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Processo nº 610/2018
(Autos de recurso cível)

Data: 1/Novembro/2018

Assunto: Regulação do exercício do poder paternal
Regime de visitas

SUMÁRIO
O processo de regulação do poder paternal tem por objecto decidir o destino dos filhos, fixar os alimentos a estes devidos e a forma da respectiva prestação, bem assim fixar o regime de visitas no tocante ao progenitor a quem não são confiados os filhos – artigo 1760.º do Código Civil.
Na falta de consenso, decidirá o Tribunal de acordo com o interesse dos menores, por forma a garantir a sua estabilidade psicológica e emocional, assegurando-lhes um sadio desenvolvimento a nível físico, psíquico, afectivo, moral e social.
Ponderando a circunstância de que a mãe tem mantido maior ligação quotidiana com a menor, andou bem o Tribunal recorrido ao indeferir que esta viaja com o pai sem a presença da mãe, enquanto não atinge certa maturidade.
       
O Relator,

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Tong Hio Fong

Processo nº 610/2018
(Autos de recurso cível)

Data: 1/Novembro/2018

Recorrente:
- B

Recorrida:
- C

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I) RELATÓRIO
B, requerido nos autos de regulação do exercício do poder paternal que correm termos no Juízo de Família e de Menores do Tribunal Judicial de Base (doravante designado por “recorrente”), inconformado com a decisão que regulou o exercício do poder paternal da filha menor, na parte relativa à fixação do regime de visitas, recorreu jurisdicionalmente para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“a) Vem o presente recurso interposto da sentença de 26/02/2018 que regulou o poder paternal da menor, DXX, filha do recorrente, B, e da requerente e ora recorrida, C.
b) Essencialmente, discorda o recorrente da decisão, porquanto, com o devido respeito, a mesma não acautela, ao contrário do que expressamente refere, “os laços afectivos que (a menor) tem com o pai e a necessidade de os fortalecer …”.
c) Isto é, a decisão do Tribunal “a quo” – não obstante, não tem dúvidas o recorrente, acautelar essencialmente os superiores interesses da menor D, no tocante ao “poder paternal” e à “pensão de alimentos” – olvida, com o devido respeito, uma situação deveras importante: a menor veio viver para Macau sem autorização do pai, o qual foi “apanhado de surpresa” por esta alteração de facto.
d) Na verdade, toda esta alteração foi motivada pela recorrida que, como se refere nos factos assentes, “em Agosto de 2016 … deslocou-se com a menor de Portugal, ocorrendo a separação do casal”; e “… recusa-se a regressar a Portugal por não ter emprego e não ter suporte económico da família”.
e) Mas, não obstante esta situação, o Tribunal “a quo”, com o devido respeito, não acautela devidamente os necessários contactos do recorrente com a menor, para, como diz, “fortalecer os contactos afectivos com o pai”.
Bem pelo contrário, o Tribunal “a quo” “delega” na recorrida a decisão quanto ao convívio mais próximo do recorrente com a filha, decidindo expressamente que “a saída da menor (de Macau) com o requerido só pode ser realizada através do acompanhamento da requerente ou com sua autorização por escrito”.
f) O ora recorrente tem tido contacto com a menor; é uma pessoa afável e de fino trato; e tem todas as condições para ter a menor consigo, em privado, fazendo-se acompanhar da mesma, dentro e for de Macau, sem a imposta presença da recorrida.
g) O recorrente fica, assim, - para que as “férias escolares de Natal, Ano Novo Chinês, Páscoa e Verão (sejam) partilhadas com cada um dos progenitores, em períodos iguais …” – vinculado a gozar férias em Macau; ver-se impostamente acompanhado da mãe da menor; ou, então, aguardar que esta autorize que o pai saia de Macau na companhia da menor.
h) Mas o recorrente e a menor têm direito a privar, não só entre si, mas também com a família do recorrente, em Portugal.
A família da menor não se circunscreve à família da mãe.
i) Entende, por isso, o recorrente que o Tribunal “a quo” impõe um regime deveras penalizador para aquilo que é, declaradamente, o superior interesse da criança em privar com o pai, após a imposta separação deste.
j) Por outro lado, é referido expressamente na sentença recorrida que, “o superior interesse da criança passa, em primeiro lugar, por manter e fortalecer a relação de afectividade que tem com a mãe”.
