Processo nº 734/2018
(Autos de recurso laboral)
Data : 29 de Novembro de 2018
Recorrente: A (2ª Ré)
Recorrida : B (Autor)
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Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
B, intentou, em 24/02/2017, junto do Tribunal Judicial de Base da RAEM, acção declarativa de processo comum do trabalho (LB1-17-0048-LAC), pedindo condenar a 2.ª Ré a pagar a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$253,100.00.
Realizado o julgamento, foi proferida a sentença com o seguinte teor na parte decisiva:
Condena-se: a 2.ª Ré a pagar ao Autor, a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$200,907.58, sendo:
- MOP$40,300.00 a título de subsídio de alimentação;
- MOP$69,010.00 a título de subsídio de efectividade;
- MOP$51,757.50 a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento descontadas;
- MOP$26,965.08 pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo;
- MOP$12,875.00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado.
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A A 2.ª Ré, discordando da decisão final, dela veio recorrer para este TSI, em cujas alegações tendo formulado as seguintes conclusões:
I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a 2.ª Ré A, ora Recorrente, no pagamento de, entre outras, uma indemnização no valor global de MOP40,300.00 a título de subsídio de alimentação, acrescida de juros moratórios à taxa legal a contar da data da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório até integral e efectivo pagamento.
II. Entende a Recorrente que a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento, estando em crer que a decisão assim proferida pelo douto Tribunal a quo padece do vício de erro de julgamento e na aplicação do direito.
III. Após audiência e discussão de julgamento o Tribunal deu como provados, entre outros, que: «Entre 22/07/2003 e 25/02/2009, o Autor exerceu as suas funções para a 2.ª Ré (A), enquanto trabalhador não residente. (D); Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de HK$7,500,00, a título de salário de base mensal. (F); Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços 6/2000 celebrado entre a Ré e a Agência de Emprego, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(...) $600,00 patacas mensal por pessoa, a título de subsídio de alimentação” (3.º); Entre 22/07/2003 e 25/02/2009, a 2.ª Ré (A) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (5.º); Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem prejuízo dos descansos semanais e férias anuais por ele gozados. (7.º); O Autor gozava anualmente 24 dias de férias anuais, e 46 dias de descanso semanal, prestando trabalho nos outros dias em cada ano durante a relação de trabalho entre o autor e a 2.ª Ré. (20.º).».
IV. O douto Tribunal a quo condenou a ora Recorrente a pagar ao Autor, ora Recorrido, a quantia de MOP40.300,00 a título de subsídio de alimentação, fundamentando que “Resulta do ponto 3.1. do Contrato de prestação de Serviços 6/2000 celebrado entre a Ré e a Agência de Emprego, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $600,00 patacas mensal por pessoa, a título de subsídio de alimentação”». […] E entre 22/07/2003 e 25/02/2009, a 2.ª Ré (A) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. Assim, o Autor tem direito a receber: período 22/07/2003 e 25/02/2009 (67 meses e 5 dias), o subsídio mensal de MOP$600.00, a quantia indemnizatória de MOP$40,300.00. O Autor tem direito a receber […] e a quantia de MOP$40,300.00 a tal título contra a 2.ª Ré.»”, olvidando-se de, neste apuramento, deduzir os 24 dias de férias anuais e os 46 dias de descanso semanal gozados anualmente pelo Autor, ora Recorrido, durante a sua relação de trabalho com a 2.ª Ré (A), ora Recorrente, que ficaram provados no quesito 20.º da matéria de facto dada como provada.
V. Com o devido respeito está a Recorrente em crer que o Tribunal não podia ter procedido à condenação nos termos em que o fez, pois quer o cômputo do subsídio de alimentação seja feito por mês (MOP600.00 mensal) ou por dia (MOP20.00/dia x 30 dias = MOP600.00) a sua natureza e os fins a que se destina é exactamente o mesmo, ou seja, fazer face a um custo suplementar a suportar por quem trabalha e por quem tem de comer fora de casa ou com custos acrescidos por causa do trabalho, porquanto ainda que calculado com base num valor mensal (MOP600.00/mês) e não num valor diário (MOP20.00/dia) a verdade é que esse acréscimo salarial pressupõe a prestação efectiva do trabalho por parte do seu beneficiário.
