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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------------
--- Data: 03/10/2018 ---------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. José Maria Dias Azedo -----------------------------------------------------------------

Processo nº 739/2018
(Autos de recurso penal)

(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)

Relatório

1. B (B), arguido com os restantes sinais dos autos, respondeu, em processo sumário no T.J.B., vindo, a final, a ser condenado como autor da prática de 1 crime de “reentrada ilegal”, p. e p. pelo art. 21° da Lei n.° 6/2004, na pena de 5 meses de prisão; (cfr., fls. 19 a 23 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado, o arguido recorreu, dizendo que excessiva é a pena e que lhe devia ser suspensa na sua execução; (cfr., fls. 29 a 33).

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Respondendo, considera o Ministério Público que o recurso é de rejeitar; (cfr., fls. 35 a 36).

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Admitindo o recurso com efeito e modo de subida adequadamente fixados, vieram os autos a este T.S.I., onde, em sede de vista, juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:

“No presente recurso vêm suscitadas as questões da medida da pena e da suspensão da sua execução.
O recorrente, condenado na pena de prisão de cinco meses, pela prática do crime de reentrada ilegal, previsto e punível pelo artigo 21.° da Lei 6/2004, entende que a pena peca por excesso, com violação dos artigos 40.° e 65.° do Código Penal, atenta a confissão integral que fez dos factos e o que isso representa como arrependimento sincero e determinação em se corrigir, e face à bitola usada em casos semelhantes, em que houve condenações em penas de 4 e 3 meses de prisão. Mais entende que a pena deveria ter sido suspensa na sua execução, o que, não tendo sucedido, importa a violação do artigo 48.° do Código Penal.
Não se crê que tenha razão.
Temos para nós que a douta sentença impugnada não enferma de qualquer excesso na determinação da medida da pena, a qual se mostra consentânea com todos os parâmetros a ter em conta, nomeadamente os do artigo 65.° do Código Penal.
Há que vincar que a confissão, que aliás foi devidamente relevada na sentença, não trouxe, no caso, qualquer contributo ao esclarecimento dos factos essenciais, na perspectiva do preenchimento dos elementos do tipo. O recorrente foi apanhado em Macau numa altura em que estava proibido de entrar na RAEM, o que era do seu conhecimento, nenhuma dúvida se suscitando a esse propósito. Assim, a admissão dos factos e a confissão sem reservas, além de indiferentes para o esclarecimento do ilícito, também não evidenciam um peso relevante ao nível do arrependimento, que justificasse uma considerável atenuação da pena, tanto mais que o arguido entrou clandestinamente decorrido escasso meio ano após a expulsão e a interdição de entrada, como bem salienta o Exm.° colega da 1.ª instância, na sua resposta.
Por outro lado, a invocação de penas menores aplicadas a casos supostamente semelhantes apresenta-se de todo irrelevante. É que, nem está demonstrada a identidade dos casos e dos factores considerados na determinação das penas, nem o acto de determinação da pena constitui uma operação matemática.
Ante as circunstâncias apuradas, o doseamento da pena em cinco meses, ainda abaixo do meio da pena máxima abstracta, não se mostra excessivo. E não é demais lembrar que os parâmetros em que se move a determinação da pena, adentro da chamada teoria da margem de liberdade, não são matemáticos, devendo aceitar-se a solução encontrada pelo tribunal do julgamento, a menos que o resultado se apresente ostensivamente intolerável, por desajustado aos fins da pena e à culpa que a delimita, o que não é o caso.
Por outro lado, não estava aconselhada a suspensão da execução da pena.
O artigo 48.° do Código Penal postula que o tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Trata-se de um poder-dever, que alguns autores denominam de discricionariedade vinculada, sujeito à verificação dos requisitos, formal e material, previstos na norma.
Ora, apesar de se encontrar preenchido o pressuposto formal da suspensão, a factualidade e circunstâncias devidamente ponderadas na sentença apontavam para a inverificação do pressuposto material. Na verdade, não é possível formular um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do recorrente no futuro, quando ele, não sendo primário, violou a proibição de entrada que lhe havia sido imposta escasso meio ano antes, e reentrou motivado por ligações ao jogo, em cujo âmbito fora anteriormente condenado por usura com exigência/aceitação de garantia documental.
Em suma, bem andou o tribunal ao dosear a pena em cinco meses de prisão e ao declinar suspender a sua execução, não merecendo a douta decisão recorrida qualquer reparo, pelo que deve ser negado provimento ao recurso”; (cfr., fls. 80 a 81-v).

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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão “provados” os factos como tal elencados na sentença recorrida a fls. 20-v a 21, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos, (não havendo factos por provar).

Do direito

3. Vem o arguido dos autos recorrer da sentença que o condenou como autor da prática de 1 crime de “reentrada ilegal”, p. e p. pelo art. 21° da Lei n.° 6/2004, na pena de 5 meses de prisão.

Pede a redução da pena que lhe tinha sido aplicada para uma outra não superior a 3 meses de prisão, e suspensão na sua execução.

Sem embargo do muito respeito por outro entendimento, não nos parece que tenha o recorrente qualquer razão, apresentando-se-nos, como já se consignou, de julgar o presente recurso manifestamente improcedente, como infra se passa a tentar explicitar.

Aliás, basta uma mera leitura ao transcrito Parecer do Ministério Público – que aqui também se dá como reproduzido para efeitos de fundamentação da decisão a proferir – para se constatar que o mesmo dá clara e cabal resposta ao presente recurso e se concluir da total falta de razão do recorrente.

Seja como for, não se deixa de consignar o que segue.

–– Pois bem, ao crime de “reentrada ilegal” cabe a pena de prisão até 1 ano; (cfr., art. 21° da Lei n.° 6/2004).

