Processo nº 528/2018
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 08 de Novembro de 2018
Recorrente: A (1ª Ré)
Recorrido: B (Autor)
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - RELATÓRIO
Por sentença de 27/02/2018, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a 1ª Ré A a pagar ao Autor B a quantia de MOP$435,967.55 e a 2ª Ré C a pagar ao Autor a quantia de MOP$9,108.10, acrescida de juros moratórios à taxa legal.
Dessa decisão vem recorrer a 1ª Ré, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
- Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a Ré A, ora Recorrente, no pagamento de uma indemnização no valor global MOP$435.967,55, acrescida de juros moratórios à taxa legal a contar do trânsito em julgado da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório,
- Entende a Recorrente que a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu, em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento estando em crer que a decisão assim proferida pelo douto Tribunal de Primeira Instância é nula por omissão de pronúncia, mostrando-se ainda inquinada pelo vício de erro na aplicação do direito, Nulidade por condenação superior ao peticionado no que respeita à compensação pelo subsídio de efectividade, nulidade por falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do Autor ora, Recorrido.
- A decisão recorrida padece do vício de nulidade por omissão de pronúncia porquanto não conheceu a excepção de prescrição invocada pela aqui Recorrente em sede de contestação e cujo conhecimento fora relegado para decisão final, conforme resulta do despacho saneador de fls 191 e ss.
- Tivesse o Tribunal recorrido apreciado a prescrição nos termos invocados pela aqui Recorrente e todos os créditos anteriores a 18 de Fevereiro de 2001 teriam sido julgados prescritos com as demais consequências legais.
- A decisão recorrida é assim nula nos termos conjugados do artigo 563º, nº 2 e 571º, nº 1 alínea d) do CPC ex vi art. 1º do CPT, devendo assim ser revogada e substituída por outra que julgando procedente a excepção de prescrição invocada pela aqui Recorrente em sede de contestação, julgue prescritos todos os créditos reclamados anteriormente a 18 de Fevereiro de 2001 e em consequência absolva a aqui Recorrente dos créditos peticionados pelo Autor entre 29 de Março de 1997 e 18 de Fevereiro de 2001.
- O Tribunal a quo não estava em condições de condenar a Recorrente no pagamento de qualquer indemnização a título de subsídio de alimentação.
- Apenas se provou que durante o período em que o Recorrido trabalhou para a Recorrente nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (9.º), sem que se tenha apurado, por exemplo, quando esteve o Recorrido ausente ainda que justificadamente.
- Não se comprovou que entre 29/3/1997 e 31/12/2006 o Recorrido trabalhou 1018 dias como parece ressaltar da fórmula de cálculo de fls. 411 pelo que nunca poderia a Recorrente ter sido condenada a pagar o subsídio de alimentação desses dias.
- O que se provou foi que durante o período em que o Recorrido prestou trabalho nunca deu qualquer falto ao trabalho, sem conhecimento e autorização prévio por porte dos Rés (cfr. resposta ao quesito 9.º), resultando assim assumido pelo Recorrido na sua petição que se gozou de vários períodos de dispensa ao trabalho remuneradas e/ou não remuneradas (cfr. artigo 38º).
- O direito invocado pelo Autor não se pode presumir como certo, e o Tribunal terá que apreciar com base nos factos alegados pelo Autor e conforme o Direito, o que não fez, sendo que a parca matéria fáctica alegada pelo Autor não poderia conduzir, sem mais, à procedência do pedido;
- Não se trata apenas de determinar o número de dias de trabalho efectivo e o número de ausência, mas antes de determinar quais os dias em que o trabalho foi prestado, cabendo o ónus da prova ao Autor.