VI. Não obstante o subsídio ser no valor mensal de MOP600.00 (seiscentas patacas) a verdade é que só será devido nos dias em que o Autor trabalhou e o facto de no contrato de prestação de serviços 6/2000 se referir a um subsídio mensal de $600.00, tal não impediu que o douto Tribunal a quo calculasse o valor do subsídio de alimentação a pagar para 5 dias, é que tendo ficado provado em relação à ora Recorrente a matéria constante no quesito 20.º, que o Autor gozava anualmente 24 dias de férias anuais e 46 dias de descanso semanal, tais dias têm que ser considerados (descontados) no apuramento para atribuição do subsídio de alimentação a título de indemnização, facto que o Tribunal se olvidou de fazer, estamos em crer que por mero lapso.
VII. Assim, no período de 22/07/2003 a 25/02/2009 o douto Tribunal a quo deveria ter deduzido, aos meses apurados de subsídio mensal a pagar, os 24 dias de férias e os 46 dias de descanso semanal que o Autor gozava em cada ano e durante os quais o Autor não deveria ter direito a subsídio de alimentação, isto porque o subsídio de alimentação, conforme tem vindo a ser entendimento unânime da doutrina e jurisprudência, trata-se de um acréscimo salarial que pressupõe necessariamente a prestação efectiva de trabalho por parte do seu beneficiário.
VIII. Efectivamente, nos termos do Acórdão nº 313/2017 de 29 de Junho do Venerando Tribunal de Segunda Instância, «O subsídio de alimentação ou de refeição depende da prestação efectiva de trabalho, fazendo todo o sentido que assim seja, tendo até em vista a sua natureza e os fins a que se propõe. Destinar-se-á a fazer face a um custo suplementar a suportar por quem trabalha e por quem tem de comer fora de casa ou com custos acrescidos por causa do trabalho. É esta a Jurisprudência deste Tribunal, concretizada no acórdão n.º 376/2012, de 14/6.».
IX. Pelo que, salvo o devido respeito por diferente opinião, tendo ficado provado que o Autor, ora Recorrido, gozava anualmente 24 dias de férias e 46 dias de descanso semanal em cada ano, não poderia o douto Tribunal ter condenado a Recorrente nos termos em que o fez, padecendo assim a douta Sentença, nesta parte, do vício de erro de julgamento e na aplicação do Direito, devendo consequentemente ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do pagamento de compensação dos 24 dias de férias anuais e dos 46 dias de descanso semanal gozados anualmente pelo Recorrido, a título de subsídio de alimentação, verificando-se assim uma contradição evidente entre a matéria de facto dada como provada e a douta fundamentação da decisão em crise.
X. Ressalvando sempre o devido respeito por opinião diversa, parecem não subsistir dúvidas que se encontra a douta sentença ferida de nulidade nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 571º, nº 1, alínea c) do Código de Processo Civil, pelo que deverá a mesma ser revogada nesta parte e substituída por outra que altere a quantia que a ora Recorrente A deverá ser condenada a título de subsídio de alimentação.
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O Autor não respondeu a este recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir
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II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – FACTOS ASSENTES:
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
1. Desde Entre 27/05/2003 a 21/07/2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (C), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (Cfr. Doc. 1). (A.)
2. O Autor foi recrutado pela D – e a partir de 2000 exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 6/2000 (Cfr. Doc. 2). (B.)
3. Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da 1.ª Ré (C) para a 2.ª Ré (A), com efeitos a partir de 21/07/2003. (Cfr. Doc. 3). (C.)
4. Entre 22/07/2003 a 25/02/2009 o Autor exerceu as suas funções para a 2.ª Ré (A), enquanto trabalhador não residente. (D.)
5. Durante todo o período de trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e as instruções das Rés. (E.)
6. Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de HK$7,500.00, a título de salário de base mensal. (F.)
7. Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HK$750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (G.)
8. Durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (H.)
9. Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré (C) num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia: Turno A: (das 08h às 16h), Turno B: (das 16h às 00h), Turno C: (das 00h às 08h). (I.)
