打印全文

Processo n.º 945/2018
(Recurso em matéria de marca)

Data: 10 de Janeiro de 2019

ASSUNTOS:

- Marca nominativa
- Capacidade distintiva
- Palavra com “secondary meaning”

SUMÁRIO:

I - A  Marca é um sinal distintivo de produtos ou serviços, visando individualizá-los no mercado, perante o consumidor e em relação aos demais, com os propósitos de assegurar e potenciar a clientela. A função essencial da marca é a distintiva, tendo também uma função complementar de garantia, no sentido de garantir a qualidade dos produtos e serviços, por referência a uma origem não enganosa.
II - A marca registanda “” é uma marca normativa, por ser constituída por palavras e não ter envolvido qualquer figura e desenho, apresentação visual própria. A mesma é constituída exclusivamente por um nome geográfico, referindo-se a uma cidade alemã, que, no comércio, possa servir para designar a proveniência geográfica, não tendo, para além disso, qualquer capacidade distintiva.
III - O aditamento de “THE”, antes do nome de cidade, não é suficiente para afastar a conexão entre a cidade Munique e a origem dos serviços que a marca se refere, nem permite que os consumidores reconhecem que os serviços em causa provêm do Recorrente.
IV - É possível conceder o registo da marca, apesar de todos os elementos serem descritivos, se a marca tiver já adquirido um “secondary meaning” que lhe confira eficácia distintiva, ou seja, quando a marca deixa de ser apreendida pelo público pelo seu sentido descritivo, mas sim por um outro sentido não descritivo ligado a determinada empresa, não é, porém, o caso da marca “”, por nada se resulta que a marca registanda tinha adquirido já qualquer “secondary meaning”, razão pela qual é de julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.

O Relator,

________________
Fong Man Chong






Processo nº 945/2018
(Autos de recurso em matéria de marca)

Data : 10 de Janeiro de 2019

Recorrente : A

Recorrida : Direcção dos Serviços de Economia (經濟局)