Nos termos do art. 40° do C.P.M.:

“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.

E, em sede de determinação da pena, tem este T.S.I. entendido que “Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 08.02.2018, Proc. n.° 30/2018, de 12.04.2018, Proc. n.° 166/2018 e de 24.05.2018, Proc. n.° 301/2018).

Por sua vez, temos vindo a afirmar que com os recursos não se visa eliminar a margem de livre apreciação reconhecida ao Tribunal de 1ª Instância em matéria de determinação da pena, devendo-se confirmar a pena aplicada se verificado estiver que no seu doseamento foram observados os critérios legais legalmente atendíveis; (cfr., v.g., os Acs. do Vdo T.U.I. de 03.12.2014, Proc. n.° 119/2014 e de 04.03.2015, Proc. n.° 9/2015).

Como decidiu o Tribunal da Relação de Évora:

“I - Também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico, pelo que o tribunal de recurso deve intervir na pena (alterando-a) apenas e só quando detectar incorrecções ou distorções no processo de determinação da sanção.
II - Por isso, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de apreciação livre reconhecida ao tribunal de 1ª instância nesse âmbito.
III - Revelando-se, pela sentença, a selecção dos elementos factuais elegíveis, a identificação das normas aplicáveis, o cumprimento dos passos a seguir no iter aplicativo e a ponderação devida dos critérios legalmente atendíveis, justifica-se a confirmação da pena proferida”; (cfr., o Ac. de 22.04.2014, Proc. n.° 291/13, in “www.dgsi.pt”, aqui citado como mera referência, e Acórdão do ora relator de 26.10.2017, Proc. n.° 829/2017, de 30.01.2018, Proc. n.° 35/2018 e de 10.05.2018, Proc. n.° 265/2018).

No mesmo sentido decidiu este T.S.I. que: “Não havendo injustiça notória na medida da pena achada pelo Tribunal a quo ao arguido recorrente, é de respeitar a respectiva decisão judicial ora recorrida”; (cfr., o Ac. de 24.11.2016, Proc. n.° 817/2016).

E, como se tem igualmente decidido:

“O recurso dirigido à medida da pena visa tão-só o controlo da desproporcionalidade da sua fixação ou a correcção dos critérios de determinação, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso.
A intervenção correctiva do Tribunal Superior, no que diz respeito à medida da pena aplicada só se justifica quando o processo da sua determinação revelar que foram violadas as regras da experiência ou a quantificação se mostrar desproporcionada”; (cfr., o Ac. da Rel. de Lisboa de 24.07.2017, Proc. n.° 17/16).

“O tribunal de recurso deve intervir na pena, alterando-a, apenas quando detectar incorrecções ou distorções no processo de aplicação da mesma, na interpretação e aplicação das normas legais e constitucionais que a regem. Nesta sede, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de actuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do ato de julgar.
A sindicabilidade da pena em via de recurso situa-se, pois, na detecção de um desrespeito dos princípios que norteiam a pena e das operações de determinação impostas por lei. E esta sindicância não abrange a determinação/fiscalização do quantum exacto da pena que, decorrendo duma correcta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionada”; (cfr., o Ac. da Rel. de Guimarães de 25.09.2017, Proc. n.° 275/16).

E, nesta conformidade, tendo-se ponderado tudo o que havia a ponderar evidente é que a pena em questão, que não atinge sequer o meio da moldura, não merece censura, mais não se mostrando de dizer.

–– Nos termos do art. 48° do C.P.M.:

“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.

Sobre a matéria já teve este T.S.I. oportunidade de dizer que:

“O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 26.10.2017, Proc. n.° 762/2017, de 11.01.2018, Proc. n.° 1157/2017 e de 26.04.2018, Proc. n.° 228/2018).

E, como temos também entendido, o instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo, posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 22.06.2017, Proc. n.° 399/2017, de 09.11.2017, Proc. n.° 853/2017 e de 18.01.2018, Proc. n.° 1/2018).

No caso dos autos, e como da matéria de facto dada como provada se retira, o arguido ora recorrente não é primário, tendo já sofrido uma condenação anterior, notando-se, que o crime dos autos foi cometido menos de 3 meses depois da condenação, (cfr., o seu C.R.C., a fls. 15 a 17), e como salienta o Ministério Público, a “escasso meio ano” da proibição de entrada.

Revela, assim, uma total ausência de vontade de aproveitar a oportunidade que lhe foi dada e de se corrigir, levando uma vida em conformidade com as normas de convivência social, demonstrando uma personalidade com tendência para delinquir, tornando, desta forma, evidentes as fortes razões de prevenção criminal especial, (e geral, em virtude do tipo e natureza do crime cometido, que comprometem, de todo, a pretendida suspensão da execução da pena, (de 5 meses de prisão em que foi condenado).

Como igualmente temos vindo a considerar, devem-se “evitar penas de prisão de curta duração”.

Porém, não é de suspender a execução da pena de prisão ainda que de curta duração, se o arguido, pelo seu passado criminal recente, revela total insensibilidade e indiferença perante o valor protegido pela incriminação em causa, continuando numa atitude de desresponsabilização e de incapacidade para tomar outra conduta; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 15.06.2017, Proc. n.° 462/2017, de 01.11.2017, Proc. n.° 948/2017 e de 22.03.2018, Proc. n.° 119/2018).

Dest’arte, há que decidir como segue.

Decisão

4. Em face do exposto, decide-se rejeitar o recurso.

Pagará o arguido a taxa de justiça que se fixa em 3 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, devolvam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 3 de Outubro de 2018

José Maria Dias Azedo
Proc. 739/2018 Pág. 16

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