10. Resulta do Contratos de Prestação de Serviços 6/2000 celebrado entre a Ré e a Agência de emprego que “(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, as Rés) paga aos operários residentes no Território”. (1.º)
11. Entre 27/05/2003 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas. (2.º)
12. Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços 6/2000 celebrado entre a Ré e a Agência de Emprego, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $600.00 patacas mensal por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (3.º)
13. Entre 27/05/2003 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (4.º)
14. Entre 22/07/2003 e 25/02/2009, a 2.ª Ré (A) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (5.º)
15. Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços 6/2000, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (6.º)
16. Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem prejuízo dos descansos semanais e férias anuais por ele gozados. (7.º)
17. Entre 27/05/2003 a 21/07/2003, a 1.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (8.º)
18. Entre 22/07/2003 a 25/02/2009, a 2.ª Ré (A) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (9.º)
19. Entre 22/07/2003 e 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança em 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias) e 1 de Maio, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 2.ª Ré (A). (10.º)
20. A 2.ª Ré (A) nunca pagou ao Autor qualquer quantia adicional (leia-se, qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (11.º)
21. Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (12.º)
22. A dedução no salário do Autor referida em G) era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego. (13.º)
23. A 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (14.º)
24. Por ordem das Rés, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (15.º)
25. O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos. (16.º)
26. Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor nunca se ausentou do trabalho (isto é, dos locais de reunião) que antecediam em, pelo menos, o início de cada turno. (17.º)
27. As rés nunca atribuíram ao autor uma qualquer garantia salarial pelo período de 30 minutos que antecediam o início de cada turno, e relativamente a qual o autor permaneceu sob as ordens e as instruções das rés. (18.º)
28. O autor gozava anualmente 24 dias de férias anuais, prestando trabalho nos outros dias em cada ano durante a relação de trabalho entre o autor e a 1ª Ré. (19.º)
29. O autor gozava anualmente 24 dias de férias anuais, e 46 dias de descanso semanal, prestando trabalho nos outros dias em cada ano durante a relação de trabalho entre o autor e a 2ª Ré. (20.º)
30. Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo. (21.º)
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IV - FUNDAMENTAÇÃO
Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, importa ver o que o Tribunal a quo decidiu. Este afirmou na sua douta decisão:
B, casado, de nacionalidade nepalesa, residente habitualmente em XXXXXX Nepal, titular do Passaporte do Nepal nº XXXXXX, instaurou contra C, (adiante, C) e A (adiante, A), identificadas melhor nos autos, a presente acção declarativa sob a forma de processo comum, emergente de contrato de trabalho, pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia total de MOP$259,885.00 acrescida de juros legais até integral e efectivo pagamento, assim discriminadas:
2.ª Ré (A):
- MOP$40,920.00 a título de subsídio de alimentação;
- MOP$69,010.00 (equivalente a HK$67,000.00) a título de subsídio de efectividade;
- MOP$51,757.50 (equivalente a HK$50,250.00) a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento descontadas;
- MOP$34,505.00 (equivalente a HK$33,500.00) pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal diário em cada ciclo de 21 dias de trabalho;
- MOP$32,960.00 (equivalente a HK$32,000.00) pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo;
- MOP$23,947.50 (equivalente a HK$23,250.00) a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado.
Tudo com os fundamentos que decorrem da sua petição inicial, que aqui damos por integralmente reproduzidos.
As Rés contestaram, pondo em crise, no essencial, a pretensão do Autor.
Foi elaborado despacho saneador em que se afirmou a validade e regularidade da instância, foi absolvido a 1.ª Ré da instância quanto ao pedido da condenação do montante correspondente às bonificações ou remunerações adicionais e seleccionou-se a matéria de facto relevante para a decisão da causa.
A audiência de julgamento decorreu com observância do formalismo legal, tendo o Tribunal, a final, respondido à matéria controvertida por despacho que não foi objecto de qualquer reclamação pelas partes.
FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Em face da matéria de facto que se mostra provada e do direito que lhe aplicável, cumpre dar resposta às questões a decidir que supra se deixaram enunciadas.