Entende o recorrente que esta relação da menor com a mãe já está verdadeiramente cimentada, o que resulta do facto de a menor sempre ter vivido, e viver, “com a requerente à guarda e aos cuidados desta”.
k) Bem pelo contrário, a única relação que carece de fortalecimento – e que, como tal, deveria merecer, toda a atenção por parte do Tribunal “a quo” – é a relação da menor com o pai, a quem de um momento para outro, foi subtraída, passando a viver, sem a sua autorização, no “outro lado do mundo”.
l) Minimizar este distanciamento é mister do Tribunal.
Não pode, por isso, ser “delegado” na mãe da menor.
m) Assim, a sentença recorrida deveria ter fixado um “regime de férias” que fomentasse o convício da menor com o pai, em Portugal e com a família residente em Portugal e não, como faz, com o devido respeito, reduzindo a família da menor à mãe e à avó.
n) O superior interesse da menor, nos presentes autos, não colide de forma alguma, e já, com um “regime de férias” que permita ao seu pai, o ora recorrente, um são convício com a sua filha, independentemente da autorização da mãe, a ora recorrida.
o) Assim, manda o bom senso que, desde já, fique assente que o pai da menor, o ora recorrente, poderá gozar, no mínimo, as suas férias anuais na exclusiva companhia da menor, em Portugal ou onde quer que seja, estabelecendo-se o seguinte regime que, na óptica do recorrente, em nada colide com os “superiores interesses da menor”:
- Até 30 de Abril de cada ano, o pai comunicará à mãe qual o seu período de férias;
- O pai fica obrigado a comunicar à mãe, previamente, quais os locais onde ficará instalado com a menor, D;
- O pai fica obrigado a ir pessoalmente a Macau “buscar” a sua filha menor, para assim viajar na sua companhia;
- O pai fica obrigado a conviver com a menor, em Macau e antes de viajar, pelo período mínimo de 3 dias, a fim de restabelecer laços antes de viajar;
- O pai poderá viajar com a menor para Portugal, nas suas férias anuais, pelo período máximo de 30 dias;
- Findo o período de férias, o pai fica obrigado a ir “levar” a sua filha a Macau, viajando na sua companhia; e
- Caso a mãe entenda ser necessária a sua presença junto da menor, durante as viagens a realizar, o pai fica obrigado a custear o preço das viagens da mãe, ao lado e na mesma classe da menor;
Mostram-se violadas, pela decisão recorrida, as normas constantes do art.º 9º, n.º 3 da “Convenção dos Direitos das Crianças”, aplicável em Macau (Aviso do Chefe do Executivo n.º 5/2001, de 4/1); e o art.º 1760º, n.º 1 do CC.
Pelo que, como supra referido, deverá ser dado provimento ao presente recurso. Assim e fazendo JUSTIÇA!”
*
Ao recurso respondeu a recorrida, formulando as seguintes conclusões alegatórias:
“1) Andou bem a douta Sentença do Tribunal a quo ao atribuir o poder paternal à Requerente, aqui Requerida, e, bem assim, ao definir o regime de visitas e férias aí indicados e ao dividir as férias escolares entre os progenitores, a acordar anualmente entre estes, submetendo no entanto a saída da menor de Macau com o Recorrente, ao acompanhamento da mãe ou à autorização por escrito desta.
2) Não corresponde à verdade a alegação do Recorrente segundo a qual a menor veio viver para Macau sem autorização do pai, o qual foi “apanhado de surpresa” por esta alteração de facto.
3) O douto Despacho do Ministério Público de 31 de Julho de 2017, constante dos presentes autos, confirma claramente que não houve qualquer ilicitude na deslocação da Recorrida com a menor para Macau, porquanto a custódia da menor não foi atribuída a qualquer dos progenitores por um tribunal.
4) Face à lei de Macau, especificamente ao artigo 1765º, n.º 1 e 2 do CC, sendo a menor filha de pais não casados, presume-se que o exercício do poder paternal cabe à mãe que aliás, sempre a teve sob a sua guarda, pelo que bem decidiu o Despacho do Ministério Público supracitado ao afastar qualquer necessidade de autorização do pai da menor para que a Recorrida viesse com a sua filha para Macau, como pretende o Recorrente.