*
   Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I - RELATÓRIO
    A Recorrente, de nacionalidade alemã, devidamente identificado os autos, não se conformando com a sentença do TJB, datada de 31/03/2018, que julgou improcedente o recurso por ele interposto contra a decisão do Director dos Serviços de Economia, dela veio, em 11/06/2018, recorrer para este TSI, com os fundamentos de fls. 214 a 226, tendo formulado as seguintes conclusões (fls. 222 a 226):
     A. A Sentença ora posta em crise, deve ser revogada e substituída por decisão que conceda o registo da marca N/XXXXXX , para assinalar serviços na classe 44ª da Classificação de Nice, porquanto inexistem fundamentos para a sua recusa.
     B. Salvo o devido respeito, que é muito, o Tribunal Judicial de Base incorreu em erro na apreciação dos requisitos de concessão da marca em causa nos presentes autos, que reúne todas as condições legalmente exigidas para que possa merecer protecção registrai na Região Administrativa Especial de Macau (doravante RAEM).
     C. A Sentença de que se recorre, recusou indevidamente o registo da marca , tendo assim violado, por incorrecta aplicação, o art.º 199.º n.º 1 alínea b) do Regulamento Jurídico da Propriedade Industrial, uma vez que o sinal apresentado a registo pela aqui Apelante, não é um sinal constituído exclusivamente por indicação que possa servir no comércio para designar a proveniência geográfica da prestação do serviço.
     D. O primeiro reparo que cumpre efectuar quanto à apesar de tudo, douta Sentença proferida, está, precisamente, relacionado com a avaliação dissecada do sinal, que em modesta opinião, não é aquela que se impunha fazer.
     E. Não existem dúvidas, nas melhores Doutrina e Jurisprudência, nacional e internacional, que o sinal tem que ser visto globalmente, no seu conjunto, já que consumidor padrão, que não é especialmente distraído, nem informado, não se irá deter numa análise detalhada dos vários elementos que compõem o sinal.
     F. Como é sabido, «A apreciação do carácter distintivo da marca tem que ser feito sob a vista do público, os consumidores médios dos produtos ou serviços que se destinam, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido.» - Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, Processo n.º 144/2014 (Recurso Cível), 11/Setembro/2017, Relator: João Gil de Oliveira, texto integral disponível para consulta em http://www.court.gov.mo/pt/subpage/researchjudgments?court=tsi.
     G. A título não exaustivo, e meramente exemplificativo, refiram-se os Acórdãos proferidos pelo Tribunal de Segunda Instância da Região Administrativa Especial de Macau (adiante designado apenas por TSI), no tocante à análise do sinal no seu todo, disponíveis em http://www.court.gov.mo/pt/subpage/researchjudgments?court=tsi:
     Recurso Jurisdicional nº 828/2014, Relator: Cândido de Pinho, Data do acórdão: 26 de Março de 2015: «E a presença ou ausência de carácter distintivo há-de procurar-se na “imagem global” da marca e não na análise individualizada de cada um dos seus elementos. É na marca, como um todo, que há-de afirmar-se ou negar-se o carácter distintivo ou a adequação para distinguir a origem comercial dos bens que se destina a marcar.
     (...)
     O método para aferir se determinado sinal tem, ou não, aptidão distintiva tem de considerar os bens que, em concreto, visa assinalar e distinguir e o público perante o qual vão ser assinalados (público de referência). Não basta a aptidão geral das palavras, sendo necessário testá-la (art. 197º do RJPI), através de tal método, em confronto com o motivo de recusa em análise (art. 199º, nº 1, al. b) do mesmo diploma legal) 1. E a presença ou ausência de carácter distintivo há-de procurar-se na “imagem global” da marca e não na análise individualizada de cada um dos seus elementos. É na marca, como um todo, que há-de afirmar-se ou negar-se o carácter distintivo ou a adequação para distinguir a origem comercial dos bens que se destina a marcar.» (ênfase adicionada)
     Processo n.º 346/2013, (Recurso cível), Relator: João Gil de Oliveira, Data: 3/Julho/2014
     e
     Processo n.º 575/2013, (Recurso cível), Relator: João Gil de Oliveira, Data: 3/Julho/2014: «Importa pois ter em conta que na análise das marcas deve proceder-se por intuição sintética, ou seja, ser apreciadas no seu conjunto e só se devendo recorrer à dissecação analítica por justificada necessidade1.
     Assim, há que analisar a marca em causa no seu conjunto.»
     H. Em face do predito, não se aceita a análise efectuada pelo Tribunal a quo, porquanto dissecou analiticamente a marca apresentada a registo, a ponto de ter referido que o que sobressaía no conjunto do sinal seria MUNICH, já que a palavra THE apenas reforçava ou definia o sinal MUNICH.
     I. Ora, entende a Apelante que o consumidor padrão, quando se deparar com a marca , não vai apenas notar a segunda palavra da mesma, nem tão pouco vai atribuir mais relevância à segunda palavra que compõe o sinal. De facto, parece olvidar o digníssimo Tribunal a quo, que o consumidor lê o sinal da esquerda para a direita, começando portanto, pela expressão THE, a qual não será omitida na leitura de conjunto que é feita do sinal.
     J. A marca não tem, na opinião da Apelante, nenhum elemento que sobressaia face aos demais. Portanto, as duas palavras que compõem o sinal , desempenham um papel equivalente no conjunto do sinal - nenhuma das palavras captará mais a atenção do consumidor, e nenhuma das palavras passará despercebida. Pelo que, a conclusão do Tribunal a quo de que «ao olhar a marca registanda, o que chama a atenção dos consumidores é a cidade de Munique pois a parte significativa, essencial e predominante da marca é a cidade de Munique» é errada.
     K. Acresce que também não se entende nem aceita o entendimento do Tribunal a quo quando refere que a adição da palavra “THE” “pretende realçar que os serviços fornecidos têm origem da Munique, na medida em que o “THE” é usado normalmente para especificar e realçar determinado objecto”.
     L. Em termos gramaticais, a palavra “THE” na língua inglesa, é um artigo definido, usado antes de um substantivo, e na língua inglesa é invariável em género e número. Pode ser usado na língua inglesa, com relação a substantivos únicos na sua espécie, como sejam “the sun”, “the sky”, “the universe”, e também, por exemplo, diante de nomes geográficos de rios – “the Amazonas River” -, oceanos – “the Pacific Ocean” - e desertos – “the Sahara”.
     M. Mas a regra é que o artigo definido “THE” não se usa diante de nomes de cidades, tal como não se usa antes de países, estados e continentes. Veja-se a este respeito, a informação disponível no sítio oficial da internet da EF Education First, acessível em https://www.ef.edu.pt/guia-de-ingles/gramatica-inglesa/artigo-definido/, e em especial, o esclarecimento e exemplos, de quando não deve ser utilizada a palavra “the”. Com especial relevo para o caso em apreço, são referidos os seguintes exemplo e explicação:
     «Não utilize the com a maioria dos nomes de cidades, ruas, estações e aeroportos.
     EXEMPLOS
     □ Victoria Station is in the centre of London.
     □ Can you direct me to Bond Street?
     □ She lives in Florence.
     □ They're flying into Heathrow.»
     N. A regra acima explicada da não utilização do artigo definido “the” com a maioria dos nomes de cidades, nos quais se inclui, Munique, ou no caso dos autos, MUNICH, é gramaticalmente pacífica. O consumidor em causa, que é o consumidor de Macau, que tem a peculiaridade de ser composto por uma diversidade cultural linguística e geográfica vastíssima, quando se deparar com a marca apresentada a registo, apreenderá imediata e facilmente o “erro gramatical” que confere distintividade ao sinal .
     O. Quanto à questão gramatical, diga-se ainda que para que o substantivo MUNICH pudesse ser entendido como proveniência geográfica era imprescindível que essa palavra se seguisse uma outra, em especial um substantivo, tal como se alegou em Primeira Instância, já que seria essa a construção gramatical correcta. Para fácil referência e ilustração, refira-se o seguinte exemplo: THE MUNICH ORCHESTRA, que significa numa tradução livre, A ORQUESTRA DE MUNIQUE. Aqui sim, estaria a atribuir-se à palavra Munique o sentido de localização geográfica concreta.
     P. A motivação subjacente à Sentença que recusa o registo da marca, radica também assim, e salvo o devido respeito, num erro de interpretação gramatical das expressões verbais que compõem o sinal submetido a registo pela Apelante.
     Q. E esta apreciação é essencial para a correcta decisão daquela que parece ser a questão fundamental no caso dos autos: a marca , tem ou não carácter distintivo? A resposta terá que ser afirmativa.