- O subsídio de alimentação, conforme tem vindo a ser entendimento unânime da doutrina e jurisprudência, trata-se de um acréscimo salarial que pressupõe necessariamente a prestação efectiva de trabalho por parte do seu beneficiário (vide, entre outros, o acórdão proferido pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância em 13.04.2014 no processo 414/2012);
- Não tendo sido alegados nem provados os factos essenciais de que depende a atribuição do mencionado subsídio de alimentação, ou seja, a prestação efectiva de trabalho, não poderia o douto Tribunal ter condenado a Recorrente nos termos em o fez, padecendo assim a douta Sentença, nesta parte, do vício de erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito, devendo consequentemente ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do pagamento de compensação a título de subsídio de alimentação, ou caso assim não se entenda, que tão-somente condene a Recorrente a pagar ao Recorrido compensação a título de subsídio de alimentação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no nº 2 do artigo 564º do CPC.
- A condenação da Recorrente no pagamento da quantia de MOP$30.400,00 a título de compensação pelo subsídio de efectividade ultrapassa o peticionado pelo Autor.
- Se é certo que resultou provado que o Autor auferia a remuneração mensal de HKD7,500.00 - o que equivale a uma remuneração diária de HKD250.00 - não é menos certo que o mesmo limitou o seu pedido de compensação pelo subsídio de efectividade a MOP$400 (quatrocentas patacas) por mês [MOP100 x 4].
- O Autor foi claro ao computar o seu pedido de compensação pelo subsídio de efectividade com base na remuneração diária de MOP$100 (cem patacas).
- A sentença Recorrida não podia ter efectuado o computo da indemnização com base no salário diário de MOP257.50 (duzentos e cinquenta e sete patacas e cinquenta avos) porquanto tal ultrapassa o peticionado pelo Autor.
- A decisão recorrida é assim nula nesta parte, atento o preceituado na alínea e) do nº 1 do artigo 571º do CPC.
- Da factualidade provada nada resulta quanto ao quantum e ao quando o Recorrido trabalhou para que se pudesse chegar à conclusão que o Recorrido tem direito a ser compensado por 282 dias de descansos semanais;
- Não obstante da decisão recorrida ressaltar que "os factos assentes demonstram que além das férias anuais de 24 dias que o Autor gozou todo os anos durante o período que trabalhou para a 1.ª Ré, o Autor não tem qualquer registo de ausência ao trabalho" a verdade é que da factualidade provada não resulta a falta de ausências.
- Não se provou, nem tão pouco se alegou, o número de dias concretos que o Recorrido trabalhou para se poder concluir pelo número de dias de descanso semanal que deixou de gozar.
- Novamente se mostra insuficiente a matéria de facto apurada nos presentes autos que permitisse ao Tribunal condenar a Recorrente pelo alegado trabalho prestado em dias de descanso semanal.
- A quantificação de qualquer montante estará dependente do concreto apuramento ou não de dias de descanso não gozado, factualidade não apurada.
- Verifica-se, assim, uma errada aplicação do Direito por parte do Tribunal a quo na condenação da Recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, em violação do princípio do dispositivo consagrado no artigo 5.º do CPC e, bem assim, o disposto nos artigos 17.º do DL 24/89/M
- O mesmo raciocínio se aplica à condenação da recorrente ao pagamento de uma compensação pelo alegado trabalho prestado em feriados, porquanto, estando provadas as dispensas ao trabalho ainda que autorizadas e justificadas e apesar dos registos emitidos pelos Serviços de Migração indicarem as entradas e saídas do Recorrido no território, não pode o Tribunal a quo, a partir destes registos, considerar que os mesmos possam substituir o registo de assiduidade do Recorrido.
- Estando provado que o Recorrido dava faltas ao serviço sem que estejam definidos em que dias foram tais faltas dadas, como pode o Digno Tribunal a quo saber que tais faltas ou ausências não tenham ocorrido em algum dos feriados obrigatórios?
- Verifica-se, assim, uma errada aplicação do Direito por parte do Tribunal a quo na condenação da Recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, em violação do princípio do dispositivo consagrado no artigo 5.º do CPC e, bem assim, o disposto no artigo 19.º do DL 24/89/M.
- Deverá assim a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado quanto à compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, respectivo descanso compensatório e pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, ou que tão-somente condene Recorrente a pagar ao Recorrido compensação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n.º 2 do artigo 564.º do CPC.