5) Quanto à alegação destemperada do Recorrente segundo a qual “[a Recorrida] veio para Macau; continua a não ter emprego; e não participa com um “único centavo” nas despesas mensais da menor…”, tal como resulta da fundamentação de facto da referida Sentença, a Recorrida encontra-se em Macau pois é aqui que tem a sua Família e goza do apoio desta, e é em Macau que pretende prosseguir com a sua vida, encontrando-se presentemente a frequentar, com excelente rendimento académico, o curso de direito na Universidade de Macau.
6) Por sua vez, o Recorrente apenas em Agosto de 2017 começou a efectuar pagamentos para ajudar na alimentação da menor, após muita insistência da Recorrida e dos seus mandatários junto do Recorrente e seus mandatários, pelo que não deixa de ser curiosa a alegação de que a Recorrida não participa com um “único centavo” nas despesas mensais da menor quando foi o próprio Recorrente quem negligenciou tal obrigação durante mais de um ano!
7) As alegações do Recorrente segundo as quais este “(…) tem todas as condições para ter a menor consigo, em privado, fazendo-se acompanhar da mesma, dentro e fora de Macau, sem a imposta presença da recorrida” opõem-se em absoluto à factualidade apurada em sede de Sentença.
8) De facto, e conforme resulta dos pontos 5) e 15 da fundamentação de facto, a menor sempre viveu e vive à guarda e aos cuidados da Recorrida, relevando-se “(…) agradada com a companhia da requerente mostrando-se alegre e satisfeita com a presença desta”.
9) Já quanto ao Recorrente, a douta Sentença a quo considerou no ponto 13) da fundamentação de facto que “Desconhecem-se as condições sociais do requerido por o mesmo não ter colaborado para o seu apuramento, tendo o mesmo referido na conferência de pais (…) que caso a menor lhe fosse entregue, teria de contratar uma empregada por não ter apoio dos seus pais que residem no Algarve”.
10) O Recorrente é jogador de futebol, não se encontrando presentemente a viver em Portugal, mas sim em Doha, Qatar (cfr. ponto 12) da fundamentação de facto), pelo que, pela sua própria ocupação profissional, não consegue oferecer a estabilidade ou disponibilidade que uma criança de tenra idade como a menor requer.
11) Pelo exposto, improcedem em absoluto os argumentos esgrimidos supra pelo Recorrente, concluindo-se pela improcedência do presente recurso e mantendo-se na íntegra a douta decisão recorrida.
12) O Recorrente opõe-se ainda ao facto de a saída da menor de Macau apenas poder ter lugar através de acompanhamento da Recorrida ou com a sua autorização por escrito, pedindo in fine que lhe seja permitido gozar “(…) as suas férias anuais na exclusiva companhia da menor, em Portugal ou onde quer que seja (…)”.
13) Tal entendimento revela não só um profundo desconhecimento do exercício do poder paternal que, sublinhe-se, foi atribuído em exclusivo à Recorrida e mãe da menor, como também faz tábua rasa do superior interesse da criança – especificamente, de uma criança de tão tenra idade – em benefício do direito do pai (e a sua família em Portugal) em privar com a menor.
14) Andou bem a douta Sentença a quo ao determinar que, caso o Recorrente se encontre em Macau, tem este o direito de conviver e pernoitar com a filha, após comunicação à Recorrida com a devida antecedência e salvaguardados o repouso e estudo da menor.
15) Ainda, nada há a apontar à douta Sentença a quo quanto ao gozo de férias escolares da menor, divididas entre os progenitores em períodos iguais, a acordar anualmente entre estes, ressalvando no entanto que a saída da menor de Macau com o Recorrente só poderá ocorrer caso esteja acompanhada pela mãe ou autorizada por esta, por escrito.
16) Tal salvaguarda deve-se, como é evidente, à tenra idade da menor, que ainda não completou três anos e que, por conseguinte, carece de ser acompanhada pela mãe e, bem assim, requer uma assistência e acompanhamento estáveis nos seus primeiros anos de vida.
17) Sendo esta assistência e presença estável assegurada por sua mãe, que, como foi bem decidido pela douta Sentença a quo, é “(…) o progenitor com quem tem maior ligação quotidiana, sendo a mãe a sua figura de referência enquanto o país ou a região onde o pai reside por motivos de profissão não é estável, entretanto, se a menor não alcançar um certo grau de maturidade, ela pode não estar familiarizada com o pai que não é o auxiliar primário por um longo tempo.” (cfr. fls. 262 da douta Sentença)