A pretensão do Autor assenta no regime legal de contratação de trabalhadores não residentes regulado no Despacho n.º 12/GM/88 de 01 de Fevereiro, cujas condições mínimas de contratação estarão, segundo defende incorporadas no contrato de prestação de serviços que as Rés celebraram tal como exigido pela alínea c) do n.º 9 desse diploma legal e na qualificação jurídica deste contrato como sendo a favor de terceiro.
Ficou provado que entre 27/05/2003 a 21/07/2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (C), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. O Autor foi recrutado pela D – e a partir de 2000 exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 6/2000. E por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da 1.ª Ré (C) para a 2.ª Ré (A), com efeitos a partir de 21/07/2003. Pois, entre 22/07/2003 a 25/02/2009 o Autor exerceu as suas funções para a 2.ª Ré (A), enquanto trabalhador não residente. Pelo que nesta acção importa analisar o regime legal a que está sujeita a contratação de trabalhadores não residentes, dado que não restarão dúvidas quanto à natureza jus laboral desta relação jurídica.
Relativamente à questão jurídica fundamental, ao enquadramento da relação estabelecida entre as partes outorgantes do mencionado contrato de prestação de serviços e à sua repercussão na esférica jurídica do Autor, o Tribunal de Segunda Instância já firmou jurisprudência unânime no sentido de que estamos na presença de um contrato a favor de terceiro que tem como beneficiário ora Autor, citando-se como exemplo, o Acórdão datado de 25.07.2013, sob o Processo nº 322/2013, cujo sumário parcial aqui nos permitimos reproduzir:
3. É de aplicar a uma dada relação de trabalho, para além do regulado no contrato celebrado directamente entre o empregador e o trabalhador, o regime legal mais favorável ao trabalhador e que decorre de um contrato celebrado entre o empregador e uma Sociedade prestadora de serviços, ao abrigo do qual o trabalhador foi contratado e ao abrigo do qual, enquanto não residente, foi autorizado a trabalhar em Macau, regime esse devidamente enquadrado por uma previsão normativa constante do Despacho 12/GM/88, de 1 de Fevereiro.
4. A Lei de Bases da Política de Emprego e dos Direitos Laborais, Lei n.º 4/98/M, de 27 de Julho, publicada no BO de Macau n.º 30, I série, no artigo 9.° admite a contratação de trabalhadores não residentes quando se verifiquem determinados pressupostos, estatuindo que essa contratação fica dependente de uma autorização administrativa a conceder individualmente a cada unidade produtiva.
5. O Despacho 12/GM/88 cuida tão somente do procedimento administrativo conducente à obtenção de autorização para a contratação de trabalhadores não residentes e não do conteúdo concreto da relação laboral a estabelecer entre os trabalhadores não residentes e as respectivas entidades patronais.
6. O trabalhador só foi contratado porque a Administração autorizou a celebração daquele contrato, devidamente enquadrado por um outro contrato que devia ser celebrado com uma empresa fornecedora de mão-de-obra e onde seriam definidas as condições mínimas da contratação, como flui do artigo 9º, d), d.2) do aludido despacho 12/GM/88.
7. Estamos perante um contrato a favor de terceiro quando, por meio de um contrato, é atribuído um benefício a um terceiro, a ele estranho, que adquire um direito próprio a essa vantagem.
8. Esta noção está plasmada no artigo 437º do CC, aí se delimitando o objecto desse benefício que se pode traduzir numa prestação ou ainda numa remissão de dívidas, numa cedência de créditos ou na constituição, transmissão ou extinção de direitos reais.
9. Será o que acontece quando um dado empregador assume o compromisso perante outrem de celebrar um contrato com um trabalhador, terceiro em relação a esse primitivo contrato, vinculando-se a determinadas estipulações e condições laborais.
10. O facto de a empregadora ter assumido a obrigação de dar trabalho, tal não é incompatível com uma prestação de contratar, relevando aí a modalidade de uma prestação de facere.
Assim sendo, sem necessidade de outras considerações, como parte beneficiária do contrato de prestação de serviços dado como assente o Autor tem direito a prevalecer-se do clausulado mínimo deles constantes para reclamar eventuais diferenças remuneratórias e complementos salariais a que tinha direito e que não lhe foram pagos.
Debrucemo-nos, pois, sobre os pedidos do Autor.