     R. De acordo com os ensinamentos doutrinários de Carlos Olavo, uma marca consiste no «sinal distintivo que serve para identificar o produto ou o serviço proposto ao consumidor» (in Propriedade Industrial, p. 37). Na definição sempre actual de Oliveira Ascensão, (in Direito Comercial, vol. II, «Propriedade industrial», p. 139), a marca é «um sinal distintivo na concorrência de produtos e serviços».
     S. Coutinho de Abreu - citado no Acórdão do TSI, Processo n.º 215/2014 (Recurso Cível), 24/Julho/2014, Relator: João Gil de Oliveira, texto integral disponível para consulta em http://www.court.gov.mo/pt/subpage/researchjudgments?court=tsi, entende que “as marcas são signos (ou sinais) susceptíveis de representação gráfica destinados sobretudo a distinguir certos produtos de outros produtos idênticos ou afins” - Cfr. A. cit. in Curso de Direito Comercial, VI.,4ª ed., pag.348.”
     T. Retomando a análise da, apesar de tudo, douta Sentença, sempre se dirá que da leitura do sinal , no seu todo, resulta que este inclui o nome da cidade de Munique, escrito na língua inglesa, mas que esse nome é precedido pelo artigo definido “THE”, o que lhe confere especial distintividade, veiculada pela estranheza causada pelo erro gramatical do sinal apresentado a registo, e que inclusivamente ajuda a afastar o entendimento de que poderia designar a proveniência geográfica.
     U. Importa de facto reiterar que seria irrazoável considerar-se que o consumidor da RAEM, ao se deparar com os serviços assinalados pela marca , pensaria que os mesmos teriam origem geográfica em Munique na Alemanha, e não em Macau, onde a marca pretende obter protecção e onde os mesmos serão oferecidos e prestados!
     V. Veja-se que auando uma menção geográfica não é usada de modo a indicar o local onde produtos e serviços sejam vendidos ou prestados, então nada obsta a que essa menção geográfica possa fazer parte da composição de uma marca registada. E será precisamente esse o caso de vários sinais que mereceram a protecção conferida pelo registo, não só em Macau como em Portugal, e em diferentes outras jurisdições. Refiram-se a título de exemplo algumas marcas que mereceram a protecção conferida por registo em Portugal, referidas por Luís Couto Gonçalves in Manual de Direito Industrial, Propriedade Industrial e Concorrência Desleal, 2015, 6.ª Ed., Almedina, página 209: “SOMÁLIA”, “HOLLYWOOD”, “TAHITI”, “SEVILLE” e “QUENIA”.
     W. Também em Macau foram concedidos registos, que se mantêm plenamente válidos e em vigor, com referências geográficas, e para os quais o entendimento foi bastante diferente daquele plasmado na Sentença ora posta em crise. É o caso, por exemplo, da marca N/XXXXX “XXXXXXXXX” e da marca N/XXXXX “XXXXXXXXX”- vide docs. N.º 3 e 4 juntos com o recurso - que poderiam também elas ser consideradas como podendo induzir em erro o consumidor indicando apenas a origem geográfica do serviço e do seu prestador específico.
     X. De facto, o sinal no seu conjunto é dotado de fantasia, já que qualquer pessoa com conhecimentos mínimos da língua inglesa sabe que é gramaticalmente incorrecta a referência à cidade de Munique como “”.
     Y. Dada a sua pertinência, cita-se parcialmente o plasmado no Acórdão do TSI, Processo n.º 144/2014 (Recurso Cível), Data: 11/Setembro/2014, Relator: João Gil de Oliveira, disponível em http://www.court.gov.mo/pt/subpage/researchjudgments?court=tsi:
     “A é uma cidade do nordeste da França, sede de uma comuna, na circunscrição administrativa de Meurthe-et-Moselle.
     Mas essa palavra é mais conhecida por corresponder a um tipo de jogo é um jogo de casino com a utilização de cartas de um baralho, de desenlace muito rápido.
     Também é facilmente ligada a uma marca famosa de cristais, aliás, produzidos naquela cidade.
     Como cidade, não se crê que seja muito conhecida.
     A detentora dessa marca vem pedir a marca para produtos determinadas classes que se não reconduzem já aos cristais, mas sim, grosso modo, para produtos de higiene e beleza.
     Enquanto marca de fantasia para esses produtos e considerando que o registo da marca não se vai apropriar em exclusivo do nome geográfico, somos a propender no sentido de que nada obsta a tal registo, pelas razões que adiante se desenvolverão.”
     (...)
     Não é permitido o registo de sinais unicamente compostos por designações geográficas quando estes se limitem a apontar a real ou relevante origem de um produto ou serviço,1 ou como diz Carlos Olavo2 “não exclui a capacidade distintiva a circunstância de se tratar de um nome geográfico, que pode ser validamente adoptado como marca, desde que assuma um valor autónomo de fantasia, sem implicar a referência á proveniência ou qualidade de um produto”
     (...)
     “Com isto, no fundo, somos a ratificar o que também já se afirmou, de que o nome de uma dada cidade, país ou região, pode compor uma dada marca. Não, o que se diz é que esse elemento não pode ser o elemento nuclear e destrinçador dessa marca. Não podem ser registadas as marcas compostas exclusiva ou essencialmente por elementos que descrevam o produto/serviços (as suas características, qualidades, proveniência geográfica, entre outros aspectos), por elementos usuais na linguagem do comércio, por determinadas formas (forma imposta pela própria natureza do produto, forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico ou forma que lhe confira um valor substancial) ou por uma única cor - cfr. art. 199º, n.º 1 do RJPI.” (sublinhados nossos)
     Z. Não olvida a Apelante, que o facto da marca ter sido concedida em muitíssimas jurisdições não constitui fundamento para concessão do sinal em causa. No entanto, esta referência tem que ser feita, porquanto porque se estivéssemos realmente na presença de um sinal desprovido de distintividade, por se limitar, supostamente, a designar uma proveniência geográfica, o registo não teria sido concedido, como foi, pelo Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), ou pelos Institutos Oficiais do Canadá, Austrália e Índia, jurisdições que inclusivamente têm a língua Inglesa como língua oficial! - cfr. Doc. N.º 5 a 13 juntos aos autos.
     AA. A marca , no seu conjunto, tem, sim, carácter distintivo, não existindo, qualquer perigo do consumidor ser induzido em erro, e entender que os serviços que sob tal marca são prestados, são provenientes da cidade de Munique, uma das mais conhecidas cidades da Alemanha, e possivelmente da Europa e do Mundo. Mas este facto, se algum peso tiver na questão ora sub judice, será no sentido de reforçar o entendimento de que o consumidor, precisamente porque conhece a cidade de Munique, não irá deixar de entender a marca como um sinal distintivo de comércio adequado a distinguir os serviços assinalados pela Apelante, dos demais serviços prestados por outros agentes no mercado, e nunca como uma referência a um local específico.
     BB. E, logo, não pensará que se está a designar a proveniência geográfica da prestação dos serviços. A marca sub judice será entendida pelo consumidor como tendo capacidade distintiva, porque é apta, por si mesma, a individualizar os serviços que pretende assinalar, e é idónea para distingui-los dos produtos e/ou serviços comercializados e prestados por outras empresas. Neste exacto sentido, vejam-se os preciosos ensinamentos da Jurisprudência do TSI, neste caso, do Acórdão proferido no Processo n.º 575/2013 (Recurso Cível), Relator: João Gil de Oliveira, datado de 03/Julho/2013: “Na palavra do Prof. Oliveira Ascensão, a marca tem de ser perfeitamente distintiva, sendo “preocupação da lei afastar do domínio da marca todos os elementos genéricos ou os destinados a comunicar outras indicações”.
     Há eficácia distintiva real quando o consumidor médio - normalmente atento - está apto a distinguir o produto marcado de outros idênticos ou semelhantes, para evitar confusões ou erros fáceis.
     Por isso, o carácter distintivo de uma marca só pode ser apreciado, por um lado, em relação aos produtos ou serviços para os quais o registo é pedido e, por outro, em relação à percepção que dele tem o público consumidor ou utilizador final, na palavra do Prof. Oliveira Ascensão, a eficácia distintiva deve ser aferida “pelo consumidor, não pelo técnico do sector, não a pessoa especialmente atenta, mas o público consumidor”.
     CC. É essencial que a marca realize as funções que lhe cabem, em especial aquela que é a sua função clássica primordial: a distintiva. Ensina Pedro Sousa e Silva in Direito Industrial - Noções Fundamentais, Coimbra Editora, pág. 142 e seguintes, relativamente à função de indicação de proveniência: “É hoje entendimento pacífico que a função jurídica essencial da marca é a de indicar a proveniência dos produtos ou serviços. Para desempenhar essa função, a marca tem de individualizar produtos ou serviços e permitir a sua diferenciação de outros da mesma espécie, para que o consumidor possa orientar a sua escolha, quando confrontado com uma pluralidade de opções de consumo. A marca proporciona-lhe, assim, um referencial unívoco para a aquisição de bens e serviços, a que atribui determinadas qualidades ou características, provenientes de uma dada organização empresarial. É nisto que reside a função distintiva e indicativa das marcas, tutelada por lei.”