- No que diz respeito à reclamação das compensações reclamadas pela prestação de trabalho em regime de turno e trabalho extraordinário, incluindo 30 minutos, à semelhança do ocorrido com os demais pedidos, o Recorrido limitou-se a invocar factos genéricos.
- O Recorrido não especifica datas, dias de trabalho efectivamente prestado, quando é que tais turnos coincidiam e quais os dias, não sendo por isso possível apurar quais as horas que o Recorrido teria trabalhado a mais ou a menos, dada a falta de alegação do Autor, ora Recorrido e de prova em julgamento;
- Se se comprovou que o Recorrido dava faltas ao serviço (ainda que justificadas) e se o próprio alegou que lhe era permitido ausentar-se numa média de 30 dias, sem que se tenha provado quantas foram essas ausências, não se vislumbra como pôde o Tribunal determinar com certeza quais os dias em que estava de turno e quantas horas extraordinárias foram feitas por dia.
- Não se provou em concreto quantos dias o Autor prestou a sua actividade pelo que não se pode com certeza afirmar quantos ciclos de 21 dias de trabalho continuo e consecutivo prestou entre 29 de Março de 1997 e 21 de Julho de 2003.
- Do mesmo modo não se vislumbra como pode o Tribunal determinar com certeza que no período entre 29/03/1997 e 21/07/2003 o Recorrido trabalhou 2158 dias conforme resulta da fórmula de calculo de fls 416v.
- Motivo pelo qual também aqui o Tribunal andou mal ao condenar a Recorrente, em violação do artigo 5.º do CPC e do artigo 10.º do DL 24/89/M, devendo assim ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado, ou que tão-somente condene 1.ª Recorrente a pagar ao Recorrido compensação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n.º 2 do artigo 564.º do CPC.
- A decisão em crise padece do vício de falta de fundamentação sendo, consequentemente nula, nos termos do artigo 571.º, n.º 1, al. b), do CPC, por manter na íntegra as conclusões incoerentes aduzidas pelo Autor em sede de petição inicial, ficando por apurar diversas questões relacionadas como o facto de o Autor alegar que trabalhava todos os dias da semana mas reconhecer que faltou algumas vezes com autorização prévia das Rés, sem que se apure quantos dias foram, faltando-lhe concretizar os factos de onde retira tais conclusões.
- O que o Tribunal a quo não podia fazer foi o que fez, ou seja, factualizar as conclusões do Autor (não suportadas em factos) e os factos incoerentes e contraditórios que se mantêm na íntegra.
- Esta decisão, por essa razão, padece também de vício de falta de fundamentação decorrente do ónus de alegação por parte do Recorrido, sendo, por isso, nula.
- Não é só o número de dias de trabalho efectivo e do número das ausências que estará em causa, mas ainda a determinação de quais os dias em que o trabalho foi prestado pelo que se impõe a anulação do julgamento.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
1. Entre 29 de Março de 1997 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (A).
2. O Autor foi recrutado pela sociedade ECONFORCE- Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. – e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contracto de Prestação de Serviços n.º 5/96, aprovado pelo Despacho n.º 687/IMO/SAEF/96, de 25/03/96 (B).
3. O referido contracto de prestação de serviço foi objecto de apreciação, fiscalização e aprovação por parte da Entidade Pública competente (C).
4. Resultada do ponto 3.1 do Contracto de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contractados) a quantia de “ (…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação (D).
5. Resultada do ponto 3.4 do Contrato de Prestação de Serviço nº 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço (E).
6. Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação dos 280 trabalhadores não residentes por parte da 1.ª Ré para a 2.ª Ré, com efeitos a partir de 21/07/2003 (cf. fls. 42 a 45, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) (F).
7. Entre 22/07/2003 e 13/11/2003, o Autor esteve ao serviço da 2.ª Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (G).
8. Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pelas Rés (H).
9. Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e as instruções das Rés (I).
10. Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de HKD7.500,00 a título de salário de base mensal (J).
11. Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pelas Rés (1.º).