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Subsídio de alimentação
Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços 6/2000 celebrado entre a Ré e a Agência de Emprego, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $600.00 patacas mensal por pessoa, a título de subsídio de alimentação”.
Ficou provado que entre 27/05/2003 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. E entre 22/07/2003 e 25/02/2009, a 2.ª Ré (A) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação.
Assim o Autor tem direito a receber:
Período
Meses
Subsídio mensal
Quantia indemnizatória
27/05/2003 a 21/07/2003
1 meses 26 dias
MOP$600.00
MOP$1,120.00
22/07/2003 a 25/02/2009
67 meses 5 dias
MOP$600.00
MOP$40,300.00
O Autor tem direito a receber a quantia de MOP$1,120.00 a título de subsídio de alimentação contra a 1.ª Ré, e a quantia de MOP$40,300.00 a tal título contra a 2.ª Ré.
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Subsídio de efectividade
Segundo os factos dados provados nos autos, no Contrato de Prestação de Serviços n.º 6/2000 ficou expressamente estipulado que o Autor teria direito a auferir um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço.
Ficou provado que durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem prejuízo dos descansos semanais e férias anuais por ele gozados.
Porém, entre 27/05/2003 a 21/07/2003, a 1.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. E entre 22/07/2003 a 25/02/2009, a 2.ª Ré (A) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade.
Termos em que, o Autor tem direito a receber as quantias calculadas segundo a fórmula: número dos meses de cada período X o salário diário X 4 dias:
Período
Meses
Salário diário X 4
Quantia indemnizatória
27/05/2003 a 21/07/2003
1 meses 26 dias
HKD$250.00 X 4
MOP$1,922.67
22/07/2003 a 25/02/2009
67 meses 5 dias
HKD$250.00 X 4
MOP$69,181.67
Assim, o Autor tem direito a receber a quantia de MOP$1,922.67 a título de subsídio de efectividade contra a 1.ª Ré, e a quantia de MOP$69,181.67 a tal título contra a 2.ª Ré.
Conforme o princípio dispositivo, deve a 2.ª Ré pagar-lhe a quantia global no montante de MOP$69,010.00.
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Compensação pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado
O Autor pretende ser indemnizado pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado, no período decorrido desde 22/07/2003 a 31/12/2008.
Ficou provado que entre 22/07/2003 e 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança em 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias) e 1 de Maio, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 2.ª Ré (A), mas esta nunca pagou ao Autor qualquer quantia adicional (leia-se, qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios.
Segundo o artigo 19.º, nºs 2 e 3, nos feriados obrigatórios os trabalhadores, que tenham completado o período experimental, devem ser dispensados da prestação de trabalho, e os trabalhadores esses têm direito à retribuição correspondente aos feriados de 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 1 de Maio e, 1 de Outubro.
O artigo 20.º do Decreto-Lei 24/89/M de 3 de Abril dispõe, no seu nº1, que se o trabalhador prestar trabalho nos dias de feriados obrigatórios remunerados na situação prevista na al. c) do mesmo, o trabalhador terá direito a auferir, para além da remuneração normal do dia de trabalho prestado, a um acréscimo salarial não inferior ao dobro da retribuição normal.
Assim sendo, para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado pelo trabalhador em feriados obrigatórios remunerados, mas somente a partir de 3 de Abril de 1989, vista a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 24/89/M, a fórmula há-de corresponder ao “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal”, para além do próprio salário normal em singelo, caso tenha que trabalhar nesses feriados, a despeito da regra da dispensa obrigatória de prestação de trabalho. Somando o singelo, no fundo vai receber no total triplo da retribuição normal (salário singelo + acréscimo salarial ao dobro da retribuição normal).
Há, todavia, que ponderar a circunstância de a 2.ª Ré ter pago o valor em singelo, pelo que aos valores apurados se tem de deduzir o montante pago em singelo pela 2.ª Ré, assim o Autor só terá direito a auferir mais o dobro da sua retribuição.1
Vejamos, então, quais os valores que deveriam ter sido pagos a este trabalhador e não foram, partindo dos valores de retribuição diários que lhe eram devidos, segundo a fórmula (Salário diário) x (nº de dias de feriado obrigatório não gozados) x 2.
