fixar o objecto ou a quantidade da condenação, seja porque ainda não ocorreram os factos constitutivos da liquidação da obrigação, seja porque, apesar de esses factos já terem ocorrido e terem sido alegados, não foi feita a sua prova”.
Efectivamente, o n.º 2 do artigo 564.º do Código de Processo Civil reporta-se unicamente aos casos de falta de elementos para fixar o objecto ou a quantidade da condenação, e não faz qualquer distinção entre as situações em que esses elementos não existem no momento da formulação do pedido ou da prolação da sentença e as situações em que a falta desses elementos resulta da falta ou fracasso da prova na acção declarativa.
Daí que, em qualquer dessas situações, deve o Tribunal relegar a fixação do respectivo montante em execução de sentença, sempre que não disponha de elementos seguros para fixar o objecto ou a quantidade da prestação devido pelo devedor.
Aliás, desde que esteja demonstrada a existência do direito e respectiva obrigação, mas não sendo possível apurar o valor exacto dos danos, mesmo assim o Tribunal não deve absolver o réu do pedido, antes competindo-lhe julgar equitativamente dentro dos limites que tiver por provados, ao abrigo do n.º 6 do artigo 560.º do Código Civil2.
Como observa Antunes Varela3, “quando sejam determinados os danos a indemnizar, mas não seja possível a fixação do seu valor exacto (não se pode prever, por ex., com segurança, qual irá ser a diminuição da capacidade profissional da vítima do acidente), designadamente por ser impreciso algum dos elementos que influem no cálculo, manda o nº 3 do artigo 566º (que corresponde ao n.º 6 do artigo 560.º do CPC de Macau) que o tribunal julgue segundo critérios de equidade, dentro dos limites provados (se os houver)”.
A jurisprudência portuguesa dominante entende que aquela disposição legal (artigo 566.º, n.º 3 do CC) aplica-se quando, pressupondo a existência de um dano, o seu valor exacto não é possível averiguar, caso contrário, deverá remeter para a execução de sentença.
Assim, das duas uma, ou o tribunal condene no que se liquidar em execução de sentença ou fixe uma quantia certa segundo um juízo de equidade, e a opção por uma ou outra dessas soluções depende do juízo que se formar, em face das circunstâncias concretas de cada caso, sobre a possibilidade de determinação do valor exacto dos danos.
Em face das circunstâncias concretas verificadas no caso vertente, não se vislumbra que a determinação do valor exacto dos danos em sede de liquidação em execução de sentença seja impossível, pelo que procedem as razões do recorrente, devendo as Rés ser condenadas no montante que se vier a liquidar em execução de sentença.
***
III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em conceder provimento ao recurso interposto pelo Autor e, em consequência, condenar as Rés a pagar ao Autor as quantias devidas a título de subsídio de alimentação, compensação dos feriados obrigatórios, comparticipação no alojamento e subsídio de efectividade, no montante que se vier a liquidar em sentença.
Mantém-se a sentença recorrida em tudo o mais.
Custas na proporção do decaimento.
Registe e notifique.
***
RAEM, 4 de Outubro de 2018
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Fong Man Chong
1 Viriato de Lima, Manual de Direito Processual Civil, CFJJ, 2005, pág. 517
2 “Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julga equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”
3 Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 7ª edição, pág. 911 e 912
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------




Processo Laboral 395/2018 Página 17