     DD. Ora, sendo a marca um sinal distintivo de comércio que tem por finalidade primordial a individualização de produtos ou serviços de uma empresa, distinguindo-os dos de outras empresas (art.º 197.º do RJPI), a eficácia distintiva da marca apresentada a registo “” estaria sempre assegurada não existindo qualquer risco do consumidor ser induzido em erro, contrariamente ao afirmado na Sentença de que se recorre.
     EE. A marca apresentada a registo , é uma construção extravagante e fantasiosa, que se pode traduzir por “A Munique”, e que dada a sua estranheza e peculiaridade a tornam especialmente distintiva para o consumidor. Neste exacto sentido, não pode a Apelante deixar de referir a Sentença proferida muito recentemente pelo Tribunal Judicial de Base, 2.º Juízo Cível, no âmbito do Processo n.º CV2-18-0006-CRJ, no qual estava em causa situação idêntica à dos presentes autos [pedido de registo de marca n.º N/11367S, para assinalar serviços na classe 35ª], e que foi, em modesto entendimento, brilhantemente analisada pelo Tribunal a quo, tendo a marca sido concedida.
     FF. Em face da sua extrema pertinência, e clareza na exposição da fundamentação da Decisão, permitimo-nos transcrever alguns excertos da referida Sentença:
     “E resulta da al. B) do nº1 do art. 199º que não são susceptíveis de protecção os sinais constituídos exclusivamente por indicações que possam servir no comércio para designar a qualidade, a proveniência geográfica ou outras características dos bens assinalados. Trata-se do que a doutrina designa de sinais descritivos.
     Temos, pois, mais um limite para que os sinais possam ser registados como marca, enquanto sinal distintivo do comércio. A marca é um sinal ou significante que deve ser apreendido pelo seu significado - determinada origem empresarial. Se os sinais têm um significado descritivo, isto é, se são interpretados como significando que os bens onde estão apostos provêm de determinado ponto geográfico, ou que têm determinada qualidade ou outras características, não servem como marca ou sinal distintivo de origens comerciais. Com efeito, quem estiver perante um bem a que foi aposto tal sinal irá concluir que esse bem provém de determinado local (ou que tem determinadas características) e se voltar a estar perante outro bem como mesmo sinal, irá concluir que também este segundo provém do mesmo local (ou que também tem as mesmas características). Mas não irá concluir que os dois bens provêm de um mesmo núcleo empresarial, da mesma fonte comercial. A comunicação humana é assim. Descodifica mensagens ou significados que se encontram em sinais ou significantes. A comunicação comercial também faz parte da comunicação humana e obedece ao mesmo devir. Marcar um bem (produto ou serviço) é apor-lhe um sinal, uma marca que o distinga quanto à usa origem comercial quando vier a ser interpretado por quem com ela se confrontar.
     (...)
     Temos, pois, que os sinais genéricos, designadamente os descritivos e os usuais, além da forma necessária e das cores simples, não são susceptíveis de protecção por não terem eficácia distintiva (art. 199º, nº 1). Isto é, por carregarem consigo um significado próprio diferente do de marca, significado esse que vai ser apreendido pelo público. Frustra-se assim a intenção de marcar que esteve na origem da aposição do sinal no produto. Por isso não deve ser admitido como marca o sinal que já se sabe que não vai poder cumprir a função a que se destina e vai falhar na função comercial que se propõe desempenhar. Do que se trata é, pois, de comunicação. Neste aspecto é relevante o público que vai receber a mensagem sobre a origem comercial. Atento o princípio da territorialidade do direito das marcas, o que releva é o público da jurisdição onde se pretende o registo, no caso a RAEM. Mais, sendo certo que cada pessoa pode interpretar os sinais descortinando-lhe imprevisíveis significados, o que releva é o significado normal, aquele que normalmente o público descortina.
     (...)
     O significado relevante dos sinais é o que lhe descortina o público alvo (médio e que contacta com a marca numa determinada área territorial). E tal significado que o público relevante apreende não pode ser descritivo de origem geográfica dos bens a assinalar, pois se for verdadeira a origem geográfica revelada, o sinal é genuinamente descritivo e se não for verdadeira, o sinal é enganoso e também não pode ser protegido pelo registo (art. 214º, nº 2, al. b)).
     Do que atrás se referiu, poderemos concluir que, perante o público relevante, o sinal registando é entendido como distintivo, ao ponto de, quando aposto em dois bens diferentes, ser entendido como se tais bens tivessem a mesma origem comercial e não que ambos teriam origem na cidade alemã de Munique ou dali são provenientes?
     Em primeiro lugar cabe referir que o público consumidor relevante, de Macau, tem a peculiaridade de ser composto por uma diversidade cultural linguística e geográfica vastíssima que coloca grandes dúvidas se ligará o sinal à referida cidade.
     Em segundo lugar, dada a distância entre Macau e Munique, apresenta-se como muito pouco provável que os consumidores que se deparem com o sinal registando se convençam que tenham origem na cidade de Munique os serviços com tal sinal assinalados (...).
     Em terceiro lugar cabe referir que é irrelevante que o público relevante se convença que os serviços assinalados com o sinal registando são prestados por empresários alemães, sociedades sedeadas em Munique ou cujos sócios e capital social são alemães, uma vez que o que releva é a proveniência geográfica dos bens e não a proveniência de quem os fornece, comercializa, produz, etc.
     (...)
     Esta susceptibilidade de servir no comércio para determinado fim (designar a proveniência geográfica) só impede o registo do sinal se este não for também susceptível de servir finalidade distintiva. Por isso se refere o normativo em análise aos sinais constituídos exclusivamente por indicações descritivas. Só os sinais puramente descritivos não servem como marca. Aqueles em que se introduza um elemento distintivo ou de fantasia, ainda que mínimo, servem como marca. (...) É evidente que o termo “MUNICH” não pode ser apropriado em exclusividade pelo requerente do registo. Porém, a composição da marca registanda, ao associar a palavra inglesa “THE” num sentido não gramaticalmente correcto nem usual, introduziu um mínimo de fantasia na imagem global da marca que lhe atribuí um mínimo de capacidade distintiva, continuando uma marca fraca em termos de distintividade. Mas tal mínimo de fantasia é um pouco ampliado no âmbito territorial onde se pretende a protecção do registo (a RAEM), atentas as apontadas características peculiares do público consumidor.
     Refere Couto Gonçalves (Direito de Marcas, 2ª Edição, p. 76) que “se o nome geográfico for usado com um significado não geográfico, de uma forma manifestamente fantasiosa de tal modo que resulte evidente que não há, nem pode haver, qualquer conexão relevante entre a denominação geográfica e a origem do produto a que a marca se refere” a marca deve ser considerada válida.
     Embora se entenda que o uso que deve ser considerado é o uso que possa fazer-se do sinal registando, também esta doutrina serve no caso presente. Acresce ainda no caso em apreço que o nome geográfico MUNICH foi ainda alterado como termo “THE”. Juntam-se dois vectores que asseguram a capacidade distintiva ao sinal registando: foi alterado com a intervenção que lhe confere alguma fantasia e, destinando-se à jurisdição da RAEM, tem de ser considerado que a sua utilização para assinalar serviços não pode ser conotada com qualquer mensagem de indicação de proveniência geográfica dos serviços assinalados.
     (...)
     Ora, o sinal “”, reportando-se a um conceito ainda minimamente fantasioso, é ainda dotado de carácter distintivo e não exclusivamente descritivo.” (ênfase adicionada)
     GG. Assim, terá que se concluir que a marca , atenta a sua especial peculiaridade, reúne todas as condições para poder desempenhar a função de garantia de qualidade não enganosa e de garantia de uma concreta origem empresarial, já que a singularidade que lhe advém da “incorrecção” gramatical intencionalmente criada, plasmada no aditamento da palavra “THE” à palavra “MUNICH”, torna a mesma distintiva.
     HH. Pelo que inexistem fundamentos para a recusa da marca N/XXXXXX para assinalar serviços na Classe 44ª, e se impõe a revogação da Sentença ora posta em crise e a sua substituição por decisão que conceda a marca in totum, o que pelo presente se peticiona.