18) Inversamente, o Recorrente não vive em Portugal (onde se encontrará a sua família) mas sim no Dubai e, por mor da sua ocupação profissional, poderá, de ano para ano, mudar de local de equipa de futebol, o que colide com o superior interesse de estabilidade e de crescimento e desenvolvimento harmónico da menor.
19) Acresce que, atendendo à profissão do Recorrido e à separação, desde tenra idade da menor, entre os progenitores, a habituação da menor ao Recorrido não poderá ser feita de maneira brusca, impondo a presença do pai à menor sem a presença da mãe, com quem, retome-se, sempre viveu e convive quotidianamente.
20) Assim, e como bem refere a douta Sentença, “(…) somente após o requerido [aqui Recorrente] ter mantido contacto relativamente longo com a menor, e terá um consenso de confiança mútua e certa colaboração com a requerente [aqui Recorrida] e ganhará certa confiança da menor, ele pode sair sozinho com a menor e garantir o seu regresso ao local de origem, Macau”, zelando deste modo pelo crescimento harmonioso da criança.
21) Antes disso, compete à Recorrida, enquanto mãe, zelar pelo superior interesse da menor, nos termos do artigo 1733º, n.º 1 do CC, pelo que é perfeitamente natural que seja a titular do poder paternal quem ajuíze da conveniência da sua filha (que ainda não fez três anos) em viajar nos moldes requeridos pelo Recorrente, os quais carecem de qualquer lógica e defendem tão-somente o direito do pai em conviver com a criança, em claro prejuízo do superior interesse desta.
22) Refira-se, ainda, que a douta Sentença a quo não impede que o Recorrente, a prazo, possa viajar com a sua filha nos termos apresentados pelo Recorrente, procurando apenas que, para se chegar a tal ponto, o convívio entre a menor e o Recorrente seja feito progressivamente, no respeito do superior interesse da criança, e com o propósito do Recorrente “ganhar a confiança da menor”.
23) Conforme resulta do Princípio 6º da Declaração dos Direitos da Criança (Proclamada pela Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas n.º 1386 (XIV), de 20 de Novembro de 1959), “salvo em circunstâncias excepcionais, a criança de tenra idade não deve ser separada da sua mãe”.
24) Tal princípio, aliado à considerável distância de Macau, onde reside a menor, relativamente a Portugal e ao Qatar (ou a qualquer outro local onde se encontre o Recorrente), e ainda à ocupação profissional do pai, ora Recorrente, obriga que a saída da menor de Macau, nos primeiros anos de vida, esteja sujeita à decisão da Recorrida enquanto titular do poder paternal.
25) Conquanto o artigo 9º, n.º 3 da Convenção sobre os Direitos das Crianças salvaguarde o direito da criança (e não o direito do progenitor) de manter regularmente relações pessoais e contactos directos com ambos os pais, tal direito está subordinado ao interesse superior da criança.
26) O qual, in casu, e como bem decidiu o douto Tribunal a quo, exige um convívio progressivo entre a menor e o Recorrente, com o propósito do Recorrente “ganhar a confiança da menor”, sob a tutela de quem detém o poder paternal.
27) Por fim, acaso o Recorrente considere que, volvidos alguns anos, a regulação do poder paternal carecer de ser revista, poderá requerer nova regulação do exercício do poder paternal, nos termos do artigo 122º, n.º 1 do Decreto-lei n.º 65/99/M, de 25 de Outubro.
28) Em conclusão, nada há a apontar à douta Sentença a quo, que arbitrou da melhor forma a regulação do poder paternal da menor DXX, zelando pelo superior interesse desta.
29) Pelo que se requer a Vossas Excelências se dignem julgar improcedente o recurso apresentado pelo recorrente, mantendo-se na íntegra a douta decisão recorrida, assim se fazendo a costumada Justiça.”
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Corridos os vistos, cumpre decidir.
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
A requerente e o Requerido tenham vivido juntos durante cerca de 3 anos em Portugal, nunca contraíram casamento;
Em 28 de Julho de 2015, nasceu DXX em Portugal;
Em Agosto de 2016, a requerente, deslocou-se com a menor de Portugal para Macau, ocorrendo a separação do casal;
A requerente recusa-se a regressar a Portugal por não ter emprego e não ter suporte económico da família;
A menor sempre viveu, e vive, com a requerente, à guarda e aos cuidados desta;