Período
Salário diário X 2
Nº de dias de trabalho prestado em feriados obrigatórios remunerados
Quantia indemnizatória
22/07/2003 a 31/12/2008
HKD$250.00X2
25
MOP$12,875.00
Assim, deve a 2.ª Ré pagar ao Autor a quantia de MOP$12,875.00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado.
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Devolução da comparticipação no alojamento
Ficou provado que aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HK$750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. E a dedução no salário do Autor referida era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego.
Dispunha o artigo 9.º do Despacho 12/GM/88, de 1 de Fevereiro que: O procedimento para a admissão de mão-de-obra não-residente observará os trâmites seguintes: (…) d.1. Garantia, directa ou indirecta, de alojamento condigno para os trabalhadores.
Prevê-se na al. a) do artigo 9.º do DL n.º 24/89/M que é proibido ao empregador obrigar o trabalhador a adquirir ou a utilizar serviços fornecidos pelo empregador ou por pessoa por ele indicada.
Com entrada em vigor da Lei n.º 7/2008 desde 1 de Janeiro de 2009, o seu artigo 10.º, al. 5) também prevê que é proibido ao empregador obrigar o trabalhador a adquirir bens ou a utilizar serviços fornecidos directamente por si ou por pessoa por si indicada.
De onde tem o Autor direito a receber a devolução da comparticipação nos custos de alojamento:
Período
Meses
Devolução mensal
Quantia indemnizatória
27/05/2003 a 21/07/2003
1 meses 26 dias
HKD$750.00
MOP$1,442.00
22/07/2003 a 25/02/2009
67 meses 5 dias
HKD$750.00
MOP$51,886.25
Assim, deve a 1.ª Ré pagar ao Autor a quantia de MOP$1,442.00 a título de devolução da comparticipação no alojamento e, deve a 2.ª Ré pagar ao Autor a quantia de MOP$51,886.25 a mesmo título.
Conforme o princípio dispositivo, deve a 2.ª Ré pagar-lhe a quantia global no montante de MOP$51,757.50.
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Compensação de trabalho extraordinário por turnos
Segundo os factos dados provados, durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. No concreto, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré (C) num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia: Turno A: (das 08h às 16h), Turno B: (das 16h às 00h), Turno C: (das 00h às 08h). Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo.
Daqui resultava que, entre o fim da prestação de trabalho no turno C (00h às 08h) e o início da prestação de trabalho no turno B (16h às 00h), o Autor prestava 16 horas (correspondente a dois períodos de 8 horas cada) de trabalho num período total de 24 horas.
E, entre o fim da prestação de trabalho no turno B (16h às 00h) e o início da prestação de trabalho no turno A (8h às 16h) o Autor prestava a sua actividade num total de 16 horas de trabalho (correspondente a dois períodos de 8 horas cada) num período total de 24 horas.
A 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo.
Segundo o artigo 11.º, nº2 do Decreto-Lei 24/89/M de 3 de Abril, nos casos de prestação de trabalho extraordinário, o trabalhador terá direito a um acréscimo de salário, do montante que for acordado entre o empregador e o trabalhador.
Sem dúvida que o Autor prestava a sua actividade num total de 16 horas de trabalho num período total de 24 horas (00h às 00h do dia seguinte) quando trocou o turno C (00h às 08h) ao turno B (16h às 00h).
No tocante à situação do turno B (16h às 00h) ao turno A (8h às 16h), apesar do Autor prestar a sua actividade num total de 16 horas de trabalho num período total de 24 horas, no entanto, em bom rigor, entendemos que, nesta situação, o Autor prestava os dois períodos de 8 horas cada prestado num dia (00h às 00h do dia seguinte). Ou seja, quando trocou ao turno A (8h às 16h), o Autor trabalhava por este turno no dia seguinte, mas não no mesmo dia do turno B (16h às 00h). Por isso, não se trata do trabalho extraordinário.
Além disso, apesar de, durante o referido período de tempo, o Autor sempre respeitar o regime de turnos especificamente fixados pela 2.ª Ré, o Autor gozava anualmente 24 dias de férias anuais, e 46 dias de descanso semanal, prestando trabalho nos outros dias em cada ano durante a relação de trabalho entre o Autor e a 2ª Ré.