*
    Notificado do recurso, veio a DSE a oferecer o merecimento dos autos (fls. 229 dos autos).
*
    Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.

* * *
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
  III – FACTOS ASSENTES:
    A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
     a) A marca n.º N/XXXXXX “”, foi apresentada a registo no dia 20/07/2016, para assinalar no Classe 44ª os seguintes serviços:
     “Seguros; serviços médicos; serviços veterinários; cuidados de higiene e de beleza para seres humanos e animais; serviços de agricultura, horticultura e silvicultura; serviços de aromaterapia; cirurgia arbórea; aconselhamento em farmácia; serviços de estações termais/spa; banhos públicos com fins higiénicos; lares com acompanhamento médico; serviços de sauna; serviços de solário; serviços de cabeleireiro para animais de estimação; banhos turcos; serviços de medicina alternativa; serviços de bancos de sangue; serviços de parteira; assistência médica; quiroprática [quiropatia]; serviços de arranjos florais; cabeleireiros; jardinagem paisagística; hospitais; serviços de terapia da fala; serviços de óptica; serviços de psicólogos; serviços de paramédicos; assistência veterinária; medicina dentária; serviços de aquicultura; serviços de viveiros de plantas; casas de repouso; centros de saúde; hospitais; clínicas médicas; sanatórios; salões de beleza; serviços de visagistas; pulverização aérea e terrestre de fertilizantes e outros produtos químicos para uso agrícola; massagistas; serviços de reabilitação/desintoxicação de toxicodependentes; jardinagem; horticultura; aconselhamento em saúde; serviços de implante de cabelo; serviços de fertilização/fecundação in vitro; enfermagem; confecção de grinaldas [arte floral]; serviços de inseminação artificial; paisagistas; serviços de manicure; plantação de árvores para fins de compensação de carbono; fisioterapia; cirurgia plástica; manutenção de relva/relvado; extermínio de animais nocivos à agricultura, horticultura e silvicultura; serviços de tatuadores; serviços de tele-medicina; serviços de terapia; tratamento de beleza de animais; criação de animais; eliminação de ervas daninhas; aluguer de material para exploração agrícola; aluguer de equipamentos médicos; aluguer de instalações sanitárias; serviços de farmacêuticos para elaborar receitas médicas.”
     b) Por despacho de 14/12/2017 proferido a fls. 23 do Processo Administrativo, foi recusado o pedido de registo da marca n.º N/XXXXXX com base nos fundamentos constantes da informação de fls. 23 a 25 do Processo Administrativo e que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.
     c) O despacho de recusa de registo foi publicado no Boletim Oficial da RAEM, nº 1, II Série, de 03/01/2018 (fls. 9)
     d) Em 05/02/2018, foi apresentado neste Tribunal o presente recurso.
* * *
    