12. Os locais de trabalho do Autor eram fixados de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades (2.º).
13. Ao longo do período que prestou trabalho, as Rés apresentaram ao Autor contractos individuais de trabalho, previamente redigidos e cujo conteúdo o Autor se limitou a assinar, sem qualquer negociação (3.º).
14. Os contractos individuais de trabalho apresentados ao Autor eram idênticos para os demais trabalhadores não residentes, guardas de segurança do Nepal (4.º).
15. Entre 29/03/1997 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação” (5.º).
16. Entre 29/03/1997 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros (6.º).
17. Entre 22/07/2003 e 13/11/2003, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação (7.º).
18. Entre 22/07/2003 e 13/11/2003, o Autor prestou a sua actividade nos Casinos que não disponibilizavam comida nas cantinas (8.º).
19. Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés (9.º).
20. Entre 29/03/1997 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade (10.º).
21. Entre 22/07/2003 e 13/11/2003, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade (11.º).
22. Entre 29/03/1997 e 31/12/2002, a 1.ª Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, nem um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição (12.º).
23. Entre 29/03/1997 e 31/12/2002, o Autor prestou a sua actividade de segurança por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1.ª Ré” (13.º).
24. Entre 29/03/1997 e 31/12/2002, a 1.ª Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal (14.º).
25. Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau (15.º).
26. Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento (16.º)
27. A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente do Autor residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agencia de emprego (17.º).
28. Entre 29/03/1997 e 21/07/2003, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante alguns dias não identificados em dias de feriados obrigatórios, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1.ª Ré (18.º).
29. Durante o referido período de tempo, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios (19.º).
30. Entre 22/07/2003 e 13/11/2003, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante alguns dias não identificados em dias de feriados obrigatórios, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 2.ª Ré (20.º).
31. Durante o referido período de tempo, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatório (21.º).
32. Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia (22.º):
Turno A : (das 08h às 16h)
Turno B : (das 16h às 00h)
Turno C : (das 00h às 08h)
33. Durante todo o período da relação de trabalho com a 1.ª Ré, o Autor sempre respeitou o regime de ternos especificamente fixados pela 1.ª Ré (23.º).
34. Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo (24.º).
35. Em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo, o Autor prestava trabalho durante dois períodos de 8 horas cada num período de 24 horas, sempre que se operasse uma mudança entre os tunos (C-B) e (B-A) (25.º).
36. A 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo (26.º).
37. Por ordem das Rés, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno (27.º).
38. Durante os 30 minutos que antecediam o início de cada turno, os superiores hierárquicos do Autor distribuíram o trabalho pelos guardas de segurança (leia-se do Autor), v.g., indicando-lhe o seu concreto posto (local dentro do casino onde o mesmo se devia colocar), os clientes tidos por “suspeitos”, sendo ainda feito um relato sobre todas as questões de segurança a ter em conta no interior do Casino, ou mesmo da necessidade de qualquer participação em ventos especiais (28.º).
39. O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos (29.º).
40. Cumprindo as ordens e as instruções que lhe eram emendas pelos seus superiores hierárquicos (30.º)
41. 兩名被告的訴訟代理人在2015年06月12日曾與原告訴訟代理人達成13宗案件的和解協議 (37.º - 43.º).
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III – FUNDAMENTAÇÃO
1. Da nulidade da sentença por falta de fundamentação:
Entendem a 1ª Ré que a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação uma vez que não contém todos os factos necessários para a sua condenação dos créditos reclamados a título dos subsídios de alimentação, da compensação da prestação das horas extraordinárias, dos dias de descanso semanal, incluindo os respectivos dias de descano compensatório, e dos feriados obrigatórios não gozados, especialmente não tendo alegado e provado o nº de dias de trabalho efectivo e o nº de dias do descanso semanal e dos feriados obrigatórios não gozados.