Isto é, não existe a questão de que o Autor prestava a sua actividade num total de 16 horas de trabalho num período total de 24 horas, durante a relação de trabalho entre o Autor e a 2.ª Ré, porque os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade após um período contínuo de sete dias.
Nestes termos, e tendo em conta os 24 dias de férias anuais por cada ano gozados pelo Autor, tem o Autor direito a receber a tal título:
Período
Horas
Salário horário
Quantia indemnizatória
27/05/2003 a 21/07/2003
2 dias X 8 horas
HK$31.25
MOP$515.00
Assim perfaz num total de MOP$515.00, montante esse deve ser pago pela 1.ª Ré.
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Compensação de trabalho extraordinário de 30 minutos antes do início de cada turno
Ficou provado que por ordem das Rés, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos, período durante o qual o Autor estava sujeito às ordens e às instruções das Rés. No entanto, as Rés nunca atribuíram ao Autor uma qualquer quantia salarial pelo período de 30 minutos que antecediam o início de cada turno.
O artigo 10.º, nº4 do Decreto-Lei 24/89/M dispõe que os períodos fixados no n.º 1 não incluem o tempo necessário à preparação para o início do trabalho e à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados, desde que no seu conjunto não ultrapassem a duração de trinta minutos diários.
Ou seja, se ultrapasse a duração de trinta minutos diários, verificando se a prestação de trabalho extraordinário, tem o trabalhador direito a receber um acréscimo de salário, nos termos do artigo 11.º, nº2 do Decreto-Lei 24/89/M.
Com entrada em vigor da Lei n.º 7/2008 desde 1 de Janeiro de 2009, o seu artigo 33.º, n.ºs 1 e 5 prevê que, o período normal de trabalho não pode exceder oito horas por dia e quarenta e oito horas por semana, e os períodos referidos não incluem o tempo necessário à preparação para o início do trabalho e à conclusão de transacções, actividades e serviços começados e não acabados, desde que no seu conjunto não ultrapassem a duração de trinta minutos por dia.
De acordo com o artigo 37.º, nº1 da mesma Lei, a prestação de trabalho extraordinário nos termos da alínea 1) do n.º 1 do artigo anterior confere ao trabalhador o direito a auferir a remuneração normal do trabalho prestado com um acréscimo de 50%.
Portanto, tendo em conta os dias de férias anuais e de descanso semanal pelo Autor gozados, ele tem direito a receber:
Período
N.º de dia de trabalho efectivo
Salário horário
Quantia indemnizatória
27/05/2003 a 21/07/2003
52+2 dias2
HKD$31.25
MOP$869.06
22/07/2003 a 31/12/2008
1608 dias
HKD$31.25
MOP$25,878.75
01/01/2009 a 25/02/2009
45 dias
HKD$46.875
MOP$1,086.33
Assim, deve a 1.ª Ré pagar ao Autor a quantia de MOP$869.06 pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo, e a 2.ª Ré pagar ao Autor a quantia de MOP$26,965.08.
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Juros moratórios
Às quantias supra mencionadas acrescerão juros a contar da data da decisão judicial que fixa o respectivo montante3, atento o que dispõe o artigo 794.º, nº4 do CC, dado que por estarmos na presença de um crédito ilíquido, os juros moratórios, só se vencem a contar da data em que seja proferida a decisão que procede à liquidação do quantum indemnizatório.
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DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, julga-se a acção parcialmente procedente e em consequência condena-se:
- a 1.ª Ré a pagar ao Autor, a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$5,868.73, sendo:
- MOP$1,120.00 a título de subsídio de alimentação;
- MOP$1,922.67 a título de subsídio de efectividade;
- MOP$1,442.00 a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento descontadas;
- MOP$515.00 pelas 8 horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho em cada ciclo de 21 dias de trabalho;
- MOP$869.06 pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo; e
- a 2.ª Ré a pagar ao Autor, a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$200,907.58, sendo:
- MOP$40,300.00 a título de subsídio de alimentação;
- MOP$69,010.00 a título de subsídio de efectividade;
- MOP$51,757.50 a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento descontadas;
- MOP$26,965.08 pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo;
- MOP$12,875.00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado.