IV – FUNDAMENTAÇÃO
    Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo tribunal de 1ª instância, importa ver o que o tribunal a quo decidiu. Este afirmou na sua douta decisão:
     A da nacionalidade alemã, com demais elementos de identificação nos autos, inconformado com a decisão da Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual, da Direcção dos Serviços de Economia, no uso de competências delegadas, quanto à recusa do registo de marca n.º N/XXXXXX requerida pelo mesmo, veio interpor o presente recurso judicial.
     Para o efeito, alega que a combinação do nome da cidade alemã“MUNICH”com o termo da língua inglesa“THE”dota de alguma fantasia o conjunto que forma o sinal registando, e a marca“”é uma construção extravagante e fantasiosa que se pode traduzir por“A MUNIQUE”e que, dada a sua estranheza e peculiaridade se torna especialmente distintiva para o consumidor.
     *
     Regularmente citada, o Director da DSE remeteu os processos administrativos do pedido de registo da marca n.º N/XXXXXX mas não respondeu.
     *
     SANEAMENTO
     O Tribunal é o competente.
     O processo é o próprio e não enferme de nulidade que o invalidam.
     As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
     Não existem outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer.
     *
     FUNDAMENTAÇÃO
     A marca tem uma função distintiva, a qual se afere em relação ao produto a que se destina e em relação às marcas já existentes.
     Portanto, a marca deve, por definição e no cumprimento da sua função própria, ter capacidade distintiva o que significa que deve ser apta, por si mesmo, a individualizar uma espécie de produtos e serviços.
     Como ensina o Ferrer Correia: “sendo a marca um sinal distintivo de coisas, há-de ela ser dotada para o bom desempenho da sua função de eficácia ou capacidade distintiva, isto é, há-de ser apropriada para diferenciar o produto marcado de outros idênticos ou semelhantes1”. 
     É com base nessa função distintiva que o artigo 197.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial (RJPI) fixa só podem ser objecto de protecção ao abrigo do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.
     Dotar de eficácia ou capacidade distintiva suficiente consiste num condicionalismo de liberação de composição de marca.
     Daí que se as marcas forem constituídas exclusivamente com indicações sobre a espécie, natureza, qualidade ou utilidade dos produtos, ou sobre a sua proveniência, essas indicações devam ser verídicas na medida em que essas não são adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.
     São chamados os meros sinais genéricos e descritivos. Diz-se genérico quando o sinal, no seu significado originário e próprio, designa exclusivamente o nome do género de produtos ou serviços marcados ou, ainda, o sinal, bi ou tridimensional, que representa unicamente, a forma comum e ordinária do produto marcado2. Enquanto descritivo aquele sinal que indica, exclusiva e directamente, a produção (espécie, lugar e tempo), qualidade, quantidade, destino, valor, ou qualquer outra característica do produto ou serviço3.
     Sinal genéricos e descritivos não são distintivos porque é comum a todos os objectos idênticos qualquer seja a sua origem4.
     Portanto, o artigo 199.º/1/b) do RJPI estabelece que não são susceptíveis de protecção os sinais constituídos exclusivamente por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos, a não ser que aquelas sinais já tiverem adquirido carácter distintivo (artigo 214.º/3 do RJPI).
     A razão desta proibição é para garantia do princípio de igualdade entre os concorrentes, não se permitindo que um comerciante transformar os elementos descritivos numa indicação específica e exclusiva de produtos de uma só empresa pois os mesmos devem ser livremente utilizável por cada um dos operadores económicos.
     Porém, a lei só proíbe as marcas exclusivamente descritivas pelo que o artigo 199.º/1/b) do RJPI fala expressamente em“exclusivamente”. Isso porque uma marca pode ser distintiva se não for exclusivamente descritiva, ou seja, a combinação de elementos descritivos e não descritivos pode oferecer um conjunto distintivo.
     No caso de nomes geográficos, i.e. nomes de cidades e país, também há situações em que se permite a sua adoptação como marca.
     Segundo Carlos Olavo, não exclui a capacidade distintiva a circunstância de se tratar de nome geográfico, que pode ser validamente adoptado como marca, desde que assuma um valor autónoma de fantasia, sem implicar referência ou qualidade de produto5.
     Para Luís M. Couto Gonçalves, uma denominação geográfica só pode ser utilizada como marca individual se for adoptado de um modo arbitrário ou fantasioso, se se reportar a um domínio territorial privado ou se limitar a sugerir, de uma forma inabitual, a origem do produto (marca geográfica expressiva6). É o caso em que se o nome geográfico for usado com significado não geográfico, de uma forma manifestamente fantasia de tal modo que resulte evidente que não há, nem pode haver, qualquer conexão relevante entre a denominação geográfico e a origem do produto que a marca se refere. Neste caso a marca deve ser válida7.
     No caso em apreço, a marca registanda é “”. A marca em causa é marca normativa por ser constituída por palavras e não ter envolvido qualquer figura e desenho, apresentação visual própria.
     A marca registanda é destinada para assinalar os serviços da classe 44.ª, tal como serviços de seguros, serviços médicos, serviços veterinários; cuidados de higiene e de beleza para seres humanos e animais, banhos públicos com fins higiénicos; lares com acompanhamento médico; serviços de sauna; casas de repouso; centros de saúde; hospitais; clínicas médicas; sanatórios; salões de beleza; serviços de visagistas; serviços de terapia; tratamento de beleza de animais aluguer de equipamentos médicos; aluguer de instalações sanitárias, etc.
     Tal como se refere pela Direcção dos Serviços da Economia, MUNICH é uma cidade da Alemanha, a terceira cidade mais populosa do país, depois da capital, Berlim, e de Hamburgo.
     Assim, não há dúvidas que a marca registanda é constituída por indicações que possam servir no comércio para designar a proveniência geográfica. Importa-se portanto saber se a marca registanda é constituída exclusivamente por nome geográfico pelo que não há capacidade distintiva.
     Para o efeito, o recorrente alega que a utilização do artigo definido THE no início da marca apresentada a registo, confere-lhe maior, e a necessária, distintividade e o facto de a expressão apresentada a registo ser “”, em vez de simplesmente MUNICH, e é na realidade uma construção extravagante e fantasiosa da marca em apreço que se pode traduzir por “A Munique”, e que dada a sua estranheza e peculiaridade a tornam especialmente distintiva para o consumidor. Mais alega que o artigo definido THE não se usa diante de nomes de cidades, sendo a marca apresentada a registo constituída, não só pelo nome da cidade de Munique em língua, MUNICH, como pelo artigo definido THE, a marca no seu todo tem, sim carácter distintivo, não havendo qualquer perigo do consumidor ser induzido em erro e confundir a cidade de Munique, como os serviços assinalados pela marca do ora Recorrente.
     A questão aqui se coloque é de saber a palavra “THE” colocada antes de “MUNICH” é um elemento distintivo tal como se defende pelo recorrente.
     Para nós, o aditamento de “THE” antes do nome de cidade não é suficiente para afastar a conexão entre a cidade Munique e a origem dos serviços que a marca se refere, nem permite que os consumidores reconhecem que os serviços em causa provêm do recorrente.
     Na língua inglesa, “THE” é usado quando pretender referir a um objecto ou a uma pessoa que já foi mencionado, ou quando pretender referir a determinado objecto, pessoa e local, ou coisa única. Normalmente é usado quando pretender referir a uma coisa específica ou determinada.
     Assim, ao aditar de palavra de “THE” antes da cidade Munique, não deixa de fazer o público pensar que os serviços da marca vêm da Alemanha, especificamente, da cidade Munique. Isso porque apesar de alguma estranheza que podia ter causado pelo aditamento de “THE” antes de “MUNICH”, é natural que os consumidores vão pensar que a empresa que usa essa marca, ao aditar “THE” antes de “MUNICH”, pretende realçar que os serviços fornecidos têm origem da Munique, na medida em que o “THE” é usado normalmente para especificar e realçar determinado objecto. Assim, a marca registanda não tem a virtualidade de fazer destacar os serviços que visa marcar dentre os serviços que têm origem de Munique.
     Como a palavra de “THE”, em vez de afastar a associação dos serviços com a Munique, dá mais a ideia de que os serviços prestados pelo recorrente são de origem de Munique, não vejamos que pode entender que o elemento aditado na marca tem capacidade suficiente para afastar conexão relevante entre a denominação geográfica e a origem dos serviços que a marca se refere.
     Nem vejamos a palavra de “THE” é um elemento diferenciador que possa deixar os consumidores associar os serviços com o recorrente. Ora, ao olhar a marca registanda, o que chama atenção dos consumidores é a cidade de Munique pois a parte significativa, essencial e predominante da marca é a cidade Munique e não outro. A mente do público consumidor seria conduzido para uma área geográfica, dando a ideia de que qualquer coisa que se pretende divulgar é algo que vem de Munique e não só os serviços provenientes do recorrente.
     Na verdade, não é difícil de chegar a conclusão de que, o recorrente, ao introduzir na marca o vocábulo MUNICH, visa criar a ideia de que o serviço prestado pelo mesmo tem algo a ver com a Munique da Alemanha. É essa associação que a marca pretende criar no espírito do destinatário da marca. Não cremos que o aditamento “THE” possa fazer desparecer essa associação e mensagem de indicação de proveniência geográficas dos serviços assinalados. Ao contrário, reforça essa associação. Assim, os consumidores médios podem associar a marca registanda não apenas com os serviços prestados pelo recorrente mas também com os outros serviços que têm origem de Alemanha prestados por outros concorrentes, em vez de pensar que os serviços prestados sob a marca registanda provêm do recorrente.
     Já referimos que não é de excluir a possibilidade de a denominação geográfica integrar na marca mas para tal é necessário que a marca tem um valor autónoma de fantasia ou o nome geográfico for usado com significado não geográfico, de uma forma manifestamente fantasia de tal modo que resulte evidente que não há qualquer conexão relevante entre a denominação geográfico e a origem do produto que a marca se refere.
     Esse é também o entendimento do TSI abordado no processo n.º 144/2014: “Uma denominação geográfica pode, pois, integrar uma marca, mas deve revestir uma natureza neutra. Quando essa neutralidade não existir e houver o risco da marca induzir em erro o público acerca da proveniência geográfica do produto ou serviço, o seu registo deve também ser recusado(…).”.
     No caso, já vimos que a referência a “THE” não tem capacidade de afastar a associação dos serviços do recorrente com a cidade Munique e distinguir a origem comercial dos serviços assinalados porque a parte predominante e essencial da marca registanda é “MUNICH”. Deste modo, entendemos que a marca registanda não tem capacidade distintiva.
     Quanto ao outro argumento apresentado pelo recorrente (para que o substantivo“MUNICH”pudesse ser entendido como proveniência geográfica era imprescindível que a tal palavra se seguisse uma outra, em especial, um substantivo, como por exemplo, THE MUNICH ORCHESTRA pois só aí é que estaria a atribuir-se à palavra Munique o sentido de localização geográfica concreta), entendemos não reside razão ao recorrente.
     Ora, o artigo 199.º/1/b) do RJPI não se proíbe os sinais constituídos simultaneamente por indicações de proveniência geográfica e o nome dos serviços e produtos mas proíbe os sinais compostos exclusivamente por indicções de proveniência geográfica. Com efeito, a menção de produto e serviços na marca não é requisito necessário para apreciação sobre a irregistabilidade de marca, o essencial é o nome geográfico seja associado com os produtos e serviços fornecidos.
     Em conformidade com essa ideia, temos os casos decididos pelo TSI os quais envolvem as marcas compostas somente pelos nomes geográficos ou localização geográfica, sem ter combinado com o nome de produtos e serviços mas também foram recusados para registo por falta de capacidade distintiva, por exemplo, “MACAU PARIS (Proc. n.º 393/2014)”, “路氹金光大道(Proc. n.º 282/2014)”,“COTAI STRIP (Proc. N.º 667/2015)” , “THE CENTRE OF COTAI (Proc. n.º 828/2014)”, “THE HEART OF COTAI (Proc. n.º 341/2013)”.
     Assim, como não resta dúvidas que a marca registanda deixa os consumidores associar os serviços assinalados com a cidade Munique, entendemos que não é de acolher o argumento do recorrente.
     Já quanto aos exemplos de marcas registadas compostas pelas referências geográficas invocados pelo recorrente ( e ) , importa-se referir que a primeira marca não é uma marca normativa simples por ter algo“design”e a segunda não consiste em nome de uma cidade. De qualquer modo, cada processo é um caso diferente pelo que não pode usar outras marcas registadas para servir fundamentos de não recusa do registo da marca registanda. Igualmente, a marca registanda foi aceite em outros países e regiões também não é fundamento para não recusa do registo da marca registanda.
     Cabe dizer ainda que não se descortina que a marca em causa tem adquirido um “secondary meaning” que lhe confira eficácia distintiva.
     Consagra-se nos termos do artigo 214.º, n.º 3 do RJPI que “o facto de a marca ser constituída exclusivamente por sinais ou indicações referidos nas alíneas b) e c) do n.° 1 do artigo 199.º não constitui fundamento de recusa se aquela tiver adquirido carácter distintivo.”
     É por isso possível a concessão de registo da marca, apesar de todos os elementos serem descritivos, se a marca tiver já adquirido um “secondary meaning” que lhe confira eficácia distintiva, ou seja, quando a marca deixa de ser apreendida pelo público pelo seu sentido descritivo, mas sim por um outro sentido não descritivo ligado a determinada empresa.
     No caso em apreço, nada se resulta que a marca registanda tinha adquirido qualquer “secondary meaning”.
     Destarte, pelo tudo exposto, entendemos que a marca registanda é desprovida de capacidade distintiva para distinguir serviços prestados pelo recorrente doutros pelo que somos a entender que é de manter a decisão de recusa do registo da marca n.º N/XXXXXX.
     Por último, como já se concluiu que ocorre motivo de recusa da marca registanda, fica prejudicada a necessidade de decidir se existir outros motivos de recusa, embora não estando o Tribunal impedido de conhecer qualquer dos motivos de recusa do registo ainda que não façam parte da fundamentação da decisão recorrida por o recurso judicial a que alude o artigo 275.º do RJPI ser um recurso de plena jurisdição8.
     ***
     DECISÃO
     Pelo exposto, decide-se julgar improcedente o recurso interposto pelo recorrente, mantendo-se a decisão recorrida.
     Custas a cargo do recorrente.
     Registe e notifique.
     Oportunamente cumpra o disposto no artigo 283.º do RJPI.
* * *
O que se discute neste recurso é saber se a palavra tem ou não capacidade distintiva enquanto marca para assinalar os serviços de classe 44ª da Classificação de Nice.
O Recorrente entende que sim, enquanto a Recorrida defende o contrário.
Ora, o artigo do 197º (Do objecto da marca) do RJPI (aprovado pelo DL nº 97/99/M, de 13 de Dezembro) prescreve:
Só podem ser objecto de protecção ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.
    A  “Marca é um sinal distintivo de produtos ou serviços, visando individualizá-los no mercado, perante o consumidor e em relação aos demais, com os propósitos de assegurar e potenciar a clientela, simultaneamente protegendo o consumidor do risco de confusão ou associação com marcas concorrentes” (ac. do STJ de 11/01/2011, proc. 627/06.7TBAMT.P1, e Ferrer Correia - Lições de Direito Comercial, vol. I, p. 253).