Sobre a questão suscitada, a jurisprudência (Ac. de 29/06/2017, Proc. nº 326/2017) recente deste TSI é no sentido seguinte:
“…Invoca-se uma insuficiente fundamentação e afigura-se-nos que a Ré, ora recorrente, tem razão, na medida em que o Mmo Juiz se terá baseado num cômputo de dias que vêm alegados pelo A., não se alcançando em que bases se louvou para o seu cálculo.
A recorrente coloca bem a questão, ao imputar o vício à sentença proferida - independentemente do enquadramento jurídico efectuado – nos seguintes termos:
“(…) a decisão em crise padece do vício de falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do Recorrido já que mantém na íntegra as conclusões incoerentes feitas na petição inicial, mantendo por responder a questões/vícios tais como: (i) ter o Autor trabalhado todos os dias da semana, embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da 1ª Ré; (ii) Quantos foram esses dias de faltas justificadas e quando foram gozados os 24 dias de férias anuais? (iii) Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o autor concede na nota 1 ao art. 22° da petição inicial? Que factos suportam esta conclusão?”
De certa forma pode-se dizer que o Mmo Juiz terá efectuado o seu cálculo com base na alegação do A. que ressalva na nota ao art. 27º da p.i. de que o A. não trabalhou 30 dias por cada ano civil, após o desconto do tempo relativo à prescrição. Mas se se se baseia nesse pressuposto de facto, logo a douta sentença peca por não se saber em que bases assentou essa fixação da matéria de facto – presumida apenas a partir da fundamentação de direito na sentença proferida, já que essa factualidade não está concretizada no capítulo em que se dá por assente a matéria de facto -, sendo certo que se trata de matéria que foi impugnada pelo A. e é certo que o A. não trabalhou durante todo o período em que esteve ao serviço da A., de forma ininterrupta, pois foi autorizado a ausentar-se. Dir-se-á que que o período de ausência era de 30 dias por ano. Mas onde está a comprovação de que assim era e que assim era de facto? O A. alegou e formulou o pedido nessa base, mas comprovou-o?
Estamos em crer que essa incompleição não pode deixar de ser suprida, havendo que aditar, se necessário, o ou os quesitos necessários referentes à concretização dos dias de trabalho efectivo prestado e desconto dos 30 dias em cada ano, tal como alegado na nota ao artigo 27º da p.i.
Embora se acolha a linha jurisprudencial mais permissiva, no sentido de que sempre que o tribunal verificar o dano ou a prestação devida, mas não tiver elementos para fixar o seu valor, quer se tenha pedido um montante determinado ou formulado um pedido genérico, lhe cumpre relegar a fixação do montante indemnizatório para liquidação em execução de sentença, ao abrigo do disposto no art. 564º/2 do CPC1 - mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade ao autor que tenha deduzido pedido líquido de provar o quantitativo devido, não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal, na medida em que a existência de danos já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor e só no caso de se não ter provado a existência de prestação devida é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto no posterior incidente de liquidação, estando subjacente a esta jurisprudência a ideia de que razões de justiça e de equidade impedem que se absolva a demandada uma vez demonstrada a sua obrigação -, a situação presente não consentirá essa via, na exacta medida em que houve já uma liquidação e o apuramento de uma base de cálculo, não se tendo o Mmo Juiz limitado a uma enunciação genérica de trabalho prestado não apurado.
Ainda que que não se enjeite essa possibilidade, numa recondução a um completamento de matéria de facto, estamos em crer que a presente solução aponta para uma necessidade de exigência e de rigor, desde logo, para as próprias partes - muitas nem sequer aqui permanecendo, porventura desinteressando-se dos seus direitos aquando da cessação dos contratos, visto até o tempo entretanto decorrido -, não podendo elas facilitar na concretização e prova das prestações que dizem estar em dívida. Quanto se diz não retira de forma nenhuma o reconhecimento à tutela dos direitos dos trabalhadores que tenham sido violados, apenas se pretendendo a sua cooperação e responsabilização na realização da Justiça.