A menor mora em Macau com a requerente e avó materna em casa por esta arrendada pela renda mensal de HKD$11.800,00, tendo a casa com boas condições de habitabilidade;
A avó materna reside em Macau e é directora da escola infantil portuguesa, auferindo o salário mensal MOP$30.000,00;
A requerente é residente permanente da Região Administração Especial de Macau;
A requerente frequenta o curso de Direito na Universidade de Macau;
A requerente dá explicações adicionais da língua portuguesa em tempo parcial e ganha o vencimento irregular de MOP$3.000,00;
A requerente e a menor são sustentadas pela avó materna;
O requerido, sendo jogador de futebol profissional, não se encontra a viver em Portugal, vivendo e trabalhando actualmente em Doha, Qatar, auferindo o salário mensal de cerca de 9,000 Euros;
Desconhecem-se as condições sociais do requerido por o mesmo não ter colaborado para o seu apuramento, tendo o mesmo referido na conferência de pais declarou que caso a menor lhe fosse entregue, teria de contratar uma empregada por não tem apoio dos seus pais quem residem no Algarve;
O requerido deslocou-se a Macau para visitar a menor em Dezembro de 2016 e em Junho de 2017;
A menor mostra-se agradada com a companhia da requerente mostrando-se satisfeita e alegre com a presença desta;
O requerido mantém contacto com a menor via facetime ou Internet quando não se encontra em Macau;
Desde agosto de 2017, o requerido começou a pagar 400 a 500 Euros por mês para alimentação da menor;
A menor irá começar a frequentar o Jardim de Infância desde Setembro do ano lectivo em curso, cuja propina anual entre MOP$36.000,00 e MOP$83.000,00 consoante diferente escola que frequentará;
A menor necessita de alimentação incluindo leite em pó com o custo de cerca de MOP$1.000,00 por mês;
Despesa mensal para o vencimento da empregada é MOP$4.000,00;
Em consultas médicas a menor despende mensalmente cerca de MOP$500,00.
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Vem o recorrente opor-se ao regime de visitas fixado pelo Juízo de Família e de Menores, defendendo que, com vista a fortalecer os laços afectivos com o pai, ora recorrente, não deveria impor a presença da mãe nas viagens a Portugal ou onde quer que seja, pedindo a alteração do regime de visitas nos seguintes termos:
- Até 30 de Abril de cada ano, o pai comunicará à mãe qual o seu período de férias;
- O pai fica obrigado a comunicar à mãe, previamente, quais os locais onde ficará instalado com a menor;
- O pai fica obrigado a ir pessoalmente a Macau “buscar” a sua filha menor, para assim viajar na sua companhia;
- O pai fica obrigado a conviver com a menor, em Macau e antes de viajar, pelo período mínimo de 3 dias, a fim de restabelecer laços antes de viajar;
- O pai poderá viajar com a menor a Portugal, nas suas férias anuais, pelo período máximo de 30 dias;
- Findo o período de férias, o pai fica obrigado a ir “levar” a sua filha a Macau, viajando na sua companhia; e
- Caso a mãe entenda ser necessária a sua presença junto da menor, durante as viagens a realizar, o pai fica obrigado a custear o preço das viagens da mãe, ao lado e na mesma classe da menor.
Salvo o devido respeito por opinião diferente, julgamos não assistir qualquer razão ao recorrente.
Vejamos o que foi decidido na sentença recorrida, quanto ao regime de visitas:
“Ficando a menor confiada à guarda da mãe impõe-se estabelecer um regime de visitas do pai, sendo certo que tal demanda o superior interesse da menor.
Numa situação como a dos autos, em que os pais residem em diferentes sítios e têm as respectivas famílias nos países de origem, o desejável era que os pais conseguissem manter um bom relacionamento por forma a conseguirem ultrapassar as desvantagens que tal situação necessariamente acarreta, ponderando, unicamente, o bem estar da menor e o seu desejável desenvolvimento harmonioso. Entretanto, no conflito entre os interesses dos pais e o interesse da filha, releva, inquestionavelmente, o desta.
O superior interesse da criança passa, em primeiro lugar, por manter e fortalecer a relação de afectividade que tem com a mãe, evidentemente não esquecendo os laços afectivos que tem com o pai e a necessidade de os fortalecer, também, para o seu equilibrado desenvolvimento emocional e psicológico. É certo que hoje os meios electrónicos permitem um contacto diário para quem não vive perto.