A função essencial da marca é a distintiva. Com efeito, a marca distingue e garante que os produtos ou serviços se reportam a uma pessoa que assume pelos mesmos o ónus de uso não enganoso, nessa medida cumprindo uma função de garantia de qualidade dos produtos e serviços, por referência a uma origem não enganosa e podendo, ainda, contribuir por si só para a promoção dos produtos ou serviços que assinala (cf. Luís Couto Gonçalves - Direito de Marcas, pp. 17-30).

Nesta óptica, é sempre na posição do consumidor que vai avaliar se existe semelhança ou não entre os produtos. A propósito do perfil do consumidor, Luís Couto Gonçalves9, define-o da seguinte forma: "A escolha de um produto ou serviço é efectuada pelo consumidor final que se apresenta como o sujeito a cuja capacidade de discernimento e grau de atenção deve ser reportado o juízo de confundibilidade resultante da verificação dos dois requisitos de imitação que analisamos. Se é o consumidor a que, normalmente, se deve atender (dotado de média inteligência, diligência e perspicácia) não se deve, todavia perder de vista os produtos ou serviços em questão. O consumidor que releva no contexto do direito de marcas deve ser uma figura flexível e variável.”
E escreve F. Nóvoa (Fundamentos de derecho de marcas, 1984, pag. 241) “(…) com o fim de aproximar, na medida do possível, a figura do consumidor e do seu comportamento habitual à realidade do mercado, não resta outro remédio senão relativizar o protótipo do consumidor distinguindo vários sub-tipos do consumidor médio. O fundamento dessa distinções deve girar segundo o mesmo autor, em tomo da natureza, características e preço dos produtos diferenciados pelas marcas correspondentes.
Nesse sentido propõe, de acordo com os dois primeiros critérios (natureza e características dos produtos e serviços), a figura do consumidor profissional e especializado no caso de produtos e serviços adquiridos por profissionais ou peritos e, de acordo com o terceiro critério (preços dos produtos e serviços), o perfil de um consumidor médio mais atento no caso de produtos e serviços terem um preço mais elevado ou o perfil de um consumidor médio menos diligente no caso de os produtos terem um baixo preço e um largo consumo.( ... )."
*
   No caso sub judice, o Tribunal a quo afirmou expressa e pertinentemente o seguinte:
   “(…)
     No caso em apreço, a marca registanda é “”. A marca em causa é marca normativa por ser constituída por palavras e não ter envolvido qualquer figura e desenho, apresentação visual própria.
    A marca registanda é destinada para assinalar os serviços da classe 44.ª, tal como serviços de seguros, serviços médicos, serviços veterinários; cuidados de higiene e de beleza para seres humanos e animais, banhos públicos com fins higiénicos; lares com acompanhamento médico; serviços de sauna; casas de repouso; centros de saúde; hospitais; clínicas médicas; sanatórios; salões de beleza; serviços de visagistas; serviços de terapia; tratamento de beleza de animais aluguer de equipamentos médicos; aluguer de instalações sanitárias, etc. (sublinhado nosso)
     Tal como se refere pela Direcção dos Serviços da Economia, MUNICH é uma cidade da Alemanha, a terceira cidade mais populosa do país, depois da capital, Berlim, e de Hamburgo.
     Assim, não há dúvidas que a marca registanda é constituída por indicações que possam servir no comércio para designar a proveniência geográfica. Importa-se portanto saber se a marca registanda é constituída exclusivamente por nome geográfico pelo que não há capacidade distintiva. (sublinhado nosso)
     Para o efeito, o recorrente alega que a utilização do artigo definido THE no início da marca apresentada a registo, confere-lhe maior, e a necessária, distintividade e o facto de a expressão apresentada a registo ser “”, em vez de simplesmente MUNICH, e é na realidade uma construção extravagante e fantasiosa da marca em apreço que se pode traduzir por “A Munique”, e que dada a sua estranheza e peculiaridade a tornam especialmente distintiva para o consumidor. Mais alega que o artigo definido THE não se usa diante de nomes de cidades, sendo a marca apresentada a registo constituída, não só pelo nome da cidade de Munique em língua, MUNICH, como pelo artigo definido THE, a marca no seu todo tem, sim carácter distintivo, não havendo qualquer perigo do consumidor ser induzido em erro e confundir a cidade de Munique, como os serviços assinalados pela marca do ora Recorrente.
     A questão aqui se coloque é de saber a palavra “THE” colocada antes de “MUNICH” é um elemento distintivo tal como se defende pelo recorrente. (sublinhado nosso)
     Para nós, o aditamento de “THE” antes do nome de cidade não é suficiente para afastar a conexão entre a cidade Munique e a origem dos serviços que a marca se refere, nem permite que os consumidores reconhecem que os serviços em causa provêm do recorrente.
     Na língua inglesa, “THE” é usado quando pretender referir a um objecto ou a uma pessoa que já foi mencionado, ou quando pretender referir a determinado objecto, pessoa e local, ou coisa única. Normalmente é usado quando pretender referir a uma coisa específica ou determinada.
     Assim, ao aditar de palavra de “THE” antes da cidade Munique, não deixa de fazer o público pensar que os serviços da marca vêm da Alemanha, especificamente, da cidade Munique. Isso porque apesar de alguma estranheza que podia ter causado pelo aditamento de “THE” antes de “MUNICH”, é natural que os consumidores vão pensar que a empresa que usa essa marca, ao aditar “THE” antes de “MUNICH”, pretende realçar que os serviços fornecidos têm origem da Munique, na medida em que o “THE” é usado normalmente para especificar e realçar determinado objecto. Assim, a marca registanda não tem a virtualidade de fazer destacar os serviços que visa marcar dentre os serviços que têm origem de Munique.
     Como a palavra de “THE”, em vez de afastar a associação dos serviços com a Munique, dá mais a ideia de que os serviços prestados pelo recorrente são de origem de Munique, não vejamos que pode entender que o elemento aditado na marca tem capacidade suficiente para afastar conexão relevante entre a denominação geográfica e a origem dos serviços que a marca se refere.
     Nem vejamos a palavra de “THE” é um elemento diferenciador que possa deixar os consumidores associar os serviços com o recorrente. Ora, ao olhar a marca registanda, o que chama atenção dos consumidores é a cidade de Munique pois a parte significativa, essencial e predominante da marca é a cidade Munique e não outro. A mente do público consumidor seria conduzido para uma área geográfica, dando a ideia de que qualquer coisa que se pretende divulgar é algo que vem de Munique e não só os serviços provenientes do recorrente.
     Na verdade, não é difícil de chegar a conclusão de que, o recorrente, ao introduzir na marca o vocábulo MUNICH, visa criar a ideia de que o serviço prestado pelo mesmo tem algo a ver com a Munique da Alemanha. É essa associação que a marca pretende criar no espírito do destinatário da marca. Não cremos que o aditamento “THE” possa fazer desparecer essa associação e mensagem de indicação de proveniência geográficas dos serviços assinalados. Ao contrário, reforça essa associação. Assim, os consumidores médios podem associar a marca registanda não apenas com os serviços prestados pelo recorrente mas também com os outros serviços que têm origem de Alemanha prestados por outros concorrentes, em vez de pensar que os serviços prestados sob a marca registanda provêm do recorrente. (sublinhado nosso)
     Já referimos que não é de excluir a possibilidade de a denominação geográfica integrar na marca mas para tal é necessário que a marca tem um valor autónoma de fantasia ou o nome geográfico for usado com significado não geográfico, de uma forma manifestamente fantasia de tal modo que resulte evidente que não há qualquer conexão relevante entre a denominação geográfico e a origem do produto que a marca se refere.”
   (…)
     Já quanto aos exemplos de marcas registadas compostas pelas referências geográficas invocados pelo recorrente ( e ) , importa-se referir que a primeira marca não é uma marca normativa simples por ter algo“design”e a segunda não consiste em nome de uma cidade. De qualquer modo, cada processo é um caso diferente pelo que não pode usar outras marcas registadas para servir fundamentos de não recusa do registo da marca registanda. Igualmente, a marca registanda foi aceite em outros países e regiões também não é fundamento para não recusa do registo da marca registanda.
     Cabe dizer ainda que não se descortina que a marca em causa tem adquirido um “secondary meaning” que lhe confira eficácia distintiva.
     Consagra-se nos termos do artigo 214.º, n.º 3 do RJPI que “o facto de a marca ser constituída exclusivamente por sinais ou indicações referidos nas alíneas b) e c) do n.° 1 do artigo 199.º não constitui fundamento de recusa se aquela tiver adquirido carácter distintivo.”
     É por isso possível a concessão de registo da marca, apesar de todos os elementos serem descritivos, se a marca tiver já adquirido um “secondary meaning” que lhe confira eficácia distintiva, ou seja, quando a marca deixa de ser apreendida pelo público pelo seu sentido descritivo, mas sim por um outro sentido não descritivo ligado a determinada empresa.
     No caso em apreço, nada se resulta que a marca registanda tinha adquirido qualquer “secondary meaning”. (sublinhado nosso)
     Destarte, pelo tudo exposto, entendemos que a marca registanda é desprovida de capacidade distintiva para distinguir serviços prestados pelo recorrente doutros pelo que somos a entender que é de manter a decisão de recusa do registo da marca n.º N/XXXXXX.
     Por último, como já se concluiu que ocorre motivo de recusa da marca registanda, fica prejudicada a necessidade de decidir se existir outros motivos de recusa, embora não estando o Tribunal impedido de conhecer qualquer dos motivos de recusa do registo ainda que não façam parte da fundamentação da decisão recorrida por o recurso judicial a que alude o artigo 275.º do RJPI ser um recurso de plena jurisdição10.
   Não encontramos razões bastantes para não acolher este ponto de vista. A par disso, acrescentamos ainda o seguinte:
1) – A palavra , para além de para assinalar uma vasta gama de serviços, não reúne, per si só, capacidade distintiva suficiente;
2) – Tal capacidade há-de ser avaliada na posição de um consumidor médio nos termos acima referidos;
3) - Podemos citar como exemplo a palavra LISBOA. Hoje em dia, provavelmente em Macau, a palavra Lisboa não será apreendida por grande número de turistas como o nome de uma cidade ou uma capital, como se passaria há umas dezenas anos atrás, pois o sinal passa a ser apreendido com uma significação diferente da descritiva originária, mas desta vez distintiva. Se a mesma situação se colocar num país qualquer (sem ser Portugal), esta palavra LISBOA também não goza de capacidade distintiva.
4) – Aqui, recordemos as lições do Prof. Ferrer Correia, a propósito de “sinais francos” e “sinais fracos” , elementos desprovidos de capacidade distintiva (in Lições de Direito Comercial, Vol. III, pág. 387 e seguintes):
“Aqui já não se trata de elementos indispensáveis à identificação dos produtos, mas antes de expressões ou sinais cujo uso de vulgarizou (entrou no património comum) e que, por consequência, não devem igualmente poder ser monopolizados. Na literatura germânica fala-se, a este propósito, em sinais “francos”11. Alguns exs. apontados pela doutrina: a figura de uma lebre, para artigos de caça; o desenho de um peixe, para artigos de pesca; a representação de flores, para artigos de perfumaria; a imagem do fogo, para aquecedores; expressões como “o melhor”, “ideal”, “esplêndido”, “extra”, etc.12.
Finalmente, nos termos do 2º do artigo 79º, “as cores, por si só, não podem constituir marca, salvo se forem unidas e combinadas entre si ou com gráfico, dizeres impressos ou outros elementos, por forma peculiar e distintiva”. A lei refere aqui, por forma meramente exemplificativa, aquilo que os autores alemães designam por sinais “fracos”: sinais desprovidos de capacidade distintiva e que, por consequência, não podem ser protegidos como marca. Outros exemplos: ao desenho de uma simples linha, aos números, às letras do alfabeto e aos simples vocábulos, quando tomados isoladamente, faltará em regra eficácia distintiva13.
c) Ainda como sinal distintivo que é das mercadorias, a marca há-de ser constituída por forma tal que se não confunda com outra anteriormente adoptada para o mesmo produto ou semelhante.”