Às quantias supra mencionadas acrescerão juros moratórios à taxa legal a contar da data da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório até integral e efectivo pagamento.
Absolve-se no mais as Rés do pedido.
As custas serão a cargo das Rés e do Autor na proporção do respectivo decaimento.
Registe e notifique.
* * *
Neste recurso, única questão que a Recorrente (A, Ré na primeira instância) suscitou é a da forma de calcular o subsídio de alimentação seguida pelo Tribunal a quo.
Este decidiu na seguinte forma:
Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços 6/2000 celebrado entre a Ré e a Agência de Emprego, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $600.00 patacas mensal por pessoa, a título de subsídio de alimentação”.
Ficou provado que entre 27/05/2003 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. E entre 22/07/2003 e 25/02/2009, a 2.ª Ré (A) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação.
Assim o Autor tem direito a receber:
Período
Meses
Subsídio mensal
Quantia indemnizatória
27/05/2003 a 21/07/2003
1 meses 26 dias
MOP$600.00
MOP$1,120.00
22/07/2003 a 25/02/2009
67 meses 5 dias
MOP$600.00
MOP$40,300.00
O Autor tem direito a receber a quantia de MOP$1,120.00 a título de subsídio de alimentação contra a 1.ª Ré, e a quantia de MOP$40,300.00 a tal título contra a 2.ª Ré.
Quid Juris?
Ora, neste ponto há de atender o conteúdo da cláusula 3.1 do contrato junto aos autos (fls. 19), que tem o seguinte teor:
3.1. Os trabalhadores a que se refere o presente contrato auferirão salário idêntico ao nível médio dos salários praticados para desempenho equivalente, num mínimo de $3,600.00 patacas mensal, acrescida de $600.00 patacas mensal por pessoa, a título de subsídio de alimentação.
É de ver que o subsídio de alimentação é também pago na unidade de mensal! E não por dias. É este critério que as partes fixaram no respectivo acordo! Pelo que, há de respeitá-lo.
Nesta óptica, não encontramos nenhum vício no aresto posto em crise pela Recorrente/Ré (A).
Pelo exposto, é da nossa conclusão que o Tribunal a quo fez uma análise ponderada dos factos e uma aplicação correcta das normas jurídicas aplicáveis, tendo proferido uma decisão conscienciosa e legalmente fundamentada, motivo pelo qual, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 do CPC, é de manter a decisão recorrida.
*
Em síntese conclusiva:
I - Por força da autonomia contratual, no caso de as partes fixarem que o subsídio de alimentação é pago na unidade de mensalidade, é este critério que deve ser atendido em termos de cálculo, quando o trabalhador vem reclamar o subsídio em causa.
II – Situação diferente será aquela em que as partes acordaram que o subsídio de alimentação seja pago por dia, então há-de apurar o número de dias em que o trabalhador laborou efectivamente para poder receber este subsídio em causa.
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Tudo visto, resta decidir
* * *
V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao recurso interposto, mantendo-se a sentença recorrida.
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Quanto ao demais, mantém-se o já decidido.
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Custas pela Recorrente nesta instância.
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Registe e Notifique.
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RAEM, 29 de Novembro de 2018.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 Cf., neste preciso sentido, Acórdão do TUI de 21 de Setembro de 2008, onde, avaliando uma situação semelhante envolvendo a aqui Ré nos presentes autos, afirma: « ... Quer isto dizer que a lei atribui uma remuneração nunca inferior ao dobro da normal, que acresce a esta, pelo que bem decidiu o Acórdão recorrido ter o trabalhador direito ao triplo da retribuição diária, já que não se provou terem as partes acordado uma remuneração superior para tal trabalho. Mas, como o autor já foi pago em singelo, terá, agora, direito ao dobro da retribuição.»
2 Como mencionado supra, o Autor prestava dois turnos em 2 dias durante o período entre 27/05/2003 a 21/07/2003.
3 Com pertinência também para este caso, a jurisprudência do Acórdão do Tribunal de Última Instância no processo n.º 69/2010 de 02/03/2011.
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