Neste contexto, em dias de semana, quando o requerido reside fora de Macau e não pode visitar a menor em pessoa, a requerente deve garantir que o requerido se comunique com a menor via Facetime, Skype ou outras formas de comunicação de som e imagem. Portanto, ambas as partes devem combinar as horas de comunicação de acordo com a diferença horária entre o país ou região de residência do requerido e Macau, e sem prejuízo do repouso e estudo da menor.
Além disso, se o requerido visitar a menor em Macau, o seu direito de visita deve estar suficientemente satisfeito de que pode conviver com a menor e pernoitar com ela, sem prejuízo o repouso e estudo da menor e com aviso prévio à requerente.
As férias escolares de Natal, Ano Novo Chinês, Páscoa e Verão da menor, em princípio, serão partilhadas com cada um dos progenitores, em períodos iguais, a acordar anualmente entre estes.
Quanto à saída da menor com o requerido para Portugal ou para outros países, no caso vertente, como a menor é confiada à mãe, por ser o progenitor com quem tem maior ligação quotidiana, sendo a mãe a sua figura de referência, enquanto o país ou a região onde o pai reside por motivos de profissão não é estável, entretanto, se a menor não alcançar um certo grau de maturidade, ela pode não estar familiarizada com o pai que não é o auxiliar primário por um longo tempo. Isso pode criar alguma insegurança e afectar os interesses da menor. Portanto, somente após o requerido ter mantido contacto relativamente longo com a menor, e terá um consenso de confiança mútua e certa colaboração com a requerente e ganhará certa confiança da menor, ele pode sair sozinho com a menor e garantir seu regresso ao local de origem Macau. Antes disso, se a confiança entre pais e pai com a menor, bem como a proximidade da relação entre o pai com a menor não forem suficientes, a saída da menor com o requerido só pode ser realizada através de acompanhamento da requerente ou com sua autorização por escrito.”
A nosso ver, esta afigura-se a melhor solução para o caso, considerando a tenra idade da menor, que acabou de completar três anos de idade, a mesma carece, pelo menos ainda nesta fase, de ser acompanhada pela mãe, por ser esta pessoa com quem a menor sempre viveu desde o seu nascimento, e continua a viver à guarda e aos cuidados da recorrida.
De facto, o regime de visitas fixado pelo Tribunal recorrido não colide com o superior interesse de estabilidade e de crescimento da menor, antes pelo contrário, permite manter harmoniosamente os laços familiares estabelecidos entre a filha e o pai, ora recorrente, de maneira que consegue assegurar a estabilidade emocional e o desenvolvimento psicológico tranquilo da menor, sem grandes sobressaltos, para além de a menor poder continuar a ter uma referência à figura paternal.
Conforme referido pelo Juízo de Família, a mãe é “a progenitora com quem tem maior ligação quotidiana, sendo ela a sua figura de referência enquanto o país ou a região onde o pai reside por motivos profissionais não é estável, se a menor não alcançar um certo grau de maturidade, ela pode não estar familiarizada com o pai que não é o auxiliar primário por um longo tempo…”, daí que, em nossa opinião, a mudança não deverá ser de forma brusca, pelo menos ainda nesta fase primária, sendo assim, não merece censura a decisão recorrida ao indeferir que a menor viaja com o pai sem a presença da mãe, com quem sempre viveu e convive quotidianamente.
Enquanto a menor não atinge certa maturidade, a mesma não deve ser separada da sua mãe, sem prejuízo de, passados alguns anos, o regime ser revisto, desde que as relações afectivas entre a menor e o pai ora recorrente se venham intensificando e consolidando progressivamente.
Aqui chegados, não se vislumbrando de forma nenhuma a alegada violação do disposto no artigo 1760.º, n.º 1 do Código Civil, muito menos o artigo 9.º, n.º 3 da Convenção dos Direitos das Crianças, nega-se provimento ao recurso interposto pelo recorrente.
***
III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso interposto pelo recorrente B, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.
Registe e notifique.
***
RAEM, 1 de Novembro de 2018

Tong Hio Fong
(Relator)
Lai Kin Hong
(Primeiro Juiz-Adjunto)

Fong Man Chong
(Segundo Juiz-Adjunto)



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