--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------------
--- Data: 24/09/2018 ---------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. José Maria Dias Azedo -----------------------------------------------------------------
Processo nº 819/2018
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)
Relatório
1. B (B), com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Coloane (E.P.C.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no art. 56° do C.P.M.; (cfr., fls. 158 a 160-v que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).
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Em resposta, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 171 a 172-v).
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Em sede de vista, juntou o Exmo. Representante do Ministério Público douto Parecer pugnando também pela improcedência do recurso; (cfr., fls. 208 a 209).
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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):
– por Acórdão do T.J.B. de 13.07.2012, foi, B, ora recorrente, condenado pela prática como co-autor e na forma continuada de 1 crime de “burla qualificada”, na pena de 9 anos de prisão, e no pagamento solidário, com os outros 6 co-arguidos, da quantia de HKD$23.722.500,00 e juros aos ofendidos dos autos;
– o mesmo recorrente, deu entrada no E.P.C. em 28.07.2011, e em 26.07.2017, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 26.07.2020;
– se lhe vier a ser concedida a liberdade condicional, irá viver com a sua família, em YUNAN, R.P.C..
Do direito
3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do art. 56° do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.
Vejamos.
— Preceitua o citado art. 56° do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:
“1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.
3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. n.° 1).
“In casu”, atenta a pena que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 28.07.2011, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.
Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do n.° 1 do referido art. 56°.
Com efeito, importa ter em conta que a liberdade condicional não é uma “medida de clemência”, constituindo uma medida que faz parte do normal desenvolver da execução da pena de prisão, manifestando-se como uma forma de individualização da pena no fito de ressocialização, pois que serve um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, equilibradamente, recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão; (cfr., v.g., J. L. Morais Rocha e A. C. Sá Gomes in “Entre a Reclusão e a Liberdade – Estudos Penitenciários”, Vol. I, em concreto, “Algumas notas sobre o direito penitenciário”, IV cap., pág. 41 e segs.).
Na esteira do repetidamente decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 17.05.2018, Proc. n.° 337/2018, de 07.06.2018, Proc. n.° 457/2018 e de 16.08.2018, Proc. n.° 765/2018, podendo-se também sobre o tema ver o Ac. da Rel. de Coimbra de 24.01.2018, Proc. n.° 540/16).
Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.
Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?
Mostra-se-nos que de sentido negativo terá de ser a resposta. (Aliás, em 14.09.2018, no âmbito do Proc. n.° 809/2018, proferiu o ora relator idêntica decisão em relação a um outro recluso, co-autor do crime de “burla” pelo qual foi condenado o ora recorrente, e em relação ao qual se verificavam idênticas circunstâncias factuais, o mesmo sucedendo com o Ac. de 20.09.2018, Proc. n.° 818/2018, e o da mesma data desta decisão, prolatado no Proc. n.° 841/2018, em relação a outos dois co-arguidos do ora recorrente).
Com efeito, (e independentemente do demais), face ao tipo de crime pelo ora recorrente cometido, o seu modus operandi, em comparticipação com outros 6 co-arguidos, com execução previamente planeada, e atenta a pena em que foi condenado, a que cumpriu e o período da que falta expiar, e ponderando no prejuízo de HKD$23.722.500,00 causado aos ofendidos dos autos, (em que foi solidáriamente condenado a pagar), há que ponderar na compatibilidade da pretendida libertação com a sua repercussão na sociedade, não se podendo postergar as exigências de tutela do ordenamento jurídico, (cfr., F. Dias in “Dto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 528 e segs.), havendo igualmente que salvaguardar a confiança e as expectativas da comunidade no que toca à validade da norma violada através do “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada”, impondo-se, também por isso, uma reafirmação social mais intensa da validade das normas jurídicas violadas; (cfr., F. Dias in “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 106 e o Ac. da Rel. do Porto de 10.01.2018, Proc. n.° 417/15).
Assim, em face das expostas considerações, e verificado não estando o pressuposto do art. 56°, n.° 1, al. b) do C.P.M., há que confirmar a decisão recorrida.
Decisão
4. Em face do exposto, decide-se rejeitar o presente recurso.
Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 3 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.
Registe e notifique.
Nada vindo de novo, e após trânsito, devolvam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 24 de Setembro de 2018
José Maria Dias Azedo
Proc. 819/2018 Pág. 8
Proc. 819/2018 Pág. 9