*
Pelo que, é de verificar que, em face das considerações e impugnações do ora Recorrente, a argumentação produzida pelo MMo. Juíz do Tribunal a quo continua a ser válida, a qual não foi contrariada mediante elementos probatórios concretos, trazidos por quem tem o ónus de prova.
Nestes termos, é da nossa conclusão que o Tribunal a quo fez uma análise ponderada dos factos e uma aplicação correcta das normas jurídicas do RJPI, tendo proferido uma decisão conscienciosa e legalmente fundamentada, motivo pelo qual, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 do CPC, é de manter a decisão recorrida.
*
Síntese conclusiva:
I - A  Marca é um sinal distintivo de produtos ou serviços, visando individualizá-los no mercado, perante o consumidor e em relação aos demais, com os propósitos de assegurar e potenciar a clientela. A função essencial da marca é a distintiva, tendo também uma função complementar de garantia, no sentido de garantir a qualidade dos produtos e serviços, por referência a uma origem não enganosa.
II - A marca registanda “” é uma marca normativa, por ser constituída por palavras e não ter envolvido qualquer figura e desenho, apresentação visual própria. A mesma é constituída exclusivamente por um nome geográfico, referindo-se a uma cidade alemã, que, no comércio, possa servir para designar a proveniência geográfica, não tendo, para além disso, qualquer capacidade distintiva.
III - O aditamento de “THE”, antes do nome de cidade, não é suficiente para afastar a conexão entre a cidade Munique e a origem dos serviços que a marca se refere, nem permite que os consumidores reconhecem que os serviços em causa provêm do Recorrente.

IV - É possível conceder o registo da marca, apesar de todos os elementos serem descritivos, se a marca tiver já adquirido um “secondary meaning” que lhe confira eficácia distintiva, ou seja, quando a marca deixa de ser apreendida pelo público pelo seu sentido descritivo, mas sim por um outro sentido não descritivo ligado a determinada empresa, não é, porém, o caso da marca “”, por nada se resulta que a marca registanda tinha adquirido já qualquer “secondary meaning”, razão pela qual é de julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
*
    Tudo visto e analisado, resta decidir.
* * *
V) - DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.
*
    Custas pelo Recorrente.
*
    Registe e Notifique.
*
RAEM, 10 de Janeiro de 2019.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho

1 Vide Lições de Direito Comercial, Vol. I, pág. 323.
2 Vide Luís M. Couto Gonçalves, Manual de Direito Industrial, pág. 171
3 Vide Luís M. Couto Gonçalves, obra citada, pág. 173
4 Vide Luís M. Couto Gonçalves, Direito de Marcas, pág. 74.
5 Vide Propriedade Industrial, vol. 1, 2.ª , pág. 86.
6 Vide Direito de Marcas, pág. 80.
7 Obr. cit., pág. 76.
8 Cfr. Ac. do TSI de 26 d Julho de 2007, processo n.º 516/2006.
9 In Direito de Marcas, pg. 142 e 143
10 Cfr. Ac. do TSI de 26 d Julho de 2007, processo n.º 516/2006.
11 Freizeichen: HÃMMERLE, ob. cit., pág.222.
12 Observe-se, no entanto, que os sinais descritivos e de uso genérico (quer figurativos, quer nominativos) poderão ser usados como marca desde que, pelo modo artístico ou original como sejam apresentados, revelem idoneidade distintiva (FERRARA JUNIOR, ob. cit., pág.213). Só que o direito a marca não abrange aqui o conteúdo ideológico do sinal, mas apenas a respectiva forma ou composição.
   Por outro lado, as expressões que, por virtude do seu uso genérico em relação a certos produtos, não podem ser usadas como marcas de tais produtos, podê-lo-ão ser, todavia, para distinguir produtos diversos: FERRARA JUNIOR, ob. cit., págs.213-214, e HÃMMERLE, ob. cit., pág.222 (ex.:a imagem da lira poderá ser usada como marca figurativa de artigos eléctricos, embora não possa utilizar-se ‒ HÃMMERLE, ibid.‒para marcar instrumentos musicais).
13 Observe-se que os sinais referidos na 1ª parte do 1º do art. 79º (sinais descritivos) são também sinais fracos.
   O problema de saber se determinada expressão ou sinal possui aptidão diferenciadora traduz-se numa questão de facto, que só poderá ser decidida perante cada caso concreto. Deverá atender-se, nomeadamente, ao uso que dessa expressão ou sinal porventura se venha fazendo e à opinião das pessoas ligadas à produção e ao consumo do produto em causa.
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------





2018-945-marca-The-Munich 36