Perante esta insuficiência, perante esta incompreensão sobre a forma como se atingiu aquele facto com que se jogou no cálculo efectuado, mais do que a falta a que alude o art. 571º, b) do CPC estaremos perante a situação prevista no art. 629º, n.º 4 do mesmo Código, o que implica a anulação da decisão proferida na parte relativa à concretização de quais e quantos os dias considerados no cálculo efectuado pelo Mmo Juiz, tendo em conta a necessidade de saber os dias concretos de trabalho e ausência para se poderem determinar as diferentes compensações. Ou seja, por exemplo, para efeitos de compensação de feriados obrigatórios, como está bem de ver, só há compensação se houve trabalho nesses dias. Mas independentemente dessa necessidade concretização, contemplada aliás, na decisão proferida, há uma outra quantificação que se tem de provar.
Compreende-se que possa não ser fácil, mas aí o A. tem o ónus de provar, não se podendo remeter para uma alegação conclusiva de que trabalhou todos os dias menos 30 por ano. Tem de provar que assim foi e esmerar-se na prova que produz. Admite-se que essa alegação seja pobre, mas não se deixa de considerar que ela ainda consubstancia um facto que se mostra essencial e como tal tem de ser comprovado, na certeza de que o tribunal não pode suprir de todo a insuficiência de alegação das partes.
Daqui decorre que, em todos os momentos em que ao longo da fundamentação expendida fazíamos alusão à necessidade de apurar o número de dias, se conclui que esse apuramento deve ser efectuado em sede de repetição do julgamento na parte pertinente e já não em sede de liquidação em execução de sentença, na medida em que se fica por perceber como se encontrou o número de dias de base do cálculo, descontados os dias de ausência, matéria que não foi levada à base instrutória, mas, ainda que incipientemente, foi alegada.”
No caso em apreço, o Tribunal a quo considerou que o Autor no período entre 29/07/1997 a 21/07/2003 gozou 146 férias anuais e deu 2 dias de faltas justificadas, a saber (pág. 11 da sentença recorrida):
Férias anuais
14/07/1998 – 07/08/1998 25 dias
13/07/1999 – 05/08/1999 24 dias
21/03/2000 – 13/04/2000 24 dias
30/06/2001 – 21/07/2001 22 dias
23/03/2002 – 16/04/2002 25 dias
06/03/2003 – 29/03/2003 24 dias
Faltas justificadas
02/09/1998 – 03/09/1998 2 dias
Contudo, não conseguimos encontrar tais factos no elenco dos factos assentes e provados constantes da sentença recorrida.
Assim, somos a reiterar o que já anteriormente decidimos sobre esta matéria no sentido de anular parcialmente o julgamento de facto de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios, determinando a repetição do mesmo.
2. Da condenação superior ao pedido em relação ao subsídio de efectividade:
Alega a 1ª Ré que a sua condenação no pagamento da quantia de MOP$30.400,00 a título de subsídio de efectividade ultrapassa o peticionado pelo Autor, pelo que a sentença recorrida é nula nesta parte nos termos da al. e) do nº 1 do artº 571º do CPCM.
Não tem mínima razão, na medida em que o montante condenado é justamente igual ao valor peticionado pelo Autor.
Por outro lado, ainda que seja superior por hipótese, tal condenação é legalmente permitida nos termos do nº 3 do artº 42º do CPT.
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Tudo visto, resta decidir.
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IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em conceder parcial provimento ao recurso interposto pela 1ª Ré, decidindo-se:
a) anular parcialmente o julgamento de facto de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios, determinando a repetição do mesmo; e
b) julgar não provido o recurso na parte restante, em consequência do que se mantém a sentença recorrida, nomeadamente na parte concernente à liquidação a que já procedeu quanto ao subsídio de efectividade e à comparticipação no alojamento.
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Vai a 1ª Ré ainda condenada nos juros de mora nos termos definidos no Ac. do TUI, de 02/03/2011, Proc. nº 69/2010.
Custas pelas partes em função do decaimento no final.
Notifique e D.N..
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RAEM, aos 08 de Novembro de 2018.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
1 Na linha de uma interpretação pioneira de Alberto dos Reis, CPC Anot, V, 71
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528/2018